TJRR 10080103814
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001008010381-4 - DA COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE : ROTAUTO RORAIMA AUTOMÓVEIS LTDA.
ADVOGADO : RICARDO HERCULANO BULHÕES DE MATTOS FILHO
APELADOS : R. DA S. L. J. E OUTROS
ADVOGADA : ANTONIETA MAGALHÃES AGUIAR
RELATORA : Dra. TÂNIA VASCONCELOS
RELATÓRIO
Rotauto Roraima Automóveis Ltda, devidamente qualificada nos autos em epígrafe, inconformada com a sentença de fls. 1.143/1.152, proferida pelo MM. Juiz da 3ª Vara Cível, que julgou procedente a Ação de Anulação de Escritura Pública de Compra e Venda c/c Pedido de Indenização (proc. nº 001002027953-4), aforada pelos menores impúberes L. S. da S. L. , R. da S. L. J. e R. da S. L. N., interpõe o presente recurso.
Na petição inicial aduzem os autores que são filhos do finado R. da S. L. F., morto em 29.01.1994, os quais herdaram cada um 16,5% (dezesseis vírgula cinco por cento) das quotas da empresa Rorasa-Roraima Diesel Ltda, perfazendo o total de 49,5% (quarenta e nove vírgula cinco por cento), sendo que 50,5% (cinqüenta vírgula cinco por cento) ficou destinada à cônjuge-meeira N. M. C. S. , que já possuía antes do falecimento de seu esposo 1% (um por cento) do capital social da referida empresa.
Após regular tramitação do feito, o MM. Juiz da causa, confirmando o pedido de antecipação de tutela concedido, proferiu a sentença de fls. 1.143/1.152, declarando a nulidade do negócio jurídico de compra e venda celebrado entre as partes litigantes, bem como da respectiva escritura pública e registro no Cartório Imobiliário, retornando o registro do imóvel a figurar em nome da empresa Rorasa-Roraima Diesel Ltda, e a pagarem os demandados, a título de danos materiais, prestações mensais no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), correspondentes a 2/3 (dois terços) do valor locatício do imóvel, desde a primeira alienação anulada.
Irresignada, alega a apelante Rotauto Roraima Automóveis Ltda, em sede preliminar, a ilegitimidade ativa “ad causam” dos menores/apelados, sob o argumento de que a sua mãe é detentora de mais da metade das cotas da empresa alienada, portanto, sendo esta a única detentora de poderes para propor tal demanda, e nulidade da sentença impugnada, por se tratar de julgamento “extra petita”, pois, segundo entende, o MM. Juiz da causa concedeu indenização por danos materiais, sem terem os autores pleiteado na peça inicial. No mérito, sustenta que “não é imperioso para validade da escritura de compra e venda de fls. 34/35 a existência de autorização judicial para a venda de imóvel pertencente à sociedade cujos sócios minoritários são menores. [...] pois não atinge a nenhuma parte útil do negócio, não sendo necessário a sua existência para a alienação do imóvel objeto desta ação e a fraude cometida não afeta os requisitos de validade (fls. 1.165/1.179).
Em contra-razões, pugna a recorrida pela manutenção da sentença hostilizada, sob o fundamento de que a apelante “busca a todo o custo realizar o impossível, ou seja, que a Justiça convalide a venda fraudulenta de um imóvel mediante o uso de um alvará falso, cuja propriedade cabia aos herdeiros menores aqui recorridos e, que fora vendido sem a indispensável prévia autorização judicial, o que atenta contra todo ordenamento jurídico pátrio, a moral e a ética” (fls. 1.187/1.213).
Instado a se manifestar o douto Procurador de Justiça opina pelo desprovimento do recurso (fls. 1.220/1.231).
Eis o sucinto relato, que submeto à douta revisão regimental, nos moldes do art. 178, III do RITJ/RR.
Boa Vista, 21 de novembro de 2008.
Dra. TÂNIA VASCONCELOS – Relatora
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001008010381-4 – DA COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE : ROTAUTO RORAIMA AUTOMÓVEIS LTDA
ADVOGADO : RICARDO HERCULANO BULHÕES DE MATTOS FILHO
APELADOS : R. DA S. L. J. E OUTROS
ADVOGADA : ANTONIETA MAGALHÃES AGUIAR
RELATORA : Dra. TÂNIA VASCONCELOS
VOTO – PRELIMINAR
Antes de adentrar ao mérito da presente irresignação, cumpre-me examinar as preliminares de ilegitimidade “ad causam” ativa dos menores/apelados, sob o argumento de que a mãe destes é detentora de mais da metade das cotas da empresa alienada, sendo ela, portanto, a única detentora de poderes para propor tal demanda, e nulidade da sentença impugnada, por se tratar de julgamento “extra petita”, pois, segundo entende a apelante, o MM. Juiz da causa concedeu indenização por danos materiais, sem que tal pedido esteja consignado na inicial.
I – Ilegitimidade ativa dos apelados
Não prospera a alegada ilegitimidade ativa dos apelados para propor a presente ação.
Ora, como a própria apelante reconhece, os recorridos eram detentores de 49,5% (quarenta e nove vírgula cinco por cento) das cotas da empresa objeto da ação, cujo bem, segundo consta dos autos, fora alienado sem observância das formalidades legais, eis que o MM. Juiz que presidiu o inventário do falecido pai dos autores, menores à época, não autorizou a expedição de alvará judicial permitindo a venda da empresa. Logo, em face da postulação deduzida na peça inicial almejar a decretação da nulidade dos atos jurídicos que culminaram com a alienação da empresa integrante do espólio, emerge dessas premissas claramente a legitimidade ativa dos herdeiros menores, por força do disposto no artigo 1.691, § único, inciso I, do CC/2002, para aforar a presente ação anulatória.
Isto posto, afasto a preliminar sob exame.
II – Nulidade da sentença, por se tratar de julgamento “extra petita”
De igual modo, deve ser rejeitada a preliminar de nulidade da sentença, por julgamento “extra petita”, pois como bem ressaltou o douto Procurador de Justiça em seu judicioso parecer “o pedido de indenização por danos materiais está na inicial (fl. 13), assim não cabendo falar-se em decisão “extra petita”. Além disso, amolda-se perfeitamente ao caso em comento, pois os danos causados aos menores devem ser reparados” (fl. 1.230).
Compulsando-se os autos, efetivamente se pode constatar que o pedido de reparação por danos materiais está inserido na peça inicial, precisamente à fl. 13. Desse modo, rejeito esta preliminar.
À vista do exposto, corroborando o mesmo entendimento do digno Procurador de Justiça, rejeito as preliminares argüidas pela recorrente.
É como voto, em preliminar.
Boa Vista, 16 de dezembro de 2008.
Dra. TÂNIA VASCONCELOS – Relatora
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001008010381-4 – DA COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE : ROTAUTO RORAIMA AUTOMÓVEIS LTDA.
ADVOGADO : RICARDO HERCULANO BULHÕES DE MATTOS FILHO
APELADOS : R. DA S. L. J. E OUTROS
ADVOGADA : ANTONIETA MAGALHÃES AGUIAR
RELATORA : Dra. TÂNIA VASCONCELOS
VOTO – MÉRITO
Inicialmente, importa esclarecer que os apelados L. S. da S. L. , R. da S. L. N., R. da S. L. J. são filhos do finado R. da S. L. F., morto em 29.01.1994, deixando os seus filhos menores impúberes, sendo que, atualmente, apenas L. S. da S. L. ainda é menor de idade.
Às fls. 22/29, comprova-se que os apelados herdaram 49,5% (quarenta e nove vírgula cinco por cento) das quotas da empresa Rorasa-Roraima Diesel Ltda, sendo que 50,5% (cinqüenta vírgula cinco por cento) do referido bem destinou-se à cônjuge-meeira, N. M. C. S. .
Através da procuração por escritura pública de fls. 34/35, datada de 03.04.1997, o sr. J. A. M., procurador da sócia majoritária, vendeu a empresa ao sr. S. C. da S..
Pela relevância, urge anotar que a alienação da referida empresa foi feita com base no alvará judicial acostado às fls. 37/38, datado de 09.02.1996, que não continha, como de fato não contém, a assinatura do MM. Juiz de Direito da 1ª Vara de Família do Amazonas, Dr. Kid Mendes de Oliveira, cuja irregularidade levou o sr. Escrivão a certificar à fl. 42, aos 14.04.1997, que “verifiquei não constar pedido e nem emissão de alvará judicial objetivando a venda da empresa Rorasa-Roraima Diesel Ltda”.
Não obstante tal irregularidade, aos 14.04.1997 lavrou-se a escritura de compra e venda da empresa, constando como adquirente o sr. S. C. da S. (fl. 43), sendo esta incorporada à empresa Rotauto Roraima Automóveis Ltda, consoante se vê às fls. 67/69.
Feita essas considerações, passa-se ao exame propriamente dito do mérito da presente irresignação.
Do estudo do caderno processual em cotejo com as razões deduzidas neste recurso, entendo que agiu com acerto o MM. Juiz sentenciante, ao julgar procedente a ação de anulatória aforada, resultando na nulidade do ato jurídico de alienação da empresa Rorasa-Roraima Diesel Ltda.
Com efeito, restou devidamente comprovado nos autos, que os apelados, mesmo através da inventariante-meeira, NÃO requereram a expedição de alvará judicial para vender a empresa, objeto da lide.
Ademais, a falta de assinatura no alvará judicial de fls. 37/38, do magistrado que presidira o juízo de sucessão contamina o negócio jurídico realizado de nulidade absoluta, posto que, em sendo a empresa um dos bens integrantes do espólio deixado por R. da S. L. F., somente poderia ocorrer a alienação através da prévia autorização judicial, isto porque todos os herdeiros necessários eram, à época, menores impúberes.
Logo, diante da evidente ineficácia do necessário alvará judicial autorizando a alienação da empresa Rorasa-Roraima Diesel Ltda, a compra e venda realizada afrontou o disposto no artigo 1.691, do Código Civil Brasileiro, tornando nulo, de pleno direito, o negócio jurídico realizado, além de conferir legitimidade ativa aos apelados para pleitear que o Poder Judiciário declare tal nulidade.
Nesta direção, é indiscutível o comando legal do artigo 1.691, do novel Código Civil Brasileiro, “verbis”:
“Art. 1691. Não podem os pais alienar, ou gravar de ônus real os imóveis dos filhos, nem contrair, em nome deles, obrigações que ultrapassem os limites da simples administração, salvo por necessidade ou evidente interesse da prole, mediante prévia autorização do juiz.
Parágrafo único. Podem pleitear a declaração de nulidade dos atos previstos neste artigo:
I - os filhos;
II - os herdeiros;
III - o representante legal.”
Por seu turno, a jurisprudência não diverge da assertiva de que deve ser decretada a nulidade do ato jurídico de alienação, quando o imóvel vendido, sem prévia autorização legal, pertencia a menores impúberes:
"Venda de imóvel de menor relativamente incapaz sem autorização judicial. Caso de nulidade e não de anulabilidade. Incidência do art. 386 do CC. Prescrição vintenária e não a anual do art. 178, §6°, III". (TJRS/Ap. Cív. 583046198/3ª Câmara Cível/Rel. Des. Galendo Lacerda, j. 14.06.84).
"AÇÃO ANULATÓRIA DE BENS DE MENOR ALIENADOS PELA CONVIVENTE MEEIRA SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 145, INCS. III E IV, DO CÓD. CIVIL. NULIDADE. PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA. INEFICÁCIA DO ATO. APELO IMPROVIDO.
I - Os bens do espólio, sejam móveis ou imóveis, não podem ser alienados pela inventariante, sem autorização judicial, porquanto não possui poderes de disposição, máxime havendo herdeiros menores.
II - A prescrição para o ajuizamento da ação anulatória, neste caso, é vintenária, subordinada, assim, ao art. 177, do Cód. Civil". (TJPR/Ap. Cível 102.752-9/2ª Câmara Cível/Rel. Des. Munir Karam).
Importa assinalar, que não se trata apenas de descumprimento de formalidade legal na celebração do ato jurídico em apreço, que por si só já respaldaria o decreto de nulidade, mas também de evidente afronta aos interesses dos menores recorridos que tiveram, consoante evidenciado nos autos, a dilapidação de parte de seus bens.
Nesta linha de raciocínio, não socorre à apelada a alegativa de serem os recorridos detentores minoritários das quotas da empresa alienada ou o fato de a gerente-meeira dispor de poderes para vender a empresa.
Como bem realçou o douto Procurador de Justiça no parecer de fls. 1.220/1.231, “essa afirmação contraria, no mínimo, o bom senso. Então a condição de sócia majoritária tem o condão de se sobrepor ao interesse dos menores, que está resguardado pelo artigo 1.691, do CC/02? Lógico que era necessário o competente alvará judicial para a venda da empresa. Tanto é verdade que tal documento foi “providenciado”. No entanto, o alvará utilizado para efetuar a compra e venda da empresa não foi expedido pelo magistrado (certidão judicial de fl. 42), assim ao que parece, restou forjado nos autos. [...] Partindo desse pressuposto, o negócio efetuado – venda da empresa RORASA-RORAIMA DIESEL LTDA – é nula de pleno direito, pois baseou-se em documento que descumpriu a forma prevista em lei. [...] No caso em tela, restou demonstrado que o alvará judicial de fls. 37/38, não é válido. E isso equipara-se a ausência do alvará judicial para a venda do bem.”
Desse modo, afigura-se incontroversamente provado o vício de formalidade legal no ato de alienação da empresa objeto da lide, eis que em se tratando de parte do patrimônio pertencente a menores impúberes, a venda imprescindiria da necessária autorização judicial, a teor do artigo 1.691, do Código Civil, não importando se a sócia majoritária da empresa possuía poderes para vendê-la ou o fato dos adquirentes terem agido de boa-fé.
Sendo assim, tenho que o MM. Juiz da causa laborou com acerto ao julgar procedente a Ação de Anulação de Escritura Pública de Compra e Venda c/c Pedido de Indenização (proc. nº 001002027953-4), aforada pelos menores impúberes L. S. da S. L. , R. da S. L. J. e R. da S. L. N., não merecendo, destarte, qualquer censura a sentença impugnada.
Finalmente, as questões relativas à eventual ressarcimento aos adquirentes; negócios subjacentes entre terceiros envolvidos na relação contratual anulada e a sócia majoritária ou o modo como será processado o pagamento dos danos materiais impostos na sentença, deverão ser enfrentados no Juízo “a quo”, na fase de execução de sentença.
À vista do exposto, considerando as provas existentes nos autos e a legislação aplicável ao caso concreto, em harmonia com o parecer ministerial, voto pelo improvimento do presente recurso, mantendo na íntegra a sentença vergastada.
É como voto.
Boa Vista, 16 de dezembro de 2008.
Dra. TÂNIA VASCONCELOS – Relatora
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001008010381-4 – DA COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE : ROTAUTO RORAIMA AUTOMÓVEIS LTDA.
ADVOGADO : RICARDO HERCULANO BULHÕES DE MATTOS FILHO
APELADOS : R. DA S. L. J. E OUTROS
ADVOGADA : ANTONIETA MAGALHÃES AGUIAR
RELATORA : Dra. TÂNIA VASCONCELOS
EMENTA – APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO C/C PEDIDO DE INDENIZAÇÃO. DIREITO HEREDITÁRIO. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE ATIVA DOS HERDEIROS MENORES E JULGAMENTO “EXTRA PETITA”. REJEIÇÃO. MÉRITO: ALIENAÇÃO DE IMÓVEL. INTERESSE DE INCAPAZ. NECESSIDADE DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. EXIGIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 1.691, DO CC/2002. FORMALIDADE LEGAL NÃO OBSERVADA. CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA HOSTILIZADA. RECURSO IMPROVIDO.
1. A legitimidade é aferida em razão das afirmações contidas na petição inicial, bastando que da análise abstrata dos fatos ali narrados se observe as condições da ação.
2. Consoante o disposto no artigo 1.691, do novel Código Civil Brasileiro, “não podem os pais alienar, ou gravar de ônus real os imóveis dos filhos, nem contrair, em nome deles, obrigações que ultrapassem os limites da simples administração, salvo por necessidade ou evidente interesse da prole, mediante prévia autorização do juiz”.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, acordam os membros da Turma Cível da colenda Câmara Única do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em rejeitar as preliminares de ilegitimidade ativa e nulidade da sentença por julgamento “extra petita”, e no mérito, em harmonia com o parecer ministerial, negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora.
Boa Vista, 16 de dezembro de 2008.
Des. CARLOS HENRIQUES – Presidente
Dra. TÂNIA VASCONCELOS – Relatora
Des. RICARDO OLIVEIRA – Julgador
Esteve presente o Dr. - Procurador de Justiça.
Publicado no Diário do Poder Judiciário, Boa Vista, 7 de janeiro de 2009 Diário do Poder Judiciário ANO XII - EDIÇÃO 3998, p. 02.
( : 16/12/2008 ,
: ,
: 0 ,
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001008010381-4 - DA COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE : ROTAUTO RORAIMA AUTOMÓVEIS LTDA.
ADVOGADO : RICARDO HERCULANO BULHÕES DE MATTOS FILHO
APELADOS : R. DA S. L. J. E OUTROS
ADVOGADA : ANTONIETA MAGALHÃES AGUIAR
RELATORA : Dra. TÂNIA VASCONCELOS
RELATÓRIO
Rotauto Roraima Automóveis Ltda, devidamente qualificada nos autos em epígrafe, inconformada com a sentença de fls. 1.143/1.152, proferida pelo MM. Juiz da 3ª Vara Cível, que julgou procedente a Ação de Anulação de Escritura Pública de Compra e Venda c/c Pedido de Indenização (proc. nº 001002027953-4), aforada pelos menores impúberes L. S. da S. L. , R. da S. L. J. e R. da S. L. N., interpõe o presente recurso.
Na petição inicial aduzem os autores que são filhos do finado R. da S. L. F., morto em 29.01.1994, os quais herdaram cada um 16,5% (dezesseis vírgula cinco por cento) das quotas da empresa Rorasa-Roraima Diesel Ltda, perfazendo o total de 49,5% (quarenta e nove vírgula cinco por cento), sendo que 50,5% (cinqüenta vírgula cinco por cento) ficou destinada à cônjuge-meeira N. M. C. S. , que já possuía antes do falecimento de seu esposo 1% (um por cento) do capital social da referida empresa.
Após regular tramitação do feito, o MM. Juiz da causa, confirmando o pedido de antecipação de tutela concedido, proferiu a sentença de fls. 1.143/1.152, declarando a nulidade do negócio jurídico de compra e venda celebrado entre as partes litigantes, bem como da respectiva escritura pública e registro no Cartório Imobiliário, retornando o registro do imóvel a figurar em nome da empresa Rorasa-Roraima Diesel Ltda, e a pagarem os demandados, a título de danos materiais, prestações mensais no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), correspondentes a 2/3 (dois terços) do valor locatício do imóvel, desde a primeira alienação anulada.
Irresignada, alega a apelante Rotauto Roraima Automóveis Ltda, em sede preliminar, a ilegitimidade ativa “ad causam” dos menores/apelados, sob o argumento de que a sua mãe é detentora de mais da metade das cotas da empresa alienada, portanto, sendo esta a única detentora de poderes para propor tal demanda, e nulidade da sentença impugnada, por se tratar de julgamento “extra petita”, pois, segundo entende, o MM. Juiz da causa concedeu indenização por danos materiais, sem terem os autores pleiteado na peça inicial. No mérito, sustenta que “não é imperioso para validade da escritura de compra e venda de fls. 34/35 a existência de autorização judicial para a venda de imóvel pertencente à sociedade cujos sócios minoritários são menores. [...] pois não atinge a nenhuma parte útil do negócio, não sendo necessário a sua existência para a alienação do imóvel objeto desta ação e a fraude cometida não afeta os requisitos de validade (fls. 1.165/1.179).
Em contra-razões, pugna a recorrida pela manutenção da sentença hostilizada, sob o fundamento de que a apelante “busca a todo o custo realizar o impossível, ou seja, que a Justiça convalide a venda fraudulenta de um imóvel mediante o uso de um alvará falso, cuja propriedade cabia aos herdeiros menores aqui recorridos e, que fora vendido sem a indispensável prévia autorização judicial, o que atenta contra todo ordenamento jurídico pátrio, a moral e a ética” (fls. 1.187/1.213).
Instado a se manifestar o douto Procurador de Justiça opina pelo desprovimento do recurso (fls. 1.220/1.231).
Eis o sucinto relato, que submeto à douta revisão regimental, nos moldes do art. 178, III do RITJ/RR.
Boa Vista, 21 de novembro de 2008.
Dra. TÂNIA VASCONCELOS – Relatora
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001008010381-4 – DA COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE : ROTAUTO RORAIMA AUTOMÓVEIS LTDA
ADVOGADO : RICARDO HERCULANO BULHÕES DE MATTOS FILHO
APELADOS : R. DA S. L. J. E OUTROS
ADVOGADA : ANTONIETA MAGALHÃES AGUIAR
RELATORA : Dra. TÂNIA VASCONCELOS
VOTO – PRELIMINAR
Antes de adentrar ao mérito da presente irresignação, cumpre-me examinar as preliminares de ilegitimidade “ad causam” ativa dos menores/apelados, sob o argumento de que a mãe destes é detentora de mais da metade das cotas da empresa alienada, sendo ela, portanto, a única detentora de poderes para propor tal demanda, e nulidade da sentença impugnada, por se tratar de julgamento “extra petita”, pois, segundo entende a apelante, o MM. Juiz da causa concedeu indenização por danos materiais, sem que tal pedido esteja consignado na inicial.
I – Ilegitimidade ativa dos apelados
Não prospera a alegada ilegitimidade ativa dos apelados para propor a presente ação.
Ora, como a própria apelante reconhece, os recorridos eram detentores de 49,5% (quarenta e nove vírgula cinco por cento) das cotas da empresa objeto da ação, cujo bem, segundo consta dos autos, fora alienado sem observância das formalidades legais, eis que o MM. Juiz que presidiu o inventário do falecido pai dos autores, menores à época, não autorizou a expedição de alvará judicial permitindo a venda da empresa. Logo, em face da postulação deduzida na peça inicial almejar a decretação da nulidade dos atos jurídicos que culminaram com a alienação da empresa integrante do espólio, emerge dessas premissas claramente a legitimidade ativa dos herdeiros menores, por força do disposto no artigo 1.691, § único, inciso I, do CC/2002, para aforar a presente ação anulatória.
Isto posto, afasto a preliminar sob exame.
II – Nulidade da sentença, por se tratar de julgamento “extra petita”
De igual modo, deve ser rejeitada a preliminar de nulidade da sentença, por julgamento “extra petita”, pois como bem ressaltou o douto Procurador de Justiça em seu judicioso parecer “o pedido de indenização por danos materiais está na inicial (fl. 13), assim não cabendo falar-se em decisão “extra petita”. Além disso, amolda-se perfeitamente ao caso em comento, pois os danos causados aos menores devem ser reparados” (fl. 1.230).
Compulsando-se os autos, efetivamente se pode constatar que o pedido de reparação por danos materiais está inserido na peça inicial, precisamente à fl. 13. Desse modo, rejeito esta preliminar.
À vista do exposto, corroborando o mesmo entendimento do digno Procurador de Justiça, rejeito as preliminares argüidas pela recorrente.
É como voto, em preliminar.
Boa Vista, 16 de dezembro de 2008.
Dra. TÂNIA VASCONCELOS – Relatora
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001008010381-4 – DA COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE : ROTAUTO RORAIMA AUTOMÓVEIS LTDA.
ADVOGADO : RICARDO HERCULANO BULHÕES DE MATTOS FILHO
APELADOS : R. DA S. L. J. E OUTROS
ADVOGADA : ANTONIETA MAGALHÃES AGUIAR
RELATORA : Dra. TÂNIA VASCONCELOS
VOTO – MÉRITO
Inicialmente, importa esclarecer que os apelados L. S. da S. L. , R. da S. L. N., R. da S. L. J. são filhos do finado R. da S. L. F., morto em 29.01.1994, deixando os seus filhos menores impúberes, sendo que, atualmente, apenas L. S. da S. L. ainda é menor de idade.
Às fls. 22/29, comprova-se que os apelados herdaram 49,5% (quarenta e nove vírgula cinco por cento) das quotas da empresa Rorasa-Roraima Diesel Ltda, sendo que 50,5% (cinqüenta vírgula cinco por cento) do referido bem destinou-se à cônjuge-meeira, N. M. C. S. .
Através da procuração por escritura pública de fls. 34/35, datada de 03.04.1997, o sr. J. A. M., procurador da sócia majoritária, vendeu a empresa ao sr. S. C. da S..
Pela relevância, urge anotar que a alienação da referida empresa foi feita com base no alvará judicial acostado às fls. 37/38, datado de 09.02.1996, que não continha, como de fato não contém, a assinatura do MM. Juiz de Direito da 1ª Vara de Família do Amazonas, Dr. Kid Mendes de Oliveira, cuja irregularidade levou o sr. Escrivão a certificar à fl. 42, aos 14.04.1997, que “verifiquei não constar pedido e nem emissão de alvará judicial objetivando a venda da empresa Rorasa-Roraima Diesel Ltda”.
Não obstante tal irregularidade, aos 14.04.1997 lavrou-se a escritura de compra e venda da empresa, constando como adquirente o sr. S. C. da S. (fl. 43), sendo esta incorporada à empresa Rotauto Roraima Automóveis Ltda, consoante se vê às fls. 67/69.
Feita essas considerações, passa-se ao exame propriamente dito do mérito da presente irresignação.
Do estudo do caderno processual em cotejo com as razões deduzidas neste recurso, entendo que agiu com acerto o MM. Juiz sentenciante, ao julgar procedente a ação de anulatória aforada, resultando na nulidade do ato jurídico de alienação da empresa Rorasa-Roraima Diesel Ltda.
Com efeito, restou devidamente comprovado nos autos, que os apelados, mesmo através da inventariante-meeira, NÃO requereram a expedição de alvará judicial para vender a empresa, objeto da lide.
Ademais, a falta de assinatura no alvará judicial de fls. 37/38, do magistrado que presidira o juízo de sucessão contamina o negócio jurídico realizado de nulidade absoluta, posto que, em sendo a empresa um dos bens integrantes do espólio deixado por R. da S. L. F., somente poderia ocorrer a alienação através da prévia autorização judicial, isto porque todos os herdeiros necessários eram, à época, menores impúberes.
Logo, diante da evidente ineficácia do necessário alvará judicial autorizando a alienação da empresa Rorasa-Roraima Diesel Ltda, a compra e venda realizada afrontou o disposto no artigo 1.691, do Código Civil Brasileiro, tornando nulo, de pleno direito, o negócio jurídico realizado, além de conferir legitimidade ativa aos apelados para pleitear que o Poder Judiciário declare tal nulidade.
Nesta direção, é indiscutível o comando legal do artigo 1.691, do novel Código Civil Brasileiro, “verbis”:
“Art. 1691. Não podem os pais alienar, ou gravar de ônus real os imóveis dos filhos, nem contrair, em nome deles, obrigações que ultrapassem os limites da simples administração, salvo por necessidade ou evidente interesse da prole, mediante prévia autorização do juiz.
Parágrafo único. Podem pleitear a declaração de nulidade dos atos previstos neste artigo:
I - os filhos;
II - os herdeiros;
III - o representante legal.”
Por seu turno, a jurisprudência não diverge da assertiva de que deve ser decretada a nulidade do ato jurídico de alienação, quando o imóvel vendido, sem prévia autorização legal, pertencia a menores impúberes:
"Venda de imóvel de menor relativamente incapaz sem autorização judicial. Caso de nulidade e não de anulabilidade. Incidência do art. 386 do CC. Prescrição vintenária e não a anual do art. 178, §6°, III". (TJRS/Ap. Cív. 583046198/3ª Câmara Cível/Rel. Des. Galendo Lacerda, j. 14.06.84).
"AÇÃO ANULATÓRIA DE BENS DE MENOR ALIENADOS PELA CONVIVENTE MEEIRA SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 145, INCS. III E IV, DO CÓD. CIVIL. NULIDADE. PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA. INEFICÁCIA DO ATO. APELO IMPROVIDO.
I - Os bens do espólio, sejam móveis ou imóveis, não podem ser alienados pela inventariante, sem autorização judicial, porquanto não possui poderes de disposição, máxime havendo herdeiros menores.
II - A prescrição para o ajuizamento da ação anulatória, neste caso, é vintenária, subordinada, assim, ao art. 177, do Cód. Civil". (TJPR/Ap. Cível 102.752-9/2ª Câmara Cível/Rel. Des. Munir Karam).
Importa assinalar, que não se trata apenas de descumprimento de formalidade legal na celebração do ato jurídico em apreço, que por si só já respaldaria o decreto de nulidade, mas também de evidente afronta aos interesses dos menores recorridos que tiveram, consoante evidenciado nos autos, a dilapidação de parte de seus bens.
Nesta linha de raciocínio, não socorre à apelada a alegativa de serem os recorridos detentores minoritários das quotas da empresa alienada ou o fato de a gerente-meeira dispor de poderes para vender a empresa.
Como bem realçou o douto Procurador de Justiça no parecer de fls. 1.220/1.231, “essa afirmação contraria, no mínimo, o bom senso. Então a condição de sócia majoritária tem o condão de se sobrepor ao interesse dos menores, que está resguardado pelo artigo 1.691, do CC/02? Lógico que era necessário o competente alvará judicial para a venda da empresa. Tanto é verdade que tal documento foi “providenciado”. No entanto, o alvará utilizado para efetuar a compra e venda da empresa não foi expedido pelo magistrado (certidão judicial de fl. 42), assim ao que parece, restou forjado nos autos. [...] Partindo desse pressuposto, o negócio efetuado – venda da empresa RORASA-RORAIMA DIESEL LTDA – é nula de pleno direito, pois baseou-se em documento que descumpriu a forma prevista em lei. [...] No caso em tela, restou demonstrado que o alvará judicial de fls. 37/38, não é válido. E isso equipara-se a ausência do alvará judicial para a venda do bem.”
Desse modo, afigura-se incontroversamente provado o vício de formalidade legal no ato de alienação da empresa objeto da lide, eis que em se tratando de parte do patrimônio pertencente a menores impúberes, a venda imprescindiria da necessária autorização judicial, a teor do artigo 1.691, do Código Civil, não importando se a sócia majoritária da empresa possuía poderes para vendê-la ou o fato dos adquirentes terem agido de boa-fé.
Sendo assim, tenho que o MM. Juiz da causa laborou com acerto ao julgar procedente a Ação de Anulação de Escritura Pública de Compra e Venda c/c Pedido de Indenização (proc. nº 001002027953-4), aforada pelos menores impúberes L. S. da S. L. , R. da S. L. J. e R. da S. L. N., não merecendo, destarte, qualquer censura a sentença impugnada.
Finalmente, as questões relativas à eventual ressarcimento aos adquirentes; negócios subjacentes entre terceiros envolvidos na relação contratual anulada e a sócia majoritária ou o modo como será processado o pagamento dos danos materiais impostos na sentença, deverão ser enfrentados no Juízo “a quo”, na fase de execução de sentença.
À vista do exposto, considerando as provas existentes nos autos e a legislação aplicável ao caso concreto, em harmonia com o parecer ministerial, voto pelo improvimento do presente recurso, mantendo na íntegra a sentença vergastada.
É como voto.
Boa Vista, 16 de dezembro de 2008.
Dra. TÂNIA VASCONCELOS – Relatora
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001008010381-4 – DA COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE : ROTAUTO RORAIMA AUTOMÓVEIS LTDA.
ADVOGADO : RICARDO HERCULANO BULHÕES DE MATTOS FILHO
APELADOS : R. DA S. L. J. E OUTROS
ADVOGADA : ANTONIETA MAGALHÃES AGUIAR
RELATORA : Dra. TÂNIA VASCONCELOS
EMENTA – APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO C/C PEDIDO DE INDENIZAÇÃO. DIREITO HEREDITÁRIO. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE ATIVA DOS HERDEIROS MENORES E JULGAMENTO “EXTRA PETITA”. REJEIÇÃO. MÉRITO: ALIENAÇÃO DE IMÓVEL. INTERESSE DE INCAPAZ. NECESSIDADE DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. EXIGIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 1.691, DO CC/2002. FORMALIDADE LEGAL NÃO OBSERVADA. CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA HOSTILIZADA. RECURSO IMPROVIDO.
1. A legitimidade é aferida em razão das afirmações contidas na petição inicial, bastando que da análise abstrata dos fatos ali narrados se observe as condições da ação.
2. Consoante o disposto no artigo 1.691, do novel Código Civil Brasileiro, “não podem os pais alienar, ou gravar de ônus real os imóveis dos filhos, nem contrair, em nome deles, obrigações que ultrapassem os limites da simples administração, salvo por necessidade ou evidente interesse da prole, mediante prévia autorização do juiz”.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, acordam os membros da Turma Cível da colenda Câmara Única do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em rejeitar as preliminares de ilegitimidade ativa e nulidade da sentença por julgamento “extra petita”, e no mérito, em harmonia com o parecer ministerial, negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora.
Boa Vista, 16 de dezembro de 2008.
Des. CARLOS HENRIQUES – Presidente
Dra. TÂNIA VASCONCELOS – Relatora
Des. RICARDO OLIVEIRA – Julgador
Esteve presente o Dr. - Procurador de Justiça.
Publicado no Diário do Poder Judiciário, Boa Vista, 7 de janeiro de 2009 Diário do Poder Judiciário ANO XII - EDIÇÃO 3998, p. 02.
( : 16/12/2008 ,
: ,
: 0 ,
Data do Julgamento
:
16/12/2008
Data da Publicação
:
07/01/2009
Classe/Assunto
:
Apelação Cível )
Relator(a)
:
JUIZA TANIA MARIA VASCONCELOS DIAS DE SOUZA CRUZ
Tipo
:
Acórdão
Mostrar discussão