TJRR 10080103954
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIME Nº 010 08 010395-4 COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
APELADO:JOÃO PAULO ROCHA OLIVEIRA
ADVOGADO: JAEDER NATAL RIBEIRO
RELATOR: DES. CARLOS HENRIQUES
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação crime, interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA em face de JOÃO PAULO ROCHA OLIVEIRA, em virtude da sentença de fls. 214/220, Autos n.º 0010 04 078633-6, que, com base no artigo 26 do Código Penal, julgou improcedente a acusação, declarando inimputável o acusado, ora apelado, por considerá-lo inteiramente incapaz de entender a ilicitude da ação praticada, absolvendo-o das penas do artigo 157, § 3º, 2ª figura (latrocínio) c/c o artigo 61, II, “a” do citado Código, aplicando, ainda, medida de segurança na forma do artigo 97 do CP.
Em sede de apelação, invocando a teoria da actio libera in causa, alega o Parquet (fls. 237/240), em síntese: que o acusado não é inimputável, eis que tinha plena consciência do que fazia, uma vez que cometeu o ilícito para assegurar o sucesso do crime anterior; que não há base sólida na perícia que concluiu estar o apelado sob efeito de cocaína no momento exato do fato, apontando contradição no laudo pericial, bem como questionando a data em que ocorreu o exame (1 ano e 2 meses após o fato).
Ao final, evocando o princípio do livre convencimento motivado e a apreciação conjunta das provas, requer a reforma da sentença para não se conhecer da imputabilidade do apelado e, em decorrência, condená-lo nas penas do crime em que foi incurso, como requerido e já reconhecido na sentença absolutória imprópria proferida.
Em sede de contra-razões, a defesa do apelado, às fls. 242/245, alega ser completamente descabida a teoria invocada pelo apelante, tendo em vista a comprovação da existência de doença mental, cujo laudo indicador do distúrbio mental não restou impugnado, bem como que o apelante não formulou, na fase apropriada, o pedido de provas que desejava produzir no sentido de infirmar o exame de insanidade mental, não podendo fazê-lo nas razões de apelação, sendo correta a decisão que absolveu o apelado, reconhecendo sua inimputabilidade e aplicando-lhe medida de segurança.
Nesta instância recursal, a Procuradoria Geral de Justiça, em judicioso parecer acostado às fls. 255/259, opina pelo conhecimento do recurso, para, no mérito, reformar a sentença a quo, com o fim de condenar o apelado nas penas do artigo 157, § 3º, 2ª figura (latrocínio) c/c o artigo 61, inciso II, alínea “a”, todos do Código Penal.
É o relatório.
Remetam-se os autos à revisão regimental (art. 178, inc. II RITJRR).
Boa Vista/RR, 02 de outubro de 2008.
Des. CARLOS HENRIQUES
Relator
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIME Nº 010 08 010395-4 COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
APELADO:JOÃO PAULO ROCHA OLIVEIRA
ADVOGADO: JAEDER NATAL RIBEIRO
RELATOR: DES. CARLOS HENRIQUES
V O T O
Conheço do recurso, posto que presentes os pressupostos de admissibilidade e processamento.
Narra a denúncia que na madrugada do dia 08 de fevereiro de 2004 (08.02.2004), JOÃO PAULO ROCHA OLIVEIRA, agindo com animus furandi e necandi, tentou subtrair para si os bens que estavam na residência da vítima LUZIA QUEIROZ DA SILVA de 74 anos de idade, localizada na Rua Pastor Almir N. Guerra, nº 196, bairro Pricumã, nesta capital, utilizando-se, para tanto, de violência física (socos e pontapés) contra a cabeça da vítima que, segundo laudo de exame cadavérico acostado, veio a falecer em razão de hemorragia intracraniana (fls. 30/31).
Apurou-se que o denunciado é usuário de entorpecentes e no dia dos fatos foi à casa da vítima com o intuito de subtrair para si bens de valor para manter seu vício, tendo conhecimento, como morador das redondezas, de que a vítima, naquele dia, se encontrava sozinha em sua residência.
O denunciado após arrombar a casa da vítima, e ao chegar ao quarto desta, foi por ela surpreendido, ocasião em que se utilizou de violência física, passando a agredi-la com socos e pontapés até a morte, tendo em seguida se evadido do local, escondendo-se em sua casa, vindo a confessar o ilícito a sua namorada e a sua mãe, que acionou a Polícia, que o prendeu.
A materialidade resta demonstrada através do Auto de Apresentação e Apreensão dos objetos subtraídos (fl. 16), bem como do Laudo do Exame Cadavérico (fls. 30/31), que atesta a morte da vítima em razão de hemorragia intracraniana produzida por traumatismo crânio-encefálico.
A autoria está positivada na confissão firmada na fase policial (fl. 06/07), ressaltando que o acusado extrajudicialmente confessou o ilícito a sua namorada e a sua mãe (que acionou a Polícia), bem como em juízo (69/70). Ademais, o acusado foi preso em flagrante, logo após o cometimento do crime.
A ocorrência do crime de latrocínio e o modo como foi praticado, em que pese a prova testemunhal produzida não ter sido presencial, restaram garantidos pelos testemunhos colhidos da namorada (ELIDIANNE FERREIRA DA SILVA – fls. 84/85) e do primo do acusado (JADSON DE OLIVEIRA SANTOS – fl. 86), à época do fato delituoso, bem como do policial que o recebeu quando da prisão em flagrante (EDMAR DOS SANTOS FIGUEIRA FILHO – fls. 06/07).
A questão, no entanto, pertine a aferir sobre a capacidade de entendimento do acusado quanto ao caráter ilícito do ato, bem como de determinar-se de acordo com este entendimento, quando da prática da ação delituosa.
O questionamento está afeto às circunstâncias que cercam o acontecimento delitivo que convergiram para o incidente de insanidade mental do acusado, que culminou com o reconhecimento da condição de inimputabilidade e com a absolvição deste das penas em que se encontrava incurso.
O inconformismo ministerial reside forte na presunção de que a ação do acusado foi livre na causa, bem como no entendimento diverso do firmado pelos peritos, conduzido pela lógica do evento e colhido de trechos do depoimento de testemunha ouvinte da confissão e do arrependimento do acusado, que fundamentam a sentença objurgada.
Quanto ao laudo do exame médico-pericial de sanidade mental do acusado, requisitado e firmado segundo os rigores da ritualística processual, está apto a integrar o conjunto probatório, tratando-se de mais um elemento do processo de convicção racional do julgador.
Relacionado aos fatos circunstanciais da ação delituosa, especificamente os ligados à questão da capacidade de entendimento do caráter ilícito do ato do acusado cabe, aqui, analisar os indícios e presunções argüidos no intuito de se perquirir a correlação e harmonia destes com os demais elementos constantes do conjunto fático-probatório, colhidos durante a fase instrutória, com vistas ao trato revisional da matéria, buscado pelo manejo da presente peça recursal.
Colhe-se, do depoimento testemunhal do policial alhures citado, às fls. 06/07, que o acusado saiu de sua casa em direção à casa da vítima, tendo conhecimento que esta se encontrava sozinha naquela noite.
De contínuo, do depoimento da mãe do acusado, firmado na fase judicial, extrai-se:
“(...) que no final de semana em que se deram os fatos a depoente se encontrava na cidade de PACARAIMA na companhia da filha da vítima e um casal (...); QUE o réu não foi para a cidade de PACARAIMA, preferindo ficar em casa com sua namorada e seu primo (...)” (LUIZA MARIA ROCHA OLIVEIRA – fl. 82).
Constata-se que o acusado tinha conhecimento de circunstâncias que favoreciam o cometimento do ilícito, tais como que a vítima, anciã que se locomovia com debilidade e necessitava de auxílio, encontrava-se sozinha, pois a filha desta, que era sua acompanhante, encontrava-se viajando com a mãe do acusado.
Pode-se inferir que o acusado tinha em mente a prática da ação delituosa já que, não aleatoriamente, nem a esmo, mas norteado pelas circunstâncias favoráveis alhures citadas, das quais era sabedor, sucumbiu o impulso para a prática do intento delituoso, ajustando-se, conscientemente, a um estado de inconsciência, drogando-se, de modo a cometer tal intento.
Tal inferência flui dos depoimentos angariados na instrução, em que constam relatados as ações e os comportamentos do acusado que demonstram seu estado de excitação nos momentos antecedentes à prática criminosa. Vejam-se os trechos extraídos do testemunho da namorada do acusado, abaixo:
“(...) que por duas vezes o réu apareceu em sua casa saindo em seguida (...) O primeiro retorno do réu a sua casa se deu mais ou menos a meia noite (...) que o réu retornou três vezes para sua casa, sendo a primeira no horário acima informado, a segunda em horário não precisado, mas com aspecto já desfigurado, e a terceira vez para noticiar o cometimento do crime (...) que quando o réu retornou pela terceira vez o mesmo foi procurar por facas e instrumentos cortantes, o que obrigou a depoente a esconder tais armas; que o réu se encontrava extremamente excitado” (ELIDIANNE FERREIRA DA SILVA – fls. 84/85). (grifados).
Ainda depreendido dos testemunhos angariados na instrução probatória, vê-se que o acusado demonstra, não raramente, sinais de que tinha discernimento para entender o caráter ilícito do ato praticado, posto ter admitido sua culpa ao dizer, repetidamente (à namorada e, em seguida, ao primo), que havia matado pessoa inocente, logo após o cometimento do ilícito. Vejam-se os trechos dos respectivos relatos, abaixo:
“(...) que o réu chegou em casa próximo das 5 horas da manhã estando bastante eufórico; (...) que o réu chegou em casa dissendo (sic) que tinha tirado a vida de um inocente” (ELIDIANNE FERREIRA DA SILVA às fls. 84/85).
“(...) que na madrugada do dia 08.02 o réu se encontrava “alterado” e com o nariz sangrando; que o réu chegou de madrugada e disse ter matado pessoa inocente” (JADSON DE OLIVEIRA SANTOS à fl. 86).
Se a condição mental do acusado, no momento exato da ação delitiva, não favorecia o juízo de valor e a conseqüente reprovação do ato, não poderia, de igual modo, possibilitar tal julgamento nos instantes seguintes ao cometimento do crime, posto que ainda se encontrava sob efeito da droga, situação em que lhe é subtraída a capacidade de entendimento e volição, segundo tese encampada pela defesa.
De outra forma, no momento anterior à ação delitiva (quando o acusado foi capaz de intentar a ação, determinando-se em condições de praticá-la) é perfeitamente possível que este fosse, ao tempo, também capaz de entender o caráter ilícito do fato, pois, de outro modo, não poderia, jamais, agir sem saber que objetivo atingir, uma vez que não saberia como proceder. Assim, da mesma forma que se envidou a praticar o ato, poderia, também, ter-se envidado no sentido de se abster de sua prática, já que, no mesmo instante, assistia-lhe capacidade mental tal que lhe permitiu intentar a ação delitiva.
Vê-se, como ainda se depreende da prova testemunhal, que o apelado, ao chegar a sua casa, demonstrou-se indigno de ser visto por sua namorada na condição em que se achava: “que o réu acordou seu primo e pediu para depoente não vê-lo daquele jeito” (ELIDIANNE FERREIRA DA SILVA às fls. 84/85). Tamanha foi a sua auto-reprovação, atitude que sinaliza remorso que, por sua vez, revela consciência da ilicitude do ato.
Neste sentido, veja-se a seguinte consideração doutrinária:
Por remorso: por sentimento de culpa, incomodado pela inquietação de sua consciência, a ponto de perturbá-lo, pode o criminoso ser levado à confissão. (...) De regra, criminosos ocasionais, que agiram por impulso no momento do crime, acabam sentindo o peso do remorso e censuram permanentemente a si mesmos até que terminam confessando, visando a cessar sua angústia. (O valor da Confissão como meio de prova no Processo Penal, Guilherme de Souza Nucci, 2ª Ed. rev. e atual., pg 95).
Não obstante a defesa tenha cuidado demonstrar ser o acusado possuidor de uma doença mental permanente (“trata-se de uma doença mental que lhe retira a capacidade de entendimento e volição”, sendo “uma alteração patológica permanente” – fl. 243), relatos dos próprios parentes apontam para um estado normal de saúde mental que converge para a situação de o acusado poder se determinar de acordo com o entendimento do caráter ilícito do fato que demonstrou possuir.
Vejam-se trechos dos depoimentos da mãe e da namorada do acusado, respectivamente:
“(...) que o réu era um bom filho (...), que o réu gozava de boa reputação social” (LUIZA MARIA ROCHA OLIVEIRA – fl. 82/83);
(...) que estava namorando o réu a mais ou menos um ano; que o réu gozava de boa reputação social; (...) que o réu nunca se mostrou violento com a depoente; (...) que o réu era pessoa amável com a depoente; que nunca presenciou o réu agressivo, nem mesmo quando se encontrava embriagado pela droga; (...) que se encontrava com o réu todos os fins de semana e durante a semana dia sim dia não, e em alguns finais de semana dormia em sua casa” (ELIDIANNE FERREIRA DA SILVA às fls. 84).
Pode-se perceber que era possível cobrar do acusado uma conduta diversa da que ocorreu, tal como abster-se de se drogar, pois, apesar da dependência química, possuía conhecimento de seus atos, tanto que se determinava em condições de se relacionar e portar-se adequada e normalmente com as pessoas de seu convívio habitual.
Eis, portanto, o juízo de reprovação, pois tal conduta se mostra incompatível com um estado mental patológico permanente que a defesa do acusado formalmente cuidou demonstrar.
Extrai-se, ainda do depoimento testemunhal do policial que recebeu o acusado quando da sua prisão em flagrante, que o acusado disse que “arrombou a janela da casa da vítima e a encontrou próximo a porta de seu quarto” (EDMAR DOS SANTOS FIGUEIRA FILHO – fl. 06). Em juízo, o policial condutor da prisão do réu, revelou:
“que o réu foi quem encaminhou o depoente até a casa da vítima, dizendo que teria entrado pela janela (...); que não percebeu nenhuma anormalidade no réu” (ANTÔNIO FRANCISCO ALVES NETO – fl. 88).
Vê-se que os relatos acima não coadunam com o que o acusado revelou: “que conversou com o réu após sua prisão e o mesmo disse que nada se lembra” (testemunho do primo do acusado à fl. 86), mas sim, corroboram com o que, de outra banda, atestaram os peritos ao afirmarem ser o acusado uma pessoa normal com pensamento ordenado, memória, atenção, imaginação e pragmatismos preservados, fls. 216, 221.
Como se pode observar, o comportamento apresentado pelo acusado, relatado nos depoimentos das testemunhas, não se mostra, no todo, condizente com a capacidade mental patológica permanente cuidada no laudo pericial.
Não se sustenta aqui que se cuide de prestidigitação de uma realidade mental inexistente, mas, de outra feita, não se cuida de realidade plena, por força do próprio meio que a demonstrou, pois, à vista das demais peças do conjunto probatório, o laudo pericial não se afigura prova absolutamente idônea ou definitiva.
No mais, é cediço que o juiz não ficará adstrito ao laudo pericial, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte, como acauteladamente prevê o art. 182, do CPP. Nesse sentido, é a ementa de julgado do Superior Tribunal de Justiça, abaixo colacionada:
PROCESSUAL PENAL - RECURSO DE HABEAS CORPUS - EXAME DE SANIDADE MENTAL - REJEIÇÃO DO LAUDO PELO JUIZ - PRETENSÃO DE NULIDADE DA SENTENÇA CONDENATORIA. - O MAGISTRADO NÃO FICA VINCULADO AO LAUDO PERICIAL MEDICO APRESENTADO, PODENDO APRECIAR LIVREMENTE O CONJUNTO PROBATORIO, NA FORMAÇÃO DE SUA CONVICÇÃO. - INADMISSIVEL A ARGUIÇÃO DE NULIDADE, NA RESTRITA VIA DO HABEAS CORPUS, SE ESTA NÃO SE APRESENTA MANIFESTA, EXTREME DE DUVIDAS OU INCERTEZA. - RECURSO IMPROVIDO.
(HC 3323 / SP1993/0035082-0 Relator(a) Ministro CID FLAQUER SCARTEZZINI (299) Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA. Data do Julgamento 02/02/1994. Data da Publicação/Fonte DJ 07/03/1994 p. 3669. RSTJ vol. 65 p. 194).
Além disso, as demais provas constantes do conjunto probatório, também firmadas segundo a rigorosa forma processual, gozam de igual credibilidade, sendo cediço que depoimentos de policiais, de testemunhas ouvintes de confissão etc., possuem a mesma eficácia probatória. Vejam-se, nesse sentido, mutatis mutandis, as ementas dos diversos julgados abaixo (STJ e Tribunais Regionais), trazidas à colação:
CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS COMO DESFAVORÁVEIS. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. FASE INQUISITORIAL. RETRATAÇÃO EM JUÍZO. CONDENAÇÃO BASEADA EM ELEMENTOS DA CONFISSÃO. RECONHECIMENTO DA ATENUANTE. CONDENAÇÃO BASEADA EM DEPOIMENTOS COLHIDOS EM JUÍZO E NÃO APENAS NAS DECLARAÇÕES PRESTADAS NA FASE INQUISITORIAL. POSSIBILIDADE.
1. Omissis.
2. Omissis.
3. É possível a utilização de declarações de testemunhas colhidas na fase do inquérito policial sem observância do contraditório, desde que verificado que a condenação se baseia, outrossim, em depoimentos de testemunhas colhidos em juízo, sob o crivo contraditório. Precedentes.
4. Omissis.
(HC 68010 / MS - HABEAS CORPUS 2006/0222203-4. Relatora Ministra LAURITA VAZ (1120). STJ/ T5 - QUINTA TURMA. Julgamento 27/03/2008. Data da Publicação/Fonte DJe 22/04/2008).(Grifados).
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. MUTATIO LIBELI. ART. 384, CAPUT, DO CPP. OBSERVÂNCIA. CONDENAÇÃO. PROVAS DO INQUÉRITO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. TESTEMUNHO POLICIAL. EFICÁCIA PROBATÓRIA. VALORAÇÃO DAS PROVAS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA. PRECEDENTES MATÉRIA RESERVADA À APRECIAÇÃO EM SEDE DE REVISÃO CRIMINAL.
(...).
6. Ademais, os policiais não se encontram legalmente impedidos de depor sobre atos de ofício nos processos de cuja fase investigatória tenham participado, no exercício de suas funções. Em sendo assim, tais depoimentos revestem-se de inquestionável eficácia probatória, sobretudo quando prestados em juízo, sob a garantia do contraditório. Precedentes do STJ e do STF.
7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido.
(REsp 604815 (2003/0195586-1 - 26/09/2005). Relatora Ministra LAURITA VAZ. Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça. Brasília (DF), 23 de agosto de 2005 (Data do Julgamento). DJ: 26/09/2005). (Grifados).
LATROCÍNIO. CONDENAÇÃO: AUTORIZADA PELA PROVA ORAL. CONFISSÃO POLICIAL: SE VALORADA, IMPERATIVO O RECONHECIMENTO DA ATENUANTE CORRESPONDENTE. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DEFENSIVO. UNÂNIME.
(Apelação Crime Nº 70023445976, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do Rs, Relator: Amilton Bueno de Carvalho, Julgado em 14/05/2008, Publicado no Diário da Justiça do Dia 05/06/2008). (Grifados).
LATROCÍNIO. COERENTES DECLARAÇÕES DAS TESTEMUNHAS, COM SEGURO RECONHECIMENTO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. CONDENAÇÃO MANTIDA.
(Apelação Crime Nº 70023064611, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do Rs, Relator: Constantino Lisbôa de Azevedo, Julgado em 27/03/2008, Publicado no Diário da Justiça do Dia 09/05/2008). (Grifados).
APELAÇÃO-CRIME. LATROCÍNIO. PROVA. CONFISSÃO DOS RÉUS NA FASE POLICIAL. RETRATAÇÃO EM JUÍZO. PROVA JUDICIALIZADA QUE AMPARA AS CONFISSÕES. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. CONDENAÇÃO DECRETADA. Os réus confessaram na fase policial o cometimento do delito, narrando detalhadamente cada ação realizada. Suas confissões foram amparadas pelas declarações, também na fase inquisitorial, de vários familiares, que disseram ter ouvido eles confessarem a autoria do latrocínio. Embora todos tenham se retratado em juízo, em evidente tentativa de arquitetar versão exculpatória para os acusados, outros elementos probatórios confortam a robusta prova policial. (...)
(Apelação Crime Nº 70022313183, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marlene Landvoigt, Julgado em 27/02/2008, publicado no Diário da Justiça do dia 25/06/2008). (Grifados).
É cediço, ainda, que fatos outros trazidos ao conhecimento do julgador poderão ser explorados, principalmente se verificada a pertinência e a relevância destes na análise conjunta dos demais fatos controversos na instrução processual. Mormente porque o Estado-Juiz não pode quedar-se conformado com a verdade formal que as partes cuidaram de demonstrar, sem ao menos inquirir a verdade real.
Destarte, da análise percuciente do conjunto fático-probatório firmado nos autos, os indícios e presunções apontados quedam-se harmônicos com os demais elementos do fato delitivo, comprovados nos testemunhos circunstanciados tanto na fase policial quanto na fase judicial, de onde, dessume-se a existência de circunstâncias que possibilitavam ao acusado uma conduta diversa da que ocorreu.
Dessa forma, por vislumbrar convergência e harmonia dos indícios e presunções apontados com os demais elementos da ação delituosa do acusado, latente das provas testemunhais firmadas no feito, que apontam os requisitos de imputabilidade do ilícito, quais sejam: capacidade de entendimento do caráter ilícito do fato e de se determinar segundo este entendimento, há que se reconhecer a culpabilidade do acusado.
Pelo exposto, à luz dos artigos 182 e 239 do Código de Processo Penal, merece ser provida a apelação manejada pelo órgão ministerial, a fim de reformar a sentença a quo, condenando o apelado nas penas do artigo 157, § 3º, 2ª figura (latrocínio) c/c o artigo 61, inciso II, alínea “a”, todos do Código Penal.
Assim sendo, passo a dosagem da reprimenda.
A culpabilidade – juízo de reprovação que deve analisar não apenas as condições pessoais do agente, isoladamente, mas o contexto das circunstâncias fáticas em que sua conduta se verificou – deve ser considerada elevada, pois o réu agiu violentamente, espancando, com socos e pontapés, até à morte, uma senhora anciã que andava com debilidade e se encontrava sozinha. Portanto, gritante é a discrepância entre o vigor da agressão e a resistência (fragilidade) da vítima.
Quanto à conduta Social e a personalidade – conjunto dos atributos psicológicos que determinam o caráter e a postura social da pessoa – malgrado o esforço da defesa em demonstrar ser o apelado pessoa de bom convívio pessoal e social, gozando de boa reputação na vizinhança, devem tais ser tidas como desfavoráveis, ante a presença de elementos reveladores da vida social desviada que o acusado levava, como se vê na FAC (fls. 153/154), suficientes para aferi-las reprováveis.
Ato contínuo, no que concerne aos motivos do crime, restou demonstrado que o apelado, influenciado pelo conhecimento de situações favoráveis à ação delitiva, determinou-se em condições de realizar a subtração de bens de valor para a mantença da viciosidade. Tal causa merece a devida reprovação.
Quanto às circunstâncias, estas devem ser censuradas, pois, pelos elementos trazidos aos autos, vê-se que o acusado se valeu de situações favoráveis ao cometimento do ilícito, aproveitando-se da fragilidade da vítima, da falta de segurança de sua residência simples, de horário noturno – madrugada – momento em que impera a conseqüente falta da vigilância ou atenção solidária natural por parte da vizinhança, quando acordada.
Nesse contexto, vê-se, ainda, delineada a periculosidade do acusado, pela forma premeditada que realizou a ação delitiva, inclusive, ajustando-se a um estado de inconsciência de modo a sair impune da prática criminosa.
No que concerne às conseqüências, estas são no todo gravíssimas, vez que restaram na morte da vítima, não havendo prejuízo maior que a subtração da vida humana.
Ademais o crime classificado (latrocínio) se trata de uma agravação da pena do roubo, em face das conseqüências dos atos violentos praticados contra a vítima. Daí, porque, havendo o resultado morte, deverá o agente ser por ele responsabilizado.
Por fim, a favor do réu estão os seus antecedentes, os quais, não obstante não serem bons, estes, no entanto, não o desfavorecem, pois é primário, não constando contra si sentença condenatória transitada em julgado, consoante atesta a certidão às fls. 153/154.
Destarte, considerando o conjunto circunstancial, fixo a pena-base em 20 (vinte) anos de reclusão e 60 (sessenta) dias de multa.
Verifica-se a ocorrência de duas atenuantes: sua confissão espontânea em juízo, bem como sua menoridade (menos de 21 anos de idade) na data do crime (art. 65, I do CP). Entretanto, como a pena-base foi fixada no mínimo legal, deixo de aplicá-las.
Reconheço a agravante específica do cometimento de crime contra maior de 60 (sessenta) anos (art. 61, II, “h”, do CP), ampliando a sanção acima de 1/6 (um sexto), ou seja, 03 (três anos) e 20 (vinte) dias.
Não concorrem causas de diminuição ou de aumento de pena a serem observadas.
Fixo a pena definitiva em 23 (vinte e três) anos, e 20 (vinte) dias de reclusão e pagamento de 70 (setenta) dias-multa, a razão de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente.
A pena deverá ser cumprida inicialmente em regime fechado (art. 33, § 2º, “a” do CP).
Com tais considerações, dou provimento ao recurso do órgão ministerial, para condenar JOÃO PAULO ROCHA OLIVEIRA pelo crime qualificado no artigo 157, § 3º, 2ª figura (latrocínio) c/c o artigo 61, inciso II, alínea “a”, todos do Código Penal, condenando-o, ainda, a cumprir pena de 23 (vinte e três) anos, e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicialmente fechado, e pena de multa fixada em 70 (setenta) dias-multa.
É como voto.
Boa Vista/RR, 14 de outubro de 2008.
Des. CARLOS HENRIQUES
Relator
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIME Nº 010 08 010395-4 COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
APELADO: JOÃO PAULO ROCHA OLIVEIRA
ADVOGADO: JAEDER NATAL RIBEIRO
RELATOR: DES. CARLOS HENRIQUES
E M E N T A
APELAÇÃO CRIME – DENÚNCIA ART. 157, § 3º, SEGUNDA PARTE C/C ART. 61, II, “a” DO CPP – ABSOLVIÇÃO – INIMPUTABILIDADE – APLICAÇÃO DE MEDIDA DE SEGURANÇA – CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL E JUDICIAL – PROVA TESTEMUNHAL – CONJUNTO PROBATÓRIO – IMPUTABILIDADE – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO – SENTENÇA REFORMADA.
1. De acordo com o art. 239 do CPP, os indícios e presunções apontados no feito restaram comprovados nos testemunhos circunstanciados tanto na fase policial quanto na fase judicial, demonstrando a harmonia daqueles com os demais elementos do fato delitivo, convergindo para a existência de circunstâncias que possibilitavam ao acusado uma conduta diversa da que ocorreu.
2. Não obstante a retratação na fase judicial, a confissão extrajudicial feita com riqueza de detalhes encontra-se perfeitamente harmonizada com o conjunto fático-probatório, durante a fase instrutória, autorizando o juízo de reprovação.
3. Nos termos do art. 182 do CPP, à vista das demais peças do conjunto probatório, o laudo pericial não se afigura prova absolutamente idônea ou definitiva, em que o julgador não ficará adstrito a este, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CRIME Nº 010 08 010395-4, da Comarca de Boa Vista, em que são partes as acima identificadas.
ACORDAM, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores que compõem a Câmara Única, Turma Criminal, do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em harmonia com o parecer da Procuradoria de Justiça, em conhecer do recurso e, no mérito, dar-lhe provimento, reformando a sentença, nos termos do relatório e voto do Relator, que ficam fazendo parte integrante deste julgado.
SALA DAS SESSÕES DA EGRÉGIA CÂMARA ÚNICA, TURMA CRIMINAL, DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RORAIMA, AOS QUATORZE DIAS DO MÊS DE OUTUBRO DO ANO DE DOIS MIL E OITO (14.10.2008).
Des. CARLOS HENRIQUES
Presidente e Relator
Des RICARDO OLIVEIRA
Revisor
Des. MAURO CAMPELLO
Julgador
Dr. SALES EURICO MELGAREJO FREITAS
Procurador de Justiça
Publicado no Diário do Poder Judiciário, ANO X - EDIÇÃO 3953, Boa Vista-RR, 23 de Outubro de 2008, p. 03.
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Ementa
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIME Nº 010 08 010395-4 COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
APELADO:JOÃO PAULO ROCHA OLIVEIRA
ADVOGADO: JAEDER NATAL RIBEIRO
RELATOR: DES. CARLOS HENRIQUES
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação crime, interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA em face de JOÃO PAULO ROCHA OLIVEIRA, em virtude da sentença de fls. 214/220, Autos n.º 0010 04 078633-6, que, com base no artigo 26 do Código Penal, julgou improcedente a acusação, declarando inimputável o acusado, ora apelado, por considerá-lo inteiramente incapaz de entender a ilicitude da ação praticada, absolvendo-o das penas do artigo 157, § 3º, 2ª figura (latrocínio) c/c o artigo 61, II, “a” do citado Código, aplicando, ainda, medida de segurança na forma do artigo 97 do CP.
Em sede de apelação, invocando a teoria da actio libera in causa, alega o Parquet (fls. 237/240), em síntese: que o acusado não é inimputável, eis que tinha plena consciência do que fazia, uma vez que cometeu o ilícito para assegurar o sucesso do crime anterior; que não há base sólida na perícia que concluiu estar o apelado sob efeito de cocaína no momento exato do fato, apontando contradição no laudo pericial, bem como questionando a data em que ocorreu o exame (1 ano e 2 meses após o fato).
Ao final, evocando o princípio do livre convencimento motivado e a apreciação conjunta das provas, requer a reforma da sentença para não se conhecer da imputabilidade do apelado e, em decorrência, condená-lo nas penas do crime em que foi incurso, como requerido e já reconhecido na sentença absolutória imprópria proferida.
Em sede de contra-razões, a defesa do apelado, às fls. 242/245, alega ser completamente descabida a teoria invocada pelo apelante, tendo em vista a comprovação da existência de doença mental, cujo laudo indicador do distúrbio mental não restou impugnado, bem como que o apelante não formulou, na fase apropriada, o pedido de provas que desejava produzir no sentido de infirmar o exame de insanidade mental, não podendo fazê-lo nas razões de apelação, sendo correta a decisão que absolveu o apelado, reconhecendo sua inimputabilidade e aplicando-lhe medida de segurança.
Nesta instância recursal, a Procuradoria Geral de Justiça, em judicioso parecer acostado às fls. 255/259, opina pelo conhecimento do recurso, para, no mérito, reformar a sentença a quo, com o fim de condenar o apelado nas penas do artigo 157, § 3º, 2ª figura (latrocínio) c/c o artigo 61, inciso II, alínea “a”, todos do Código Penal.
É o relatório.
Remetam-se os autos à revisão regimental (art. 178, inc. II RITJRR).
Boa Vista/RR, 02 de outubro de 2008.
Des. CARLOS HENRIQUES
Relator
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIME Nº 010 08 010395-4 COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
APELADO:JOÃO PAULO ROCHA OLIVEIRA
ADVOGADO: JAEDER NATAL RIBEIRO
RELATOR: DES. CARLOS HENRIQUES
V O T O
Conheço do recurso, posto que presentes os pressupostos de admissibilidade e processamento.
Narra a denúncia que na madrugada do dia 08 de fevereiro de 2004 (08.02.2004), JOÃO PAULO ROCHA OLIVEIRA, agindo com animus furandi e necandi, tentou subtrair para si os bens que estavam na residência da vítima LUZIA QUEIROZ DA SILVA de 74 anos de idade, localizada na Rua Pastor Almir N. Guerra, nº 196, bairro Pricumã, nesta capital, utilizando-se, para tanto, de violência física (socos e pontapés) contra a cabeça da vítima que, segundo laudo de exame cadavérico acostado, veio a falecer em razão de hemorragia intracraniana (fls. 30/31).
Apurou-se que o denunciado é usuário de entorpecentes e no dia dos fatos foi à casa da vítima com o intuito de subtrair para si bens de valor para manter seu vício, tendo conhecimento, como morador das redondezas, de que a vítima, naquele dia, se encontrava sozinha em sua residência.
O denunciado após arrombar a casa da vítima, e ao chegar ao quarto desta, foi por ela surpreendido, ocasião em que se utilizou de violência física, passando a agredi-la com socos e pontapés até a morte, tendo em seguida se evadido do local, escondendo-se em sua casa, vindo a confessar o ilícito a sua namorada e a sua mãe, que acionou a Polícia, que o prendeu.
A materialidade resta demonstrada através do Auto de Apresentação e Apreensão dos objetos subtraídos (fl. 16), bem como do Laudo do Exame Cadavérico (fls. 30/31), que atesta a morte da vítima em razão de hemorragia intracraniana produzida por traumatismo crânio-encefálico.
A autoria está positivada na confissão firmada na fase policial (fl. 06/07), ressaltando que o acusado extrajudicialmente confessou o ilícito a sua namorada e a sua mãe (que acionou a Polícia), bem como em juízo (69/70). Ademais, o acusado foi preso em flagrante, logo após o cometimento do crime.
A ocorrência do crime de latrocínio e o modo como foi praticado, em que pese a prova testemunhal produzida não ter sido presencial, restaram garantidos pelos testemunhos colhidos da namorada (ELIDIANNE FERREIRA DA SILVA – fls. 84/85) e do primo do acusado (JADSON DE OLIVEIRA SANTOS – fl. 86), à época do fato delituoso, bem como do policial que o recebeu quando da prisão em flagrante (EDMAR DOS SANTOS FIGUEIRA FILHO – fls. 06/07).
A questão, no entanto, pertine a aferir sobre a capacidade de entendimento do acusado quanto ao caráter ilícito do ato, bem como de determinar-se de acordo com este entendimento, quando da prática da ação delituosa.
O questionamento está afeto às circunstâncias que cercam o acontecimento delitivo que convergiram para o incidente de insanidade mental do acusado, que culminou com o reconhecimento da condição de inimputabilidade e com a absolvição deste das penas em que se encontrava incurso.
O inconformismo ministerial reside forte na presunção de que a ação do acusado foi livre na causa, bem como no entendimento diverso do firmado pelos peritos, conduzido pela lógica do evento e colhido de trechos do depoimento de testemunha ouvinte da confissão e do arrependimento do acusado, que fundamentam a sentença objurgada.
Quanto ao laudo do exame médico-pericial de sanidade mental do acusado, requisitado e firmado segundo os rigores da ritualística processual, está apto a integrar o conjunto probatório, tratando-se de mais um elemento do processo de convicção racional do julgador.
Relacionado aos fatos circunstanciais da ação delituosa, especificamente os ligados à questão da capacidade de entendimento do caráter ilícito do ato do acusado cabe, aqui, analisar os indícios e presunções argüidos no intuito de se perquirir a correlação e harmonia destes com os demais elementos constantes do conjunto fático-probatório, colhidos durante a fase instrutória, com vistas ao trato revisional da matéria, buscado pelo manejo da presente peça recursal.
Colhe-se, do depoimento testemunhal do policial alhures citado, às fls. 06/07, que o acusado saiu de sua casa em direção à casa da vítima, tendo conhecimento que esta se encontrava sozinha naquela noite.
De contínuo, do depoimento da mãe do acusado, firmado na fase judicial, extrai-se:
“(...) que no final de semana em que se deram os fatos a depoente se encontrava na cidade de PACARAIMA na companhia da filha da vítima e um casal (...); QUE o réu não foi para a cidade de PACARAIMA, preferindo ficar em casa com sua namorada e seu primo (...)” (LUIZA MARIA ROCHA OLIVEIRA – fl. 82).
Constata-se que o acusado tinha conhecimento de circunstâncias que favoreciam o cometimento do ilícito, tais como que a vítima, anciã que se locomovia com debilidade e necessitava de auxílio, encontrava-se sozinha, pois a filha desta, que era sua acompanhante, encontrava-se viajando com a mãe do acusado.
Pode-se inferir que o acusado tinha em mente a prática da ação delituosa já que, não aleatoriamente, nem a esmo, mas norteado pelas circunstâncias favoráveis alhures citadas, das quais era sabedor, sucumbiu o impulso para a prática do intento delituoso, ajustando-se, conscientemente, a um estado de inconsciência, drogando-se, de modo a cometer tal intento.
Tal inferência flui dos depoimentos angariados na instrução, em que constam relatados as ações e os comportamentos do acusado que demonstram seu estado de excitação nos momentos antecedentes à prática criminosa. Vejam-se os trechos extraídos do testemunho da namorada do acusado, abaixo:
“(...) que por duas vezes o réu apareceu em sua casa saindo em seguida (...) O primeiro retorno do réu a sua casa se deu mais ou menos a meia noite (...) que o réu retornou três vezes para sua casa, sendo a primeira no horário acima informado, a segunda em horário não precisado, mas com aspecto já desfigurado, e a terceira vez para noticiar o cometimento do crime (...) que quando o réu retornou pela terceira vez o mesmo foi procurar por facas e instrumentos cortantes, o que obrigou a depoente a esconder tais armas; que o réu se encontrava extremamente excitado” (ELIDIANNE FERREIRA DA SILVA – fls. 84/85). (grifados).
Ainda depreendido dos testemunhos angariados na instrução probatória, vê-se que o acusado demonstra, não raramente, sinais de que tinha discernimento para entender o caráter ilícito do ato praticado, posto ter admitido sua culpa ao dizer, repetidamente (à namorada e, em seguida, ao primo), que havia matado pessoa inocente, logo após o cometimento do ilícito. Vejam-se os trechos dos respectivos relatos, abaixo:
“(...) que o réu chegou em casa próximo das 5 horas da manhã estando bastante eufórico; (...) que o réu chegou em casa dissendo (sic) que tinha tirado a vida de um inocente” (ELIDIANNE FERREIRA DA SILVA às fls. 84/85).
“(...) que na madrugada do dia 08.02 o réu se encontrava “alterado” e com o nariz sangrando; que o réu chegou de madrugada e disse ter matado pessoa inocente” (JADSON DE OLIVEIRA SANTOS à fl. 86).
Se a condição mental do acusado, no momento exato da ação delitiva, não favorecia o juízo de valor e a conseqüente reprovação do ato, não poderia, de igual modo, possibilitar tal julgamento nos instantes seguintes ao cometimento do crime, posto que ainda se encontrava sob efeito da droga, situação em que lhe é subtraída a capacidade de entendimento e volição, segundo tese encampada pela defesa.
De outra forma, no momento anterior à ação delitiva (quando o acusado foi capaz de intentar a ação, determinando-se em condições de praticá-la) é perfeitamente possível que este fosse, ao tempo, também capaz de entender o caráter ilícito do fato, pois, de outro modo, não poderia, jamais, agir sem saber que objetivo atingir, uma vez que não saberia como proceder. Assim, da mesma forma que se envidou a praticar o ato, poderia, também, ter-se envidado no sentido de se abster de sua prática, já que, no mesmo instante, assistia-lhe capacidade mental tal que lhe permitiu intentar a ação delitiva.
Vê-se, como ainda se depreende da prova testemunhal, que o apelado, ao chegar a sua casa, demonstrou-se indigno de ser visto por sua namorada na condição em que se achava: “que o réu acordou seu primo e pediu para depoente não vê-lo daquele jeito” (ELIDIANNE FERREIRA DA SILVA às fls. 84/85). Tamanha foi a sua auto-reprovação, atitude que sinaliza remorso que, por sua vez, revela consciência da ilicitude do ato.
Neste sentido, veja-se a seguinte consideração doutrinária:
Por remorso: por sentimento de culpa, incomodado pela inquietação de sua consciência, a ponto de perturbá-lo, pode o criminoso ser levado à confissão. (...) De regra, criminosos ocasionais, que agiram por impulso no momento do crime, acabam sentindo o peso do remorso e censuram permanentemente a si mesmos até que terminam confessando, visando a cessar sua angústia. (O valor da Confissão como meio de prova no Processo Penal, Guilherme de Souza Nucci, 2ª Ed. rev. e atual., pg 95).
Não obstante a defesa tenha cuidado demonstrar ser o acusado possuidor de uma doença mental permanente (“trata-se de uma doença mental que lhe retira a capacidade de entendimento e volição”, sendo “uma alteração patológica permanente” – fl. 243), relatos dos próprios parentes apontam para um estado normal de saúde mental que converge para a situação de o acusado poder se determinar de acordo com o entendimento do caráter ilícito do fato que demonstrou possuir.
Vejam-se trechos dos depoimentos da mãe e da namorada do acusado, respectivamente:
“(...) que o réu era um bom filho (...), que o réu gozava de boa reputação social” (LUIZA MARIA ROCHA OLIVEIRA – fl. 82/83);
(...) que estava namorando o réu a mais ou menos um ano; que o réu gozava de boa reputação social; (...) que o réu nunca se mostrou violento com a depoente; (...) que o réu era pessoa amável com a depoente; que nunca presenciou o réu agressivo, nem mesmo quando se encontrava embriagado pela droga; (...) que se encontrava com o réu todos os fins de semana e durante a semana dia sim dia não, e em alguns finais de semana dormia em sua casa” (ELIDIANNE FERREIRA DA SILVA às fls. 84).
Pode-se perceber que era possível cobrar do acusado uma conduta diversa da que ocorreu, tal como abster-se de se drogar, pois, apesar da dependência química, possuía conhecimento de seus atos, tanto que se determinava em condições de se relacionar e portar-se adequada e normalmente com as pessoas de seu convívio habitual.
Eis, portanto, o juízo de reprovação, pois tal conduta se mostra incompatível com um estado mental patológico permanente que a defesa do acusado formalmente cuidou demonstrar.
Extrai-se, ainda do depoimento testemunhal do policial que recebeu o acusado quando da sua prisão em flagrante, que o acusado disse que “arrombou a janela da casa da vítima e a encontrou próximo a porta de seu quarto” (EDMAR DOS SANTOS FIGUEIRA FILHO – fl. 06). Em juízo, o policial condutor da prisão do réu, revelou:
“que o réu foi quem encaminhou o depoente até a casa da vítima, dizendo que teria entrado pela janela (...); que não percebeu nenhuma anormalidade no réu” (ANTÔNIO FRANCISCO ALVES NETO – fl. 88).
Vê-se que os relatos acima não coadunam com o que o acusado revelou: “que conversou com o réu após sua prisão e o mesmo disse que nada se lembra” (testemunho do primo do acusado à fl. 86), mas sim, corroboram com o que, de outra banda, atestaram os peritos ao afirmarem ser o acusado uma pessoa normal com pensamento ordenado, memória, atenção, imaginação e pragmatismos preservados, fls. 216, 221.
Como se pode observar, o comportamento apresentado pelo acusado, relatado nos depoimentos das testemunhas, não se mostra, no todo, condizente com a capacidade mental patológica permanente cuidada no laudo pericial.
Não se sustenta aqui que se cuide de prestidigitação de uma realidade mental inexistente, mas, de outra feita, não se cuida de realidade plena, por força do próprio meio que a demonstrou, pois, à vista das demais peças do conjunto probatório, o laudo pericial não se afigura prova absolutamente idônea ou definitiva.
No mais, é cediço que o juiz não ficará adstrito ao laudo pericial, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte, como acauteladamente prevê o art. 182, do CPP. Nesse sentido, é a ementa de julgado do Superior Tribunal de Justiça, abaixo colacionada:
PROCESSUAL PENAL - RECURSO DE HABEAS CORPUS - EXAME DE SANIDADE MENTAL - REJEIÇÃO DO LAUDO PELO JUIZ - PRETENSÃO DE NULIDADE DA SENTENÇA CONDENATORIA. - O MAGISTRADO NÃO FICA VINCULADO AO LAUDO PERICIAL MEDICO APRESENTADO, PODENDO APRECIAR LIVREMENTE O CONJUNTO PROBATORIO, NA FORMAÇÃO DE SUA CONVICÇÃO. - INADMISSIVEL A ARGUIÇÃO DE NULIDADE, NA RESTRITA VIA DO HABEAS CORPUS, SE ESTA NÃO SE APRESENTA MANIFESTA, EXTREME DE DUVIDAS OU INCERTEZA. - RECURSO IMPROVIDO.
(HC 3323 / SP1993/0035082-0 Relator(a) Ministro CID FLAQUER SCARTEZZINI (299) Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA. Data do Julgamento 02/02/1994. Data da Publicação/Fonte DJ 07/03/1994 p. 3669. RSTJ vol. 65 p. 194).
Além disso, as demais provas constantes do conjunto probatório, também firmadas segundo a rigorosa forma processual, gozam de igual credibilidade, sendo cediço que depoimentos de policiais, de testemunhas ouvintes de confissão etc., possuem a mesma eficácia probatória. Vejam-se, nesse sentido, mutatis mutandis, as ementas dos diversos julgados abaixo (STJ e Tribunais Regionais), trazidas à colação:
CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS COMO DESFAVORÁVEIS. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. FASE INQUISITORIAL. RETRATAÇÃO EM JUÍZO. CONDENAÇÃO BASEADA EM ELEMENTOS DA CONFISSÃO. RECONHECIMENTO DA ATENUANTE. CONDENAÇÃO BASEADA EM DEPOIMENTOS COLHIDOS EM JUÍZO E NÃO APENAS NAS DECLARAÇÕES PRESTADAS NA FASE INQUISITORIAL. POSSIBILIDADE.
1. Omissis.
2. Omissis.
3. É possível a utilização de declarações de testemunhas colhidas na fase do inquérito policial sem observância do contraditório, desde que verificado que a condenação se baseia, outrossim, em depoimentos de testemunhas colhidos em juízo, sob o crivo contraditório. Precedentes.
4. Omissis.
(HC 68010 / MS - HABEAS CORPUS 2006/0222203-4. Relatora Ministra LAURITA VAZ (1120). STJ/ T5 - QUINTA TURMA. Julgamento 27/03/2008. Data da Publicação/Fonte DJe 22/04/2008).(Grifados).
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. MUTATIO LIBELI. ART. 384, CAPUT, DO CPP. OBSERVÂNCIA. CONDENAÇÃO. PROVAS DO INQUÉRITO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. TESTEMUNHO POLICIAL. EFICÁCIA PROBATÓRIA. VALORAÇÃO DAS PROVAS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA. PRECEDENTES MATÉRIA RESERVADA À APRECIAÇÃO EM SEDE DE REVISÃO CRIMINAL.
(...).
6. Ademais, os policiais não se encontram legalmente impedidos de depor sobre atos de ofício nos processos de cuja fase investigatória tenham participado, no exercício de suas funções. Em sendo assim, tais depoimentos revestem-se de inquestionável eficácia probatória, sobretudo quando prestados em juízo, sob a garantia do contraditório. Precedentes do STJ e do STF.
7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido.
(REsp 604815 (2003/0195586-1 - 26/09/2005). Relatora Ministra LAURITA VAZ. Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça. Brasília (DF), 23 de agosto de 2005 (Data do Julgamento). DJ: 26/09/2005). (Grifados).
LATROCÍNIO. CONDENAÇÃO: AUTORIZADA PELA PROVA ORAL. CONFISSÃO POLICIAL: SE VALORADA, IMPERATIVO O RECONHECIMENTO DA ATENUANTE CORRESPONDENTE. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DEFENSIVO. UNÂNIME.
(Apelação Crime Nº 70023445976, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do Rs, Relator: Amilton Bueno de Carvalho, Julgado em 14/05/2008, Publicado no Diário da Justiça do Dia 05/06/2008). (Grifados).
LATROCÍNIO. COERENTES DECLARAÇÕES DAS TESTEMUNHAS, COM SEGURO RECONHECIMENTO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. CONDENAÇÃO MANTIDA.
(Apelação Crime Nº 70023064611, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do Rs, Relator: Constantino Lisbôa de Azevedo, Julgado em 27/03/2008, Publicado no Diário da Justiça do Dia 09/05/2008). (Grifados).
APELAÇÃO-CRIME. LATROCÍNIO. PROVA. CONFISSÃO DOS RÉUS NA FASE POLICIAL. RETRATAÇÃO EM JUÍZO. PROVA JUDICIALIZADA QUE AMPARA AS CONFISSÕES. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. CONDENAÇÃO DECRETADA. Os réus confessaram na fase policial o cometimento do delito, narrando detalhadamente cada ação realizada. Suas confissões foram amparadas pelas declarações, também na fase inquisitorial, de vários familiares, que disseram ter ouvido eles confessarem a autoria do latrocínio. Embora todos tenham se retratado em juízo, em evidente tentativa de arquitetar versão exculpatória para os acusados, outros elementos probatórios confortam a robusta prova policial. (...)
(Apelação Crime Nº 70022313183, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marlene Landvoigt, Julgado em 27/02/2008, publicado no Diário da Justiça do dia 25/06/2008). (Grifados).
É cediço, ainda, que fatos outros trazidos ao conhecimento do julgador poderão ser explorados, principalmente se verificada a pertinência e a relevância destes na análise conjunta dos demais fatos controversos na instrução processual. Mormente porque o Estado-Juiz não pode quedar-se conformado com a verdade formal que as partes cuidaram de demonstrar, sem ao menos inquirir a verdade real.
Destarte, da análise percuciente do conjunto fático-probatório firmado nos autos, os indícios e presunções apontados quedam-se harmônicos com os demais elementos do fato delitivo, comprovados nos testemunhos circunstanciados tanto na fase policial quanto na fase judicial, de onde, dessume-se a existência de circunstâncias que possibilitavam ao acusado uma conduta diversa da que ocorreu.
Dessa forma, por vislumbrar convergência e harmonia dos indícios e presunções apontados com os demais elementos da ação delituosa do acusado, latente das provas testemunhais firmadas no feito, que apontam os requisitos de imputabilidade do ilícito, quais sejam: capacidade de entendimento do caráter ilícito do fato e de se determinar segundo este entendimento, há que se reconhecer a culpabilidade do acusado.
Pelo exposto, à luz dos artigos 182 e 239 do Código de Processo Penal, merece ser provida a apelação manejada pelo órgão ministerial, a fim de reformar a sentença a quo, condenando o apelado nas penas do artigo 157, § 3º, 2ª figura (latrocínio) c/c o artigo 61, inciso II, alínea “a”, todos do Código Penal.
Assim sendo, passo a dosagem da reprimenda.
A culpabilidade – juízo de reprovação que deve analisar não apenas as condições pessoais do agente, isoladamente, mas o contexto das circunstâncias fáticas em que sua conduta se verificou – deve ser considerada elevada, pois o réu agiu violentamente, espancando, com socos e pontapés, até à morte, uma senhora anciã que andava com debilidade e se encontrava sozinha. Portanto, gritante é a discrepância entre o vigor da agressão e a resistência (fragilidade) da vítima.
Quanto à conduta Social e a personalidade – conjunto dos atributos psicológicos que determinam o caráter e a postura social da pessoa – malgrado o esforço da defesa em demonstrar ser o apelado pessoa de bom convívio pessoal e social, gozando de boa reputação na vizinhança, devem tais ser tidas como desfavoráveis, ante a presença de elementos reveladores da vida social desviada que o acusado levava, como se vê na FAC (fls. 153/154), suficientes para aferi-las reprováveis.
Ato contínuo, no que concerne aos motivos do crime, restou demonstrado que o apelado, influenciado pelo conhecimento de situações favoráveis à ação delitiva, determinou-se em condições de realizar a subtração de bens de valor para a mantença da viciosidade. Tal causa merece a devida reprovação.
Quanto às circunstâncias, estas devem ser censuradas, pois, pelos elementos trazidos aos autos, vê-se que o acusado se valeu de situações favoráveis ao cometimento do ilícito, aproveitando-se da fragilidade da vítima, da falta de segurança de sua residência simples, de horário noturno – madrugada – momento em que impera a conseqüente falta da vigilância ou atenção solidária natural por parte da vizinhança, quando acordada.
Nesse contexto, vê-se, ainda, delineada a periculosidade do acusado, pela forma premeditada que realizou a ação delitiva, inclusive, ajustando-se a um estado de inconsciência de modo a sair impune da prática criminosa.
No que concerne às conseqüências, estas são no todo gravíssimas, vez que restaram na morte da vítima, não havendo prejuízo maior que a subtração da vida humana.
Ademais o crime classificado (latrocínio) se trata de uma agravação da pena do roubo, em face das conseqüências dos atos violentos praticados contra a vítima. Daí, porque, havendo o resultado morte, deverá o agente ser por ele responsabilizado.
Por fim, a favor do réu estão os seus antecedentes, os quais, não obstante não serem bons, estes, no entanto, não o desfavorecem, pois é primário, não constando contra si sentença condenatória transitada em julgado, consoante atesta a certidão às fls. 153/154.
Destarte, considerando o conjunto circunstancial, fixo a pena-base em 20 (vinte) anos de reclusão e 60 (sessenta) dias de multa.
Verifica-se a ocorrência de duas atenuantes: sua confissão espontânea em juízo, bem como sua menoridade (menos de 21 anos de idade) na data do crime (art. 65, I do CP). Entretanto, como a pena-base foi fixada no mínimo legal, deixo de aplicá-las.
Reconheço a agravante específica do cometimento de crime contra maior de 60 (sessenta) anos (art. 61, II, “h”, do CP), ampliando a sanção acima de 1/6 (um sexto), ou seja, 03 (três anos) e 20 (vinte) dias.
Não concorrem causas de diminuição ou de aumento de pena a serem observadas.
Fixo a pena definitiva em 23 (vinte e três) anos, e 20 (vinte) dias de reclusão e pagamento de 70 (setenta) dias-multa, a razão de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente.
A pena deverá ser cumprida inicialmente em regime fechado (art. 33, § 2º, “a” do CP).
Com tais considerações, dou provimento ao recurso do órgão ministerial, para condenar JOÃO PAULO ROCHA OLIVEIRA pelo crime qualificado no artigo 157, § 3º, 2ª figura (latrocínio) c/c o artigo 61, inciso II, alínea “a”, todos do Código Penal, condenando-o, ainda, a cumprir pena de 23 (vinte e três) anos, e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicialmente fechado, e pena de multa fixada em 70 (setenta) dias-multa.
É como voto.
Boa Vista/RR, 14 de outubro de 2008.
Des. CARLOS HENRIQUES
Relator
CÂMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIME Nº 010 08 010395-4 COMARCA DE BOA VISTA
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
APELADO: JOÃO PAULO ROCHA OLIVEIRA
ADVOGADO: JAEDER NATAL RIBEIRO
RELATOR: DES. CARLOS HENRIQUES
E M E N T A
APELAÇÃO CRIME – DENÚNCIA ART. 157, § 3º, SEGUNDA PARTE C/C ART. 61, II, “a” DO CPP – ABSOLVIÇÃO – INIMPUTABILIDADE – APLICAÇÃO DE MEDIDA DE SEGURANÇA – CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL E JUDICIAL – PROVA TESTEMUNHAL – CONJUNTO PROBATÓRIO – IMPUTABILIDADE – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO – SENTENÇA REFORMADA.
1. De acordo com o art. 239 do CPP, os indícios e presunções apontados no feito restaram comprovados nos testemunhos circunstanciados tanto na fase policial quanto na fase judicial, demonstrando a harmonia daqueles com os demais elementos do fato delitivo, convergindo para a existência de circunstâncias que possibilitavam ao acusado uma conduta diversa da que ocorreu.
2. Não obstante a retratação na fase judicial, a confissão extrajudicial feita com riqueza de detalhes encontra-se perfeitamente harmonizada com o conjunto fático-probatório, durante a fase instrutória, autorizando o juízo de reprovação.
3. Nos termos do art. 182 do CPP, à vista das demais peças do conjunto probatório, o laudo pericial não se afigura prova absolutamente idônea ou definitiva, em que o julgador não ficará adstrito a este, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CRIME Nº 010 08 010395-4, da Comarca de Boa Vista, em que são partes as acima identificadas.
ACORDAM, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores que compõem a Câmara Única, Turma Criminal, do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em harmonia com o parecer da Procuradoria de Justiça, em conhecer do recurso e, no mérito, dar-lhe provimento, reformando a sentença, nos termos do relatório e voto do Relator, que ficam fazendo parte integrante deste julgado.
SALA DAS SESSÕES DA EGRÉGIA CÂMARA ÚNICA, TURMA CRIMINAL, DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RORAIMA, AOS QUATORZE DIAS DO MÊS DE OUTUBRO DO ANO DE DOIS MIL E OITO (14.10.2008).
Des. CARLOS HENRIQUES
Presidente e Relator
Des RICARDO OLIVEIRA
Revisor
Des. MAURO CAMPELLO
Julgador
Dr. SALES EURICO MELGAREJO FREITAS
Procurador de Justiça
Publicado no Diário do Poder Judiciário, ANO X - EDIÇÃO 3953, Boa Vista-RR, 23 de Outubro de 2008, p. 03.
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Data do Julgamento
:
14/10/2008
Data da Publicação
:
23/10/2008
Classe/Assunto
:
Apelação Criminal )
Relator(a)
:
DES. CARLOS HENRIQUES RODRIGUES
Tipo
:
Acórdão
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