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Jurisprudência


TJRR 10080104408

Ementa
Câmara Única – Turma Criminal Recurso em Sentido Estrito nº 010.08.010440-8 Recorrente: Joseliomar Bispo de Sousa Advogado: Dr. Elias Bezerra da Silva Recorrido: Ministério Público de Roraima Relator: Des. Mauro Campello R E L A T Ó R I O Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto contra a sentença de 1º grau que pronunciou o réu acima nominado, nas penas dos artigos 121, §2º, II, c/c art.14, inciso II, ambos do Código Penal, sujeitando-o a julgamento pelo Tribunal do Júri. Através das razões articuladas, pretende o Recorrente a desclassificação do crime de tentativa de homicídio, para lesões corporais, crime capitulado no art.129, caput, uma vez que o laudo demonstra claramente que a vítima em nenhum momento sofreu risco de morte. Suporta sua tese com base na desistência voluntária, permitida pela Lei Substantiva Penal, em seu art.15, alegando para tanto que um homem com 38 anos de idade, como o réu ao tempo do fato, se quisesse poderia ter matado a vítima, que tinha 57 anos. Nas contra-razões do recurso, o Ministério Público defende a propriedade da sentença vergastada, por entender que esta obedeceu a sua natureza de juízo de admissibilidade da acusação no rito, lastreando-se na comprovada materialidade do fato e nos indícios de autoria constantes do contexto probatório. Defende a não caracterização, no caso concreto, da alegada desistência voluntária, por entender que restou patente o animus do réu em ceifar a vida da vítima, provado quando o mesmo desfere os golpes de faca na vítima, não prosseguindo em virtude da ação da testemunha David. Parecer da D. Procuradoria de Justiça pelo conhecimento e improvimento do Recurso, forte nas razões consistentes nas peculiaridades do procedimento do Tribunal do Júri, como o princípio, vigente no juízo de admissibilidade da acusação, do in dubio pro societate. É o relatório. Inclua-se o feito em pauta, para julgamento. Boa Vista-RR, 02 de março de 2009. DES. MAURO CAMPELLO Relator Câmara Única – Turma Criminal Recurso em Sentido Estrito nº 010.08.010440-8 Recorrente: Joseliomar Bispo de Sousa Advogado: Dr. Elias Bezerra da Silva Recorrido: Ministério Público de Roraima Relator: Des. Mauro Campello V O T O O recurso é tempestivo e escorreito quanto aos demais pressupostos recursais, a merecer, pois, juízo positivo de admissibilidade. Assim, passa-se ao mérito. De início, consigne-se que a sentença de pronúncia tem natureza de decisão interlocutória mista não terminativa, na qual se declara a plausibilidade da imputação em juízo de prelibação, sem avaliar-se o mérito, exame este de competência exclusiva do Tribunal do Júri. A sentença de pronúncia, porquanto, encerra mero juízo de admissibilidade da acusação, exige que o magistrado fundamente seu convencimento na materialidade do fato e em indícios suficientes de autoria. Tais peculiaridades importam na incidência do princípio do in dubio pro societate, haja vista que o exame acurado do mérito é diferido para a fase seguinte do rito escalonado do Júri. Assentado o correto regime que deve informar o feito, tem-se que a desclassificação somente se impõe na hipótese de existência clara de circunstância que comprove a ocorrência de crime diverso dos crimes dolosos contra a vida. E razão alguma assiste ao Recorrente, nesse aspecto, posto que o conjunto probatório colacionado aos autos mostra-se, no azo, suficiente para embasar a r. decisão de pronúncia, não existindo qualquer prova a referendar, de maneira incontroversa, a desistência voluntária, haja vista que ficou suficientemente comprovado que este só parou a execução do crime, em virtude da interferência de terceiro, isto é, por circunstâncias alheias a sua vontade. Neste sentido, a decisão vergastada embasou-se na comprovada materialidade do fato e em indícios plausíveis da autoria atribuída, cotejados os depoimentos e testemunhos constantes dos autos. E mesmo se de dúvida cogitássemos, ao cotejar a alegação de desistência voluntária com o contexto probatório até então produzido, era de aplicar-se, nesta fase processual, a regra da dúvida, para pronunciar o acusado, pois ao Tribunal do Júri cabe dirimir a questão, reconhecendo a tese sustentada pelo Recorrente ou pelo representante do parquet. É forçoso reconhecer que não cabe ao juiz a quo, realizar esta aferição, pois a sentença de pronúncia é mero juízo de probabilidade, sendo necessário para o pronunciamento apenas prova da materialidade e indício de autoria., conforme dispõe nossos pretórios excelsos: “ A pronúncia exige a comprovação do crime , é corpus delicti. Da autoria basta a prova indiciária”(TJSP – RT 479/286) “As provas indiciárias autorizam a pronúncia do réu e, em tais circunstâncias, somente ao Tribunal do Júri compete decidir.”(TJMT – RT 527/389) Não se olvide, importa consignar, que a profunda incursão nas provas até então produzidas, caso a tese agitada pela defesa assim demande, está proscrita ao juiz singular, haja vista que tal é providência que toca, como cediço, ao Tribunal do Júri. Nesse sentido a Corte Suprema, no julgamento do HC 69.893-0, Rel. Min. Ilmar Galvão, já assentou que a exagerada incursão nas provas dos autos desnatura a sentença de pronúncia, podendo, com isso, influir no ânimo do Conselho de Sentença. Outros Tribunais tem o mesmo entendimento: “PROCESSO PENAL - PRONÚNCIA - INDÍCIOS DE AUTORIA E PROVA DA EXISTÊNCIA DO CRIME - ADMISSIBILIDADE DA ACUSAÇÃO PARA SUBMETER O RÉU A JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JÚRI - IN DUBIO PRO SOCIETATE. Para a sentença de pronúncia, simples juízo provisório de admissibilidade da denúncia antes de submeter o réu ao julgamento pelo Júri Popular, a análise é feita segundo o princípio do in dubio pro societate, sendo necessário apenas presença de indícios de autoria e de provas da existência do crime, vez que o exame mais apurado a respeito da pertinência ou não do inteiro teor da acusação compete ao Conselho de Sentença, verdadeiros Juízes naturais da causa. Recurso desprovido.(TJMG Número do processo: 1.0024.05.820234-2/001(1) Relator: ANTÔNIO ARMANDO DOS ANJOS Data do Julgamento: 06/11/2007 Data da Publicação: 29/11/2007)” “RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - SENTENÇA DE PRONÚNCIA - HOMICÍDIO TENTADO - IMPRONÚNCIA - IMPOSSIBILIDADE - MATERIALIDADE DELITIVA - INDÍCIOS DA AUTORIA - MANUTENÇÃO DA PRONÚNCIA - DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÃO CORPORAL - INADMISSIBILIDADE - RECURSO IMPROVIDO. - Havendo provas da existência do crime e indícios de autoria, deve ser mantida a sentença de pronúncia, nos termos do artigo 408, do Código de Processo Penal. - Inadmissível a desclassificação do delito de homicídio tentado para lesão corporal, se existem dúvidas quanto à ausência de animus necandi do agente, devendo prevalecer o brocardo in dubio pro societate, relegando-se a decisão para o Tribunal do Júri.( TJMG Número do processo: 1.0701.99.014473-8/001(1) Relator: PEDRO VERGARA Data do Julgamento: 01/04/2008 Data da Publicação: 26/04/2008)” Sobre o tema, trago à baila os ensinamentos do renomado Eugenio Pacelli de Oliveira: "Pronuncia-se alguém quando, ao exame do material probatório levado aos autos, pode-se verificar a demonstração da provável existência de um crime doloso contra a vida, bem como da respectiva e suposta autoria. Na decisão de pronúncia, o que o juiz afirma, com efeito, é a existência de provas no sentido da materialidade e da autoria. Em relação à materialidade, a prova há de ser segura quanto ao fato. Já em relação à autoria, bastará a presença de elementos indicativos, devendo o juiz, tanto quanto possível, abster-se de revelar um convencimento absoluto quanto a ela. É preciso considerar que a decisão de pronúncia somente deve revelar um juízo de probabilidade, e não de certeza." [Oliveira, Eugenio Pacelli de, Curso de Processo Penal - 6ª ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2006, Páginas 563 e, 564] “ O intento de lesionar, apto a operar a desclassificação para o delito previsto no artigo 129, do Código Penal, não restou comprovado de forma incontroversa, plena e segura nos autos. Ainda que tenha afirmado o agente que não queria matar a vítima, não existe comprovação plena de seu animus laedendi, já que seis facadas desferidas na ofendida, atestadas pela palavra da vítima, de testemunhas e pelos laudos periciais, são incompatíveis com a intenção de somente lesionar. Vale transcrever o depoimento da vítima Geraldina de Araújo Teixeira e da testemunha David Sousa Oliveira, na fase judicial: Fls.89,v(vítima): “; na ocasião o acusado puxou o braço esquerdo da depoente e deu a 1ª facada no braço esquerdo, em seguida deu a 2ª facada a altura do ombro esquerdo quando a depoente se virou para correr, em seguida deu a 3ª facada clavícula direita; posteriormente a depoente se lembra que apenas segurou a mão do acusado que tinha a faca e foi agredida na cabeça e no braço e no antebraço esquerdo; em seguida o acusado encostou a depoente num ferro, que sustenta um motor de cortar ferro; o acusado pressionou a depoente nesse ferro; não se lembra se recebeu chutes e socos; além das lesões com a faca, está machucada no braço, rins, fígado e costelas do lado esquerdo; está com o lado esquerdo quase todo “esquecida” (paralisado); para o tratamento todo o seu dinheiro já acabou bem como o dinheiro do David e da Edileuza; já foi gasto com remédio cerca de R$ 2.200,00; e a depoente acha que quem tem que pagar a conta é o acusado; a depoente perdeu a passagem; Edileuza viu a depoente já ensangüentada e a sombra do acusado com a faca na mão; Edileuza gritou pedindo socorro e em razão desse fato David agarrou o acusado por trás e o jogou no terreiro;” Fls.90 (testemunha): “Que dos fatos já viu quando a vítima já estava furada e o acusado tentando furá-la mais ainda; ouviu um grito dentro de casa, correu e viu o acusado com a faca na mão; o depoente puxou o acusado e o colocou para fora;” Necessária prova robusta de que o recorrente agiu com animus laedendi e não animus necandi para se acolher a pretensão de desclassificação, o que não se verifica no caso em apreço. Se para a desclassificação faz-se imprescindível a certeza, para a pronúncia basta a dúvida, prevalecendo o brocardo in dubio pro societate, cabendo ao Conselho de Sentença dirimir a questão. Nesse sentido, os ensinamentos do já mencionado Eugenio Pacelli de Oliveira: "Na fase de pronúncia, o que se faz é unicamente o encaminhamento regular do processo ao órgão jurisdicional competente, pela inexistência das hipóteses de absolvição sumária e de desclassificação. Essas duas decisões, como visto, exigem a afirmação judicial de certeza total quanto aos fatos e à autoria - por isso são excepcionais." [Obra cit., Páginas 563 e, 564] “ Assim, havendo dúvidas quanto à intenção do agente, não se procede à desclassificação pleiteada, devendo a questão ser submetida a julgamento perante o Tribunal do Júri. Entendo, pois, que a sentença de pronúncia analisou escorreitamente as provas trazidas aos autos, devendo ser mantida in totum, a fim de que seja julgado o ora recorrente pelo Tribunal do Júri, foro idôneo para que deduza sua tese. Isto posto, em consonância com o douto parecer ministerial, conheço do recurso, para negar-lhe provimento, mantendo na íntegra a sentença vergastada. É como Voto. Boa Vista, RR, 17 de março de 2009. DES. MAURO CAMPELLO Relator Câmara Única – Turma Criminal Recurso em Sentido Estrito nº 010.08.010440-8 Recorrente: Joseliomar Bispo de Sousa Advogado: Dr. Elias Bezerra da Silva Recorrido: Ministério Público de Roraima Relator: Des. Mauro Campello E M E N T A PROCESSO PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – SENTENÇA DE PRONÚNCIA – DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÕES CORPORAIS - PROVA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS SUFICIENTES DA AUTORIA - IN DUBIO PRO SOCIETATE - DECISÃO MANTIDA - RECURSO IMPROVIDO. A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso em Sentido Estrito, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Turma Criminal da Colenda Câmara Única do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade, em conhecer do recurso e, em consonância com a douta manifestação da Procuradoria de Justiça, negar provimento, na forma do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado. Sala das sessões do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, aos dezessete dias do mês de março do ano de dois mil e nove. Des. MAURO CAMPELLO Presidente/Relator Des. LUPERCINO NOGUEIRA Julgador Des. RICARDO OLIVEIRA Julgador Esteve presente o D. Procurador de Justiça: EDSON DAMAS Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XII - EDIÇÃO 4060, Boa Vista, 16 de abril de 2009, p. 07. ( : 17/03/2009 , : XII , : 7 ,

Data do Julgamento : 17/03/2009
Data da Publicação : 16/04/2009
Classe/Assunto : Recurso em Sentido Estrito )
Relator(a) : DES. MAURO JOSE DO NASCIMENTO CAMPELLO
Tipo : Acórdão
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