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Jurisprudência


TJRR 10080106940

Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 010.08.010694-0 Apelante: O Estado de Roraima Apelados: Alex dos Santos Silva e Sidnei da Silva Tomaz Advogado: Wilson Roy Leite da Silva Relator: Des. Mauro Campello R E L A T Ó R I O Trata-se de Apelação Criminal, interposta pelo Ministério Público do Estado de Roraima, em face de decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da 4ª Vara Criminal da Comarca de Boa Vista, nos autos da Ação Penal nº 010.05.102119-3, que condenou os réus Alex dos Santos Silva e Sidnei da Silva Tomaz, como incursos nas penas do art.155, §4º, IV(furto qualificado pelo concurso de pessoas) do Código Penal. Em suas razões recursais fls. 184/188, o Apelante requereu a reforma da r. Decisão, a fim de condenar os réus nas penas do art.157,§2º,II (Roubo qualificado pelo concurso de pessoas) do Código Penal. Alega para tanto que, ficou provado nos autos que os réus simularam a existência de uma arma de fogo enrolada na camisa na mão de um dos acusados, o que configura o tipo penal de roubo, pela grave ameaça. Justificam este entendimento, juntando jurisprudência que valora preferencialmente o depoimento da vítima em detrimento do depoimento dos réus. Em suas contra razões, fls. 190/194 e 198/206, a defesa, em síntese, manifestou-se pelo desprovimento do apelo, mantendo-se incólume a sentença vergastada. A Procuradoria de Justiça opina pelo conhecimento e pelo provimento do Recurso, para ver reformada a sentença, a fim de condenar os réus na penas cominadas para o crime de roubo. É o sucinto relatório. Remetam-se os autos à douta revisão, na forma regimental. Boa Vista, 02 de abril de 2009. Des. MAURO CAMPELLO Relator APELAÇÃO CRIMINAL Nº 010.08.010694-0 Apelante: O Estado de Roraima Apelados: Alex dos Santos Silva e Sidnei da Silva Tomaz Advogado: Wilson Roy Leite da Silva Relator: Des. Mauro Campello V O T O Atendidos os pressupostos recursais, conheço do recurso, estando permitido o juízo de mérito. Consta dos autos que na manhã do dia 08 de janeiro de 2005, na Praça do Centro Cívico, a vítima retornava do bar denominado Videokê e quando passava pela referida praça foi abordado pelos réus, que lhe subtraíram o celular e a carteira. A denúncia foi oferecida, tipificando a conduta dos réus no art. 157, §2º inciso II do Código Penal, pois em seu depoimento em juízo a vítima disse que um dos acusados estava com a camisa enrolada na mão como se estivesse com uma arma. Contudo, ao proferir a sentença, o magistrado “a quo”, aplicando o instituto a emendatio libelli, condenou os acusados nas penas do art.155, §4º, IV do mesmo diploma legal. Agiu assim o magistrado, pelo fato de ter entendido que a palavra da vítima não estava corroborada com outras provas no sentido de que os réus realmente tivessem simulado porte de arma, não restando caracterizado que os mesmos tenham agido mediante grave ameaça. Como dito alhures, o Ministério Público Estadual apelou do decisum para que os réus sejam condenados nos termos da denúncia, alegando que a palavra da vítima deve ser especialmente valorada e que os mesmos devem responder pelo crime de roubo e não pelo de furto. Analisando detidamente os autos, verifica-se que não assiste razão ao apelante, pois apesar de ter afirmado em dois depoimentos que um dos réus estava com uma camisa enrolada na mão parecendo portar uma arma, em seu primeiro depoimento no dia dos acontecimentos, este falou que foi abordado por apenas uma pessoa e que esta estava vestida com uma camisa, sem mencionar qualquer evento acerca de simulação de arma. Ademais, os réus confessaram o crime em todos os depoimentos, havendo discordância apenas no fato de dizerem que só pegaram o celular e não a carteira, o que foi desmentido pelo fato de um dos réus ter sido encontrado de posse de cartões da vítima. Contudo, no restante das declarações eles foram uníssonos, sempre afirmando que a vítima estava dormindo no banco da praça e que apenas Sidnei aproximou-se da vítima e Alex permaneceu em outro banco tendo ficado com o celular. Negam também a simulação de porte de arma. Vejamos todos os depoimentos prestados pelos réus: Alex fls. 17 “Que no sábado dia 08.01.05, estava sentado no banco da praça do centro cívico fumando um cigarro de maconha quando chegou um rapaz perguntando se ele conhecia o indivíduo que estava dormindo e pegou o celular e a carteira; Que ele abriu a carteira e tirou os únicos três reais que estavam dentro da referida carteira e lhe entregou o celular dizendo que ia sair para beber uma cachaça; Que então colocou o celular no bolso e saiu em direção ao bairro Caetano Filho para dormir na casa de um amigo...” Alex fls. 22 “Que reitera hoje os fatos relatados no seu interrogatório anterior; Que também confirma que além do celular pegou dois cartões sendo um da Loja esplanada e outro que não sabe especificar, cartões esses que pertenciam a referida vítima.” Alex fls. 60 “ Que não são verdadeiros os fatos narrados na denúncia; que conheceu o réu Sidnei no dia dos fatos, às 07:00 horas da manhã quando o depoente estava sentado em um banco da Praça do Centro Cívico fumando um baseado de maconha; que Sidnei estava no outro banco e quando viu a vítima deitada dormindo em outro banco da praça perguntou se o depoente a conhecia, tendo respondido que não; que se manteve sentado enquanto Sidnei foi em direção a vítima e lhe tomou o celular, a carteira e o relógio; que a vítima se mexeu, mas não levantou do banco; que não sabe se Sidnei estava armado; que Sidnei deu o celular para o depoente guardar e disse que voltaria mais tarde para pegar....que logo em seguida a vítima se levantou e foi embora; que o depoente acabou de fumar e foi para sua casa...” Sidnei fls.11 “Que estava na Praça do Centro Cívico dia 08.01.05 às 6 horas aproximadamente, quando viu um cidadão deitado no banco da praça; Que não conhecia a pessoa; Que o cidadão tinha um celular; Que pegou o celular da pessoa que estava deitada e entregou paro o “Diabinho”; Que fez isso porque quis, sem receber nada em troca; Que não pegou as outras coisas da pessoa que estava dormindo, como dinheiro, carteira, documentos etc...; Que conhece o “Diabinho” da praça do centro cívico;.....Que não usou arma alguma; Que no dia em que furtou o celular estava trajando camisa, bermuda e sandália.” Sidnei fls. 75 “Que são verdadeiros os fatos narrados na denúncia; que não conhecia a vítima; que conhecia o réu Alex da Praça do Centro Cívico; Que conhece Alex como “Diabinho”; que os fatos se deram no domingo por volta das 07 horas da manhã; que a vítima estava dormindo na praça; que os réus estavam chegando na praça e ao se depararem com a vítima dormindo resolveram pegar o seu celular; que não pegaram a carteira da vítima; que a vítima nem viu quando pegaram o celular; que não estavam armados; que foi levado para a delegacia dias depois mediante indicação do réu Alex à polícia.....que não é verdadeira a informação da vítima de que teriam simulado o porte de uma arma; que foi o depoente que pegou o celular da vítima;....” A vítima, por sua vez, fez declarações desencontradas, haja vista que no Boletim de Ocorrência lavrado no dia dos fatos a mesma alega que foi abordada por apenas uma pessoa e que esta estava vestindo calça jeans e uma camisa de manga curta, usando tênis, não mencionando qualquer camisa na mão do mesmo que fizesse presumir estar a pessoa portando arma. No depoimento prestado na delegacia, dias depois e no depoimento prestado em juízo, a vítima passou a dizer que foi abordada por dois homens e que um deles estava com a camisa enrolada na mão parecendo portar uma arma de fogo. Vejamos os 03 depoimentos da vítima: Vítima fls. 07 “O declarante vem informar que hoje, por volta das 07 horas, quando voltava da casa de show conhecida como Videokê e estava retornando para a sua residência ao chegar na praça do centro cívico, foi abordado por uma pessoa com as seguintes características; moreno, cabelos lisos, com aproximadamente 1,75m, trajando calça jeans e uma camisa de manga curta, usando tênis e que este lhe disse que era um assalto, subtraindo do comunicante a sua carteira porta-cédula...” Vítima fls. 32 “Que no dia 08.01.05, por volta das 05:30 horas da manhã, quando retornava do Videokê ao passar pela praça do centro cívico, dois rapazes abordaram o declarante, estando um com uma camisa enrolada na mão, pediram sua carteira e seu celular; Que, o declarante não sabia se o rapaz que estava com a camisa enrolada na mão estava armado, por isso entregou a carteira e o celular sem qualquer reação; Que, os rapazes não praticaram nenhum tipo de violência física contra o declarante..” Vítima fls.79 “que realmente eu fui vítima de uma assalto, sendo que um deles estava com a camisa enrolada na mão como se estivesse com uma arma e exigiram que eu entregasse minha carteira porta cédulas e meu celular, que esse fato aconteceu por volta das 05:30 horas, que eu entreguei os objetos e eles saíram e eu fui embora; .......que eles me apontavam a mão com um pano enrolado e exigiam que eu entregasse meu celular e porta carteira.....que o assaltante que estava com um pano enrolado na mão era esse diabinho.” Assim, quanto ao modo como os réus se comportaram durante a abordagem e ao fato de terem cometido o crime, eles são uníssonos em dizer que a vítima estava dormindo no banco da praça e que não acordou ao ser furtada e que quem se aproximou da vítima para pegar seus pertences foi apenas um dos réus, o Sidnei. Quanto à vítima, esta deixa dúvida em suas declarações, pois inicialmente diz que foi abordada por apenas uma pessoa, que estava vestida com uma camisa de manga curta e depois muda seu depoimento alegando que fora abordada pelos dois réus e que um deles estava com a camisa enrolada na mão parecendo estar armado. Destarte, o crime que ficou realmente provado no processo, sem sombra de dúvidas, pois confessado pelos réus e confirmado pelo auto de apreensão dos pertences, foi o crime de furto. É cediço que no Direito Brasileiro vigora o princípio “in dúbio pro reo”. Ora, não foi encontrada nenhuma arma com os réus, a vítima ora tem uma versão dos fatos, ora muda a versão justamente no ponto crucial para verificação do crime de roubo, logo, andou bem o magistrado em usar o instituto da “emendatio libeli”. Assim, não merece reparo a sentença objurgada. O Ministério Público usou como argumento em favor de sua tese, o fato de que a vítima só teve versão diferente no Boletim de Ocorrência, onde segundo o parquet, as declarações são superficiais, e que sua palavra deve ser valorada em detrimento da palavra dos réus. Ocorre que, apesar do Boletim de Ocorrência ter declarações superficiais, não se pode admitir que circunstâncias tão importantes como o número de pessoas que o abordaram e o fato de estarem ou não com uma arma, seja omitido. A vítima se lembrou da roupa que o réu estava usando na ocasião, mas esqueceu-se de mencionar que haviam dois réus e que estes portavam uma arma? Não é possível valorar uma informação desencontrada como esta, principalmente pelo fato de que a ocorrência da grave ameaça muda a tipificação do crime e consequentemente sua pena. Vejamos o entendimento jurisprudencial acerca do princípio “in dúbio pro reo” e da relatividade da valoração do depoimento da vítima em caso de divergência de depoimentos: ROUBO - AUTORIA E MATERIALIDADE DUVIDOSAS - PALAVRA DA VÍTIMA - INCONGRUÊNCIA - ABSOLVIÇÃO Em crimes cometidos na clandestinidade - dentre eles o roubo - a palavra da vítima é de substancial importância, merecendo especial valoração por parte do julgador, desde que coerente, uniforme e em harmonia com as demais provas produzidas, sob pena de prevalência do princípio do in dubio pro reo. Recurso provido.( TJMG - Número do processo: 2.0000.00.434208-9/000(1) Relator: ANTÔNIO ARMANDO DOS ANJOS Data do Julgamento: 27/04/2004 Data da Publicação: 08/05/2004) ROUBO MAJORADO - EMPREGO DE ARMA - CONCURSO DE PESSOAS - DELITO COMETIDO EM TOTAL CLANDESTINIDADE - PALAVRA DA VÍTIMA - CONTRADIÇÕES - ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE - PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. Em crimes praticados em total clandestinidade, ausente qualquer testemunha, a palavra da vítima assume especial importância. Entretanto, verificado que as declarações da vítima, ouvida apenas na fase policial, revelam-se contraditórias, a absolvição é medida que se impõe, nos termos do conhecido princípio do in dubio pro reo.( TJMG - Número do processo: 2.0000.00.422738-1/000(1) Relator: VIEIRA DE BRITO Data do Julgamento: 15/06/2004 Data da Publicação: 26/06/2004) ROUBO - ABSOLVIÇÃO - FALTA DE PROVA - PALAVRA DA VÍTIMA -AUSÊNCIA DE OUTRAS PROVAS -INSUFICIENTE AO DECRETO CONDENATÓRIO - PROVA INDICIÁRIA NÃO RATIFICADA EM JUÍZO - VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA - MELHOR SOLUÇÃO - PRONUNCIAMENTO DO NON LIQUET -RECURSO PROVIDO. Inexistindo provas suficientes da participação do apelante no delito de roubo, sendo a autoria negada pelo mesmo, impõe-se a absolvição. Não obstante o relevante valor probatório da palavra da vítima, esta não pode servir de base para uma condenação, quando se encontrar isolada das demais provas colacionadas. Prova indiciária, não ratificada em juízo, é insuficiente para se condenar, sob pena de se ferirem os princípios do contraditório e da ampla defesa.( TJMG - Número do processo: 1.0024.98.130616-0/001(1) Relator: PEDRO VERGARA Data do Julgamento: 27/02/2007 Data da Publicação: 14/04/2007) Diante do exposto, em dissonância com o parecer ministerial, conheço deste apelo, para negar-lhe provimento, mantendo in totum a sentença combatida. É como voto. Boa Vista, 28 de abril de 2009. Des. MAURO CAMPELLO Relator APELAÇÃO CRIMINAL Nº 010.08.010694-0 Apelante: O Estado de Roraima Apelados: Alex dos Santos Silva e Sidnei da Silva Tomaz Advogado: Wilson Roy Leite da Silva Relator: Des. Mauro Campello E M E N T A APELAÇÃO CRIMINAL – ROUBO – EMENDATIO LIBELLI – POSSIBILIDADE - FALTA DE PROVA DE QUE OS RÉUS SIMULARAM A POSSE DE ARMA DE FOGO - PALAVRA DA VÍTIMA – DECLARAÇÕES CONTRADITÓRIAS - AUSÊNCIA DE OUTRAS PROVAS -INSUFICIENTE AO DECRETO CONDENATÓRIO PELO CRIME DE ROUBO- IMPROVIMENTO. A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Crime, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Turma Criminal da Colenda Câmara Única do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade em conhecer do recurso, e em dissonância com a douta manifestação da Procuradoria de Justiça, negar provimento, na forma do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado. Sala das sessões do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, aos vinte e oito dias do mês de abril do ano de dois mil e nove. Des. MAURO CAMPELLO Presidente/Relator Des. LUPERCINO NOGUEIRA Revisor Des. RICARDO OLIVEIRA Julgador Esteve presente o D. Procurador de Justiça: EDSON DAMAS Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XII - EDIÇÃO 4080, Boa Vista, 16 de maio de 2009, p. 016. ( : 28/04/2009 , : XII , : 16 ,

Data do Julgamento : 28/04/2009
Data da Publicação : 16/05/2009
Classe/Assunto : Apelação Criminal )
Relator(a) : DES. MAURO JOSE DO NASCIMENTO CAMPELLO
Tipo : Acórdão
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