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Jurisprudência


TJRR 10090129577

Ementa
CÂMARA ÚNICA – TURMA CÍVEL AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 010.09.012957-7 AGRAVANTE: ANTÔNIO RUIZ ZAPATA AGRAVADA: ANDRÉIA CRISTIANE MACIEL BARBOSA RELATOR: EXMO. SR. DES. ROBÉRIO NUNES RELATÓRIO Antônio Ruiz Zapata ajuizou o presente recurso de agravo por não se conformar com a decisão interlocutória do Exmo Sr. Dr. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista, exarada nos autos da ação de passagem forçada – processo nº 010.2009.904.292-0, onde figura como autora a Srª Andréia Cristiane Maciel Barbosa, em que indeferiu a preliminar de incompetência do juízo, com base nas disposições do art. 36, I, d, do COJERR. Argumentou ter incorrido o magistrado em error in judicando na interpretação de sua competência em relação aos conceitos de questões agrária e fundiária, espécie de que não se trata na mencionada ação, de natureza meramente possessória. Sustentou a ocorrência de lesão ao devido processo legal, que prevê autoridade judiciária competente para seu julgamento, e requereu a suspensão dos efeitos do despacho impugnado, que deferi às fls. 32/33. Em contrarrazões de fls. 38/42, a agravada pugnou pela manutenção da decisão alegando que diversas famílias estão com as suas propriedades encravadas em região de difícil acesso, restando o caminho alternativo impossível de ser utilizado, tendo em vista o nível baixo do rio. É o relatório. Boa Vista, 08 de fevereiro de 2010 . Des. Robério Nunes – Relator. CÂMARA ÚNICA – TURMA CÍVEL AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 010.09.012957-7 AGRAVANTE: ANTÔNIO RUIZ ZAPATA AGRAVADA: ANDRÉIA CRISTIANE MACIEL BARBOSA RELATOR: EXMO. SR. DES. ROBÉRIO NUNES VOTO O recurso comporta provimento. Cuidam os autos principais de ação de passagem forçada na qual alega a autora/agravada encontrar-se o seu imóvel rural encravado em área de difícil acesso, existindo tão somente passagem terrestre pela fazenda do réu/agravante, utilizada há mais de treze anos. Argumenta ainda que, desde a aquisição da fazenda pelo agravante, a sua família, dentre outras, está em situação de total confinamento. Trata-se, portanto, de processo que envolve conflitos de interesses individuais, onde as partes discutem o direito de passagem, regulado no art. 1285 do Código Civil. O magistrado indeferiu a preliminar de incompetência absoluta sob alegar que “todo conflito agrário e fundiário rural, que diga respeito a questão agrária, em todo o Estado, é de competência da 3ª Vara Cível, na forma do COJERR” (sic). Vejamos o disposto no art. 36 do COJERR: “Art. 36 – Ao Juiz da 3ª Vara Cível compete: I – Processar e Julgar: d) as causas inerentes às questões agrárias e fundiárias em todo o Estado”. (grifei). O cerne da questão gira em torno da correta interpretação do aludido dispositivo. Embora os vocábulos agrário e fundiário, etmologicamente se refiram ao campo e aos fenômenos que ali têm sede, na acepção jurídica do direito agrário e das questões agrárias ou fundiárias têm significação diversa. Partindo da interpretação teleológica da norma constitucional que criou o Juízo ou a Vara com competência para os feitos agrários, a intenção do legislador, como vê dos anais do Congresso Nacional, não visou a solução das ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e as demais causas em que se evidencie o interesse público pela natureza da lide ou pela qualidade das partes, objetivando a promoção da paz no campo em questões que dependem de negociação e compreendem questões sociais. Da proposta de Emenda à Constituição, lê-se claramente a finalidade da criação da justiça agrária, quando se propôs acrescentar-se ao art. 109 da Constituição o inciso XII, com a seguinte redação: “as causas fundiárias definidas em lei que envolvam interesses ou direitos coletivos e/ou interesses ou direitos individuais homogêneos, estes entendidos como de origem comum de que sejam titulares proprietários ou possuidores rurais, grupos, categorias ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária, desde que envolvam disputas possessórias ou de domínio voltadas para a política de reforma agrária.” Regulamentando a ação judicial do juiz agrário no Estado de Santa Catarina, o Tribunal de Justiça daquele estado baixou a Resolução n. 12/2000/CM, cujo art. 1º define precisamente as ações sujeitas à sua decisão: “Art. 1º - O Togado designado para assuntos agrários terá competência para processar e julgar as ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural, mencionadas no art. 82, inciso III, do Código de Processo Civil, com a redação que lhe foi dada pela Lei 9.415, de 23.12.96;” O Estado do Pará, a sua vez, disciplinando a matéria, estabeleceu no art. 1º da Resolução nº 018/2005-GP: “Art. 1º. As questões agrárias sujeitas à competência das Varas Agrárias são as ações que envolvam litígios coletivos pela posse e propriedade da terra em área rural. Parágrafo único. Em outras ações em área rural, inclusive nas individuais, poderá ser estabelecida a competência das Varas Agrárias, desde que haja interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte, a ser definida por ato do Presidente do Tribunal, em cada caso concreto e em qualquer fase do processo, de ofício, por requerimento das partes, do Juiz, do Ministério Público ou de órgão fundiário da União ou do Estado dirigido diretamente à Presidência do Tribunal, processando sem efeito suspensivo.” O Estado do Mato Grosso também, na Resolução nº 07/2008/OE, disciplinou a competência do juiz da Vara Especializada em direito Agrário, no seu art. 2º, nos seguintes termos: “Art. 2º. O Juiz de Direito da Vara Especializada em Direito Agrário, com sede na Comarca de Cuiabá – MT, tem jurisdição em todo o Estado de Mato Grosso e competência para processar e julgar as ações que envolvam litígios coletivos pela posse de terras rurais, mencionadas no artigo 82, inciso III, do Código de Processo Civil, e as que lhe são conexas.” Já o Estado de Minas Gerais, por meio da Resolução nº398/2002, regulamentou o funcionamento da Vara de Conflitos Agrários, definindo a sua competência no art. 1º, verbis: “O Juiz de Direito da Vara de Conflitos Agrários tem competência para processar e julgar as ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural, mencionadas no art. 82, inciso III, do Código de Processo Civil, com a redação que lhe foi dada pela Lei 9.415, de 23.12.96.” Como se vê, é pacífico o entendimento dos tribunais brasileiros no sentido de dar corporificação ao preceito constitucional, criando juízes ou varas agrárias destinadas especificamente à solução dos conflitos coletivos pela posse da terra rural ao pressuposto do interesse social e não aos litígios individuais que se resolvem pelas disposições do Código Civil Brasileiro no juízo cível comum. Com estas considerações, concluo ser incompetente o Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista, vez que a ação de passagem forçada não possui caráter coletivo e não envolve questão agrária ou fundiária propriamente dita (desapropriação para reforma agrária ou invasões coletivas de entidades como o MST). Sobre o tema, colaciono o seguinte aresto: “PROCESSUAL CIVIL – CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA – AÇÃO POSSESSÓRIA – IMÓVEL RURAL – CONFLITO AGRÁRIO NÃO CARACTERIZADO – INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO ESPECIALIZADO – 1- Não havendo discussão a respeito da desapropriação do imóvel objeto da lide, para fins de reforma agrária, já que, por ocasião do ajuizamento da ação possessória, a ação de desapropriação já se encontrava julgada definitivamente, com a transmissão do imóvel ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, não se caracteriza o conflito agrário, a justificar a competência da vara especializada. 2- Conflito conhecido e julgado procedente, para declarar a competência do Juízo Federal da Subseção Judiciária de Patos de Minas (MG), suscitado.” (TRF 1ª R. – CC 2009.01.00.043305-3/MG – 2ª S. – Rel. Des. Fed. Daniel Paes Ribeiro – DJe 28.09.2009 – p. 190) Diante do exposto, dou provimento ao agravo e determino a redistribuição do feito, levando-se em consideração o foro da situação da coisa, nos termos do art.95 do CPC. É como voto. Boa Vista, 09 de fevereiro de 2010. Des. Robério Nunes – Relator. CÂMARA ÚNICA – TURMA CÍVEL AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 010.09.012957-7 AGRAVANTE: ANTÔNIO RUIZ ZAPATA AGRAVADA: ANDRÉIA CRISTIANE MACIEL BARBOSA RELATOR: EXMO. SR. DES. ROBÉRIO NUNES ACÓRDÃO AGRAVO DE INSTRUMENTO - DIREITO AGRÁRIO – POSSE CIVIL – CONFLITO INDIVIDUAL – AUSÊNCIA DE INTERESSE SOCIAL COLETIVO – INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO AGRÁRIO. 1. A competência do juízo agrário está circunscrita às questões fundiárias que envolvam interesses sociais coletivos pela posse da terra rural. 2. Recurso provido. Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, acordam, à unanimidade de votos, os Desembargadores integrantes da Câmara Única, por sua Turma Cível, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Boa Vista, Sala de Sessões do Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, aos nove dias do mês de fevereiro do ano de dois mil e dez. Des. Mauro Campello Presidente e Julgador Des. Robério Nunes Relator Des. Ricardo Oliveira Julgador Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XIII - EDIÇÃO 4268, Boa Vista, 4 de março de 2010, p. 012. ( : 09/02/2010 , : XIII , : 12 ,

Data do Julgamento : 09/02/2010
Data da Publicação : 04/03/2010
Classe/Assunto : Agravo de Instrumento )
Relator(a) : DES. ROBERIO NUNES DOS ANJOS
Tipo : Acórdão
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