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Jurisprudência


TJRR 10090130336

Ementa
CÂMARA ÚNICA – TURMA CÍVEL CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA Nº 010 09 013033-6 SUSCITANTE: JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA SUSCITADO: JUÍZO DE DIREITO DA 6ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA RELATOR: EXMO. SR. DES. ROBÉRIO NUNES D E C I S Ã O Vistos, etc. Trata-se de conflito negativo de competência, tendo como suscitante o Juízo de Direito da 3ª Vara Cível e suscitado, o Juízo de Direito da 4ª Vara Cível, ambos da Comarca de Boa Vista, com respeito à dúvida sobre qual o juízo competente para processar e julgar a ação reintegração de posse – processo nº.010.2008.902149-6 (PROJUDI), ajuizada por Oseias Ferreira Sobrinho em desfavor de Raimundo de Tal e outros. A ação foi proposta perante o Juízo da 6ª Vara Cível desta comarca, tendo o magistrado determinado a remessa dos autos ao Juízo da 3ª Vara Cível, sob alegar respeito às regras processuais. O MM Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista suscitou o presente conflito, argumentando: “...segundo diretriz constitucional, somente o conflito fundiário que diga respeito à questão agrária é que, por princípio, é de competência da vara especializada para o julgamento de ‘questões agrárias’, dúvida não devendo haver, então, de que o conflito fundiário urbano, por não dizer respeito a questão agrária, está excluído da competência da vara especializada criada pelo Tribunal de Justiça do Estado para atender à determinação constitucional”. (sic) Em parecer de fls. 28/33, o ilustre Representante do Ministério Público, Dr. Edson Damas da Silveira, opinou pelo conhecimento do conflito, a fim de declarar competente o Juízo de Direito da 6ª Vara Cível de Boa Vista para processar e julgar o feito. É o relatório. Dispõe o art. 120 e seu parágrafo único do Código Buzaid: “Art. 120. Poderá o relator, de ofício, ou a requerimento de qualquer das partes, determinar, quando o conflito for positivo, seja sobrestado o processo, mas, neste caso, bem como no de conflito negativo, designará um dos juízes para resolver, em caráter provisório, as medidas urgentes. Parágrafo único. Havendo jurisprudência dominante do tribunal sobre a questão suscitada, o relator poderá decidir de plano o conflito de competência, cabendo agravo, no prazo de cinco dias, contado da intimação da decisão às partes, para o órgão recursal competente. (Incluído pela Lei nº 9.756, de 17.12.1998)” Ao comentarem o dispositivo supra, os processualistas Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, em Código de Processo Civil Comentado, RT, 7ª ed., lecionam: “A norma autoriza o relator a decidir de plano, monocraticamente, o conflito de competência pelo mérito, quando a tese já estiver pacificada no tribunal, constituindo jurisprudência dominante. Nada impede que o relator possa, também, julgar o mérito do conflito quanto à tese já firmada em jurisprudência dominante no STF e no STJ, em atenção ao princípio da economia processual.” Esta Corte já firmou entendimento no sentido de declarar competente o Juízo da 3ª Vara Cível (Vara Especializada Agrária) apenas quando se trate de conflitos de interesse coletivo que dizem respeito à posse de terra rural, conforme se observa nos processos números: 010.09.013232-4, 010.09.013288-6, 010.09.013182-1, 010.09.013172-2, 010.09.013220-9, 010.09.013036-9, 010.09.013264-7, 010.09.013287-8, 010.09.013174-8, 010.09.013319-9, 010.09.013173-0, 010.09.013263-9, 010.09.013322-3, 010.09.013374-4 e 010.09.013266-2. Autorizado por essa norma, passo a decidir. Embora os vocábulos agrário e fundiário, etimologicamente, se refiram ao campo e aos fenômenos que ali têm sede, na acepção jurídica do direito agrário e das questões agrárias ou fundiárias têm significação diversa. Partindo da interpretação teleológica da norma constitucional que criou o Juízo ou a Vara com competência para os feitos agrários, a intenção do legislador, como consta dos anais do Congresso Nacional, visou à solução das ações que envolvam litígios de interesse pela posse da terra rural e as demais causas em que se evidencie o interesse público pela natureza da lide ou pela qualidade das partes, objetivando a promoção da paz no campo em questões que dependem de negociação e compreendem questões sociais. Da proposta de Emenda à Constituição, lê-se claramente a finalidade da criação da justiça agrária, quando se propôs acrescentar-se ao art. 109 da Constituição o inciso XII, com a seguinte redação: “... as causas fundiárias definidas em lei que envolvam interesses ou direitos coletivos e/ou interesses ou direitos individuais homogêneos, estes entendidos como de origem comum de que sejam titulares proprietários ou possuidores rurais, grupos, categorias ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária, desde que envolvam disputas possessórias ou de domínio voltadas para a política de reforma agrária.” Regulamentando a ação judicial do juiz agrário no Estado de Santa Catarina, o Tribunal de Justiça daquele estado baixou a Resolução n. 12/2000/CM, cujo art. 1º define precisamente as ações sujeitas à sua decisão: “Art. 1º - O Togado designado para assuntos agrários terá competência para processar e julgar as ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural, mencionadas no art. 82, inciso III, do Código de Processo Civil, com a redação que lhe foi dada pela Lei 9.415, de 23.12.96;” O Estado do Pará, à sua vez, disciplinando a matéria, estabeleceu no art. 1º da Resolução nº 018/2005-GP: “Art. 1º. As questões agrárias sujeitas à competência das Varas Agrárias são as ações que envolvam litígios coletivos pela posse e propriedade da terra em área rural. Parágrafo único. Em outras ações em área rural, inclusive nas individuais, poderá ser estabelecida a competência das Varas Agrárias, desde que haja interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte, a ser definida por ato do Presidente do Tribunal, em cada caso concreto e em qualquer fase do processo, de ofício, por requerimento das partes, do Juiz, do Ministério Público ou de órgão fundiário da União ou do Estado dirigido diretamente à Presidência do Tribunal, processando sem efeito suspensivo.” O Estado do Mato Grosso também, na Resolução nº 07/2008/OE, disciplinou a competência do juiz da Vara Especializada em Direito Agrário, no seu art. 2º, nos seguintes termos: “Art. 2º. O Juiz de Direito da Vara Especializada em Direito Agrário, com sede na Comarca de Cuiabá – MT, tem jurisdição em todo o Estado de Mato Grosso e competência para processar e julgar as ações que envolvam litígios coletivos pela posse de terras rurais, mencionadas no artigo 82, inciso III, do Código de Processo Civil, e as que lhe são conexas.” Já o Estado de Minas Gerais, por meio da Resolução nº398/2002, regulamentou o funcionamento da Vara de Conflitos Agrários, definindo a sua competência no art. 1º, verbis: “O Juiz de Direito da Vara de Conflitos Agrários tem competência para processar e julgar as ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural, mencionadas no art. 82, inciso III, do Código de Processo Civil, com a redação que lhe foi dada pela Lei 9.415, de 23.12.96.” Como se vê, é pacífico o entendimento dos tribunais brasileiros no sentido de dar corporificação ao preceito constitucional, criando juízes ou varas agrárias destinadas especificamente à solução dos conflitos coletivos pela posse da terra rural ao pressuposto do interesse social e não aos litígios individuais que se resolvem pelas disposições do Código Civil Brasileiro no juízo cível comum. Neste sentido, transcrevo o judicioso parecer do ilustrado representante do Ministério Público, Dr. Edson Damas, em processo que trata da matéria idêntica (proc. nº. 010.09.013287-8) “A discussão, portanto, gira em torno de saber qual o Juízo competente para processar e julgar os conflitos fundiários. Melhor dizendo, os conflitos fundiários urbanos. Os termos “agrários e fundiários”, na verdade, possuem o mesmo significado na medida em que ambos referem-se à terras. Foram empregados de forma genérica (questões vinculadas à terra), no art. 36, I, alínea “d” do COJERR. Mas existe na realidade uma diferença entre os dois termos. Vejamos. Os conflitos devem ser observados quanto aos interesses que os envolvam, se são individuais ou coletivos. As questões fundiárias urbanas (interesses individuais) foram vinculadas às varas cíveis genéricas, em razão da competência residual; enquanto à vara especializada cabe o processamento e julgamento dos conflitos ligados à reforma agrária (interesses coletivos). As expressões “agrários e fundiários” contidas no texto da LC 002/93 (COJERR) foram empregadas de forma genérica, cabendo ao magistrado interpretá-las de acordo com a norma constitucional que a originou, no caso, o art. 126, da Constituição Federal. Corroborando este entendimento, o Professor de Direito Agrário Marcus Alan de Melo Gomes, proferiu palestra no XI Seminário de Direito Agrário e II Encontro de Professores de Direito Agrário, que foram realizados em São Luís/MA, no dia 26.06.03, onde esclareceu que a vara agrária está ligada à reforma agrária e não a conflitos interindividuais. Confira-se: “Entretanto, de acordo com o tratamento legal reservado à matéria, não basta que a proteção se pretende seja agrária, para que se defina a competência da Vara, Imperioso que a posse sobre o imóvel rural seja discutida em juízo sob o enfoque da Reforma Agrária, ou seja, que o direito do possuidor esteja sendo questionado com fins de promover melhor repartição da terra, de modo que a posse modificada venha a atender aos princípios da justiça social e ao aumento de produtividade. Não é suficiente, assim, haja a ameaça, a turbação ou o esbulho do direito alegado. Imprescindível que o requerido esteja a praticar tais atos com fins de execução da Reforma Agrária. As Varas Agrárias não receberam tanta atenção do legislador para que seu juiz cumprisse o expediente forense a julgar conflitos interindividuais. O juiz agrário não existe para decidir em que posição vai ficar a cerca que divide a área do Sr. João do Loto do Sr. José, quando um deles a tiver erguido um pouco além dos limites da demarcação. A função deste Magistrado vai muito alem. Cabe a ele contribuir, no âmbito jurisdicional, com a modificação de mentalidade e com a efetiva realização de uma Reforma Agrária justa do ponto de vista social, sem olvidar, por óbvio, que nenhuma Reforma Agrária será legítima se efetuada ao arrepio do Direito”. (grifou-se) Sem adentrarmos ao mérito da questão, tão-somente abordando a questão relativa à competência do Juízo, entendemos que a competência para processar e julgar o feito é da 4ª Vara Cível (genérica), pois a ação de usucapião, não possui caráter coletivo e não envolve questão agrária ou fundiária propriamente dita (desapropriação para reforma agrária ou invasões coletivas de entidades como o MST).” Diante do exposto, com fulcro no art. 120, parágrafo único do Código de Processo Civil, conheço do conflito e declaro competente para processar o presente feito o Juízo da 6 ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista. Boa Vista, 10 de março de 2009. Des. Robério Nunes Relator Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XIII - EDIÇÃO 4280, Boa Vista, 20 de março de 2010, p. 063. ( : 10/03/2009 , : XIII , : 63 ,

Data do Julgamento : 10/03/2009
Data da Publicação : 20/03/2010
Classe/Assunto : Conflito de Competência )
Relator(a) : DES. ROBERIO NUNES DOS ANJOS
Tipo : Decisão Monocrática
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