TJRR 10090131730
CÂMARA ÚNICA – TURMA CÍVEL
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA Nº 010.09.013319-9
SUSCITANTE: JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA
SUSCITADO: JUÍZO DE DIREITO DA 6ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA
RELATOR: EXMO. SR. DES. ROBÉRIO NUNES
R E L A T Ó R I O
Trata-se de conflito negativo de competência, tendo como suscitante o JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA e suscitado, o JUÍZO DE DIREITO DA 6ª VARA CÌVEL DA COMARCA DE BOA VISTA, havendo dúvida sobre qual o Juízo competente para processar e julgar a Ação de Reintegração de Posse – processo nº.0010.08.182071-3, ajuizada por Samuel de Macedo Souza em desfavor de João Tereza Gracillino da Silva.
A ação foi proposta perante o Juízo da 6ª Vara Cível desta comarca, tendo o magistrado determinado a remessa dos autos ao Juízo da 3ª Vara Cível, sob alegar respeito às regras processuais.
O MM Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista suscitou o presente conflito, argumentando:
“...segundo diretriz contitucional, somente o conflito fundiário que diga respeito à questão agrária é que, por princípio, é de competência da vara especializada para o julgamento de ‘questões agrárias’, dúvida não devendo haver, então, de que o conflito fundiário urbano, por não dizer respeito a questão agrária, está excluído da competência da vara especializada criada pelo Tribunal de Justiça do Estado para atender à determinação constitucional”. (sic)
Em parecer de fls. 14/19, o ilustre Representante do Ministério Público, Dr. Edson Damas, opinou pelo conhecimento do conflito, a fim de declarar competente o Juízo de Direito da 6ª Vara Cível para processar e julgar o feito.
É o quanto basta relatar.
Feito que independe de revisão (art. 178 do RITJRR).
Em mesa para julgamento (art. 185 do RITJRR).
Boa Vista, 01 de dezembro de 2009.
Des. Robério Nunes
Relator
CÂMARA ÚNICA – TURMA CÍVEL
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA Nº 010.09.013287-8
SUSCITANTE: JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA
SUSCITADO: JUÍZO DE DIREITO DA 4ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA
RELATOR: EXMO. SR. DES. ROBÉRIO NUNES
VOTO
Embora os vocábulos agrário e fundiário, etmologicamente, se refiram ao campo e aos fenômenos que ali têm sede, na acepção jurídica do direito agrário e das questões agrárias ou fundiárias têm significação diversa.
Partindo da interpretação teleológica da norma constitucional que criou o Juízo ou a Vara com competência para os feitos agrários, a intenção do legislador, como se vê dos anais do Congresso Nacional, visou à solução das ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e as demais causas em que se evidencie o interesse público pela natureza da lide ou pela qualidade das partes, objetivando a promoção da paz no campo em questões que dependem de negociação e compreendem questões sociais.
Da proposta de Emenda à Constituição, lê-se claramente a finalidade da criação da justiça agrária, quando se propôs acrescentar-se ao art. 109 da Constituição o inciso XII, com a seguinte redação:
“as causas fundiárias definidas em lei que envolvam interesses ou direitos coletivos e/ou interesses ou direitos individuais homogêneos, estes entendidos como de origem comum de que sejam titulares proprietários ou possuidores rurais, grupos, categorias ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária, desde que envolvam disputas possessórias ou de domínio voltadas para a política de reforma agrária.”
Regulamentando a ação judicial do juiz agrário no Estado de Santa Catarina, o Tribunal de Justiça daquele estado baixou a Resolução n. 12/2000/CM, cujo art. 1º define precisamente as ações sujeitas à sua decisão:
“Art. 1º - O Togado designado para assuntos agrários terá competência para processar e julgar as ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural, mencionadas no art. 82, inciso III, do Código de Processo Civil, com a redação que lhe foi dada pela Lei 9.415, de 23.12.96;”
O Estado do Pará, a sua vez, disciplinando a matéria, estabeleceu no art. 1º da Resolução nº 018/2005-GP:
“Art. 1º. As questões agrárias sujeitas à competência das Varas Agrárias são as ações que envolvam litígios coletivos pela posse e propriedade da terra em área rural.
Parágrafo único. Em outras ações em área rural, inclusive nas individuais, poderá ser estabelecida a competência das Varas Agrárias, desde que haja interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte, a ser definida por ato do Presidente do Tribunal, em cada caso concreto e em qualquer fase do processo, de ofício, por requerimento das partes, do Juiz, do Ministério Público ou de órgão fundiário da União ou do Estado dirigido diretamente à Presidência do Tribunal, processando sem efeito suspensivo.”
O Estado do Mato Grosso também, na Resolução nº 07/2008/OE, disciplinou a competência do juiz da Vara Especializada em direito Agrário, no seu art. 2º, nos seguintes termos:
“Art. 2º. O Juiz de Direito da Vara Especializada em Direito Agrário, com sede na Comarca de Cuiabá – MT, tem jurisdição em todo o Estado de Mato Grosso e competência para processar e julgar as ações que envolvam litígios coletivos pela posse de terras rurais, mencionadas no artigo 82, inciso III, do Código de Processo Civil, e as que lhe são conexas.”
Já o Estado de Minas Gerais, por meio da Resolução nº398/2002, regulamentou o funcionamento da Vara de Conflitos Agrários, definindo a sua competência no art. 1º, verbis:
“O Juiz de Direito da Vara de Conflitos Agrários tem competência para processar e julgar as ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural, mencionadas no art. 82, inciso III, do Código de Processo Civil, com a redação que lhe foi dada pela Lei 9.415, de 23.12.96.”
Como se vê, é pacífico o entendimento dos tribunais brasileiros no sentido de dar corporificação ao preceito constitucional, criando juízes ou varas agrárias destinadas especificamente à solução dos conflitos coletivos pela posse da terra rural ao pressuposto do interesse social e não aos litígios individuais que se resolvem pelas disposições do Código Civil Brasileiro no juízo cível comum.
Neste sentido, transcrevo o judicioso parecer do ilustrado representante do Ministério Público, Dr. Edson Damas:
“De acordo com a inicial de fls. 05/08, os requerentes alegam que adquiriram em 27/05/2003, um imóvel residencial localizado na Rua Valério Magalhães, nº. 1008, bairro de São Francisco, com terreno medindo 14,92m de frente por 30,00 e 23,85 de fundos, perfazendo área total de 483,66m², sendo que desde 1983 permanece o imóvel registrado no Cartório de Registro em nome da Sra. Maria Medeiros de Matos, já falecida.
Trata-se, portanto, de processo que envolve conflitos de interesses individuais, onde as partes disputam a aquisição da propriedade do imóvel descrito acima.
O MM. Juiz da 6ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista, ao declarar-se incompetente para processar e julgar feitos dessa natureza, encaminhou os autos ao MM. Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca da Capital, com base no que preceitua a alínea “d”, inciso I, do art. 36, do COJER, verbis:
“Art. 36 – Ao Juiz da 3ª Vara Cível compete:
I – Processar e Julgar:
d) as causas inerentes às questões agrárias e fundiárias em todo o Estado”. (grifei).
Em contrapartida, o MM. Juiz da 3ª Vara da comarca da Capital, ora suscitante, arguiu a sua incompetência para processar e julgar feitos que digam respeito a conflito de terras urbanas, com fundamento no que dispõe o art. 126, CF, e EC 45/2004, que assim dispõem, respectivamente : “para dirimir conflitos fundiários, o Tribunal de Justiça designará juízes de entrância especial, com competência exclusiva para questões agrárias; para dirimir conflitos fundiários, o Tribunal de Justiça proporá a criação de varas especializadas, com competência exclusiva para questões agrárias”.
Assim, depreende-se que a controvérsia surgida nos presentes autos é quanto a correta interpretação do disposto no art. 36, I, “d”, do COJER (Lei Complementar nº 002/93), que atribuiu ao Juiz de Direito da 3ª Vara Cível, competência para processar e julgar as causas inerentes às questões agrárias e fundiárias, com jurisdição em todo o Estado. No caso, trata-se de competência absoluta em razão da matéria.
Quanto à competência para julgamento de questões agrárias em todo o Estado, ressaltou o MM. Juiz suscitante não existirem dúvidas, pois o COJER é bem claro ao atribuir competência a esse Juízo para tal mister.
A discussão, portanto, gira em torno de saber qual o Juízo competente para processar e julgar os conflitos fundiários. Melhor dizendo, os conflitos fundiários urbanos.
Os termos “agrários e fundiários”, na verdade, possuem o mesmo significado na medida em que ambos referem-se à terras. Foram empregados de forma genérica (questões vinculadas à terra), no art. 36, I, alínea “d” do COJERR. Mas existe na realidade uma diferença entre os dois termos. Vejamos.
Os conflitos devem ser observados quanto aos interesses que os envolvam, se são individuais ou coletivos. As questões fundiárias urbanas (interesses individuais) foram vinculadas às varas cíveis genéricas, em razão da competência residual; enquanto à vara especializada cabe o processamento e julgamento dos conflitos ligados à reforma agrária (interesses coletivos).
As expressões “agrários e fundiários” contidas no texto da LC 002/93 (COJERR) foram empregadas de forma genérica, cabendo ao magistrado interpretá-las de acordo com a norma constitucional que a originou, no caso, o art. 126, da Constituição Federal.
Corroborando este entendimento, o Professor de Direito Agrário Marcus Alan de Melo Gomes, proferiu palestra no XI Seminário de Direito Agrário e II Encontro de Professores de Direito Agrário, que foram realizados em São Luís/MA, no dia 26.06.03, onde esclareceu que a vara agrária está ligada à reforma agrária e não a conflitos interindividuais. Confira-se:
“Entretanto, de acordo com o tratamento legal reservado à matéria, não basta que a proteção se pretende seja agrária, para que se defina a competência da Vara, Imperioso que a posse sobre o imóvel rural seja discutida em juízo sob o enfoque da Reforma Agrária, ou seja, que o direito do possuidor esteja sendo questionado com fins de promover melhor repartição da terra, de modo que a posse modificada venha a atender aos princípios da justiça social e ao aumento de produtividade. Não é suficiente, assim, haja a ameaça, a turbação ou o esbulho do direito alegado. Imprescindível que o requerido esteja a praticar tais atos com fins de execução da Reforma Agrária.
As Varas Agrárias não receberam tanta atenção do legislador para que seu juiz cumprisse o expediente forense a julgar conflitos interindividuais. O juiz agrário não existe para decidir em que posição vai ficar a cerca que divide a área do Sr. João do Loto do Sr. José, quando um deles a tiver erguido um pouco além dos limites da demarcação. A função deste Magistrado vai muito alem. Cabe a ele contribuir, no âmbito jurisdicional, com a modificação de mentalidade e com a efetiva realização de uma Reforma Agrária justa do ponto de vista social, sem olvidar, por óbvio, que nenhuma Reforma Agrária será legítima se efetuada ao arrepio do Direito”. (grifou-se)
Sem adentrarmos ao mérito da questão, tão-somente abordando a questão relativa à competência do Juízo, entendemos que a competência para processar e julgar o feito é da 6ª Vara Cível (genérica), pois a ação de usucapião de imóvel urbano, não possui caráter coletivo e não envolve questão agrária ou fundiária propriamente dita (desapropriação para reforma agrária ou invasões coletivas de entidades como o MST).
Por outro o exposto, esta Procuradoria de Justiça opina pela atribuição da competência para o processamento e julgamento da Ação de Usucapião Nº. 0010.04.079331-6, ao Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista-RR, afastando-se no caso em comento a aplicação do art. 36, I, “d” do COJER, que fica adstrito à questões relativas à reforma agrária, nos moldes do que dispõe o art. 126, da CF/88”.
Diante do exposto, conheço do conflito e declaro competente para processar o presente feito o Juízo da 4 ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista.
É o meu voto.
Boa Vista, 01 de dezembro de 2009.
Des. Robério Nunes
Relator
CÂMARA ÚNICA – TURMA CÍVEL
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA Nº 010 09 013173-0
SUSCITANTE: JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA
SUSCITADO: JUÍZO DE DIREITO DA 4ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA
RELATOR: EXMO. SR. DES. ROBÉRIO NUNES
A C Ó R D Ã O
EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA – DIREITO AGRÁRIO – POSSE CIVIL – CONFLITO INDIVIDUAL – AUSÊNCIA DE INTERESSE SOCIAL COLETIVO – INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO AGRÁRIO.
A competência do juízo agrário está circunscrita às questões fundiárias que envolvam interesses sociais coletivos pela posse da terra rural.
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, acordam os Desembargadores integrantes da Câmara Única, por sua Turma Cível, à unanimidade de votos, em conhecer do conflito e declarar competente o Juízo da 4ª Vara Cível, nos termos do voto do Relator.
Boa Vista, Sala de Sessões do Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, ao primeiro dia do mês de dezembro do ano de dois mil e nove.
DES. MAURO CAMPELLO
Presidente e Julgador
DES. ROBÉRIO NUNES
Relator
DES. LUPERCINO NOGUEIRA
Julgador
Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XIII - EDIÇÃO 4273, Boa Vista, 11 de março de 2010, p. 039.
( : 01/12/2009 ,
: XIII ,
: 39 ,
Ementa
CÂMARA ÚNICA – TURMA CÍVEL
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA Nº 010.09.013319-9
SUSCITANTE: JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA
SUSCITADO: JUÍZO DE DIREITO DA 6ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA
RELATOR: EXMO. SR. DES. ROBÉRIO NUNES
R E L A T Ó R I O
Trata-se de conflito negativo de competência, tendo como suscitante o JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA e suscitado, o JUÍZO DE DIREITO DA 6ª VARA CÌVEL DA COMARCA DE BOA VISTA, havendo dúvida sobre qual o Juízo competente para processar e julgar a Ação de Reintegração de Posse – processo nº.0010.08.182071-3, ajuizada por Samuel de Macedo Souza em desfavor de João Tereza Gracillino da Silva.
A ação foi proposta perante o Juízo da 6ª Vara Cível desta comarca, tendo o magistrado determinado a remessa dos autos ao Juízo da 3ª Vara Cível, sob alegar respeito às regras processuais.
O MM Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista suscitou o presente conflito, argumentando:
“...segundo diretriz contitucional, somente o conflito fundiário que diga respeito à questão agrária é que, por princípio, é de competência da vara especializada para o julgamento de ‘questões agrárias’, dúvida não devendo haver, então, de que o conflito fundiário urbano, por não dizer respeito a questão agrária, está excluído da competência da vara especializada criada pelo Tribunal de Justiça do Estado para atender à determinação constitucional”. (sic)
Em parecer de fls. 14/19, o ilustre Representante do Ministério Público, Dr. Edson Damas, opinou pelo conhecimento do conflito, a fim de declarar competente o Juízo de Direito da 6ª Vara Cível para processar e julgar o feito.
É o quanto basta relatar.
Feito que independe de revisão (art. 178 do RITJRR).
Em mesa para julgamento (art. 185 do RITJRR).
Boa Vista, 01 de dezembro de 2009.
Des. Robério Nunes
Relator
CÂMARA ÚNICA – TURMA CÍVEL
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA Nº 010.09.013287-8
SUSCITANTE: JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA
SUSCITADO: JUÍZO DE DIREITO DA 4ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA
RELATOR: EXMO. SR. DES. ROBÉRIO NUNES
VOTO
Embora os vocábulos agrário e fundiário, etmologicamente, se refiram ao campo e aos fenômenos que ali têm sede, na acepção jurídica do direito agrário e das questões agrárias ou fundiárias têm significação diversa.
Partindo da interpretação teleológica da norma constitucional que criou o Juízo ou a Vara com competência para os feitos agrários, a intenção do legislador, como se vê dos anais do Congresso Nacional, visou à solução das ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e as demais causas em que se evidencie o interesse público pela natureza da lide ou pela qualidade das partes, objetivando a promoção da paz no campo em questões que dependem de negociação e compreendem questões sociais.
Da proposta de Emenda à Constituição, lê-se claramente a finalidade da criação da justiça agrária, quando se propôs acrescentar-se ao art. 109 da Constituição o inciso XII, com a seguinte redação:
“as causas fundiárias definidas em lei que envolvam interesses ou direitos coletivos e/ou interesses ou direitos individuais homogêneos, estes entendidos como de origem comum de que sejam titulares proprietários ou possuidores rurais, grupos, categorias ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária, desde que envolvam disputas possessórias ou de domínio voltadas para a política de reforma agrária.”
Regulamentando a ação judicial do juiz agrário no Estado de Santa Catarina, o Tribunal de Justiça daquele estado baixou a Resolução n. 12/2000/CM, cujo art. 1º define precisamente as ações sujeitas à sua decisão:
“Art. 1º - O Togado designado para assuntos agrários terá competência para processar e julgar as ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural, mencionadas no art. 82, inciso III, do Código de Processo Civil, com a redação que lhe foi dada pela Lei 9.415, de 23.12.96;”
O Estado do Pará, a sua vez, disciplinando a matéria, estabeleceu no art. 1º da Resolução nº 018/2005-GP:
“Art. 1º. As questões agrárias sujeitas à competência das Varas Agrárias são as ações que envolvam litígios coletivos pela posse e propriedade da terra em área rural.
Parágrafo único. Em outras ações em área rural, inclusive nas individuais, poderá ser estabelecida a competência das Varas Agrárias, desde que haja interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte, a ser definida por ato do Presidente do Tribunal, em cada caso concreto e em qualquer fase do processo, de ofício, por requerimento das partes, do Juiz, do Ministério Público ou de órgão fundiário da União ou do Estado dirigido diretamente à Presidência do Tribunal, processando sem efeito suspensivo.”
O Estado do Mato Grosso também, na Resolução nº 07/2008/OE, disciplinou a competência do juiz da Vara Especializada em direito Agrário, no seu art. 2º, nos seguintes termos:
“Art. 2º. O Juiz de Direito da Vara Especializada em Direito Agrário, com sede na Comarca de Cuiabá – MT, tem jurisdição em todo o Estado de Mato Grosso e competência para processar e julgar as ações que envolvam litígios coletivos pela posse de terras rurais, mencionadas no artigo 82, inciso III, do Código de Processo Civil, e as que lhe são conexas.”
Já o Estado de Minas Gerais, por meio da Resolução nº398/2002, regulamentou o funcionamento da Vara de Conflitos Agrários, definindo a sua competência no art. 1º, verbis:
“O Juiz de Direito da Vara de Conflitos Agrários tem competência para processar e julgar as ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural, mencionadas no art. 82, inciso III, do Código de Processo Civil, com a redação que lhe foi dada pela Lei 9.415, de 23.12.96.”
Como se vê, é pacífico o entendimento dos tribunais brasileiros no sentido de dar corporificação ao preceito constitucional, criando juízes ou varas agrárias destinadas especificamente à solução dos conflitos coletivos pela posse da terra rural ao pressuposto do interesse social e não aos litígios individuais que se resolvem pelas disposições do Código Civil Brasileiro no juízo cível comum.
Neste sentido, transcrevo o judicioso parecer do ilustrado representante do Ministério Público, Dr. Edson Damas:
“De acordo com a inicial de fls. 05/08, os requerentes alegam que adquiriram em 27/05/2003, um imóvel residencial localizado na Rua Valério Magalhães, nº. 1008, bairro de São Francisco, com terreno medindo 14,92m de frente por 30,00 e 23,85 de fundos, perfazendo área total de 483,66m², sendo que desde 1983 permanece o imóvel registrado no Cartório de Registro em nome da Sra. Maria Medeiros de Matos, já falecida.
Trata-se, portanto, de processo que envolve conflitos de interesses individuais, onde as partes disputam a aquisição da propriedade do imóvel descrito acima.
O MM. Juiz da 6ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista, ao declarar-se incompetente para processar e julgar feitos dessa natureza, encaminhou os autos ao MM. Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca da Capital, com base no que preceitua a alínea “d”, inciso I, do art. 36, do COJER, verbis:
“Art. 36 – Ao Juiz da 3ª Vara Cível compete:
I – Processar e Julgar:
d) as causas inerentes às questões agrárias e fundiárias em todo o Estado”. (grifei).
Em contrapartida, o MM. Juiz da 3ª Vara da comarca da Capital, ora suscitante, arguiu a sua incompetência para processar e julgar feitos que digam respeito a conflito de terras urbanas, com fundamento no que dispõe o art. 126, CF, e EC 45/2004, que assim dispõem, respectivamente : “para dirimir conflitos fundiários, o Tribunal de Justiça designará juízes de entrância especial, com competência exclusiva para questões agrárias; para dirimir conflitos fundiários, o Tribunal de Justiça proporá a criação de varas especializadas, com competência exclusiva para questões agrárias”.
Assim, depreende-se que a controvérsia surgida nos presentes autos é quanto a correta interpretação do disposto no art. 36, I, “d”, do COJER (Lei Complementar nº 002/93), que atribuiu ao Juiz de Direito da 3ª Vara Cível, competência para processar e julgar as causas inerentes às questões agrárias e fundiárias, com jurisdição em todo o Estado. No caso, trata-se de competência absoluta em razão da matéria.
Quanto à competência para julgamento de questões agrárias em todo o Estado, ressaltou o MM. Juiz suscitante não existirem dúvidas, pois o COJER é bem claro ao atribuir competência a esse Juízo para tal mister.
A discussão, portanto, gira em torno de saber qual o Juízo competente para processar e julgar os conflitos fundiários. Melhor dizendo, os conflitos fundiários urbanos.
Os termos “agrários e fundiários”, na verdade, possuem o mesmo significado na medida em que ambos referem-se à terras. Foram empregados de forma genérica (questões vinculadas à terra), no art. 36, I, alínea “d” do COJERR. Mas existe na realidade uma diferença entre os dois termos. Vejamos.
Os conflitos devem ser observados quanto aos interesses que os envolvam, se são individuais ou coletivos. As questões fundiárias urbanas (interesses individuais) foram vinculadas às varas cíveis genéricas, em razão da competência residual; enquanto à vara especializada cabe o processamento e julgamento dos conflitos ligados à reforma agrária (interesses coletivos).
As expressões “agrários e fundiários” contidas no texto da LC 002/93 (COJERR) foram empregadas de forma genérica, cabendo ao magistrado interpretá-las de acordo com a norma constitucional que a originou, no caso, o art. 126, da Constituição Federal.
Corroborando este entendimento, o Professor de Direito Agrário Marcus Alan de Melo Gomes, proferiu palestra no XI Seminário de Direito Agrário e II Encontro de Professores de Direito Agrário, que foram realizados em São Luís/MA, no dia 26.06.03, onde esclareceu que a vara agrária está ligada à reforma agrária e não a conflitos interindividuais. Confira-se:
“Entretanto, de acordo com o tratamento legal reservado à matéria, não basta que a proteção se pretende seja agrária, para que se defina a competência da Vara, Imperioso que a posse sobre o imóvel rural seja discutida em juízo sob o enfoque da Reforma Agrária, ou seja, que o direito do possuidor esteja sendo questionado com fins de promover melhor repartição da terra, de modo que a posse modificada venha a atender aos princípios da justiça social e ao aumento de produtividade. Não é suficiente, assim, haja a ameaça, a turbação ou o esbulho do direito alegado. Imprescindível que o requerido esteja a praticar tais atos com fins de execução da Reforma Agrária.
As Varas Agrárias não receberam tanta atenção do legislador para que seu juiz cumprisse o expediente forense a julgar conflitos interindividuais. O juiz agrário não existe para decidir em que posição vai ficar a cerca que divide a área do Sr. João do Loto do Sr. José, quando um deles a tiver erguido um pouco além dos limites da demarcação. A função deste Magistrado vai muito alem. Cabe a ele contribuir, no âmbito jurisdicional, com a modificação de mentalidade e com a efetiva realização de uma Reforma Agrária justa do ponto de vista social, sem olvidar, por óbvio, que nenhuma Reforma Agrária será legítima se efetuada ao arrepio do Direito”. (grifou-se)
Sem adentrarmos ao mérito da questão, tão-somente abordando a questão relativa à competência do Juízo, entendemos que a competência para processar e julgar o feito é da 6ª Vara Cível (genérica), pois a ação de usucapião de imóvel urbano, não possui caráter coletivo e não envolve questão agrária ou fundiária propriamente dita (desapropriação para reforma agrária ou invasões coletivas de entidades como o MST).
Por outro o exposto, esta Procuradoria de Justiça opina pela atribuição da competência para o processamento e julgamento da Ação de Usucapião Nº. 0010.04.079331-6, ao Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista-RR, afastando-se no caso em comento a aplicação do art. 36, I, “d” do COJER, que fica adstrito à questões relativas à reforma agrária, nos moldes do que dispõe o art. 126, da CF/88”.
Diante do exposto, conheço do conflito e declaro competente para processar o presente feito o Juízo da 4 ª Vara Cível da Comarca de Boa Vista.
É o meu voto.
Boa Vista, 01 de dezembro de 2009.
Des. Robério Nunes
Relator
CÂMARA ÚNICA – TURMA CÍVEL
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA Nº 010 09 013173-0
SUSCITANTE: JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA
SUSCITADO: JUÍZO DE DIREITO DA 4ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BOA VISTA
RELATOR: EXMO. SR. DES. ROBÉRIO NUNES
A C Ó R D Ã O
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA – DIREITO AGRÁRIO – POSSE CIVIL – CONFLITO INDIVIDUAL – AUSÊNCIA DE INTERESSE SOCIAL COLETIVO – INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO AGRÁRIO.
A competência do juízo agrário está circunscrita às questões fundiárias que envolvam interesses sociais coletivos pela posse da terra rural.
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, acordam os Desembargadores integrantes da Câmara Única, por sua Turma Cível, à unanimidade de votos, em conhecer do conflito e declarar competente o Juízo da 4ª Vara Cível, nos termos do voto do Relator.
Boa Vista, Sala de Sessões do Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, ao primeiro dia do mês de dezembro do ano de dois mil e nove.
DES. MAURO CAMPELLO
Presidente e Julgador
DES. ROBÉRIO NUNES
Relator
DES. LUPERCINO NOGUEIRA
Julgador
Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XIII - EDIÇÃO 4273, Boa Vista, 11 de março de 2010, p. 039.
( : 01/12/2009 ,
: XIII ,
: 39 ,
Data do Julgamento
:
01/12/2009
Data da Publicação
:
11/03/2010
Classe/Assunto
:
Conflito de Competência )
Relator(a)
:
DES. ROBERIO NUNES DOS ANJOS
Tipo
:
Acórdão
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