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Jurisprudência


TJSC 2010.016230-1 (Acórdão)

Ementa
RESCISÓRIA. PRETENDIDA DESCONSTITUIÇÃO DE SENTENÇA PROFERIDA EM AÇÃO POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, COM FUNDAMENTO NO ART. 485, V, DO CPC. PROCEDÊNCIA PARCIAL. Hipótese em que os autores, sucessores de réu em ação de improbidade administrativa que veio a óbito antes mesmo de ser notificado para apresentar a sua defesa prévia, pretendem a rescisão da sentença de procedência. A uma, porque seria de rigor a citação de todos os herdeiros do de cujus, o que não ocorreu, uma vez que o ato foi perfectibilizado em seu espólio, de modo que insultados os arts. 8º da LIA e 47 do CPC. A duas, porque o Magistrado afirmou textualmente que o réu não teria agido com dolo e má-fé, condição sine qua non para a tipificação do ato como ofensivo aos princípios da Administração Pública - art. 11 da Lei n. 8.429/1992, dispositivo na qual foi enquadrada a conduta do agente político. E, a três, porque incabível a sua sujeição ao pagamento da multa civil, à luz do art. 5º, XLV, da Constituição Federal de 1988. Duas primeiras alegações que se impõe rejeitadas, uma vez que a apregoada violação não ficou caracterizada a contento quanto aos preceitos legais ditos violados. Deveras, "O art. 12 do CPC atribui ao espólio capacidade processual, tanto ativa, como passiva, de modo que é em face dele que devem ser propostas as ações que originariamente se dirigiriam contra o de cujus. O princípio da saisine, segundo o qual a herança se transfere imediatamente aos herdeiros com o falecimento do titular do patrimônio, destina-se a evitar que a herança permaneça em estado de jacência até sua distribuição aos herdeiros, não influindo na capacidade processual do espólio. Antes da partilha, todo o patrimônio permanece em situação de indivisibilidade, a que a lei atribui natureza de bem imóvel (art. 79, II, do CC/16). Esse condomínio, consubstanciado no espólio, é representado pelo inventariante" (REsp n. 108614/SP, rela. Mina. Nancy Andrighi, p. 21-9-2009). Logo, sendo certo que, à época da notificação, a partilha ainda não havia sido concretizada, e, aliás, até o presente momento não o foi (conforme informação obtida no sítio do Poder Judiciário), de todo cabível a substituição da parte que veio a falecer pelo seu espólio. De outro vértice, quando do julgamento da actio, 5-3-2008, entendia-se, à larga, que era dispensável a comprovação do dolo ou da má-fé para apenar o agente incurso no art. 11 da LIA. Com efeito, conforme precedente de maio de 2008, "Em princípio, a lesão a princípios administrativos contida no art. 11 da Lei nº 8.429/92 não exige dolo ou culpa na conduta do agente, nem prova da lesão ao erário público. Basta a simples ilicitude ou imoralidade administrativa para restar configurado o ato de improbidade" (STJ, REsp n. 988374/MG, rel. Min. Castro Meira, p. 16-5-2008). Em igual norte: REsp n. 817.557/ES, rel. Min. Herman Benjamin, p. 10-2-2010). Deveras, com relação à Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, apenas a contar do julgamento do Recurso Especial n. 765.212/AC, publicado em 19-5-2010, é que houve a alteração de seu posicionamento, veja-se: "quanto ao elemento subjetivo, por ocasião do julgamento do Recurso Especial 765.212/AC, DJe de 19.05.10, relator o eminente Ministro Herman Benjamin, a orientação desta Turma foi alterada no sentido de ser preciso estar presente na conduta do agente público ao menos o dolo lato sensu ou genérico, sob pena de caracterizar-se verdadeira responsabilidade objetiva dos administradores" (REsp 1140315/SP, rel. Min. Castro Meira, p. 19-8-2010, grifo nosso). Existência de precedentes deste Tribunal que, por igual, dispensavam a comprovação do dolo para a tipificação do ato como ímprobo, por ofensivo aos princípios da administração pública (Apelação Cível n. 2008.047623-4, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 16-9-2008; Apelação Cível n. 2008.010633-7, rel. Des. Newton Trisotto, j. 29-8-2008; Apelação Cível n. 2007.058858-1, rel. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, j. 27-5-2008; dentre outros). Decerto que julgados em sentido oposto também foram proferidos, do signatário, inclusive (Reexame Necessário n. 2007.045603-3, de Pinhalzinho, j. 2-4-2008); porém, é inequívoco que pairava controvérsia sobre a quaestio juris. Enfim, ainda que, hodiernamente, pacificada a orientação de que a Lei n. 8.429/1992 "reprova o agente desonesto, que age com má-fé, e o que deixa de agir de forma diligente no desempenho da função para a qual foi investido" (REsp n. 1233629/SP, rel. Herman Benjamin), a celeuma outrora existente obsta o êxito da rescisória, no ponto. Ora, "O que se afigura decisivo para o deslinde da demanda é o fato de que somente uma interpretação de tal modo aberrante das normas aplicáveis à espécie equivaleria à sua violação literal de modo a conduzir, em tese, à desconstituição do julgado, com base no art. 485, V, do CPC [...]. Na interpretação do artigo 485, V, do Código de Processo Civil, a jurisprudência do STJ e do STF é no sentido de que não é toda e qualquer violação à lei que pode comprometer a coisa julgada e dar ensejo à ação rescisória, mas somente aquela "especialmente qualificada" (Embargos de Divergência no Recurso Especial nº 608122/RJ (2004/0114316-4), 1ª Seção do STJ, Rel. Teori Albino Zavascki. j. 09.05.2007, maioria, DJ 28.05.2007). Tanto que foi editada a Súmula 343/STF, segundo a qual: 'Não cabe ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais' (Ação Rescisória n. 1.0000.09.508034-7/000, rel. Des. Armando Freire, j. 10-2-2015). E, mutatis mutandis, "Violar literal disposição de lei equivale a conferir-lhe interpretação equivocada de maneira aberrante, evidente, que salta aos olhos, afronta literal que não ocorrerá, portanto, se, à época, a interpretação for razoável ou se havia polêmica ou divergência jurisprudencial. 2. Na hipótese dos autos, à época da prolação da sentença, em 5.8.2010, consignou o juízo sentenciante que 'a matéria tratada nos presentes autos tem sido discutida no Superior Tribunal de Justiça, cujo entendimento é no sentido de se reconhecer a ilegalidade da cobrança do PIS e da COFINS nas contas referentes aos serviços prestados pelas concessionárias de telefonia, o que por analogia estende-se às concessionárias de energia elétrica'. 3. Há precedentes do STJ amparando esse entendimento: REsp 910.784/RJ, Rel. Min. ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/06/2009, DJe 23/06/2009; EDcl nos EDcl no REsp 625.767/RJ, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/11/2008, DJe 15/12/2008; REsp 1.053.778/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/09/2008, DJe 30/09/2008. 4. Entendimento diverso passou a vigorar após a prolação da sentença, no julgamento do REsp 976.836/RS, Rel. Min. Luiz Fux (julgado em 25.8.2010 e publicado no DJe em 5.10.2010) e do Resp 1.185.070/RS, Rel. Min. Teori Albino Zavascki (julgado em 22/09/2010 e publicado no DJe em 27/09/2010), quando a Primeira Seção acabou por reconhecer a legitimidade do repasse do PIS e da COFINS nas contas de telefone e energia elétrica, respectivamente. 5. O que pretende a recorrente é a revisão da sentença acobertada pelo manto da coisa julgada para que seja promovida nova interpretação do mérito à luz da modificação superveniente do entendimento jurisprudencial, agora favorável à sua pretensão, hipótese que não autoriza o ajuizamento da ação rescisória (Súmulas 343/STF e 134/TRF)" (REsp n. 135716/RO, rel. Min. Humberto Martins, p. 25-3-2015, grifo nosso). Acolhimento, em contrapartida, da assertiva de não cabimento da multa, à luz do art. 5º, XLV, da CF/1988 - "nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido", mormente porque, na espécie, a conduta do ex-agente não foi enquadrada nos arts. 9º e 10 da LIA, embora, porquanto constatada a existência de prejuízo ao erário, o correto seria que se aplicasse à espécie o segundo tipo (art. 10), o qual dispensa o dolo. Porém, já havia o entendimento deste Tribunal no sentido de que a multa civil nunca é transmissível aos herdeiros. É que a sanção em tela não é pena e tampouco ilustra obrigação de ressarcimento de dano ao patrimônio público. "Consoante o art. 8º da Lei de Improbidade Administrativa, a multa civil é transmissível aos herdeiros, 'até o limite do valor da herança", somente quando houver violação aos arts. 9° e 10° da referida lei (dano ao patrimônio público ou enriquecimento ilícito), sendo inadmissível quando a condenação se restringir ao art. 11' (REsp n. 951.389, Rel. Min. Herman Benjamin)" (Apelação Cível n. 2008.061488-9, de São Joaquim, rel. Des. Newton Janke). Daí a procedência parcial da ação rescisória para se excluir a multa do montante condenatório e ora já em execução. (TJSC, Ação Rescisória n. 2010.016230-1, de Videira, rel. Des. Vanderlei Romer, Terceira Câmara de Direito Público, j. 05-05-2015).

Data do Julgamento : 05/05/2015
Classe/Assunto : Terceira Câmara de Direito Público
Órgão Julgador : Luiz Henrique Bonatelli
Relator(a) : Vanderlei Romer
Comarca : Videira
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