TJSC 2010.016780-6 (Acórdão)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS. CIRURGIA PLÁSTICA APÓS TRATAMENTO ORTODÔNTICO PRÉVIO. PRELIMINARES. ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO SEM A OITIVA DAS TESTEMUNHAS ARROLADAS NA CONTESTAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA INEXISTENTE. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA CLÍNICA RÉ. CIRURGIAS REALIZADAS EM HOSPITAL MUNICIPAL. PREFACIAL ACOLHIDA. MÉDICO CIRURGIÃO PLÁSTICO. INTERVENÇÕES CIRÚRGICAS COM INTUITO TAMBÉM ESTÉTICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. EXEGESE DO ARTIGO 14 DO CÓDIGO CONSUMERISTA. CORREÇÃO DE PROGNATISMO MANDIBULAR E RETROGNATISMO MAXILAR SUPERIOR DECORRENTES DA DOENÇA "ACROMEGALIA". INSUCESSO DAS CIRURGIAS E AGRAVAMENTO DOS PROBLEMAS FÍSICOS DA PACIENTE. DEVER DE CAUTELA DO PROFISSIONAL DA SAÚDE EM VERIFICAR SE A SÍNDROME ESTAVA CONTROLADA. OBRIGAÇÃO DE INFORMAR QUANTO À POSSIBILIDADE DE FRACASSO DO TRATAMENTO. NÃO COMPROVAÇÃO DAS CAUSAS EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL. DEVER DE REPARAR OS DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS CARACTERIZADOS. CONDENAÇÃO A TÍTULO DE PERDAS E DANOS AFASTADA. PREQUESTIONAMENTO. PRESCINDIBILIDADE DE MANIFESTAÇÃO EXPRESSA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. I - Não há cerceamento de defesa quando o magistrado a quo deixa de ouvir as testemunhas arroladas por uma das partes e dá por encerrada a instrução quando a prova documental acostada ao processo e a prova pericial produzida são bastantes para a prolatação do decisum. II - Merece ser acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam da pessoa jurídica da qual o médico Réu é sócio majoritário, e, declarado extinto o processo, sem resolução do mérito, em relação a ela, tendo em vista que todas as cirurgias a que se submeteu a Autora e que não tiveram o resultado esperado foram realizadas em Hospital Municipal. III - Em regra, os contratos de prestação de serviços médicos originam obrigações de meio e não de resultado, sendo uma das exceções a esta regra os casos de cirurgia plástica, na exata medida em que ela tem por escopo, entre outros, o embelezamento estético do paciente, razão pela qual é considerada obrigação de resultado. Nessa linha, deixando a intervenção cirúrgica dessa natureza de atingir o escopo desejado e previamente definido pelo profissional da saúde com o seu paciente, responde o réu (prestador de serviço), objetivamente, pelos danos causados à vítima (consumidor), salvo demonstrada de maneira cabal alguma causa de exclusão de culpa (inexistência de falha ou defeito na prestação dos serviços contratados pelo paciente, ocorrência de culpa exclusiva do consumidor, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior), hipóteses não verificadas no caso em exame. IV - O Réu, mesmo sabedor que a patologia de que a autora é portadora poderia levar ao fracasso da intervenção cirúrgica, assumiu o risco de sua realização, devendo arcar com os danos causados. Além disso, tinha o dever de cautela de se certificar previamente de que a doença estava controlada para submetê-la à cirurgia, ou, caso assim tenha procedido, comprovar tal situação nos autos, o que não ocorreu. V - O médico tem obrigação de informar ao paciente sobre os riscos envolvidos na operação e a possibilidade do agravamento da sua condição física por conta da patologia existente, tomando por escrito a sua ciência e autorização para a intervenção cirúrgica, naquelas condições previamente bem definidas. No caso, é forçoso concluir que a Autora não estava devidamente alertada do provável insucesso de suas cirurgias, pois, se assim estivesse, certamente não se sujeitaria ao tratamento doloroso e dispendioso a que se submeteu. VI - Havendo provas suficientes acerca dos danos suportados pela Autora, e, diante da ausência de exclusão do nexo de causalidade formado entre o dano e o serviço prestado ou de excludente de culpabilidade, fica configurada a responsabilidade civil do Réu e, consequentemente, o dever de reparar os danos materiais, estéticos e morais experimentados. VII - Manifesta a ocorrência de danos morais pela dor física, sofrimento e angústia experimentadas pela vítima, somando-se ainda a necessidade de submeter-se a outra (ou outras) intervenção cirúrgica, com todas as dores e aflições naturalmente decorrentes. VIII - Para a configuração do dano estético, é necessária a comprovação de que a lesão efetivamente tenha alterado a aparência física da vítima, capaz de causar-lhe insatisfação ou constrangimento. Destarte, ficou demonstrado na prova pericial a ocorrência de prejuízo físico hábil e suficiente a amparar o pedido de reparação por danos estéticos. IX - Merece acolhida o apelo no que diz respeito à condenação por perdas e danos, sob pena de se configurar bis in idem, uma vez que as complicações físicas decorrentes das malsinadas cirurgias serão indenizadas pelo quantum fixado a título de danos estéticos e o prejuízo suportado pelo insucesso do tratamento será reparado com a devolução da quantia paga pela autora ao réu. X - O julgador não está obrigado a manifestar-se sobre todos os pontos levantados pelas partes, desde que, de modo devidamente fundamentado, demonstre as razões de seu convencimento. XI - Sucumbindo a Autora em relação aos pedidos formulados contra um dos Réus, que foi excluído da lide por ilegitimidade passiva ad causam, e do pedido de custeio de novo tratamento, é necessário redistribuir-se os ônus sucumbenciais. (TJSC, Apelação Cível n. 2010.016780-6, de Barra Velha, rel. Des. Joel Figueira Júnior, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 15-08-2013).
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS. CIRURGIA PLÁSTICA APÓS TRATAMENTO ORTODÔNTICO PRÉVIO. PRELIMINARES. ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO SEM A OITIVA DAS TESTEMUNHAS ARROLADAS NA CONTESTAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA INEXISTENTE. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA CLÍNICA RÉ. CIRURGIAS REALIZADAS EM HOSPITAL MUNICIPAL. PREFACIAL ACOLHIDA. MÉDICO CIRURGIÃO PLÁSTICO. INTERVENÇÕES CIRÚRGICAS COM INTUITO TAMBÉM ESTÉTICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. EXEGESE DO ARTIGO 14 DO CÓDIGO CONSUMERISTA. CORREÇÃO DE PROGNATISMO MANDIBULAR E RETROGNATISMO MAXILAR SUPERIOR DECORRENTES DA DOENÇA "ACROMEGALIA". INSUCESSO DAS CIRURGIAS E AGRAVAMENTO DOS PROBLEMAS FÍSICOS DA PACIENTE. DEVER DE CAUTELA DO PROFISSIONAL DA SAÚDE EM VERIFICAR SE A SÍNDROME ESTAVA CONTROLADA. OBRIGAÇÃO DE INFORMAR QUANTO À POSSIBILIDADE DE FRACASSO DO TRATAMENTO. NÃO COMPROVAÇÃO DAS CAUSAS EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL. DEVER DE REPARAR OS DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS CARACTERIZADOS. CONDENAÇÃO A TÍTULO DE PERDAS E DANOS AFASTADA. PREQUESTIONAMENTO. PRESCINDIBILIDADE DE MANIFESTAÇÃO EXPRESSA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. I - Não há cerceamento de defesa quando o magistrado a quo deixa de ouvir as testemunhas arroladas por uma das partes e dá por encerrada a instrução quando a prova documental acostada ao processo e a prova pericial produzida são bastantes para a prolatação do decisum. II - Merece ser acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam da pessoa jurídica da qual o médico Réu é sócio majoritário, e, declarado extinto o processo, sem resolução do mérito, em relação a ela, tendo em vista que todas as cirurgias a que se submeteu a Autora e que não tiveram o resultado esperado foram realizadas em Hospital Municipal. III - Em regra, os contratos de prestação de serviços médicos originam obrigações de meio e não de resultado, sendo uma das exceções a esta regra os casos de cirurgia plástica, na exata medida em que ela tem por escopo, entre outros, o embelezamento estético do paciente, razão pela qual é considerada obrigação de resultado. Nessa linha, deixando a intervenção cirúrgica dessa natureza de atingir o escopo desejado e previamente definido pelo profissional da saúde com o seu paciente, responde o réu (prestador de serviço), objetivamente, pelos danos causados à vítima (consumidor), salvo demonstrada de maneira cabal alguma causa de exclusão de culpa (inexistência de falha ou defeito na prestação dos serviços contratados pelo paciente, ocorrência de culpa exclusiva do consumidor, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior), hipóteses não verificadas no caso em exame. IV - O Réu, mesmo sabedor que a patologia de que a autora é portadora poderia levar ao fracasso da intervenção cirúrgica, assumiu o risco de sua realização, devendo arcar com os danos causados. Além disso, tinha o dever de cautela de se certificar previamente de que a doença estava controlada para submetê-la à cirurgia, ou, caso assim tenha procedido, comprovar tal situação nos autos, o que não ocorreu. V - O médico tem obrigação de informar ao paciente sobre os riscos envolvidos na operação e a possibilidade do agravamento da sua condição física por conta da patologia existente, tomando por escrito a sua ciência e autorização para a intervenção cirúrgica, naquelas condições previamente bem definidas. No caso, é forçoso concluir que a Autora não estava devidamente alertada do provável insucesso de suas cirurgias, pois, se assim estivesse, certamente não se sujeitaria ao tratamento doloroso e dispendioso a que se submeteu. VI - Havendo provas suficientes acerca dos danos suportados pela Autora, e, diante da ausência de exclusão do nexo de causalidade formado entre o dano e o serviço prestado ou de excludente de culpabilidade, fica configurada a responsabilidade civil do Réu e, consequentemente, o dever de reparar os danos materiais, estéticos e morais experimentados. VII - Manifesta a ocorrência de danos morais pela dor física, sofrimento e angústia experimentadas pela vítima, somando-se ainda a necessidade de submeter-se a outra (ou outras) intervenção cirúrgica, com todas as dores e aflições naturalmente decorrentes. VIII - Para a configuração do dano estético, é necessária a comprovação de que a lesão efetivamente tenha alterado a aparência física da vítima, capaz de causar-lhe insatisfação ou constrangimento. Destarte, ficou demonstrado na prova pericial a ocorrência de prejuízo físico hábil e suficiente a amparar o pedido de reparação por danos estéticos. IX - Merece acolhida o apelo no que diz respeito à condenação por perdas e danos, sob pena de se configurar bis in idem, uma vez que as complicações físicas decorrentes das malsinadas cirurgias serão indenizadas pelo quantum fixado a título de danos estéticos e o prejuízo suportado pelo insucesso do tratamento será reparado com a devolução da quantia paga pela autora ao réu. X - O julgador não está obrigado a manifestar-se sobre todos os pontos levantados pelas partes, desde que, de modo devidamente fundamentado, demonstre as razões de seu convencimento. XI - Sucumbindo a Autora em relação aos pedidos formulados contra um dos Réus, que foi excluído da lide por ilegitimidade passiva ad causam, e do pedido de custeio de novo tratamento, é necessário redistribuir-se os ônus sucumbenciais. (TJSC, Apelação Cível n. 2010.016780-6, de Barra Velha, rel. Des. Joel Figueira Júnior, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 15-08-2013).
Data do Julgamento
:
15/08/2013
Classe/Assunto
:
Sexta Câmara de Direito Civil
Órgão Julgador
:
Edson Luiz de Oliveira
Relator(a)
:
Joel Figueira Júnior
Comarca
:
Barra Velha
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