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Jurisprudência


TJSC 2010.025853-0 (Acórdão)

Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. AGRAVO RETIDO. ROL DE TESTEMUNHA APRESENTADO APÓS O PRAZO ESTIPULADO PELO MAGISTRADO. ANTECEDÊNCIA DE 116 DIAS DA AUDIÊNCIA. CUMPRIMENTO NO INTERREGNO DO ARTIGO 407 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. PREJUÍZO EVIDENCIADO. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. POR OUTRO LADO, PROVAS COLACIONADAS AOS AUTOS SUFICIENTES PARA A MODIFICAÇÃO DO JULGADO EM FAVOR DAS AUTORAS. DESNECESSIDADE DE ANULAÇÃO DA SENTENÇA. CONTRATO DE MONITORAMENTO ELETRÔNICO (SEGURANÇA PRIVADA). RELAÇÃO DE CONSUMO. APLICAÇÃO NAS NORMAS DO CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. CLÁUSULA EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE NULA DE PLENO DIREITO. EXEGESE DO ARTIGO 51, I, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ASSALTO A APARTAMENTO PERTENCENTE ÀS AUTORAS. CONDOMÍNIO COM SISTEMA DE VIGILÂNCIA ELETRÔNICA VULNERÁVEL. VENDA DE PONTOS SENSORIAIS QUE NÃO ATENDEM AS NECESSIDADES DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE CLÁUSULA CONTRATUAL ADVERTINDO O ADQUIRENTE SOBRE A QUESTÃO POSTA. DEFESA QUE SE FUNDA NA EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE POR NÃO ENCONTRAR-SE O ALARME DO CONDOMÍNIO ATIVADO NA MADRUGADA DO ROUBO. ALEGAÇÃO DAS AUTORAS NÃO DERRUIDA PELA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA EM FAVOR DO CONSUMIDOR NO SENTIDO DE QUE OS FIOS DE CONEXÃO COM A EMPRESA CONTRATADA HAVIAM SIDO CORTADOS PELOS LADRÕES. AUSÊNCIA DE PROVA PERICIAL QUE MILITA EM FAVOR DAS AUTORAS. DEFESA QUE TAMBÉM SE FUNDA EM PROVA UNILATERAL QUE INDICA ENCONTRAR-SE O SISTEMA DE ALARME DESARMADO POR VÁRIOS DIAS, CONTINUAMENTE. OBRIGAÇÃO DE ALERTAR O SÍNDICO E VERIFICAR SITUAÇÃO MANIFESTAMENTE ATÍPICA. OMISSÃO CULPOSA. EVIDENCIADA A MÁ PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. NEXO DE CAUSALIDADE COMPROVADO, CULPA E DANOS. DEVER DE INDENIZAR E COMPENSAR AS VÍTIMAS. DANOS MATERIAIS. APURAÇÃO DO QUANTUM EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA, POR ARTIGOS. DANOS MORAIS EVIDENTES. VÍTIMAS QUE SÃO AGREDIDAS E AMARRADAS POR ASSALTANTES, ALÉM DE SOFREREM AMEAÇAS DE MORTE E CRIMES SEXUAIS. VIS CORPORALIS E VIS COMPULSIVA ENSEJADORAS DE ILÍCITO CIVIL SUSCETÍVEL DE SER COMPENSADO PECUNIÁRIAMENTE. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. SENTENÇA REFORMADA. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. RECURSO PROVIDO. I - Configura cerceamento de defesa o indeferimento da prova oral por intempestividade na apresentação do rol, quando a petição, informando os nomes e os endereços das testemunhas arroladas, é protocolada ainda em prazo muito superior aquele estipulado no artigo 407 do Código de Processo Civil, cumprindo a intenção do legislador matizada em possibilitar a regular intimação das pessoas chamadas à juízo para prestarem seus depoimentos, bem como a impugnação de qualquer uma delas, culminando a ilegalidade com o julgamento improcedente dos pedidos formulados pelas autoras por ausência de provas. Contudo, deixa-se de anular a sentença por entender-se que o elenco probatório constante do caderno processual somado a força da inversão do ônus da prova em razão da configuração de relação de consumo entre as partes litigantes, é suficiente para reformar a sentença objurgada e acolher integralmente os pedidos formulados na peça inaugural. II - O fato de constar em contrato de prestação de serviço de monitoramento (alarme 24 horas) cláusula excludente de responsabilidade civil por danos eventualmente causados ao condomínio ou condôminos, não exime a empresa do dever de indenizar, pois, o artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor, em seu inciso I, considera nula de pleno direito a cláusula contratual que impossibilite, exonere ou atenue a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos ou serviços. Ademais, a teor do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à má prestação de seus serviços. III - No caso em exame, é patente a má prestação de serviços prestados pela Ré, por diversas razões: a) a começar pela aceitação da venda de pontos externos de alarme com sensores perimetrais sabidamente insuficientes pela prestadora de serviços para a cobertura da área de acesso ao condomínio (ausência de sensores na parte frontal); b) ausência de cláusula de advertência ao consumidor (síndico) para o fato atinente a vulnerabilidade do condomínio, informação que seria hábil a configurar a sua cabal ciência e consequências (prováveis) negativas de sua escolha; c) omissão culposa no atendimento imediato ao consumidor em face do corte da rede sensorial do sistema de alarme pelos assaltantes; d) omissão culposa, mesmo se acolhida a tese do não acionamento do sistema de alarme pelo síndico na madrugada do assalto, tendo-se como certo que a própria ré faz prova no sentido de que tinha ciência de encontrar-se o sistema desarmado ininterruptamente por mais de uma semana, deixando de tomar qualquer providência para verificação do ocorrido e, até mesmo, com o escopo elementar de avisar seu cliente; e) inserir contratualmente cláusula enganosa no sentido de conferir "segurança especializada que prevê garantia de 99%" e, simultaneamente, inserindo previsão abusiva de exclusão de responsabilidade. Nesse cenário, quase surreal, dois assaltantes após cortar os fios do alarme externo que, por meio de sensores de presença e movimento, os fundos do condomínio, (salienta-se que a interrupção do sinal indica imediatamente para os monitores a ocorrência de violação), sobem por um toldo instalado no apartamento do primeiro andar e acessam o apartamento das autoras, tornando-as reféns por várias horas, oportunidade em que, fazendo uso de força física e moral e após amarrar as vítimas, subtraem de seu interior diversos bens e fogem sem deixar qualquer pista, sem que a Ré tivesse comparecido ao local ou comunicado as autoridades policiais para tomada de providências, situação configuradora de responsabilidade civil a ser suportada pela empresa ré, contratualmente responsável pela segurança privada dos condôminos. IV - Não ficando devidamente demonstrado o valor total dos prejuízos materiais sofridos pelas vítimas, necessário se faz a apuração do quantum indenizatório em liquidação de sentença, por artigos, na forma preconizada nos artigos 475-E, F e G, todos do Código de Processo Civil. Afigura-se verossímil a tese de que as autoras, em face da condição social e econômica que possuem, eram proprietárias de jóias que foram subtraídas pelos assaltantes. Todavia, não tendo ficado durante a instrução em processo de conhecimento ficado patente a extensão desses danos materiais, mister a sua apuração em liquidação por artigos. Ademais, se assim não for, o cerceamento de defesa que se reconheceu preliminarmente, porém afastado pelo acolhimento do recurso em favor das autoras, fica parcialmente prejudicado e, por conseguinte, violado o devido processo legal, diante da desconsideração da prova documental efetuada acerca da propriedade das jóias roubadas, na exata medida em que não lhes foi oportunizada a produção de prova oral. Por essas razões, a prova da extensão do dano material haveria de ser procedida em liquidação de sentença por artigos, jamais julgado improcedente esse pedido, por falta de provas, justamente por ter-se reconhecido, em preliminar, o cerceamento de defesa, pois a prova oral (não realizada) teria perfeitamente o condão de suprir a eventual omissão. V - Os danos morais decorrentes de lesões graves por ilícito civil estão matizados no sofrimento, dores físicas, risco de vida, angústias, dúvidas, incertezas, ameaças, abusos sexuais e demais situações aflitivas indescritíveis experimentadas pelas vítimas de assalto, notadamente por serem mulheres. Esse tipo de dano encontra-se "in re ipsa", portanto, independente de prova. In casu, as lesões sofridas pelas autoras causaram-lhes abalo moral e intenso sofrimento, fazendo-se mister a compensação pecuniária em sintonia com a extensão do dano, grau de culpa e capacidade econômica das partes, não devendo acarretar enriquecimento da vítima e empobrecimento do ofensor, servindo a providência como medida de caráter pedagógico, punitivo e profilático inibidor. VI - Tratando-se de ilícito civil gerador de dano moral, os juros moratórios fluirão a partir do evento danoso, consoante o exposto na Súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça. (TJSC, Apelação Cível n. 2010.025853-0, da Capital, rel. Des. Joel Figueira Júnior, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 12-09-2013).

Data do Julgamento : 12/09/2013
Classe/Assunto : Sexta Câmara de Direito Civil
Órgão Julgador : Rosane Portella Wolff
Relator(a) : Joel Figueira Júnior
Comarca : Capital
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