TJSC 2010.036023-7 (Acórdão)
JUÍZO PETITÓRIO INSTAURADO NO CURSO DO JUÍZO POSSESSÓRIO. VEDAÇÃO LEGAL PELAS NORMAS DE DIREITO MATERIAL (ART. 1.210, § 2º, DO CC) E PROCESSUAL (ART. 923 DO CPC). EXCEPTIO PROPRIETATIS EXPRESSAMENTE NÃO PERMITIDA. VERDADEIRA CONDIÇÃO SUSPENSIVA DO EXERCÍCIO DE AÇÃO FUNDADA APENAS NA PROPRIEDADE. PROIBIÇÃO QUE, EM CARÁTER EXCEPCIONAL, OBJETIVA RESGUARDAR A TUTELA DA POSSE, EXPRESSAMENTE ACOLHIDA EM NOSSO ORDENAMENTO JURÍDICO. Tanto quanto o ordenamento jurídico assegura ao proprietário não possuidor se valer da ação reivindicatória contra o possuidor não proprietário, àquele que detém posse injusta também se assegura os interditos proibitórios, inclusive contra o próprio proprietário que não possui a coisa, visto que o Legislador atual estabeleceu, para corrigir uma aparente incompatibilidade anterior (art. 505 do CC/1916), que "não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade ou de outro direito sobre a coisa" (art. 1.210, § 2º, do CC/2003). A exceção de domínio (exceptio proprietatis) não é admitida pelo ordenamento jurídico atual quando pendente ação possessória (as distinções ocorriam só no sistema passado, as quais passaram a ser resolvidas, após penosa batalha jurisprudencial, pela Súmula nº 487 do STF), pois, caso contrário, ficaria esvaziada a proteção da posse se apresentada defesa exclusivamente com base no domínio. A proibição, estampada tanto na lei material (art. 1.210, § 2º, do CC) como na lei processual (art. 923 do CPC), é clara: não cabe ação petitória se já foi anteriormente proposta uma ação de natureza possessória. Trata-se, como ensina a doutrina, de uma verdadeira condição suspensiva do exercício de ação fundada exclusivamente na propriedade. ENTENDIMENTO TENDENTE A EXTINÇÃO DA PETITÓRIA SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, NA FORMA PREVISTA NO ART. 267, INCISO IV, DO CPC, CONTUDO, RELATIVIZADO. CIRCUNSTÂNCIAS EXCEPCIONAIS QUE PERMITEM A APRECIAÇÃO DO FEITO. JULGADOR QUE, EM RAZÃO DAS PECULIARIDADES DOS AUTOS, MUITO ALÉM DE TRILHAR O CAMINHO DE NORMAS E PROCEDIMENTOS PARA SOLUCIONAR DE MODO ESCORREITO A LIDE, DEVE ASPIRAR A CÉLERE DISTRIBUIÇÃO DA JUSTIÇA. TRÂMITE DAS DEMANDAS SUPERIOR A 10 (DEZ) ANOS. NECESSIDADE DE SOLUÇÃO EFETIVA DO LITÍGIO APÓS BEM OBTEMPERADAS AS PARTICULARIDADES DO CASO. NECESSIDADE DE SOLUÇÃO EFETIVA APÓS O MOROSO DECURSO DAS DEMANDAS, CONSIDERADA A AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE POSSE PELA APELANTE. Embora o Legislador tenha traçado um modelo a ser observado para a prática dos atos processuais, todo e qualquer vício presente deve ser considerado com redobrada precaução e com a clara, direta e expressa intencionalidade, por parte deste Julgador, de aproveitamento máximo do ato, pois qualquer consequência jurídica que, se não for absolutamente necessária, importe na invalidade de alguma ação já adotada e, por conseguinte, acarrete à resolução da lide mais morosidade, não se revelará verdadeiramente justa. A busca da celeridade na prestação jurisdicional é imperativo constitucional, estabelecido no art. 5º, inciso LXXVIII, da CF, segundo o qual "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação" e o STJ também compreende que "em atenção à garantia constitucional da razoável duração do processo, bem como ao princípio da economia processual, não seria pertinente a anulação do feito, que já dura mais de dez anos, pois, certamente, causaria ainda maiores prejuízos às partes" (AgRg no EREsp nº 1.331.946-RJ, rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 11.06.2014). USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. PRETENSÃO LASTRADA NO CAPUT DO ART. 1.238 DO CÓDIGO CIVIL ATUAL. TERMO A QUO DO PRAZO PRESCRICIONAL AQUISITIVO INICIADO SOB A VIGÊNCIA DO CÓDIGO REVOGADO. MAIS DE METADE DO PRAZO QUE SE PASSOU SOB A ÉGIDE DE TAL DIPLOMA. APLICAÇÃO DA REGRA DE TRANSIÇÃO DO ART. 2.028 DO CÓDIGO CIVIL ATUAL. PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA EXIGIDA PARA O CASO NOS TERMOS DO ART. 550 DO CÓDIGO DE 1916. A pretensão de usucapir com base no art. 1238, caput, do Código Civil atual é aplicável só se o prazo da prescrição aquisitiva de quinze anos se deu totalmente sob sua égide, ou se não transcorrido mais da metade do prazo sob o domínio do Diploma revogado, nos termos da regra de transição do art. 2.028 do Código atual. Se mais da metade do prazo prescritivo se deu na vigência do Diploma Civil revogado, aplica-se a prescrição vintenária do artigo 550 do Código Civil de 1916. POSSE MANSA, PACÍFICA E SEM INTERRUPÇÃO POR MAIS DE VINTE ANOS. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. EXEGESE DO ART. 550 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. ATOS DE POSSE PRATICADOS PELA CONTESTANTE QUE ALEGA SER PROPRIETÁRIA DA ÁREA QUE INICIARAM APÓS CUMPRIDO O PRAZO VINTENÁRIO. SENTENÇA MANTIDA. Comprovada a posse mansa, pacífica e ininterrupta, por vinte anos, preenchidos estão os requisitos do art. 550 do Código Civil de 1916 a ensejar a declaração de domínio sobre a área usucapienda. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DEMANDA AJUIZADA PELA CONTESTANTE DA AÇÃO DE USUCAPIÃO. MESMA ÁREA EM LITÍGIO. REQUISITOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA POSSE SUPOSTAMENTE EXERCIDA PELA AUTORA. ESCRITURA DE CESSÃO QUE NÃO SERVE COMO COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DA POSSE. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À REINTEGRAÇÃO EM RAZÃO DA PROCEDÊNCIA DA AÇÃO DE USUCAPIÃO. Não comprovada a posse, o esbulho, a data do esbulho e a perda do bem, ônus atribuído ao apelante por força dos arts. 927 e 333, I, do Código de Processo Civil, não há como conceder a reintegração de posse pretendida. Ausente um dos requisitos previstos no art. 927 do CPC, não há se falar em reintegração de posse, sendo encargo do autor demonstrar que efetivamente exercia a posse anteriormente ao esbulho. A existência, por si só, de documento que atesta a posse do bem esbulhado não é suficiente para demonstrar o exercício do instituto, ainda mais quando as demais provas rumam em sentido contrário. Conjunto probatório que não comprova, com a segurança jurídica necessária, fato constitutivo do direito do autor (art. 333, inciso I, do CPC). SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO (TJSC, Apelação Cível n. 2010.036023-7, de São João Batista, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 25-06-2015).
Ementa
JUÍZO PETITÓRIO INSTAURADO NO CURSO DO JUÍZO POSSESSÓRIO. VEDAÇÃO LEGAL PELAS NORMAS DE DIREITO MATERIAL (ART. 1.210, § 2º, DO CC) E PROCESSUAL (ART. 923 DO CPC). EXCEPTIO PROPRIETATIS EXPRESSAMENTE NÃO PERMITIDA. VERDADEIRA CONDIÇÃO SUSPENSIVA DO EXERCÍCIO DE AÇÃO FUNDADA APENAS NA PROPRIEDADE. PROIBIÇÃO QUE, EM CARÁTER EXCEPCIONAL, OBJETIVA RESGUARDAR A TUTELA DA POSSE, EXPRESSAMENTE ACOLHIDA EM NOSSO ORDENAMENTO JURÍDICO. Tanto quanto o ordenamento jurídico assegura ao proprietário não possuidor se valer da ação reivindicatória contra o possuidor não proprietário, àquele que detém posse injusta também se assegura os interditos proibitórios, inclusive contra o próprio proprietário que não possui a coisa, visto que o Legislador atual estabeleceu, para corrigir uma aparente incompatibilidade anterior (art. 505 do CC/1916), que "não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade ou de outro direito sobre a coisa" (art. 1.210, § 2º, do CC/2003). A exceção de domínio (exceptio proprietatis) não é admitida pelo ordenamento jurídico atual quando pendente ação possessória (as distinções ocorriam só no sistema passado, as quais passaram a ser resolvidas, após penosa batalha jurisprudencial, pela Súmula nº 487 do STF), pois, caso contrário, ficaria esvaziada a proteção da posse se apresentada defesa exclusivamente com base no domínio. A proibição, estampada tanto na lei material (art. 1.210, § 2º, do CC) como na lei processual (art. 923 do CPC), é clara: não cabe ação petitória se já foi anteriormente proposta uma ação de natureza possessória. Trata-se, como ensina a doutrina, de uma verdadeira condição suspensiva do exercício de ação fundada exclusivamente na propriedade. ENTENDIMENTO TENDENTE A EXTINÇÃO DA PETITÓRIA SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, NA FORMA PREVISTA NO ART. 267, INCISO IV, DO CPC, CONTUDO, RELATIVIZADO. CIRCUNSTÂNCIAS EXCEPCIONAIS QUE PERMITEM A APRECIAÇÃO DO FEITO. JULGADOR QUE, EM RAZÃO DAS PECULIARIDADES DOS AUTOS, MUITO ALÉM DE TRILHAR O CAMINHO DE NORMAS E PROCEDIMENTOS PARA SOLUCIONAR DE MODO ESCORREITO A LIDE, DEVE ASPIRAR A CÉLERE DISTRIBUIÇÃO DA JUSTIÇA. TRÂMITE DAS DEMANDAS SUPERIOR A 10 (DEZ) ANOS. NECESSIDADE DE SOLUÇÃO EFETIVA DO LITÍGIO APÓS BEM OBTEMPERADAS AS PARTICULARIDADES DO CASO. NECESSIDADE DE SOLUÇÃO EFETIVA APÓS O MOROSO DECURSO DAS DEMANDAS, CONSIDERADA A AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE POSSE PELA APELANTE. Embora o Legislador tenha traçado um modelo a ser observado para a prática dos atos processuais, todo e qualquer vício presente deve ser considerado com redobrada precaução e com a clara, direta e expressa intencionalidade, por parte deste Julgador, de aproveitamento máximo do ato, pois qualquer consequência jurídica que, se não for absolutamente necessária, importe na invalidade de alguma ação já adotada e, por conseguinte, acarrete à resolução da lide mais morosidade, não se revelará verdadeiramente justa. A busca da celeridade na prestação jurisdicional é imperativo constitucional, estabelecido no art. 5º, inciso LXXVIII, da CF, segundo o qual "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação" e o STJ também compreende que "em atenção à garantia constitucional da razoável duração do processo, bem como ao princípio da economia processual, não seria pertinente a anulação do feito, que já dura mais de dez anos, pois, certamente, causaria ainda maiores prejuízos às partes" (AgRg no EREsp nº 1.331.946-RJ, rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 11.06.2014). USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. PRETENSÃO LASTRADA NO CAPUT DO ART. 1.238 DO CÓDIGO CIVIL ATUAL. TERMO A QUO DO PRAZO PRESCRICIONAL AQUISITIVO INICIADO SOB A VIGÊNCIA DO CÓDIGO REVOGADO. MAIS DE METADE DO PRAZO QUE SE PASSOU SOB A ÉGIDE DE TAL DIPLOMA. APLICAÇÃO DA REGRA DE TRANSIÇÃO DO ART. 2.028 DO CÓDIGO CIVIL ATUAL. PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA EXIGIDA PARA O CASO NOS TERMOS DO ART. 550 DO CÓDIGO DE 1916. A pretensão de usucapir com base no art. 1238, caput, do Código Civil atual é aplicável só se o prazo da prescrição aquisitiva de quinze anos se deu totalmente sob sua égide, ou se não transcorrido mais da metade do prazo sob o domínio do Diploma revogado, nos termos da regra de transição do art. 2.028 do Código atual. Se mais da metade do prazo prescritivo se deu na vigência do Diploma Civil revogado, aplica-se a prescrição vintenária do artigo 550 do Código Civil de 1916. POSSE MANSA, PACÍFICA E SEM INTERRUPÇÃO POR MAIS DE VINTE ANOS. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. EXEGESE DO ART. 550 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. ATOS DE POSSE PRATICADOS PELA CONTESTANTE QUE ALEGA SER PROPRIETÁRIA DA ÁREA QUE INICIARAM APÓS CUMPRIDO O PRAZO VINTENÁRIO. SENTENÇA MANTIDA. Comprovada a posse mansa, pacífica e ininterrupta, por vinte anos, preenchidos estão os requisitos do art. 550 do Código Civil de 1916 a ensejar a declaração de domínio sobre a área usucapienda. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DEMANDA AJUIZADA PELA CONTESTANTE DA AÇÃO DE USUCAPIÃO. MESMA ÁREA EM LITÍGIO. REQUISITOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA POSSE SUPOSTAMENTE EXERCIDA PELA AUTORA. ESCRITURA DE CESSÃO QUE NÃO SERVE COMO COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DA POSSE. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À REINTEGRAÇÃO EM RAZÃO DA PROCEDÊNCIA DA AÇÃO DE USUCAPIÃO. Não comprovada a posse, o esbulho, a data do esbulho e a perda do bem, ônus atribuído ao apelante por força dos arts. 927 e 333, I, do Código de Processo Civil, não há como conceder a reintegração de posse pretendida. Ausente um dos requisitos previstos no art. 927 do CPC, não há se falar em reintegração de posse, sendo encargo do autor demonstrar que efetivamente exercia a posse anteriormente ao esbulho. A existência, por si só, de documento que atesta a posse do bem esbulhado não é suficiente para demonstrar o exercício do instituto, ainda mais quando as demais provas rumam em sentido contrário. Conjunto probatório que não comprova, com a segurança jurídica necessária, fato constitutivo do direito do autor (art. 333, inciso I, do CPC). SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO (TJSC, Apelação Cível n. 2010.036023-7, de São João Batista, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 25-06-2015).
Data do Julgamento
:
25/06/2015
Classe/Assunto
:
Segunda Câmara de Direito Civil
Órgão Julgador
:
Cláudio Márcio Areco Júnior
Relator(a)
:
Gilberto Gomes de Oliveira
Comarca
:
São João Batista
Mostrar discussão