TJSC 2011.022302-8 (Acórdão)
INDIGNIDADE PARA O OFICIALATO. NULIDADE. IMPEDIMENTO DE MEMBRO DO CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO. INOCORRÊNCIA. ESFERAS PENAL E ADMINISTRATIVA. INDEPENDÊNCIA E AUTONOMIA. NULIDADE. CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, ART. 305. NÃO RECEPÇÃO. COAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. COMPOSIÇÃO DO CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO. OFICIAIS SUPERIORES. DEFENSOR DO JUSTIFICANTE. LIVRE ESCOLHA. PRORROGAÇÃO DOS TRABALHOS. DECISÃO DO COMANDANTE-GERAL DA POLÍCIA MILITAR. COMPETÊNCIA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. ENCAMPAÇÃO. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. RESPOSTA ESCRITA PERANTE O TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRESCRIÇÃO. LEI ESTADUAL N. 5.277/76, ART. 2.º, IV. TERMO INICIAL. TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. SOBRESTAMENTO DO FEITO. APURAÇÃO JUDICIAL DOS MESMOS FATOS. IRRELEVÂNCIA. AUTONOMIA DAS ESFERAS JUDICIAIS E ADMINISTRATIVAS. MÉRITO. OFICIAL DA POLÍCIA MILITAR. ENVOLVIMENTO COM O "JOGO DO BICHO". EXTORSÃO DE CONTRAVENTOR. CONDENAÇÃO PELO CRIME DE CONCUSSÃO. PRÁTICA DIAMETRALMENTE CONTRÁRIA AO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO POLICIAL MILITAR. 1. As esferas civis, penais e administrativas são independentes e autônomas entre si. Tal característica, contudo, não impede que a mesma autoridade tome conhecimento do fato e julgue suas consequências sob esses diferentes aspectos. O que não se permite é que o mesmo juiz profira decisão em graus de jurisdição (ou de instância) distintos. 2. A isolada menção ao art. 305 do Código de Processo Penal Militar - que prevê que o "silêncio poderá ser interpretado em prejuízo da própria defesa" - não é suficiente para invalidar o interrogatório. Cumpre ao interessado comprovar o efetivo prejuízo de eventual coação em depor. Se dos termos do interrogatório percebe-se claramente que o acusado aproveitou a ocasião para dar sua versão dos fatos, exercendo na plenitude a oportunidade de autodefesa que o ato propicia, não se há falar em nulidade. 3. O Conselho de Justificação será "composto por 3 (três) oficiais da ativa de posto superior ao do acusado" (Lei estadual n. 5.277/76, art. 4.º). É da essência de qualquer procedimento administrativo-disciplinar o julgamento por superiores, nunca por subalternos, quanto mais dentro das instituições militares. A escolha livre e espontânea, pelo acusado, de oficial subalterno para exercer sua defesa junto ao Conselho de Justificação não invalida o processo. 4. Cumpre ao Governador do Estado decidir sobre eventual necessidade de prorrogação ou de sobrestamento dos trabalhos do Conselho de Justificação. Eventual deliberação nesse sentido feita pelos próprios membros do Conselho ou pelo Comandante-Geral da Polícia Militar fica convalidada se o chefe do Poder Executivo, ao receber o relatório final, encampa a decisão, remetendo os autos ao Tribunal de Justiça para apuração da indignidade para o oficialato. 5. As deliberações finais do Conselho de Justificação são meramente opinativas; servem para fornecer ao Governador do Estado elementos para uma das decisões previstas no art. 12 da Lei estadual n. 5.277/76. Não há necessidade de intimar o acusado acerca do relatório final. Distribuídos os autos no Tribunal de Justiça para apuração de eventual indignidade para o oficialato, o contraditório e a ampla defesa perfectibilizam-se mediante a intimação do acusado para apresentar defesa (RISTM, art. 158; Lei n. 5.836/72, art. 15). É despicienda, pois, sua intimação antes da remessa dos autos. 6. Fundada a instauração de Conselho de Justificação na hipótese do inciso IV do art. 2.º da Lei estadual n. 5.277/76, o prazo prescricional de 6 anos (art. 18) começa a correr a partir do trânsito em julgado da sentença condenatória. 7. As instâncias civis, criminais e administrativas são autônomas. Sendo assim, o ajuizamento de revisão criminal não tem o condão de, automaticamente, sobrestar a apuração da responsabilidade administrativa, notadamente quando nem sequer há registro do exercício de tal pretensão rescisória. 8. Instaurado o Conselho de Justificação com base nas hipóteses do inciso I do art. 2.º da Lei estadual n. 5.277/76, não cabe ao Tribunal de Justiça apreciar se os fatos ali narrados configuram crime. Cumpre tão somente avaliar se ofendem de tal forma a instituição policial militar, a ponto de tornar seu autor indigno para o oficialato. Por outro lado, quando a formação do Conselho de Justificação se dá em razão da hipótese elencada no inciso IV do art. 2.º da Lei estadual n. 5.277/76, o que importa é apreciar se a condenação em si - e não os fatos que a ensejaram - é de tamanha gravidade, suficiente para tornar o acusado indigno para o oficialato. 9. A condenação pela prática da conduta descrita no art. 324 do Código Penal Militar, desde que não cause notório prejuízo às instituições militares, é insuficiente para tornar o apenado indigno para o oficialato (Lei estadual n. 5.277/76, art. 2.º, IV), notadamente se a ele foi aplicada a pena mínima prevista. 10. Não comprovados os fatos que ensejaram a instauração do Conselho de Disciplina, impossível é a declaração de indignidade para o oficialato. 11. O envolvimento de oficial superior da Polícia Militar com o "jogo do bicho", exigindo vantagem indevida de contraventor para evitar ações ostensivas contra a citada prática contravencional, é motivo suficiente para declará-lo indigno para o oficialato, notadamente quando, à época do fatos, exercia o comando do policiamento de toda uma região do estado, tendo sob sua responsabilidade mais de 350 homens. INDIGNIDADE PARA O OFICIALATO DECLARADA. CONSEQUENTE PERDA DO POSTO E DA PATENTE. (TJSC, Indignidade para o Oficialato n. 2011.022302-8, da Capital, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, Seção Criminal, j. 26-03-2014).
Ementa
INDIGNIDADE PARA O OFICIALATO. NULIDADE. IMPEDIMENTO DE MEMBRO DO CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO. INOCORRÊNCIA. ESFERAS PENAL E ADMINISTRATIVA. INDEPENDÊNCIA E AUTONOMIA. NULIDADE. CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, ART. 305. NÃO RECEPÇÃO. COAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. COMPOSIÇÃO DO CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO. OFICIAIS SUPERIORES. DEFENSOR DO JUSTIFICANTE. LIVRE ESCOLHA. PRORROGAÇÃO DOS TRABALHOS. DECISÃO DO COMANDANTE-GERAL DA POLÍCIA MILITAR. COMPETÊNCIA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. ENCAMPAÇÃO. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. RESPOSTA ESCRITA PERANTE O TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRESCRIÇÃO. LEI ESTADUAL N. 5.277/76, ART. 2.º, IV. TERMO INICIAL. TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. SOBRESTAMENTO DO FEITO. APURAÇÃO JUDICIAL DOS MESMOS FATOS. IRRELEVÂNCIA. AUTONOMIA DAS ESFERAS JUDICIAIS E ADMINISTRATIVAS. MÉRITO. OFICIAL DA POLÍCIA MILITAR. ENVOLVIMENTO COM O "JOGO DO BICHO". EXTORSÃO DE CONTRAVENTOR. CONDENAÇÃO PELO CRIME DE CONCUSSÃO. PRÁTICA DIAMETRALMENTE CONTRÁRIA AO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO POLICIAL MILITAR. 1. As esferas civis, penais e administrativas são independentes e autônomas entre si. Tal característica, contudo, não impede que a mesma autoridade tome conhecimento do fato e julgue suas consequências sob esses diferentes aspectos. O que não se permite é que o mesmo juiz profira decisão em graus de jurisdição (ou de instância) distintos. 2. A isolada menção ao art. 305 do Código de Processo Penal Militar - que prevê que o "silêncio poderá ser interpretado em prejuízo da própria defesa" - não é suficiente para invalidar o interrogatório. Cumpre ao interessado comprovar o efetivo prejuízo de eventual coação em depor. Se dos termos do interrogatório percebe-se claramente que o acusado aproveitou a ocasião para dar sua versão dos fatos, exercendo na plenitude a oportunidade de autodefesa que o ato propicia, não se há falar em nulidade. 3. O Conselho de Justificação será "composto por 3 (três) oficiais da ativa de posto superior ao do acusado" (Lei estadual n. 5.277/76, art. 4.º). É da essência de qualquer procedimento administrativo-disciplinar o julgamento por superiores, nunca por subalternos, quanto mais dentro das instituições militares. A escolha livre e espontânea, pelo acusado, de oficial subalterno para exercer sua defesa junto ao Conselho de Justificação não invalida o processo. 4. Cumpre ao Governador do Estado decidir sobre eventual necessidade de prorrogação ou de sobrestamento dos trabalhos do Conselho de Justificação. Eventual deliberação nesse sentido feita pelos próprios membros do Conselho ou pelo Comandante-Geral da Polícia Militar fica convalidada se o chefe do Poder Executivo, ao receber o relatório final, encampa a decisão, remetendo os autos ao Tribunal de Justiça para apuração da indignidade para o oficialato. 5. As deliberações finais do Conselho de Justificação são meramente opinativas; servem para fornecer ao Governador do Estado elementos para uma das decisões previstas no art. 12 da Lei estadual n. 5.277/76. Não há necessidade de intimar o acusado acerca do relatório final. Distribuídos os autos no Tribunal de Justiça para apuração de eventual indignidade para o oficialato, o contraditório e a ampla defesa perfectibilizam-se mediante a intimação do acusado para apresentar defesa (RISTM, art. 158; Lei n. 5.836/72, art. 15). É despicienda, pois, sua intimação antes da remessa dos autos. 6. Fundada a instauração de Conselho de Justificação na hipótese do inciso IV do art. 2.º da Lei estadual n. 5.277/76, o prazo prescricional de 6 anos (art. 18) começa a correr a partir do trânsito em julgado da sentença condenatória. 7. As instâncias civis, criminais e administrativas são autônomas. Sendo assim, o ajuizamento de revisão criminal não tem o condão de, automaticamente, sobrestar a apuração da responsabilidade administrativa, notadamente quando nem sequer há registro do exercício de tal pretensão rescisória. 8. Instaurado o Conselho de Justificação com base nas hipóteses do inciso I do art. 2.º da Lei estadual n. 5.277/76, não cabe ao Tribunal de Justiça apreciar se os fatos ali narrados configuram crime. Cumpre tão somente avaliar se ofendem de tal forma a instituição policial militar, a ponto de tornar seu autor indigno para o oficialato. Por outro lado, quando a formação do Conselho de Justificação se dá em razão da hipótese elencada no inciso IV do art. 2.º da Lei estadual n. 5.277/76, o que importa é apreciar se a condenação em si - e não os fatos que a ensejaram - é de tamanha gravidade, suficiente para tornar o acusado indigno para o oficialato. 9. A condenação pela prática da conduta descrita no art. 324 do Código Penal Militar, desde que não cause notório prejuízo às instituições militares, é insuficiente para tornar o apenado indigno para o oficialato (Lei estadual n. 5.277/76, art. 2.º, IV), notadamente se a ele foi aplicada a pena mínima prevista. 10. Não comprovados os fatos que ensejaram a instauração do Conselho de Disciplina, impossível é a declaração de indignidade para o oficialato. 11. O envolvimento de oficial superior da Polícia Militar com o "jogo do bicho", exigindo vantagem indevida de contraventor para evitar ações ostensivas contra a citada prática contravencional, é motivo suficiente para declará-lo indigno para o oficialato, notadamente quando, à época do fatos, exercia o comando do policiamento de toda uma região do estado, tendo sob sua responsabilidade mais de 350 homens. INDIGNIDADE PARA O OFICIALATO DECLARADA. CONSEQUENTE PERDA DO POSTO E DA PATENTE. (TJSC, Indignidade para o Oficialato n. 2011.022302-8, da Capital, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, Seção Criminal, j. 26-03-2014).
Data do Julgamento
:
26/03/2014
Classe/Assunto
:
Seção Criminal
Órgão Julgador
:
Seção Criminal
Relator(a)
:
Roberto Lucas Pacheco
Comarca
:
Capital
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