TJSC 2012.052452-1 (Acórdão)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. EXTINÇÃO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, COM SUPEDÂNEO NO ART. 267, INC. IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, AO ENTENDIMENTO DE QUE OS AUTORES NÃO TROUXERAM AO PROCESSO DOCUMENTO ESSENCIAL PARA O PROCESSAMENTO DA DEMANDA. INSURGÊNCIA DOS REQUERENTES. ACERVO PROBATÓRIO QUE PROPICIA A ESPECIFICAÇÃO DOS LIMITES E DAS CONFRONTAÇÕES DO IMÓVEL SUB JUDICE. ANULAÇÃO DO FEITO A PARTIR DA SENTEÇA QUE SE IMPÕE, INCLUSIVE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. "Se a documentação trazida com a petição inicial da ação de usucapião permite a exata localização do imóvel e a identificação dos seus confrontantes, não há motivo plausível para se produzir estudos mais detalhados" (TJSC, AI nº 2010.024088-7, de São José, rel.: Des. Vanderlei Romer, j. 31/08/2010) (Apelação Cível n. 2011.090963-0, de Araranguá, rel. Des. Luiz Fernando Boller, j. 5-9-2015). vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2012.052452-1, da comarca de Araranguá (2ª Vara Cível), em que são apelantes Antonio Rosso e outro, e apelados Itamar Rocha e outros: A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Custas legais. O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Eládio Torret Rocha, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Joel Figueira Júnior. Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Paulo Ricardo da Silva. Florianópolis, 25 de fevereiro de 2016.Stanley BragaRelator RELATÓRIO Trata-se de Recurso de Apelação Cível (fls. 97-102) interposto por Antonio Rosso e Adirlei Américo contra a sentença que, em autos de ação de usucapião aforada em desfavor de Itamar Rocha, Arnoldo Elviro Pedroso e Alison Presa Presa Benedette, assim decidiu o litígio: "Ante o exposto julgo extinta a presente demanda com fundamento no artigo 267, inciso IV do Código de Processo Civil, condenando a parte autora ao pagamento das custas processuais, ficando a exigibilidade suspensa em face da gratuidade judiciária deferida neste ato. Honorários incabíveis" (fl. 94). Em suas razões, os apelantes assinalaram que, contrariamente ao que constou do decisum hostilizado, trouxeram ao feito o memorial descritivo, a planta do imóvel individualizado e indicaram os confinantes; noutras palavras, satisfizeram os requisitos necessários ao reconhecimento da prescrição aquisitiva. Disseram, ainda, in verbis: [...] verifica-se que as informações prestadas pelos recorrentes estão corretas: não há outros confrontantes que não sejam os proprietários de quatro imóveis, pois o imóvel, conforme documentos do Cartório de Registro de Imóveis e Memorial Descritivo com planta (fls. 91 e 92) está localizado sobre quatro lotes e se confronta com os mesmos (sic). Até mesmo pela matrícula (fl. 62) se constata esta realidade, pois os lotes medem 12m por 25m, e, se comparados com os documentos da Prefeitura de Arroio Silva (fl. 23), os quais retratam o que existe de fato no local (a posse), verifica-se que os lotes têm o primeiro de frente para a praia com 16,30m por 26,70m e os demais têm 15m por 26,70m. Portanto, impossível que os lotes coincidam (fl. 101). Requereram, ao final, a anulação da decisão singular. O prazo para o oferecimento das contrarrazões transcorreu em branco, conforme certidão de fl. 109. Dispensado o preparo, por litigarem os apelantes sob o pálio da justiça gratuita, ascenderam os autos a esta Instância. Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo Ricardo da Silva, que opinou pelo conhecimento e provimento do apelo, a fim de que se dê prosseguimento ao feito. Este é o relatório. VOTO Da admissibilidade: Presentes os pressupostos legais, o recurso é conhecido. Do julgamento: Preliminares: Não foram suscitadas preliminares. Porém, compulsando o processo, verificou-se que lhe foram apensados os autos da Ação Reinvidicatória 004.08.012001-0 ajuizada por Transcontinental Empreendimentos Imobiliários Ltda. contra o ora apelante, Antonio Rosso, que tem por objeto o imóvel matriculado sob o n. 6.144, livro 2, no Registro de Imóveis da comarca de Araranguá, sobre o qual paira a pretensão de reconhecimento da prescrição aquisitiva. Justamente por isso, foi reconhecida a conexão entre as ações e determinada a sua reunião para julgamento conjunto (fl. 77 da Ação de Usucapião). Procedeu-se a tanto, e, como relatado, a Ação de Usucapião foi julgada extinta, sem resolução do mérito, com lastro no art. 267, IV, do CPC. A informação é relevante, porquanto tivesse sido prolatada sentença definitiva, ou seja, com resolução do meritum causae, e sem que fosse apreciada concomitantemente a Ação Reinvidicatória, poder-se-ia cogitar até mesmo da nulidade decisum. Isso porque, embora o ordenamento jurídico não obrigue o julgamento simultâneo das ações conexas, de rigor a cassação do ato judicial em casos tais uma vez demonstrado o prejuízo. Na hipótese, por se cuidarem de ações reinvindicatória e de usucapião, pode-se perfeitamente presumir que haveria, sim, prejuízo às partes. A respeito, confira-se excerto de precedente da Segunda Câmara de Direito Civil, mudando o que deve ser mudado: [...] recomenda-se que a decisão seja anulada somente quando houver respectivo prejuízo advindo do julgamento em separado das ações o que, de fato, ocorre no presente caso, motivo pelo qual a sentença deve ser cassada e os autos retornarem ao primeiro grau para que ambas as ações sejam analisadas em conjunto. Explico. Embora não haja obrigatoriedade das ações serem julgadas simultaneamente, veja-se que no caso em análise, que trata de uma ação de usucapião proposta pelos supostos herdeiros que dizem serem possuidores da terra há mais de 20 (vinte) anos, há conexão com a ação de usucapião nº 036.04.003226-0 proposta pelos terceiros interessados, os quais também se dizem possuidores da terra, de forma que a decisão proferida numa ação por decorrência lógica é prejudicial à outra. Ocorre que a sentença proferida analisou apenas a ação aqui em comento e julgou procedente o pedido, sem se reportar à ação conexa, o que não poderia ter ocorrido, haja vista a estreita ligação entre o objeto das demandas. Diante deste quadro, da prejudicialidade desta ação em face da segunda, o ideal é a análise e julgamento conjunto dos autos, a fim de que o mérito e as provas de ambas as ações sejam examinadas simultaneamente, sem risco de prejuízo a nenhuma das partes. Portanto, ainda que a conexão não induza obrigatoriamente ao julgamento simultâneo das ações, tenho que no caso presente, que se trata de usucapião de uma extensa faixa de terra, é mais do que recomendável, senão imperativo, que ambas as ações de usucapião sejam analisadas em conjunto, a fim de possibilitar a análise de todos os dados e informações relevantes ao autos, além de obstar julgamentos contrários que resulte prejuízo aos litigantes (Apelação Cível n. 2011.030026-5, de Jaraguá do Sul, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, j. 14-2-2013). Afora isso, como assinalado pelo Signatário ao proferir seu voto nas Apelações Cíveis n. 2010.076969-3 e 2010.076930-1, de Rio do Sul, em 5-9-2013: [...] diante da conexão existente entre os feitos, que possuem as mesmas partes e o mesmo objeto, e, consoante já mencionado alhures, levando-se em consideração que o reconhecimento da usucapião, quando possível alegar a sua existência como matéria de defesa em ação reinvindicária, constitui óbice à restituição da área sobre a qual é exercido o domínio, não há que se falar em causas de pedir distintas. Entretanto, a sentença hostilizada foi terminativa, sem, insista-se, análise do mérito, e, portanto, não houve pronunciamento judicial sobre o direito postulado. Tampouco o houve, vale dizer, na Ação Reinvidicatória, que ascendeu a este grau de jurisdição juntamente com a Ação de Usucapião. Note-se que o seu trâmite não foi suspenso, o que, aliás, afiguraria-se o mais adequado; mas, diante da remessa do feito, ele se encontra, de todo modo, estagnado desde abril de 2012. À conclusão, eventual provimento deste recurso de apelação resultará tão somente na anulação da sententia, a fim de que se dê prosseguimento à Ação de Usucapião, sem pronunciamento final sobre o direito vindicado. Contrario sensu, ou seja, havendo o desprovimento, será mantida a extinção, e, independentemente do resultado, a Reinvidicatória seguirá seu trâmite normal. Isso posto, passa-se à análise das razões recursais. Do recurso propriamente dito: Convém, inicialmente, historiar o iter processual. Antonio Rosso e Adirlei Américo ajuizaram ação de usucapião originariamente contra Itamar Rocha, Arnoldo Elviro Pedroso e Alison Presa Benedette. Relataram, em síntese, ter adquirido, mediante contrato de compra e venda, um imóvel urbano, com área de 406,88 m², sito no município de Araranguá. Disseram que a aquisição deu-se no ano de 1990, e, à época, os vendedores informaram-lhes que, conquanto o bem não fosse registrado, possuíam-no há mais de uma década. Ao final, aduziram que, somada a de seus antecessores, a posse que exercem, de forma mansa, pacífica e ininterrupta, sem nenhuma oposição, é superior a 25 (vinte e cinco) anos (considerando a data da propositura da demanda), pelo que atendido o prazo temporal requerido para o reconhecimento da prescrição aquisitiva (art. 1.243 do CC/2002). Com a exordial, trouxeram o memorial descritivo e a planta do imóvel. Citados os confrontantes e eventuais interessados, com o decurso in albis do prazo para a contestação, determinou-se a emenda da inicial. Antonio Rosso atravessou petição, na qual consignou que o imóvel compreende parte dos lotes 23.975, 23.978, 23.976 e 23.977, os dois primeiros matriculados nos nomes de Sul Brasileiro Crédito Imobiliário S.A. em liquidação extrajudicial; e os demais, nos nomes de Poti de Mello e Edel Empresa e Engenharia, respectivamente. Juntou documentos, a saber, certidão emitida pelo 1º Tabelionato de Registro de Imóveis e Protestos em Geral e registros imobiliários. Em novo despacho, foi deferida a emenda à inicial e determinado aos requerentes que promovessem a citação da Transcontinental S.A., cessionária dos bens outrora pertencentes à Sul Brasileiro Crédito Imobiliário S.A. Foi formulado pedido de reconsideração, ocasião na qual se mencionou a prefalada Ação Reinvindicatória e se asseverou que a Transcontinental S.A. não é proprietária do imóvel usucapiendo. A União, instada, asseverou que a planta apresentada pelos autores não é suficiente para a identificação precisa do bem. Pugnou pela sua intimação para apresentar nova planta topográfica, com dados mais específicos. Ao entendimento de que inviável a exata individualização da área, e, por conseguinte, dos imóveis confinantes, o Juiz de Direito determinou a apresentação de memorial descritivo com a individualização das frações que compõem a área sub judice. Os autores, então, assinalaram que os imóveis atingidos pela actio são apenas aqueles já indicados anteriormente. Porém, anexaram novo croqui e memorial descritivo. Sobreveio, então, a sentença extintiva, calcada no art. 267, IV, do CPC. Quedaram-se irresignados os postulantes, como outrora assinalado, e, ao seu recurso recurso de apelação deve ser dado provimento, porquanto satisfeitos os requisitos do art. 942 do CPC. Com efeito, a documentação produzida ao longo dos autos propicia a exata delimitação da área que se pretende ver usucapida, assim como permite a identificação dos confrontantes. Veja-se que esta Câmara já se deparou com hipótese que guarda singular similitude com a presente, igualmente proveniente da comarca de Araranguá, e na qual, a exemplo do que aqui ocorre, extinguiu o processo, sem resolução do mérito, em sentença respaldada nos mesmos fundamentos que embasa a que ora se impugna. Segue a reprodução do bem lançado voto condutor do aresto: Conheço do presente apelo porque, além de tempestivo, atende aos demais requisitos de admissibilidade, sobressaindo que Caciana Marques pretende a desconstituição da sentença combatida, entendendo não estar caracterizada situação capaz de ensejar o prematuro encerramento do feito, visto que os limites do terreno usucapiendo teriam sido devidamente esclarecidos na peça vestibular, bradando, pois, pelo retorno do feito à origem, para que tenha regular prosseguimento. Pois bem. O Código de Processo Civil estatui, in verbis: "Art. 283. A petição inicial será instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação. Art. 284. Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos exigidos nos arts. 282 e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor a emende, ou a complete, no prazo de 10 (dez) dias. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial." Mais especificamente no que diz respeito à ação de usucapião, dispõe o aludido digesto, em seu art. 942, que: "O autor, expondo na petição inicial o fundamento do pedido e juntando planta do imóvel, requererá a citação daquele em cujo nome estiver registrado o imóvel usucapiendo, bem como dos confinantes e, por edital, dos réus em lugar incerto e dos eventuais interessados, observado quanto ao prazo o disposto no inciso IV do art. 232." Dos termos da decisão redarguida, constato que a extinção do processo, sem resolução do mérito, foi motivada pela suposta ausência de documentos e informações indispensáveis à propositura da demanda, situação que teria persistido mesmo após oportunizada a emenda da prefacial, para suprimento da falta. Todavia, após compulsar detidamente tudo quanto consta encartado nos autos, estou convencido de que os elementos trazidos por Caciana Marques são suficientes à especificação dos limites e confrontações do lote usucapiendo, permitindo a citação e/ou convocação dos interessados. Neste sentido, convém assentar que a indicação dos confrontantes foi efetivada na inicial, sendo complementada no petitório de fls. 94/95, ao passo que a Certidão obtida junto ao Cartório de Registro de Imóveis de Araranguá (fl. 10) aponta o proprietário do imóvel matriculado sob o nº 53.279, onde está inserido o lote cuja declaração de domínio é objetivada. Já às fls. 13/14, constam o Levantamento Planimétrico e o Memorial Descritivo do terreno, em conformidade com o art. 942 do Código de Processo Civil, o que igualmente demonstra ter sido observada a individualização do imóvel usucapiendo. Diante deste contexto, forçoso concluir estarem reunidos os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, impondo-se, via de consequência, a reforma da decisão admoestada. Aliás, da jurisprudência dos Tribunais pátrios, colhe-se: "USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO - Petição inicial - Determinação de emenda para a apresentação de planta atualizada do imóvel usucapiendo, assinada por profissional habilitado - Desnecessidade - Instrução do pedido com certidão do registro imobiliário e croqui do loteamento, contendo a descrição do imóvel, sua área e confrontações - Documentos suficientes à identificação do bem - Manutenção da exigência que apenas dificultaria o acesso do requerente à Justiça - Decisão reformada - Recurso provido" (TJSP, AI nº 5892144800, rel.: Des. Álvaro Passos, j. 27/08/2008, DJ do dia 08/09/2008). No mesmo rumo: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. USUCAPIÃO. INICIAL INSTRUÍDA COM CÓPIA DA MATRÍCULA E PLANTA DO IMÓVEL USUCAPIENDO. CUMPRIDO DISPOSTO O ART. 942 DO CPC, SENDO DESCABIDA A DETERMINAÇÃO DE JUNTADA DO MAPA DO IMÓVEL USUCAPIENDO E MEMORIAL DESCRITIVO DA ÁREA, ATUALIZADOS. RECURSO PROVIDO" (TJRS, AI nº 70043413962, de Lajeado, rel.: Des. Luiz Renato Alves da Silva, j. 08/09/2011, DJ do dia 27/09/2011). E especialmente de nossa Corte: "CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. USUCAPIÃO. DOCUMENTAÇÃO ACOSTADA AO FEITO PELO AUTOR QUE, DE ACORDO COM A MUNICIPALIDADE, É INSUFICIENTE PARA A EXATA LOCALIZAÇÃO DO IMÓVEL SUB JUDICE. REQUERIMENTO DE LEVANTAMENTO PLANIMÉTRICO GEORREFERENCIADO E DE ELABORAÇÃO DE MEMORIAL DESCRITIVO DA POLIGONAL EM COORDENADAS UTM. PROVIDÊNCIAS DISPENSÁVEIS. REQUISITOS PRE (TJSC, Apelação Cível n. 2012.052452-1, de Araranguá, rel. Des. Stanley Braga, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 25-02-2016).
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. EXTINÇÃO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, COM SUPEDÂNEO NO ART. 267, INC. IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, AO ENTENDIMENTO DE QUE OS AUTORES NÃO TROUXERAM AO PROCESSO DOCUMENTO ESSENCIAL PARA O PROCESSAMENTO DA DEMANDA. INSURGÊNCIA DOS REQUERENTES. ACERVO PROBATÓRIO QUE PROPICIA A ESPECIFICAÇÃO DOS LIMITES E DAS CONFRONTAÇÕES DO IMÓVEL SUB JUDICE. ANULAÇÃO DO FEITO A PARTIR DA SENTEÇA QUE SE IMPÕE, INCLUSIVE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. "Se a documentação trazida com a petição inicial da ação de usucapião permite a exata localização do imóvel e a identificação dos seus confrontantes, não há motivo plausível para se produzir estudos mais detalhados" (TJSC, AI nº 2010.024088-7, de São José, rel.: Des. Vanderlei Romer, j. 31/08/2010) (Apelação Cível n. 2011.090963-0, de Araranguá, rel. Des. Luiz Fernando Boller, j. 5-9-2015). vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2012.052452-1, da comarca de Araranguá (2ª Vara Cível), em que são apelantes Antonio Rosso e outro, e apelados Itamar Rocha e outros: A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Custas legais. O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Eládio Torret Rocha, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Joel Figueira Júnior. Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Paulo Ricardo da Silva. Florianópolis, 25 de fevereiro de 2016.Stanley BragaRelator RELATÓRIO Trata-se de Recurso de Apelação Cível (fls. 97-102) interposto por Antonio Rosso e Adirlei Américo contra a sentença que, em autos de ação de usucapião aforada em desfavor de Itamar Rocha, Arnoldo Elviro Pedroso e Alison Presa Presa Benedette, assim decidiu o litígio: "Ante o exposto julgo extinta a presente demanda com fundamento no artigo 267, inciso IV do Código de Processo Civil, condenando a parte autora ao pagamento das custas processuais, ficando a exigibilidade suspensa em face da gratuidade judiciária deferida neste ato. Honorários incabíveis" (fl. 94). Em suas razões, os apelantes assinalaram que, contrariamente ao que constou do decisum hostilizado, trouxeram ao feito o memorial descritivo, a planta do imóvel individualizado e indicaram os confinantes; noutras palavras, satisfizeram os requisitos necessários ao reconhecimento da prescrição aquisitiva. Disseram, ainda, in verbis: [...] verifica-se que as informações prestadas pelos recorrentes estão corretas: não há outros confrontantes que não sejam os proprietários de quatro imóveis, pois o imóvel, conforme documentos do Cartório de Registro de Imóveis e Memorial Descritivo com planta (fls. 91 e 92) está localizado sobre quatro lotes e se confronta com os mesmos (sic). Até mesmo pela matrícula (fl. 62) se constata esta realidade, pois os lotes medem 12m por 25m, e, se comparados com os documentos da Prefeitura de Arroio Silva (fl. 23), os quais retratam o que existe de fato no local (a posse), verifica-se que os lotes têm o primeiro de frente para a praia com 16,30m por 26,70m e os demais têm 15m por 26,70m. Portanto, impossível que os lotes coincidam (fl. 101). Requereram, ao final, a anulação da decisão singular. O prazo para o oferecimento das contrarrazões transcorreu em branco, conforme certidão de fl. 109. Dispensado o preparo, por litigarem os apelantes sob o pálio da justiça gratuita, ascenderam os autos a esta Instância. Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo Ricardo da Silva, que opinou pelo conhecimento e provimento do apelo, a fim de que se dê prosseguimento ao feito. Este é o relatório. VOTO Da admissibilidade: Presentes os pressupostos legais, o recurso é conhecido. Do julgamento: Preliminares: Não foram suscitadas preliminares. Porém, compulsando o processo, verificou-se que lhe foram apensados os autos da Ação Reinvidicatória 004.08.012001-0 ajuizada por Transcontinental Empreendimentos Imobiliários Ltda. contra o ora apelante, Antonio Rosso, que tem por objeto o imóvel matriculado sob o n. 6.144, livro 2, no Registro de Imóveis da comarca de Araranguá, sobre o qual paira a pretensão de reconhecimento da prescrição aquisitiva. Justamente por isso, foi reconhecida a conexão entre as ações e determinada a sua reunião para julgamento conjunto (fl. 77 da Ação de Usucapião). Procedeu-se a tanto, e, como relatado, a Ação de Usucapião foi julgada extinta, sem resolução do mérito, com lastro no art. 267, IV, do CPC. A informação é relevante, porquanto tivesse sido prolatada sentença definitiva, ou seja, com resolução do meritum causae, e sem que fosse apreciada concomitantemente a Ação Reinvidicatória, poder-se-ia cogitar até mesmo da nulidade decisum. Isso porque, embora o ordenamento jurídico não obrigue o julgamento simultâneo das ações conexas, de rigor a cassação do ato judicial em casos tais uma vez demonstrado o prejuízo. Na hipótese, por se cuidarem de ações reinvindicatória e de usucapião, pode-se perfeitamente presumir que haveria, sim, prejuízo às partes. A respeito, confira-se excerto de precedente da Segunda Câmara de Direito Civil, mudando o que deve ser mudado: [...] recomenda-se que a decisão seja anulada somente quando houver respectivo prejuízo advindo do julgamento em separado das ações o que, de fato, ocorre no presente caso, motivo pelo qual a sentença deve ser cassada e os autos retornarem ao primeiro grau para que ambas as ações sejam analisadas em conjunto. Explico. Embora não haja obrigatoriedade das ações serem julgadas simultaneamente, veja-se que no caso em análise, que trata de uma ação de usucapião proposta pelos supostos herdeiros que dizem serem possuidores da terra há mais de 20 (vinte) anos, há conexão com a ação de usucapião nº 036.04.003226-0 proposta pelos terceiros interessados, os quais também se dizem possuidores da terra, de forma que a decisão proferida numa ação por decorrência lógica é prejudicial à outra. Ocorre que a sentença proferida analisou apenas a ação aqui em comento e julgou procedente o pedido, sem se reportar à ação conexa, o que não poderia ter ocorrido, haja vista a estreita ligação entre o objeto das demandas. Diante deste quadro, da prejudicialidade desta ação em face da segunda, o ideal é a análise e julgamento conjunto dos autos, a fim de que o mérito e as provas de ambas as ações sejam examinadas simultaneamente, sem risco de prejuízo a nenhuma das partes. Portanto, ainda que a conexão não induza obrigatoriamente ao julgamento simultâneo das ações, tenho que no caso presente, que se trata de usucapião de uma extensa faixa de terra, é mais do que recomendável, senão imperativo, que ambas as ações de usucapião sejam analisadas em conjunto, a fim de possibilitar a análise de todos os dados e informações relevantes ao autos, além de obstar julgamentos contrários que resulte prejuízo aos litigantes (Apelação Cível n. 2011.030026-5, de Jaraguá do Sul, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, j. 14-2-2013). Afora isso, como assinalado pelo Signatário ao proferir seu voto nas Apelações Cíveis n. 2010.076969-3 e 2010.076930-1, de Rio do Sul, em 5-9-2013: [...] diante da conexão existente entre os feitos, que possuem as mesmas partes e o mesmo objeto, e, consoante já mencionado alhures, levando-se em consideração que o reconhecimento da usucapião, quando possível alegar a sua existência como matéria de defesa em ação reinvindicária, constitui óbice à restituição da área sobre a qual é exercido o domínio, não há que se falar em causas de pedir distintas. Entretanto, a sentença hostilizada foi terminativa, sem, insista-se, análise do mérito, e, portanto, não houve pronunciamento judicial sobre o direito postulado. Tampouco o houve, vale dizer, na Ação Reinvidicatória, que ascendeu a este grau de jurisdição juntamente com a Ação de Usucapião. Note-se que o seu trâmite não foi suspenso, o que, aliás, afiguraria-se o mais adequado; mas, diante da remessa do feito, ele se encontra, de todo modo, estagnado desde abril de 2012. À conclusão, eventual provimento deste recurso de apelação resultará tão somente na anulação da sententia, a fim de que se dê prosseguimento à Ação de Usucapião, sem pronunciamento final sobre o direito vindicado. Contrario sensu, ou seja, havendo o desprovimento, será mantida a extinção, e, independentemente do resultado, a Reinvidicatória seguirá seu trâmite normal. Isso posto, passa-se à análise das razões recursais. Do recurso propriamente dito: Convém, inicialmente, historiar o iter processual. Antonio Rosso e Adirlei Américo ajuizaram ação de usucapião originariamente contra Itamar Rocha, Arnoldo Elviro Pedroso e Alison Presa Benedette. Relataram, em síntese, ter adquirido, mediante contrato de compra e venda, um imóvel urbano, com área de 406,88 m², sito no município de Araranguá. Disseram que a aquisição deu-se no ano de 1990, e, à época, os vendedores informaram-lhes que, conquanto o bem não fosse registrado, possuíam-no há mais de uma década. Ao final, aduziram que, somada a de seus antecessores, a posse que exercem, de forma mansa, pacífica e ininterrupta, sem nenhuma oposição, é superior a 25 (vinte e cinco) anos (considerando a data da propositura da demanda), pelo que atendido o prazo temporal requerido para o reconhecimento da prescrição aquisitiva (art. 1.243 do CC/2002). Com a exordial, trouxeram o memorial descritivo e a planta do imóvel. Citados os confrontantes e eventuais interessados, com o decurso in albis do prazo para a contestação, determinou-se a emenda da inicial. Antonio Rosso atravessou petição, na qual consignou que o imóvel compreende parte dos lotes 23.975, 23.978, 23.976 e 23.977, os dois primeiros matriculados nos nomes de Sul Brasileiro Crédito Imobiliário S.A. em liquidação extrajudicial; e os demais, nos nomes de Poti de Mello e Edel Empresa e Engenharia, respectivamente. Juntou documentos, a saber, certidão emitida pelo 1º Tabelionato de Registro de Imóveis e Protestos em Geral e registros imobiliários. Em novo despacho, foi deferida a emenda à inicial e determinado aos requerentes que promovessem a citação da Transcontinental S.A., cessionária dos bens outrora pertencentes à Sul Brasileiro Crédito Imobiliário S.A. Foi formulado pedido de reconsideração, ocasião na qual se mencionou a prefalada Ação Reinvindicatória e se asseverou que a Transcontinental S.A. não é proprietária do imóvel usucapiendo. A União, instada, asseverou que a planta apresentada pelos autores não é suficiente para a identificação precisa do bem. Pugnou pela sua intimação para apresentar nova planta topográfica, com dados mais específicos. Ao entendimento de que inviável a exata individualização da área, e, por conseguinte, dos imóveis confinantes, o Juiz de Direito determinou a apresentação de memorial descritivo com a individualização das frações que compõem a área sub judice. Os autores, então, assinalaram que os imóveis atingidos pela actio são apenas aqueles já indicados anteriormente. Porém, anexaram novo croqui e memorial descritivo. Sobreveio, então, a sentença extintiva, calcada no art. 267, IV, do CPC. Quedaram-se irresignados os postulantes, como outrora assinalado, e, ao seu recurso recurso de apelação deve ser dado provimento, porquanto satisfeitos os requisitos do art. 942 do CPC. Com efeito, a documentação produzida ao longo dos autos propicia a exata delimitação da área que se pretende ver usucapida, assim como permite a identificação dos confrontantes. Veja-se que esta Câmara já se deparou com hipótese que guarda singular similitude com a presente, igualmente proveniente da comarca de Araranguá, e na qual, a exemplo do que aqui ocorre, extinguiu o processo, sem resolução do mérito, em sentença respaldada nos mesmos fundamentos que embasa a que ora se impugna. Segue a reprodução do bem lançado voto condutor do aresto: Conheço do presente apelo porque, além de tempestivo, atende aos demais requisitos de admissibilidade, sobressaindo que Caciana Marques pretende a desconstituição da sentença combatida, entendendo não estar caracterizada situação capaz de ensejar o prematuro encerramento do feito, visto que os limites do terreno usucapiendo teriam sido devidamente esclarecidos na peça vestibular, bradando, pois, pelo retorno do feito à origem, para que tenha regular prosseguimento. Pois bem. O Código de Processo Civil estatui, in verbis: "Art. 283. A petição inicial será instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação. Art. 284. Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos exigidos nos arts. 282 e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor a emende, ou a complete, no prazo de 10 (dez) dias. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial." Mais especificamente no que diz respeito à ação de usucapião, dispõe o aludido digesto, em seu art. 942, que: "O autor, expondo na petição inicial o fundamento do pedido e juntando planta do imóvel, requererá a citação daquele em cujo nome estiver registrado o imóvel usucapiendo, bem como dos confinantes e, por edital, dos réus em lugar incerto e dos eventuais interessados, observado quanto ao prazo o disposto no inciso IV do art. 232." Dos termos da decisão redarguida, constato que a extinção do processo, sem resolução do mérito, foi motivada pela suposta ausência de documentos e informações indispensáveis à propositura da demanda, situação que teria persistido mesmo após oportunizada a emenda da prefacial, para suprimento da falta. Todavia, após compulsar detidamente tudo quanto consta encartado nos autos, estou convencido de que os elementos trazidos por Caciana Marques são suficientes à especificação dos limites e confrontações do lote usucapiendo, permitindo a citação e/ou convocação dos interessados. Neste sentido, convém assentar que a indicação dos confrontantes foi efetivada na inicial, sendo complementada no petitório de fls. 94/95, ao passo que a Certidão obtida junto ao Cartório de Registro de Imóveis de Araranguá (fl. 10) aponta o proprietário do imóvel matriculado sob o nº 53.279, onde está inserido o lote cuja declaração de domínio é objetivada. Já às fls. 13/14, constam o Levantamento Planimétrico e o Memorial Descritivo do terreno, em conformidade com o art. 942 do Código de Processo Civil, o que igualmente demonstra ter sido observada a individualização do imóvel usucapiendo. Diante deste contexto, forçoso concluir estarem reunidos os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, impondo-se, via de consequência, a reforma da decisão admoestada. Aliás, da jurisprudência dos Tribunais pátrios, colhe-se: "USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO - Petição inicial - Determinação de emenda para a apresentação de planta atualizada do imóvel usucapiendo, assinada por profissional habilitado - Desnecessidade - Instrução do pedido com certidão do registro imobiliário e croqui do loteamento, contendo a descrição do imóvel, sua área e confrontações - Documentos suficientes à identificação do bem - Manutenção da exigência que apenas dificultaria o acesso do requerente à Justiça - Decisão reformada - Recurso provido" (TJSP, AI nº 5892144800, rel.: Des. Álvaro Passos, j. 27/08/2008, DJ do dia 08/09/2008). No mesmo rumo: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. USUCAPIÃO. INICIAL INSTRUÍDA COM CÓPIA DA MATRÍCULA E PLANTA DO IMÓVEL USUCAPIENDO. CUMPRIDO DISPOSTO O ART. 942 DO CPC, SENDO DESCABIDA A DETERMINAÇÃO DE JUNTADA DO MAPA DO IMÓVEL USUCAPIENDO E MEMORIAL DESCRITIVO DA ÁREA, ATUALIZADOS. RECURSO PROVIDO" (TJRS, AI nº 70043413962, de Lajeado, rel.: Des. Luiz Renato Alves da Silva, j. 08/09/2011, DJ do dia 27/09/2011). E especialmente de nossa Corte: "CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. USUCAPIÃO. DOCUMENTAÇÃO ACOSTADA AO FEITO PELO AUTOR QUE, DE ACORDO COM A MUNICIPALIDADE, É INSUFICIENTE PARA A EXATA LOCALIZAÇÃO DO IMÓVEL SUB JUDICE. REQUERIMENTO DE LEVANTAMENTO PLANIMÉTRICO GEORREFERENCIADO E DE ELABORAÇÃO DE MEMORIAL DESCRITIVO DA POLIGONAL EM COORDENADAS UTM. PROVIDÊNCIAS DISPENSÁVEIS. REQUISITOS PRE (TJSC, Apelação Cível n. 2012.052452-1, de Araranguá, rel. Des. Stanley Braga, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 25-02-2016).
Data do Julgamento
:
25/02/2016
Classe/Assunto
:
Quarta Câmara de Direito Civil
Órgão Julgador
:
Fábio Nilo Bagattoli
Relator(a)
:
Stanley Braga
Comarca
:
Araranguá
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