TJSC 2012.081595-8 (Acórdão)
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROPOSTA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. DECISÃO ANTECIPATÓRIA DA TUTELA OBRIGANDO O ESTADO DE SANTA CATARINA A NOMEAR, EM 60 (SESSENTA) DIAS, POLICIAIS CIVIS E MILITARES PARA DESEMPENHAREM FUNÇÕES NO MUNICÍPIO DE MONDAÍ. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO PROVIDO. "No exercício da missão constitucional de prestar a jurisdição e resolver litígios, com frequência o Judiciário se defronta com o dilema de ter que sopesar princípios de direito em conflito. Cumpre-lhe optar por aquele de 'maior peso diante das circunstâncias concretas' (Humberto Bergmann Ávila); na ponderação, 'deve sempre levar em conta o princípio da dignidade humana, valor máximo da tábua axiológica da Constituição da República' (Alexandre Freitas Câmara). No expressivo dizer do Ministro Celso de Mello, 'a destinação de recursos públicos, sempre tão dramaticamente escassos, faz instaurar situações de conflito, quer com a execução de políticas públicas definidas no texto constitucional, quer, também, com a própria implementação de direitos sociais assegurados pela Constituição da República, daí resultando contextos de antagonismo que impõem, ao Estado, o encargo de superá-los mediante opções por determinados valores, em detrimento de outros igualmente relevantes, compelindo, o Poder Público, em face dessa relação dilemática, causada pela insuficiência de disponibilidade financeira e orçamentária, a proceder a verdadeiras 'escolhas trágicas' em decisão governamental cujo parâmetro, fundado na dignidade da pessoa humana, deverá ter em perspectiva a intangibilidade do mínimo existencial, em ordem a conferir real efetividade às normas programáticas positivadas na própria Lei Fundamental. Magistério da doutrina. A cláusula da reserva do possível - que não pode ser invocada, pelo Poder Público, com o propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição - encontra insuperável limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que representa, no contexto de nosso ordenamento positivo, emanação direta do postulado da essencial dignidade da pessoa humana. [...] A noção de 'mínimo existencial', que resulta, por implicitude, de determinados preceitos constitucionais (CF, art. 1º, III, e art. 3º, III), compreende um complexo de prerrogativas cuja concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, em ordem a assegurar, à pessoa, acesso efetivo ao direito geral de liberdade e, também, a prestações positivas originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o direito à educação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente, o direito à saúde, o direito à assistência social, o direito à moradia, o direito à alimentação e o direito à segurança' (AgRgRE n. 639.337). De ordinário, apenas quando comprometido esse 'mínimo existencial' será permitido ao Poder Judiciário impor ao Poder Executivo a implementação de ações administrativas. A cláusula da 'reserva do possível' somente pode ser ignorada se necessário para evitar a 'aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade'. À luz dessa premissa, é forçoso reconhecer que não deve subsistir decisão que obriga o Estado a manter em hospital, 'durante 24 horas dos 7 dias da semana, ao menos um médico pediatra e um plantonista no setor de urgência e emergência, sem que para tanto sejam utilizados médicos dos demais setores', notadamente se admitido pelo juiz que para resolução é imprescindível a realização de prova pericial" (AI n. 2011.061320-3, Des. Newton Trisotto). Também não pode subsistir decisão antecipatória da tutela - proferida em ação civil pública aforada pelo Ministério Público - que impõe ao Estado a obrigação de em 60 (sessenta) dias nomear "pelo menos 6 (seis) Policiais Militares e 4 (quatro) Policiais Civis, todos integrantes do quadro de servidores das Polícias Civil e Militar do Estado de Santa Catarina, para que passem a desempenhar suas funções de forma exclusiva na Comarca de Mondaí". (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2012.081595-8, de Mondaí, rel. Des. Newton Trisotto, Primeira Câmara de Direito Público, j. 10-09-2013).
Ementa
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROPOSTA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. DECISÃO ANTECIPATÓRIA DA TUTELA OBRIGANDO O ESTADO DE SANTA CATARINA A NOMEAR, EM 60 (SESSENTA) DIAS, POLICIAIS CIVIS E MILITARES PARA DESEMPENHAREM FUNÇÕES NO MUNICÍPIO DE MONDAÍ. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO PROVIDO. "No exercício da missão constitucional de prestar a jurisdição e resolver litígios, com frequência o Judiciário se defronta com o dilema de ter que sopesar princípios de direito em conflito. Cumpre-lhe optar por aquele de 'maior peso diante das circunstâncias concretas' (Humberto Bergmann Ávila); na ponderação, 'deve sempre levar em conta o princípio da dignidade humana, valor máximo da tábua axiológica da Constituição da República' (Alexandre Freitas Câmara). No expressivo dizer do Ministro Celso de Mello, 'a destinação de recursos públicos, sempre tão dramaticamente escassos, faz instaurar situações de conflito, quer com a execução de políticas públicas definidas no texto constitucional, quer, também, com a própria implementação de direitos sociais assegurados pela Constituição da República, daí resultando contextos de antagonismo que impõem, ao Estado, o encargo de superá-los mediante opções por determinados valores, em detrimento de outros igualmente relevantes, compelindo, o Poder Público, em face dessa relação dilemática, causada pela insuficiência de disponibilidade financeira e orçamentária, a proceder a verdadeiras 'escolhas trágicas' em decisão governamental cujo parâmetro, fundado na dignidade da pessoa humana, deverá ter em perspectiva a intangibilidade do mínimo existencial, em ordem a conferir real efetividade às normas programáticas positivadas na própria Lei Fundamental. Magistério da doutrina. A cláusula da reserva do possível - que não pode ser invocada, pelo Poder Público, com o propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição - encontra insuperável limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que representa, no contexto de nosso ordenamento positivo, emanação direta do postulado da essencial dignidade da pessoa humana. [...] A noção de 'mínimo existencial', que resulta, por implicitude, de determinados preceitos constitucionais (CF, art. 1º, III, e art. 3º, III), compreende um complexo de prerrogativas cuja concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, em ordem a assegurar, à pessoa, acesso efetivo ao direito geral de liberdade e, também, a prestações positivas originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o direito à educação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente, o direito à saúde, o direito à assistência social, o direito à moradia, o direito à alimentação e o direito à segurança' (AgRgRE n. 639.337). De ordinário, apenas quando comprometido esse 'mínimo existencial' será permitido ao Poder Judiciário impor ao Poder Executivo a implementação de ações administrativas. A cláusula da 'reserva do possível' somente pode ser ignorada se necessário para evitar a 'aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade'. À luz dessa premissa, é forçoso reconhecer que não deve subsistir decisão que obriga o Estado a manter em hospital, 'durante 24 horas dos 7 dias da semana, ao menos um médico pediatra e um plantonista no setor de urgência e emergência, sem que para tanto sejam utilizados médicos dos demais setores', notadamente se admitido pelo juiz que para resolução é imprescindível a realização de prova pericial" (AI n. 2011.061320-3, Des. Newton Trisotto). Também não pode subsistir decisão antecipatória da tutela - proferida em ação civil pública aforada pelo Ministério Público - que impõe ao Estado a obrigação de em 60 (sessenta) dias nomear "pelo menos 6 (seis) Policiais Militares e 4 (quatro) Policiais Civis, todos integrantes do quadro de servidores das Polícias Civil e Militar do Estado de Santa Catarina, para que passem a desempenhar suas funções de forma exclusiva na Comarca de Mondaí". (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2012.081595-8, de Mondaí, rel. Des. Newton Trisotto, Primeira Câmara de Direito Público, j. 10-09-2013).
Data do Julgamento
:
10/09/2013
Classe/Assunto
:
Primeira Câmara de Direito Público
Órgão Julgador
:
Rogério Carlos Demarchi
Relator(a)
:
Newton Trisotto
Comarca
:
Mondaí
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