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Jurisprudência


TJSC 2013.011168-8 (Acórdão)

Ementa
DIREITO DE FAMÍLIA. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. AÇÕES CONEXAS. JULGAMENTO CONJUNTO. AÇÃO CAUTELAR DE BUSCA E APREENSÃO, AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR E AÇÃO DECLARATÓRIA DE ANULAÇÃO DE REGISTRO CIVIL AFORADAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL EM RAZÃO DA OCORRÊNCIA DE 'ADOÇÃO À BRASILEIRA'. DEMANDA DE GUARDA DEFLAGRADA PELA AVÓ MATERNA. PRELIMINAR DE NULIDADE DO ATO SENTENCIAL. CARÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO E OFENSA AO ART. 93, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INOCORRÊNCIA. NULIDADE ARREDADA. A sentença é um discurso de lógica jurídica, pelo que a sua motivação pode ser sucinta ou mesmo equivocada, o que não a torna inválida. Suficiente, para a validade e eficácia do ato decisório é que, ao solucionar o conflito de interesses, o julgador deixe evidenciadas as razões do seu convencimento. Tendo a sentença invectivada analisado as questões suscitadas e estando ela suficientemente fundamentada para os fins dos arts. 93, inc. IX, da Constituição da República, 165 e 458, II, do Código de Processo Civil, não se pode pretendê-la nula. DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. NEONATA PREMATURA EXTREMA. NASCIMENTO NA TRIGÉSIMA SEMANA DE GESTAÇÃO, PESANDO CERCA DE 1.400 (MIL E QUATROCENTOS) GRAMAS. INTERNAÇÃO DA MENOR EM UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA NEONATAL (UTI). AVÓ MATERNA QUE BUSCA AUXÍLIO COM MÉDICO PEDIATRA EM CUJA CLÍNICA LABORAVA COMO AUXILIAR DE SERVIÇOS GERAIS. REGISTRO DA MENOR EM NOME DO MÉDICO E INCLUSÃO DA RECÉM NASCIDA NO PLANO DE SAÚDE DO PAI REGISTRAL. EMPENHO DO SUPOSTO PAI E RESPECTIVA ESPOSA NA PRESERVAÇÃO DA VIDA DA MENOR. CASAL QUE, PRECEDENTEMENTE AO NASCIMENTO DA MENOR, FREQÜENTARA PARTE DO CURSO DE PREPARAÇÃO À ADOÇÃO. MÃE BIOLÓGICA QUE PERMITIU QUE A FILHA FICASSE SOB A GUARDA E CUIDADOS DO MÉDICO E SUA ESPOSA PSICÓLOGA, MESMO APÓS A ALTA HOSPITALAR. PROPOSITURA DE AÇÃO DE ADOÇÃO PELA CONSORTE DO PAI REGISTRAL, COM A ANUÊNCIA DA MÃE BIOLÓGICA. VERSÃO INVERÍDICA DE CASO AMOROSO EXTRACONJUGAL ENTRE PAI REGISTRAL E A GERATRIZ. ATUAÇÃO MINISTERIAL QUE, EMBASADA NOS INDÍCIOS DE ADOÇÃO À BRASILEIRA, PROMOVE A BUSCA E APREENSÃO DA MENOR E SUA INCLUSÃO EM FAMÍLIA ACOLHEDORA POR BURLA AO CADASTRO NACIONAL DE PRETENDENTES HABILITADOS À ADOÇÃO. EXAME DE DNA EXCLUDENTE DA PATERNIDADE REGISTRAL. ARREPENDIMENTO DA GERATRIZ QUE, NA IMINÊNCIA DE VER ROMPIDOS EM DEFINITIVO OS LAÇOS COM A FILHA MENOR, MANIFESTA DESEJO DE REAVÊ-LA. AVÓ MATERNA QUE TAMBÉM PERSEGUE A GUARDA DA NETA A FIM DE IMPEDIR SUA ENTREGA À FAMÍLIA SUBSTITUTA EM ADOÇÃO. MENOR QUE, EMBORA SOB A GUARDA ILEGAL DE TERCEIROS, MANTINHA CONTATO COM A FAMÍLIA NATURAL. PREFERÊNCIA LEGISLATIVA CONTEMPORÂNEA DE MANUTENÇÃO DOS FILHOS MENORES NO SEIO DA FAMÍLIA NATURAL OU EXTENSA, SALVO ABSOLUTA IMPOSSIBILIDADE. MEDIDA DESTITUTÓRIA QUE NÃO PODE OSTENTAR CARÁTER PUNITIVO DOS EQUÍVOCOS MATERNOS EM RELAÇÃO AO DESTINO DA PROLE, MAS SIM ESSENCIALMENTE PROTETIVO DOS INTERESSES DA INCAPAZ, VISANDO PRESERVAR O SEU BEM ESTAR, DESENVOLVIMENTO E INTEGRIDADE FÍSICA E PSÍQUICA. CIRCUNSTÂNCIAS SUBJACENTES QUE MILITAM EM FAVOR DA VERSÃO FORNECIDA PELOS ENVOLVIDOS, RETRATANDO O DESESPERO COM A SITUAÇÃO DA SAÚDE DA MENOR E O ENVOLVIMENTO EMOCIONAL GRADATIVO DO MÉDICO E SUA ESPOSA COM A SITUAÇÃO DA MENINA. INTERVENÇÃO DO PEDIATRA QUE, EMBORA ILEGAL E REPREENSÍVEL DO PONTO DE VISTA JURÍDICO, POTENCIALMENTE CONTRIBUIU PARA A SOBREVIVÊNCIA DA RECÉM-NASCIDA, PARA O SEU BEM-ESTAR E RECUPERAÇÃO. FAMÍLIA NUCLEAR COMPOSTA PELA AVÓ MATERNA, PELA GENITORA E POR DUAS IRMÃS CONSANGUÍNEAS. INDICATIVOS DE UM NÚCLEO FAMILIAR ESTRUTURADO E QUE, MESMO NA CARÊNCIA DE RECURSOS, DESEMPENHA, A CONTENTO, OS DEVERES FAMILIARES EM RELAÇÃO ÀS DUAS IRMÃS MAIS VELHAS DA MENOR. FALÊNCIA FAMILIAR E IMPOSSIBILIDADE ABSOLUTA DE PERMANÊNCIA DA MENOR NA FAMÍLIA NATURAL NÃO VERIFICADAS. APELO DA GENITORA PROVIDO. 1 Sob o império do regramento positivado pela novel Lei Nacional de Convivência Familiar - Lei n. 12.010/09 - a intervenção do Estado nas relações familiares há que ser prioritariamente voltada à orientação, apoio e promoção social da família natural, junto à qual a criança e o adolescente devem permanecer, salvo absoluta impossibilidade (art. 1.º, §1.º). É de incumbência do Magistrado o dever de decidir, em cada caso concreto, em atenção ao melhor interesse da criança, de modo que modificações na guarda ou poder familiar se concretizem sempre, e tão-somente, nas hipóteses em que avulta ofensa ou agressão a direito fundamental do infante, com vistas a preservar seu desenvolvimento físico, psíquico e emocional, desde que já esgotadas ou inexistentes as possibilidades de convívio do incapaz com sua família natural ou extensa. 2 Conquanto imperativas as regras do Estatuto da Criança e do Adolescente que vedam aos pais a entrega direta dos filhos aos cuidados de pessoa específica, em burla à prévia inscrição e segundo a ordem cronológica do Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo (CUIDA ou CNCAA), os Tribunais pátrios têm atentado para as peculiaridades e excepcionalidades de cada caso, lançando sobre as relações de família um olhar mais sensível e humano, consentâneo com o escopo primário da ação estatal na seara da infância e juventude, que é exclusivamente a promoção e proteção dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes. 3 Inexistindo exposição da menor a situação de risco ou ofensa a direito fundamental seu, inviabiliza-se o rompimento definitivo dos seus vínculos consanguíneos com a mãe biológica, com as irmãs e com a avó materna, mormente quando manifesto o arrependimento maternal em relação à entrega da filha aos cuidados de terceiros, médico pediatra e sua esposa psicóloga, quando o contexto fático delineado nos autos demonstra, satisfatoriamente, que tal medida foi tomada no interesse da saúde e bem estar da menor, aliado ao fato de que a família natural apresenta condições de receber e educar a menor. Em tal contexto, há que se prestigiar o estreitamento dos laços familiares como medida que melhor atende aos interesses da infante, emprestando-se plena efetividade às disposições legais que priorizam a manutenção da criança no seio de sua família nuclear. (TJSC, Apelação Cível n. 2013.011168-8, de Brusque, rel. Des. Trindade dos Santos, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 11-07-2013).

Data do Julgamento : 11/07/2013
Classe/Assunto : Segunda Câmara de Direito Civil
Órgão Julgador : Maria Augusta Tridapalli
Relator(a) : Trindade dos Santos
Comarca : Brusque
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