main-banner

Jurisprudência


TJSC 2013.019747-5 (Acórdão)

Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL. TORTURA CASTIGO. VÍTIMA CRIANÇA. LEI N. 9.455/97, ART. 1.º, II, C/C § 4.º, II. CONDENAÇÃO. RECURSO DEFENSIVO. ABSOLVIÇÃO. AUSÊNCIA DE DOLO GENÉRICO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA INTENÇÃO DE CAUSAR INTENSO SOFRIMENTO À VÍTIMA. CONDUTA QUE NÃO SE AMOLDA AO CRIME DE TORTURA. CONFIGURAÇÃO, CONTUDO, DO CRIME DE CÁRCERE PRIVADO. GRAVE SOFRIMENTO FÍSICO E MORAL IMPOSTO À VÍTIMA. CÓDIGO PENAL, ART. 148, § 1.º, I e IV. SITUAÇÃO MAIS BENÉFICA À RÉ. DESCLASSIFICAÇÃO EX OFFICIO. 1 Para a configuração do crime de tortura, faz-se necessária a prova do elemento subjetivo genérico (vontade de causar intenso sofrimento) e do elemento subjetivo específico (conduta praticada como forma de aplicar castigo ou medida preventiva). In casu, apesar de demonstradas a materialidade e a autoria delitivas, bem como o elemento subjetivo específico (impor castigo ao filho), inexistem provas de que a ré agiu com o dolo de submeter a vítima a intenso sofrimento físico ou mental, razão pela qual não pode ser condenada pelo crime previsto no art. 1.º, II, combinado com o seu § 4.º, II, da Lei n. 9.455/97. 2 Se, por outro lado, existirem provas suficientes de que a ré mantinha o filho em cárcere privado, trancado no quarto, sozinho, sem comida e com apenas um pote para fazer as necessidades fisiológicas, impedindo-o, até mesmo, de frequentar a escola, a conduta se subsome ao crime previsto no art. 148, § 1.º, I e IV, do Código Penal, devendo-se realizar a desclassificação de ofício, já que caracteriza situação mais benéfica à acusada. DESCLASSIFICAÇÃO. CRIME DE MAUS TRATOS. CÓDIGO PENAL, ART. 136. INVIABILIDADE. CRIME NÃO DESCRITO NA DENÚNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE, ADEMAIS, NÃO É SUFICIENTE PARA A DEMONSTRAÇÃO DESSE DELITO. Não estando o delito de maus tratos (CP, art. 136) descrito na denúncia não há como proceder-se à desclassificação. In casu, ainda, há que se ponderar que o acervo probatório não é suficiente para a demonstração dessa infração penal, restando, contudo, a comprovação do crime de cárcere privado (CP, art. 148, § 1.º, I e IV). DOSIMETRIA. PENA-BASE. PERSONALIDADE NÃO VALORADA PARA O AUMENTO DA REPRIMENDA. MOTIVOS E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME QUE NÃO PERMITEM A FIXAÇÃO DA PENA BASILAR ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CONSEQUÊNCIAS DO DELITO QUE, NO ENTANTO, MOSTRARAM-SE DESFAVORÁVEIS. 1 Se o magistrado reconhece, expressamente, a inexistência de provas para a aferição da personalidade da ré, não há falar em exclusão de aumento decorrente desta circunstância judicial. 2 Quando o conjunto probatório demonstra que a ré, embora de forma totalmente equivocada, praticou o crime de cárcere privado contra seu filho no intuito de prevenir que ele fosse molestado sexualmente na escola, os motivos do delito não servem para a exasperação da pena basilar. 3 Desclassificada a conduta para o crime de cárcere privado, a circunstância de a vítima ter sido enclausurada não remanesce como fundamento para a fixação da pena-base acima do mínimo legal. 4 In casu, as consequências do delito mostraram-se desfavoráveis, visto que a vítima era pessoa em estado especial de desenvolvimento (dez anos de idade) e a privação de sua liberdade acarretou prejuízos em sua formação intelectual, pois foi impedida de frequentar a escola. REGIME PRISIONAL. QUANTUM DE PENA INFERIOR A 4 ANOS. RÉ PRIMÁRIA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS NA MAIORIA FAVORÁVEIS. ESTABELECIMENTO DO REGIME ABERTO. Tratando-se de condenação à pena de 2 anos de reclusão pela prática do crime de cárcere privado (CP, art. 148, § 1.º, I e IV), não se verifica a necessidade de fixação de regime prisional diferente do aberto quando a ré é primária e as circunstâncias judiciais, em sua maioria, são favoráveis. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. PENA INFERIOR A 4 ANOS. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS NA MAIORIA FAVORÁVEIS. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS DO ART. 44 DO CÓDIGO PENAL. BENESSE CONCEDIDA. Preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, a acusada faz jus à substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA O CRIME DE CÁRCERE PRIVADO (CP, ART. 148, § 1.º, I e IV) E SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS REALIZADAS DE OFÍCIO. (TJSC, Apelação Criminal n. 2013.019747-5, de Tubarão, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, Quarta Câmara Criminal, j. 07-08-2014).

Data do Julgamento : 07/08/2014
Classe/Assunto : Quarta Câmara Criminal
Órgão Julgador : Elleston Lissandro Canali
Relator(a) : Roberto Lucas Pacheco
Comarca : Tubarão
Mostrar discussão