TJSC 2013.033055-6 (Acórdão)
RESPONSABILIDADE OBRIGACIONAL. SEGURO HABITACIONAL (SFH). PLEITO ACOLHIDO. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES. 1 AGRAVO RETIDO ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. SEGURADORA DEMANDADA QUE NÃO MAIS OPERA NA MODALIDADE DE SEGURO TRATADA NOS AUTOS. IRRELEVÂNCIA NA HIPÓTESE. Coincidente a gênese do sinistro que afeta o imóvel popular do qual é proprietário o autor com o período em que a acionada à época em que a demandada era a responsável pelo respectivo seguro habitacional, cujos prêmios foram por ela recebidos, a sua posterior substituição como seguradora líder dessa modalidade securitária não tem o condão de liberá-la da obrigação de arcar com a reparação dos prejuízos sofridos pelo mutuário. CONDIÇÃO DE SEGURADO DO AUTOR. FALTA DE COMPROVAÇÃO. IMÓVEL QUITADO. CIRCUNSTÂNCIA QUE NÃO ARREDA A LEGITIMAÇÃO DO POSTULANTE PARA A CAUSA. Em tema de seguro habitacional, a quitação do imóvel segurado não implica na isenção do dever de prestar ao mutuário a indenização pelos danos físicos que assolam a construção, quando esses danos remontam à data da própria contratação do mútuo. PRESCRIÇÃO. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. MOMENTO DA ECLOSÃO DOS DANOS. PROGRESSIVIDADE DOS MESMOS. INVIABILIDADE DE PRECISÃO DO DIES A QUO DO INÍCIO DA FLUÊNCIA DO PRAZO PARA O EXERCÍCIO DA AÇÃO. Os danos físicos que se instalam em imóveis populares financiados pelo Sistema Financeiro da Habitação, decorrem, de regra, de uma concepção arquitetônica equivocada, de uma execução deficiente e do emprego de materiais de péssima qualidade. Isso gera um resultado inevitável: a deterioração dia a dia do bem, por se tratarem de danos essencialmente progressivos e que variam com o passar do tempo, numa verdadeira sequência. Dessa forma, não há que se cogitar da ocorrência do sinistro como dies a quo da contagem do prazo de prescrição, vez que, sendo os danos contínuos e permanentes, não há como se adotar um fato isolado e precisar uma data correta para a instalação do lapso prescritivo. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. 2 APELAÇÃO CÍVEL DA SEGURADORA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA A CAUSA. PRETENSÃO REJEITADA. 2.1 Celebrado o contrato de mútuo precedentemente à 2 de dezembro de 1988, data da edição da Lei n.º 7.682/1988, excluído fica qualquer interesse jurídico da Caixa Econômica Federal, a autorizar o deslocamento da competência para a Justiça Federal, para o julgamento de causa versante sobre responsabilidade obrigacional de seguradora habitacional em ressarcir os gastos tidos com a recuperação dos vícios construtivos que comprometem a estrutura de imóvel popular financiado com recursos do Sistema Financeiro da Habitação. É que, de acordo com a orientação contida no acórdão proferido, pelo Superior Tribunal de Justiça, nos Embargos de Declaração nos Embargos de Declaração no Recurso Especial n.º 1.091.393/SC, ao qual foi atribuída a condição de representativo de controvérsia repetitiva, é pressuposto essencial à possibilidade jurídica do reconhecimento de interesse da instituição financeira estatal que os contratos de mútuo habitacional tenham sido ajustados no período compreendido entre a edição da Lei n.º 7.682/1988 e à da Medida Provisória n.º 478/2009, ou seja, entre 2 de dezembro de 1988 e 29 de dezembro de 2009. 2.2 O mero fato de a apólice de seguro habitacional estar vinculada a contrato averbado na Apólice Pública do SF/SFH - Ramo 66 -, não justifica o ingresso da Caixa Econômica Federal em ação movida com fulcro em tal apólice por mutuário do Sistema Financeiro de Habitação contra a respectiva companhia de seguros, em se tratando de contrato anterior a 2 de dezembro de 1988. 2.3 É de pronto aplicável, não dependendo, pois, do trânsito em julgado do acórdão proferido em Recurso Especial submetido à disciplina do art. 543-C, do Código de Processo Civil, a tese jurídica nele esposada. 2.4 Em seu art. 87, encampou o nosso Código de Processo Civil o princípio da 'perpetuatio iurisdictionis', segundo o qual é a data da propositura da ação que demarca a competência do órgão jurisdicional para o seu processamento e julgamento, competência essa que, a partir daí, torna-se imutável. Assim, posteriores alterações legislativas somente influenciarão nessa imutabilidade, quando implicarem em extinção do órgão julgador ou na hipótese de modificarem a competência em razão da matéria ou da hierarquia. E o princípio da estabilização da jurisdição, resta ver, integra o do juiz natural, cuja não violação é abrangida na garantia constitucional apregoada pelo art. 5.º, XXXVII, da Constituição Federal. 2.5 A Medida Provisória n.º 513/2010, convertida na Lei n.º 12.409/2011, tem a contaminá-la aparentes inconstitucionalidades, porquanto, além de afrontar o princípio da moralidade, por transferir aos cofres públicos a responsabilidade de débitos e obrigações contraídas por entes privados - as seguradoras habitacionais -, colide acintosamente com a expressa vedação contida no art. 62, inc. I, alínea 'b', da nossa Lei Máxima, ao tratar de normas de direito processual civil. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. Pacífico o entendimento segundo o qual plenamente aplicável o Código de Defesa do Consumidor às causas envolvendo o seguro dos imóveis adquiridos por meio do Sistema Financeiro de Habitação. DANOS NO IMÓVEL FINANCIADO. LIGAÇÃO A VÍCIOS CONSTRUTIVOS. PERÍCIA CONTUNDENTE A RESPEITO. OBRIGAÇÃO INDENIZATÓRIA DA SEGURADORA ACIONADA ESCORREITA. Estabelecida, de modo incontroverso, pela perícia levada a cabo no processo, a vinculação entre os danos que comprometem a estrutura do imóvel segurado e a concepção arquitetônica equivocada do mesmo, aliada ao uso de materiais de duvidosa qualidade e a incorretezas primárias na execução da construção, vícios esses com origem, pois, na própria edificação do bem, sem que esteja peremptoriamente excluído o risco de seu desmoronamento, não há como se emprestar prevalência à cláusula contratual que particulariza os riscos cobertos. No âmbito do seguro habitacional, prevalece o princípio do risco integral, com a proteção de um interesse maior resultante da segurança dos ocupantes do imóvel, segurança essa que é a razão de ser dessa espécie de seguro. Assim, ainda que decorrentes os danos constatados de vícios de construção, inquestionável é o dever de prestação da cobertura securitária avençada. EXCLUSÃO DO VALOR RESSARCITÓRIO DOS ACRÉSCIMOS REFERENTES A BONIFICAÇÕES/BENEFÍCIOS E DESPESAS INDIRETAS (BDI) E ENCARGOS SOCIAIS. INVIABILIDADE. Legítimos e justos são os acréscimos feitos sobre o valor indenizatório apurado pericialmente do referencial denominado "Bonificações/Benefícios e Despesas Indiretas" (BDI) e de Encargos Sociais, pois, em que pese não haver nos autos prova contundente de haver o mutuário, quando da realização da reforma por ele promovida com a finalidade de evitar maiores danos ao imóvel de sua propriedade, tenha efetivamente despendido tais verbas, a presunção do desembolso é razoável, coerente e, até, lógica, além do que não é crível impor ao segurado a obrigação de reter, por vários anos, os documentos pertinentes ao custo global da reforma então procedida. RECLAMO APELATÓRIO DESPROVIDO. 3 APELAÇÃO CÍVEL DO AUTOR MULTA DECENDIAL. IMPORTE DE 2% SOBRE O VALOR DA INDENIZAÇÃO. PREVISÃO CONTRATUAL EXPRESSA. INCIDÊNCIA, NO ENTANTO, A PARTIR DO TRIGÉSIMO DIA APÓS A CITAÇÃO DA DEMANDADA. MANIFESTAÇÃO RECURSAL ACOLHIDA. SENTENÇA, NESSE ASPECTO, REFORMADA. Prevista contratualmente a incidência de multa decendial para a hipótese de falta de pagamento da indenização securitária, é ela contabilizada a contar do trigésimo dia após a citação inicial da seguradora acionada, incidindo sobre o valor da indenização, observados, todavia, os limites impostos pelo art. 412 do Código Civil. (TJSC, Apelação Cível n. 2013.033055-6, de Joinville, rel. Des. Trindade dos Santos, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 03-10-2013).
Ementa
RESPONSABILIDADE OBRIGACIONAL. SEGURO HABITACIONAL (SFH). PLEITO ACOLHIDO. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES. 1 AGRAVO RETIDO ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. SEGURADORA DEMANDADA QUE NÃO MAIS OPERA NA MODALIDADE DE SEGURO TRATADA NOS AUTOS. IRRELEVÂNCIA NA HIPÓTESE. Coincidente a gênese do sinistro que afeta o imóvel popular do qual é proprietário o autor com o período em que a acionada à época em que a demandada era a responsável pelo respectivo seguro habitacional, cujos prêmios foram por ela recebidos, a sua posterior substituição como seguradora líder dessa modalidade securitária não tem o condão de liberá-la da obrigação de arcar com a reparação dos prejuízos sofridos pelo mutuário. CONDIÇÃO DE SEGURADO DO AUTOR. FALTA DE COMPROVAÇÃO. IMÓVEL QUITADO. CIRCUNSTÂNCIA QUE NÃO ARREDA A LEGITIMAÇÃO DO POSTULANTE PARA A CAUSA. Em tema de seguro habitacional, a quitação do imóvel segurado não implica na isenção do dever de prestar ao mutuário a indenização pelos danos físicos que assolam a construção, quando esses danos remontam à data da própria contratação do mútuo. PRESCRIÇÃO. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. MOMENTO DA ECLOSÃO DOS DANOS. PROGRESSIVIDADE DOS MESMOS. INVIABILIDADE DE PRECISÃO DO DIES A QUO DO INÍCIO DA FLUÊNCIA DO PRAZO PARA O EXERCÍCIO DA AÇÃO. Os danos físicos que se instalam em imóveis populares financiados pelo Sistema Financeiro da Habitação, decorrem, de regra, de uma concepção arquitetônica equivocada, de uma execução deficiente e do emprego de materiais de péssima qualidade. Isso gera um resultado inevitável: a deterioração dia a dia do bem, por se tratarem de danos essencialmente progressivos e que variam com o passar do tempo, numa verdadeira sequência. Dessa forma, não há que se cogitar da ocorrência do sinistro como dies a quo da contagem do prazo de prescrição, vez que, sendo os danos contínuos e permanentes, não há como se adotar um fato isolado e precisar uma data correta para a instalação do lapso prescritivo. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. 2 APELAÇÃO CÍVEL DA SEGURADORA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA A CAUSA. PRETENSÃO REJEITADA. 2.1 Celebrado o contrato de mútuo precedentemente à 2 de dezembro de 1988, data da edição da Lei n.º 7.682/1988, excluído fica qualquer interesse jurídico da Caixa Econômica Federal, a autorizar o deslocamento da competência para a Justiça Federal, para o julgamento de causa versante sobre responsabilidade obrigacional de seguradora habitacional em ressarcir os gastos tidos com a recuperação dos vícios construtivos que comprometem a estrutura de imóvel popular financiado com recursos do Sistema Financeiro da Habitação. É que, de acordo com a orientação contida no acórdão proferido, pelo Superior Tribunal de Justiça, nos Embargos de Declaração nos Embargos de Declaração no Recurso Especial n.º 1.091.393/SC, ao qual foi atribuída a condição de representativo de controvérsia repetitiva, é pressuposto essencial à possibilidade jurídica do reconhecimento de interesse da instituição financeira estatal que os contratos de mútuo habitacional tenham sido ajustados no período compreendido entre a edição da Lei n.º 7.682/1988 e à da Medida Provisória n.º 478/2009, ou seja, entre 2 de dezembro de 1988 e 29 de dezembro de 2009. 2.2 O mero fato de a apólice de seguro habitacional estar vinculada a contrato averbado na Apólice Pública do SF/SFH - Ramo 66 -, não justifica o ingresso da Caixa Econômica Federal em ação movida com fulcro em tal apólice por mutuário do Sistema Financeiro de Habitação contra a respectiva companhia de seguros, em se tratando de contrato anterior a 2 de dezembro de 1988. 2.3 É de pronto aplicável, não dependendo, pois, do trânsito em julgado do acórdão proferido em Recurso Especial submetido à disciplina do art. 543-C, do Código de Processo Civil, a tese jurídica nele esposada. 2.4 Em seu art. 87, encampou o nosso Código de Processo Civil o princípio da 'perpetuatio iurisdictionis', segundo o qual é a data da propositura da ação que demarca a competência do órgão jurisdicional para o seu processamento e julgamento, competência essa que, a partir daí, torna-se imutável. Assim, posteriores alterações legislativas somente influenciarão nessa imutabilidade, quando implicarem em extinção do órgão julgador ou na hipótese de modificarem a competência em razão da matéria ou da hierarquia. E o princípio da estabilização da jurisdição, resta ver, integra o do juiz natural, cuja não violação é abrangida na garantia constitucional apregoada pelo art. 5.º, XXXVII, da Constituição Federal. 2.5 A Medida Provisória n.º 513/2010, convertida na Lei n.º 12.409/2011, tem a contaminá-la aparentes inconstitucionalidades, porquanto, além de afrontar o princípio da moralidade, por transferir aos cofres públicos a responsabilidade de débitos e obrigações contraídas por entes privados - as seguradoras habitacionais -, colide acintosamente com a expressa vedação contida no art. 62, inc. I, alínea 'b', da nossa Lei Máxima, ao tratar de normas de direito processual civil. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. Pacífico o entendimento segundo o qual plenamente aplicável o Código de Defesa do Consumidor às causas envolvendo o seguro dos imóveis adquiridos por meio do Sistema Financeiro de Habitação. DANOS NO IMÓVEL FINANCIADO. LIGAÇÃO A VÍCIOS CONSTRUTIVOS. PERÍCIA CONTUNDENTE A RESPEITO. OBRIGAÇÃO INDENIZATÓRIA DA SEGURADORA ACIONADA ESCORREITA. Estabelecida, de modo incontroverso, pela perícia levada a cabo no processo, a vinculação entre os danos que comprometem a estrutura do imóvel segurado e a concepção arquitetônica equivocada do mesmo, aliada ao uso de materiais de duvidosa qualidade e a incorretezas primárias na execução da construção, vícios esses com origem, pois, na própria edificação do bem, sem que esteja peremptoriamente excluído o risco de seu desmoronamento, não há como se emprestar prevalência à cláusula contratual que particulariza os riscos cobertos. No âmbito do seguro habitacional, prevalece o princípio do risco integral, com a proteção de um interesse maior resultante da segurança dos ocupantes do imóvel, segurança essa que é a razão de ser dessa espécie de seguro. Assim, ainda que decorrentes os danos constatados de vícios de construção, inquestionável é o dever de prestação da cobertura securitária avençada. EXCLUSÃO DO VALOR RESSARCITÓRIO DOS ACRÉSCIMOS REFERENTES A BONIFICAÇÕES/BENEFÍCIOS E DESPESAS INDIRETAS (BDI) E ENCARGOS SOCIAIS. INVIABILIDADE. Legítimos e justos são os acréscimos feitos sobre o valor indenizatório apurado pericialmente do referencial denominado "Bonificações/Benefícios e Despesas Indiretas" (BDI) e de Encargos Sociais, pois, em que pese não haver nos autos prova contundente de haver o mutuário, quando da realização da reforma por ele promovida com a finalidade de evitar maiores danos ao imóvel de sua propriedade, tenha efetivamente despendido tais verbas, a presunção do desembolso é razoável, coerente e, até, lógica, além do que não é crível impor ao segurado a obrigação de reter, por vários anos, os documentos pertinentes ao custo global da reforma então procedida. RECLAMO APELATÓRIO DESPROVIDO. 3 APELAÇÃO CÍVEL DO AUTOR MULTA DECENDIAL. IMPORTE DE 2% SOBRE O VALOR DA INDENIZAÇÃO. PREVISÃO CONTRATUAL EXPRESSA. INCIDÊNCIA, NO ENTANTO, A PARTIR DO TRIGÉSIMO DIA APÓS A CITAÇÃO DA DEMANDADA. MANIFESTAÇÃO RECURSAL ACOLHIDA. SENTENÇA, NESSE ASPECTO, REFORMADA. Prevista contratualmente a incidência de multa decendial para a hipótese de falta de pagamento da indenização securitária, é ela contabilizada a contar do trigésimo dia após a citação inicial da seguradora acionada, incidindo sobre o valor da indenização, observados, todavia, os limites impostos pelo art. 412 do Código Civil. (TJSC, Apelação Cível n. 2013.033055-6, de Joinville, rel. Des. Trindade dos Santos, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 03-10-2013).
Data do Julgamento
:
03/10/2013
Classe/Assunto
:
Segunda Câmara de Direito Civil
Órgão Julgador
:
Gustavo Marcos de Farias
Relator(a)
:
Trindade dos Santos
Comarca
:
Joinville
Mostrar discussão