TJSC 2013.038905-4 (Acórdão)
ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESSARCIMENTO DE DANOS MATERIAIS (EMERGENTES E PENSIONAMENTO MENSAL), ESTÉTICO E MORAL. CONCESSÃO APENAS DESTE PLEITO, APESAR DO RECONHECIMENTO DO ILÍCITO. INSATISFAÇÃO DA SEGURADORA, QUE FOI ACIONADA AO LADO DA CULPADA, E DO AUTOR. AUSÊNCIA DE INSURGÊNCIA CONTRA O CAPÍTULO DA SENTENÇA QUE DELIBEROU SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL AQUILIANA. IMUTABILIDADE DA DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU, NO PONTO. AGRAVO RETIDO PELA SEGURADORA. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. CULPADA PELO INFORTÚNIO QUE É MULHER DO PROPRIETÁRIO DO BEM SEGURADO E CAUSADOR DO DANO. SUPOSTA AUSÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL ENTRE ELA E A SEGURADORA. EFEITOS DA RELATIVIDADE SUBJETIVA DO CONTRATO. TESES AFASTADAS. SOLIDARIEDADE DA CONDUTORA DO AUTOMÓVEL (RESPONSABILIDADE AQUILIANA) E DO PROPRIETÁRIO (CULPA IN ELIGENDO E IN VIGILANDO, AMBAS ASSOCIADAS AO DEVER DE GUARDA). PACTO DE SEGURO. ESTIPULAÇÃO DE VANTAGEM PECUNIÁRIA EM FAVOR DE TERCEIRO INICIALMENTE NÃO IDENTIFICADO, MAS IDENTIFICÁVEL POR OCASIÃO DO SINISTRO. NEGÓCIO QUE, EXCEPCIONALMENTE, AFASTA A INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA RELATIVIDADE SUBJETIVA DOS CONTRATOS. LIAME PRÁTICO-AXIOLÓGICO. PROCESSO QUE DEVE CONSTITUIR UM MEIO DE BUSCA DA EFETIVIDADE DO DIREITO MATERIAL EM DETRIMENTO DA INFLEXIBILIDADE DA FORMA. CONTRATO DE SEGURO EM NOVA ROUPAGEM TRAZIDA AO ORDENAMENTO JURÍDICO PELO CÓDIGO CIVIL. AJUSTE DE VERDADEIRA CORRESPONSABILIDADE ENTRE O SEGURADO E A SEGURADORA EM RELAÇÃO AOS DANOS CAUSADOS A TERCEIROS. POSSIBILIDADE, POR TODOS ESTES FATORES, DE SE ACIONAR DIRETAMENTE A SEGURADORA. QUESTÃO, ALIÁS, RESOLVIDA PELO STJ À ÓTICA DOS RECURSOS REPETITIVOS. Para a pretensão de ressarcimento de danos oriundos de acidente de trânsito, a responsabilidade do condutor e a do proprietário do veículo é solidária. A primeira, de ordem delitual, ou de natureza extracontratual (aquiliana), pressupõe a comprovação inequívoca de culpa lato sensu. Já a segunda deflui do empréstimo do bem para terceiros e da má fruição/utilização da coisa. Trata-se, dentro da teoria do ilícito civil, de culpa nas modalidades in eligendo ou in vigilando. Em razão da solidariedade entre a condutora do veículo e o proprietário do bem segurado, a seguradora que garante o risco para este deve ressarcir os prejuízos advindos da má utilização do bem móvel por aquela. O seguro, modalidade contratual específica prevista em nosso ordenamento e de natureza bilateral, onerosa e aleatória, para que possa produzir os efeitos jurídicos desejados, deve se sujeitar aos pressupostos de validade que regem a teoria dos negócios jurídicos (art. 104 do CC) e aos mesmos princípios que tocam o direito contratual, tais como a autonomia da vontade, a liberdade e a função social do contrato, a equivalência das prestações, a supremacia da ordem pública e a obrigatoriedade dos contratos. Situado entre os princípios da autonomia de vontade e da obrigatoriedade dos contratos, com efeito, reside o princípio da relatividade subjetiva do contrato, que tem por sustentáculo a ideia que terceiros não envolvidos no negócio não se submetem aos seus efeitos. Significa dizer, em outras palavras, que o pacto não possui efeitos erga omnes, apenas inter partes. O contrato de seguro, não obstante, excepciona a incidência do princípio da relatividade subjetiva dos contratos. É que, através desta modalidade de negócio, a seguradora assume um risco futuro e incerto previamente estabelecido e, conquanto não se trate de pacto que aponte com precisão um terceiro beneficiário, como se dá com os seguros de vida, a negociação (seguro de dano) também traz a estipulação de uma vantagem - verdadeira garantia patrimonial - em relação a um terceiro que, embora indeterminado no momento da concretização do ajuste, por ocasião do sinistro vem a ser identificado. Como os negócios securitários, para resguardar a vida ou mesmo eventuais danos, não se encerram entre os contratantes, pois atingem os beneficiários, prévia ou posteriormente identificados, porque se trata de verdadeira estipulação em favor de terceiro, é plenamente possível que este, verdadeira vítima do acidente de trânsito, na forma prevista no parágrafo único do art. 436 do Código Civil, reclame os valores que lhes devidos diretamente da seguradora. O Julgador deve olhar para o processo como um mencanismo de verdadeira obtenção da Justiça e não como um fim em si mesmo ou um sistema de procedimentos irredutíveis e burocráticos gerados por uma Lei inacessível. Logo, deve ser permitido, em prol dos princípios da celeridade e economia processuais, pensamento este consentâneo à hermenêutica constitucional (art. 5º, inciso LXXVIII, da CF), que a seguradora seja diretamente acionada em ação de ressarcimento de danos advindos de acidente de trânsito causado por veículo cuja garantia estendeu. Em razão da nova roupagem trazida pelo Legislador em 2003 no novo Código Civil ao contrato de seguro, há, verdadeiramente, uma corresponsabilidade entre o segurado e a seguradora em relação aos danos causados a terceiros. O STJ decidiu, por ocasião do julgamento do REsp nº 925.130-SP, de relatoria do Min. Luis Felipe Salomão, em 08.02.2012, que, "para fins do art. 543-C do CPC, em ação de reparação de danos movida em face do segurado, a seguradora denunciada pode ser condenada direta e solidariamente junto com este a pagar a indenização devida à vítima, nos limites contratados na apólice". APELO DA SEGURADORA. EXCLUSÃO, NA APÓLICE, DO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E ESTÉTICO. VOTO, POR MAIORIA, VENCEDOR: CLÁUSULA RESTRITIVA REDIGIDA COM DESTAQUE NA APÓLICE. CONDIÇÃO LÍCITA. É válida a restrição, para o pagamento de indenização por dano moral e estético, contida na apólice securitária, se ela for redigida em destaque para o consumidor. VOTO VENCIDO DO RELATOR: PRETENSÃO NÃO ACOLHIDA EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO, DURANTE AS TRATATIVAS PRELIMINARES, QUE TAL RESTRIÇÃO FOI SUBMETIDA INEQUIVOCADAMENTE AO CONHECIMENTO PRÉVIO DO SEGURADO, QUE, SABE-SE, PORQUE DERIVA DA PRÁTICA VIL E COSTUMEIRA DOS CORRETORES DE SEGURO, APENAS RECEBE A APÓLICE E AS CONDIÇÕES GERAIS APÓS A CONCLUSÃO DO NEGÓCIO E, INCLUSIVE, DO PAGAMENTO DE ALGUMAS PARCELAS DO PRÊMIO. DANO MORAL, ADEMAIS, QUE SE INCLUI NO DANO CORPORAL, FIXADO, IN CASU, EM VALOR EXPRESSIVO. CONTRASSENSO, DIANTE DA AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO QUE O SEGURADO FOI ADEQUADAMENTE INFORMADO SOBRE TODAS AS NUANCES RESTRITIVAS DO NEGÓCIO, QUE SE RESOLVE RESTRITIVAMENTE E EM FAVOR DO CONSUMIDOR. EXEGESE DO CONTIDO NOS ARTS. 6º, INCISO III, E 47 DO CDC. Para que seja excluída a responsabilidade da seguradora ao pagamento de indenização por dano moral, deve a cláusula restritiva estar destacada na apólice, para possibilitar o conhecimento pelo segurado, e deve estar comprovada a anuência expressa do segurado no tocante a tal limitação. É um contrassenso pressupor em favor da seguradora, sabendo-se, de um lado, que os dano moral inclui-se no dano corporal, fixado na apólice em alta proporção, e, de outro, da grande concorrência em tal área do mercado e da prática vil e rotineira de oferta e contratação verbal por parte dos corretores para que, apenas mais tarde, o consumidor receba em sua residência as condições gerais do negócio e a respectiva apólice, apenas porque constou nesta a restrição de pagamento de dano moral, que dela o consumidor foi fielmente informado, tal qual exige, de forma adequada, clara e precisa, a legislação de consumo (art. 6, III, do CDC). Cláusulas ambíguas ou não submetidas ao conhecimento prévio do segurado devem ser interpretadas restritivamente e sempre de maneira mais favorável ao consumidor (art. 47 do CDC). O princípio da informação não foi trazido pelo Legislador para embelezar o ordenamento jurídico mas, sim, em virtude do constante favorecimento do fornecedor em detrimento dos consumidores. Há, então, diante da desigualdade e dos objetivos constitucionais a serem perseguidos (art. 5º, caput e XXXII, da CF e art. 4º, I, do CDC), a preemente necessidade de serem estes informados de forma iniludível e tal princípio básico, dentro da teoria do ônus probatório (art. 333 do CPC), nas relações de consumo, repassa o fardo de demonstração à seguradora (art 6º, VIII, do CDC). IMPRESCINDIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO DO DANO MORAL. PROPOSIÇÃO AFASTADA. RESPONSABILIDADE DO TRANSGRESSOR, EM ACIDENTE DE CIRCULAÇÃO, QUE SE OPERA PELA SIMPLES VIOLAÇÃO - DANUM IN RE IPSA. A concepção há muito predominante na doutrina e na jurisprudência orienta-se no sentido que a responsabilidade do transgressor, em acidente de circulação, opera-se pela simples violação. Trata-se, portanto, de danum in re ipsa, cuja necessidade de reparação deflui do próprio ato ilícito, o que afasta a alegada imperiosidade de demonstração do abalo anímico do ser. APELO DO AUTOR. INDENIZAÇÃO POR DANOS ESTÉTICOS. NÃO CONCESSÃO EM SENTENÇA. EQUIVOCO. FRATURA NO FÊMUR ESQUERDO QUE OCASIONA O ENCURTAMENTO DE 1 CM NA PERNA DA VÍTIMA. DEFORMAÇÃO, COM A PERDA DA CAPACIDADE DE DEAMBULAR NORMALMENTE, AINDA QUE ACEITÁVEL DO PONTO DE VISTA MÉDICO, QUE GERA O DEVER DE COMPENSAÇÃO. STATUS QUO ANTE QUE DEVE SER ALCANÇADO. Comprovado, por perícia médica judicial, que a vítima de acidente de trânsito, em razão da fratura no fêmur esquerdo que sofreu, apresentou encurtamento de 1 cm de sua perna e, em razão disso, perde a capacidade de deambular normalmente, o agente transgressor deve compensá-la patrimonialmente pelo dano estético sofrido, pois este se verifica a partir de quaisquer deformações anatômicas, em especial quando a alteração implica na perda da capacidade de deambulação, ainda que infimamente do ponto de vista médico, porquanto as questões afetas à intensidade e à profundidade do dano ligam-se apenas ao quantum debeatur da paga pecuniária a ser arbitrada. PENSIONAMENTO MENSAL. ALEGADA INCAPACIDADE LABORAL PLENA. VERBA NÃO CONCEDIDA. VÍTIMA QUE, NÃO OBSTANTE, EM RAZÃO DA FRATURA NO FÊMUR E CLAUDICAÇÃO À DEAMBULAÇÃO APRESENTADA NÃO PODE MAIS REALIZAR GRANDE ESFORÇO FÍSICO, COMO AQUELE EXIGIDO NO SEU OFÍCIO (SERRALHEIRO). REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA VERIFICADA. PENSIONAMENTO DEVIDO. APLICABILIDADE DO ART. 950 DO CC. INCIDÊNCIA, ADEMAIS, DO PRINCÍPIO DA RESTITUIÇÃO INTEGRAL. Resulta da Lei (art. 950 do CC), o pensionamento mensal oriundo de ato ilícito se dá quando do sinistro resulte incapacidade total da vítima para o desempenho do seu ofício, e não para todo e qualquer trabalho. Demonstrado que a vítima de acidente de trânsito encontra-se inapta ao seu trabalho, procede o pedido, fundado em incapacidade plena, de pensionamento mensal. A indenização por ato ilícito tem por desiderato recompor o estado anterior da vítima, de modo que o pensionamento mensal é devido se o ofendido não pode mais desempenhar o seu ofício, até porque, consoante entendimento do Tribunal da Cidadania, "o só fato de se presumir que a vítima de ato ilícito portadora de limitações está capacitada para exercer algum trabalho não exclui o pensionamento, pois a experiência mostra que o deficiente mercado de trabalho brasileiro é restrito mesmo quando se trata de pessoa sem qualquer limitação física" (REsp nº 899.869, rel. Min. Gomes de Barros, julgado em 23.02.2007). "Em se tratando de ato ilícito gerador de incapacidade para o trabalho, o salário a ser considerado para efeito de cálculos das verbas indenizatórias, deve ser aquele que o trabalhador recebia à época do evento" (STJ. REsp nº 240.246-RJ, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, julgado em 29.11.2005). INDENIZAÇÃO CALÇADA NA PERDA DA POSSIBILIDADE DE ABRIR UM NEGÓCIO PRÓPRIO. TEORIA, INSPIRADA NA DOUTRINA FRANCESA, DA PERDA DE UMA CHANCE. POSSIBILIDADE REAL E CONCRETA, ENTRETANTO, NÃO DEMONSTRADA. MERO ACONTECIMENTO EVENTUAL E FUTURO. INDENIZAÇÃO QUE NÃO SE FAZ DEVIDA. CHANCE NÃO PROSTRADA. A teoria da perda de uma chance, inspirada na doutrina francesa, traz em si a idéia que, praticado um ato ilícito por alguém, a vítima perde uma oportunidade de obter uma vantagem ou de afastar um prejuízo, ambas as situações dentro de um juízo de probabilidade e não de uma mera possibilidade. Trata-se, portanto, de teoria cuja efetiva aplicabilidade não admite conjecturas, de modo que o lesado, para auferir compensação pecuniária, deve demonstrar que, real e concretamente, perdeu uma boa chance. A alegação, calçada em acontecimento eventual e futuro que a vítima de acidente de trânsito poderia vir abrir um negócio próprio não fosse as lesões que sofreu, não enseja reparação calçada na teoria de uma chance, que deve ser, dentro de um juízo de probabilidade, real e certa. QUANTUM DEBEATUR DAS INDENIZAÇÕES POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. PAGA PECUNIÁRIA MAJORADA EM RELAÇÃO ÀQUELES E FIXADA, TAMBÉM DE ACORDO COM A EXTENSÃO DO DANO (ART. 944 DO CC), EM RELAÇÃO A ESTES. FUNÇÕES PEDAGÓGICA E COMPENSATÓRIA. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. Embora entregue ao livre arbítrio do Julgador (art. 944 do CC), já que não existem critérios objetivos em lei para o arbitramento do quantum indenizatório, alguns elementos devem ser ponderados em cada caso, a começar pelas funções que a paga pecuniária deve desempenhar, quais sejam, compensar a vítima, de certo modo, pela dor psíquica experimentada, e admoestar o agente causador do dano para que a prática ilícita não se reitere. Diversos critérios são esquadrinhados. As condições das partes são medidas, o seu nível social e grau de escolaridade são aquilatados, o prejuízo é mensurado, a intensidade do sofrimento e da culpa são verificados, etc. Todas estas balizadoras traçam uma verdadeira diretriz para que se possa arbitrar o quantum em respeito aos parâmetros de cada hipótese. JUROS DE MORA. ENCARGO QUE DEVE INCIDIR A PARTIR DA OCORRÊNCIA DO EVENTO DANOSO. APLICAÇÃO DA SUMULA Nº 54 DO STJ E DO ART. 398 DO CC. CORREÇÃO MONETÁRIA QUE FLUI A PARTIR DA DATA DA FIXAÇÃO DO VALOR EM CONDENAÇÃO. Tratando-se de ilícito gerador de dano moral, os juros de mora fluem a partir da ocorrência do evento danoso, consoante o enunciado da Súmula nº 54 do STJ e art. 398 do CC. A atualização monetária tem incidência a partir da data de fixação do valor estabelecido em condenação (Súmula nº 362 do STJ). IMPOSTO DE RENDA. AUSÊNCIA DE INCIDÊNCIA SOBRE VERBA DE CUNHO INDENIZATÓRIO. SÚMULA Nº 498 DO STJ. Não incide Imposto de Renda sobre indenização por danos morais e estéticos (Súmula nº 498 do STJ), visto que se trata de verba destinada a recuperar o patrimônio da vítima (status quo ante) e não de acréscimo patrimonial tributável. APELO DA SEGURADORA PARCIALMENTE PROVIDO, POR MAIORIA, VENCIDO, NO PONTO, O RELATOR. APELO DO AUTOR A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO, POR UNANIMIDADE. (TJSC, Apelação Cível n. 2013.038905-4, de Joinville, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 29-05-2014).
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ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESSARCIMENTO DE DANOS MATERIAIS (EMERGENTES E PENSIONAMENTO MENSAL), ESTÉTICO E MORAL. CONCESSÃO APENAS DESTE PLEITO, APESAR DO RECONHECIMENTO DO ILÍCITO. INSATISFAÇÃO DA SEGURADORA, QUE FOI ACIONADA AO LADO DA CULPADA, E DO AUTOR. AUSÊNCIA DE INSURGÊNCIA CONTRA O CAPÍTULO DA SENTENÇA QUE DELIBEROU SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL AQUILIANA. IMUTABILIDADE DA DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU, NO PONTO. AGRAVO RETIDO PELA SEGURADORA. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. CULPADA PELO INFORTÚNIO QUE É MULHER DO PROPRIETÁRIO DO BEM SEGURADO E CAUSADOR DO DANO. SUPOSTA AUSÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL ENTRE ELA E A SEGURADORA. EFEITOS DA RELATIVIDADE SUBJETIVA DO CONTRATO. TESES AFASTADAS. SOLIDARIEDADE DA CONDUTORA DO AUTOMÓVEL (RESPONSABILIDADE AQUILIANA) E DO PROPRIETÁRIO (CULPA IN ELIGENDO E IN VIGILANDO, AMBAS ASSOCIADAS AO DEVER DE GUARDA). PACTO DE SEGURO. ESTIPULAÇÃO DE VANTAGEM PECUNIÁRIA EM FAVOR DE TERCEIRO INICIALMENTE NÃO IDENTIFICADO, MAS IDENTIFICÁVEL POR OCASIÃO DO SINISTRO. NEGÓCIO QUE, EXCEPCIONALMENTE, AFASTA A INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA RELATIVIDADE SUBJETIVA DOS CONTRATOS. LIAME PRÁTICO-AXIOLÓGICO. PROCESSO QUE DEVE CONSTITUIR UM MEIO DE BUSCA DA EFETIVIDADE DO DIREITO MATERIAL EM DETRIMENTO DA INFLEXIBILIDADE DA FORMA. CONTRATO DE SEGURO EM NOVA ROUPAGEM TRAZIDA AO ORDENAMENTO JURÍDICO PELO CÓDIGO CIVIL. AJUSTE DE VERDADEIRA CORRESPONSABILIDADE ENTRE O SEGURADO E A SEGURADORA EM RELAÇÃO AOS DANOS CAUSADOS A TERCEIROS. POSSIBILIDADE, POR TODOS ESTES FATORES, DE SE ACIONAR DIRETAMENTE A SEGURADORA. QUESTÃO, ALIÁS, RESOLVIDA PELO STJ À ÓTICA DOS RECURSOS REPETITIVOS. Para a pretensão de ressarcimento de danos oriundos de acidente de trânsito, a responsabilidade do condutor e a do proprietário do veículo é solidária. A primeira, de ordem delitual, ou de natureza extracontratual (aquiliana), pressupõe a comprovação inequívoca de culpa lato sensu. Já a segunda deflui do empréstimo do bem para terceiros e da má fruição/utilização da coisa. Trata-se, dentro da teoria do ilícito civil, de culpa nas modalidades in eligendo ou in vigilando. Em razão da solidariedade entre a condutora do veículo e o proprietário do bem segurado, a seguradora que garante o risco para este deve ressarcir os prejuízos advindos da má utilização do bem móvel por aquela. O seguro, modalidade contratual específica prevista em nosso ordenamento e de natureza bilateral, onerosa e aleatória, para que possa produzir os efeitos jurídicos desejados, deve se sujeitar aos pressupostos de validade que regem a teoria dos negócios jurídicos (art. 104 do CC) e aos mesmos princípios que tocam o direito contratual, tais como a autonomia da vontade, a liberdade e a função social do contrato, a equivalência das prestações, a supremacia da ordem pública e a obrigatoriedade dos contratos. Situado entre os princípios da autonomia de vontade e da obrigatoriedade dos contratos, com efeito, reside o princípio da relatividade subjetiva do contrato, que tem por sustentáculo a ideia que terceiros não envolvidos no negócio não se submetem aos seus efeitos. Significa dizer, em outras palavras, que o pacto não possui efeitos erga omnes, apenas inter partes. O contrato de seguro, não obstante, excepciona a incidência do princípio da relatividade subjetiva dos contratos. É que, através desta modalidade de negócio, a seguradora assume um risco futuro e incerto previamente estabelecido e, conquanto não se trate de pacto que aponte com precisão um terceiro beneficiário, como se dá com os seguros de vida, a negociação (seguro de dano) também traz a estipulação de uma vantagem - verdadeira garantia patrimonial - em relação a um terceiro que, embora indeterminado no momento da concretização do ajuste, por ocasião do sinistro vem a ser identificado. Como os negócios securitários, para resguardar a vida ou mesmo eventuais danos, não se encerram entre os contratantes, pois atingem os beneficiários, prévia ou posteriormente identificados, porque se trata de verdadeira estipulação em favor de terceiro, é plenamente possível que este, verdadeira vítima do acidente de trânsito, na forma prevista no parágrafo único do art. 436 do Código Civil, reclame os valores que lhes devidos diretamente da seguradora. O Julgador deve olhar para o processo como um mencanismo de verdadeira obtenção da Justiça e não como um fim em si mesmo ou um sistema de procedimentos irredutíveis e burocráticos gerados por uma Lei inacessível. Logo, deve ser permitido, em prol dos princípios da celeridade e economia processuais, pensamento este consentâneo à hermenêutica constitucional (art. 5º, inciso LXXVIII, da CF), que a seguradora seja diretamente acionada em ação de ressarcimento de danos advindos de acidente de trânsito causado por veículo cuja garantia estendeu. Em razão da nova roupagem trazida pelo Legislador em 2003 no novo Código Civil ao contrato de seguro, há, verdadeiramente, uma corresponsabilidade entre o segurado e a seguradora em relação aos danos causados a terceiros. O STJ decidiu, por ocasião do julgamento do REsp nº 925.130-SP, de relatoria do Min. Luis Felipe Salomão, em 08.02.2012, que, "para fins do art. 543-C do CPC, em ação de reparação de danos movida em face do segurado, a seguradora denunciada pode ser condenada direta e solidariamente junto com este a pagar a indenização devida à vítima, nos limites contratados na apólice". APELO DA SEGURADORA. EXCLUSÃO, NA APÓLICE, DO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E ESTÉTICO. VOTO, POR MAIORIA, VENCEDOR: CLÁUSULA RESTRITIVA REDIGIDA COM DESTAQUE NA APÓLICE. CONDIÇÃO LÍCITA. É válida a restrição, para o pagamento de indenização por dano moral e estético, contida na apólice securitária, se ela for redigida em destaque para o consumidor. VOTO VENCIDO DO RELATOR: PRETENSÃO NÃO ACOLHIDA EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO, DURANTE AS TRATATIVAS PRELIMINARES, QUE TAL RESTRIÇÃO FOI SUBMETIDA INEQUIVOCADAMENTE AO CONHECIMENTO PRÉVIO DO SEGURADO, QUE, SABE-SE, PORQUE DERIVA DA PRÁTICA VIL E COSTUMEIRA DOS CORRETORES DE SEGURO, APENAS RECEBE A APÓLICE E AS CONDIÇÕES GERAIS APÓS A CONCLUSÃO DO NEGÓCIO E, INCLUSIVE, DO PAGAMENTO DE ALGUMAS PARCELAS DO PRÊMIO. DANO MORAL, ADEMAIS, QUE SE INCLUI NO DANO CORPORAL, FIXADO, IN CASU, EM VALOR EXPRESSIVO. CONTRASSENSO, DIANTE DA AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO QUE O SEGURADO FOI ADEQUADAMENTE INFORMADO SOBRE TODAS AS NUANCES RESTRITIVAS DO NEGÓCIO, QUE SE RESOLVE RESTRITIVAMENTE E EM FAVOR DO CONSUMIDOR. EXEGESE DO CONTIDO NOS ARTS. 6º, INCISO III, E 47 DO CDC. Para que seja excluída a responsabilidade da seguradora ao pagamento de indenização por dano moral, deve a cláusula restritiva estar destacada na apólice, para possibilitar o conhecimento pelo segurado, e deve estar comprovada a anuência expressa do segurado no tocante a tal limitação. É um contrassenso pressupor em favor da seguradora, sabendo-se, de um lado, que os dano moral inclui-se no dano corporal, fixado na apólice em alta proporção, e, de outro, da grande concorrência em tal área do mercado e da prática vil e rotineira de oferta e contratação verbal por parte dos corretores para que, apenas mais tarde, o consumidor receba em sua residência as condições gerais do negócio e a respectiva apólice, apenas porque constou nesta a restrição de pagamento de dano moral, que dela o consumidor foi fielmente informado, tal qual exige, de forma adequada, clara e precisa, a legislação de consumo (art. 6, III, do CDC). Cláusulas ambíguas ou não submetidas ao conhecimento prévio do segurado devem ser interpretadas restritivamente e sempre de maneira mais favorável ao consumidor (art. 47 do CDC). O princípio da informação não foi trazido pelo Legislador para embelezar o ordenamento jurídico mas, sim, em virtude do constante favorecimento do fornecedor em detrimento dos consumidores. Há, então, diante da desigualdade e dos objetivos constitucionais a serem perseguidos (art. 5º, caput e XXXII, da CF e art. 4º, I, do CDC), a preemente necessidade de serem estes informados de forma iniludível e tal princípio básico, dentro da teoria do ônus probatório (art. 333 do CPC), nas relações de consumo, repassa o fardo de demonstração à seguradora (art 6º, VIII, do CDC). IMPRESCINDIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO DO DANO MORAL. PROPOSIÇÃO AFASTADA. RESPONSABILIDADE DO TRANSGRESSOR, EM ACIDENTE DE CIRCULAÇÃO, QUE SE OPERA PELA SIMPLES VIOLAÇÃO - DANUM IN RE IPSA. A concepção há muito predominante na doutrina e na jurisprudência orienta-se no sentido que a responsabilidade do transgressor, em acidente de circulação, opera-se pela simples violação. Trata-se, portanto, de danum in re ipsa, cuja necessidade de reparação deflui do próprio ato ilícito, o que afasta a alegada imperiosidade de demonstração do abalo anímico do ser. APELO DO AUTOR. INDENIZAÇÃO POR DANOS ESTÉTICOS. NÃO CONCESSÃO EM SENTENÇA. EQUIVOCO. FRATURA NO FÊMUR ESQUERDO QUE OCASIONA O ENCURTAMENTO DE 1 CM NA PERNA DA VÍTIMA. DEFORMAÇÃO, COM A PERDA DA CAPACIDADE DE DEAMBULAR NORMALMENTE, AINDA QUE ACEITÁVEL DO PONTO DE VISTA MÉDICO, QUE GERA O DEVER DE COMPENSAÇÃO. STATUS QUO ANTE QUE DEVE SER ALCANÇADO. Comprovado, por perícia médica judicial, que a vítima de acidente de trânsito, em razão da fratura no fêmur esquerdo que sofreu, apresentou encurtamento de 1 cm de sua perna e, em razão disso, perde a capacidade de deambular normalmente, o agente transgressor deve compensá-la patrimonialmente pelo dano estético sofrido, pois este se verifica a partir de quaisquer deformações anatômicas, em especial quando a alteração implica na perda da capacidade de deambulação, ainda que infimamente do ponto de vista médico, porquanto as questões afetas à intensidade e à profundidade do dano ligam-se apenas ao quantum debeatur da paga pecuniária a ser arbitrada. PENSIONAMENTO MENSAL. ALEGADA INCAPACIDADE LABORAL PLENA. VERBA NÃO CONCEDIDA. VÍTIMA QUE, NÃO OBSTANTE, EM RAZÃO DA FRATURA NO FÊMUR E CLAUDICAÇÃO À DEAMBULAÇÃO APRESENTADA NÃO PODE MAIS REALIZAR GRANDE ESFORÇO FÍSICO, COMO AQUELE EXIGIDO NO SEU OFÍCIO (SERRALHEIRO). REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA VERIFICADA. PENSIONAMENTO DEVIDO. APLICABILIDADE DO ART. 950 DO CC. INCIDÊNCIA, ADEMAIS, DO PRINCÍPIO DA RESTITUIÇÃO INTEGRAL. Resulta da Lei (art. 950 do CC), o pensionamento mensal oriundo de ato ilícito se dá quando do sinistro resulte incapacidade total da vítima para o desempenho do seu ofício, e não para todo e qualquer trabalho. Demonstrado que a vítima de acidente de trânsito encontra-se inapta ao seu trabalho, procede o pedido, fundado em incapacidade plena, de pensionamento mensal. A indenização por ato ilícito tem por desiderato recompor o estado anterior da vítima, de modo que o pensionamento mensal é devido se o ofendido não pode mais desempenhar o seu ofício, até porque, consoante entendimento do Tribunal da Cidadania, "o só fato de se presumir que a vítima de ato ilícito portadora de limitações está capacitada para exercer algum trabalho não exclui o pensionamento, pois a experiência mostra que o deficiente mercado de trabalho brasileiro é restrito mesmo quando se trata de pessoa sem qualquer limitação física" (REsp nº 899.869, rel. Min. Gomes de Barros, julgado em 23.02.2007). "Em se tratando de ato ilícito gerador de incapacidade para o trabalho, o salário a ser considerado para efeito de cálculos das verbas indenizatórias, deve ser aquele que o trabalhador recebia à época do evento" (STJ. REsp nº 240.246-RJ, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, julgado em 29.11.2005). INDENIZAÇÃO CALÇADA NA PERDA DA POSSIBILIDADE DE ABRIR UM NEGÓCIO PRÓPRIO. TEORIA, INSPIRADA NA DOUTRINA FRANCESA, DA PERDA DE UMA CHANCE. POSSIBILIDADE REAL E CONCRETA, ENTRETANTO, NÃO DEMONSTRADA. MERO ACONTECIMENTO EVENTUAL E FUTURO. INDENIZAÇÃO QUE NÃO SE FAZ DEVIDA. CHANCE NÃO PROSTRADA. A teoria da perda de uma chance, inspirada na doutrina francesa, traz em si a idéia que, praticado um ato ilícito por alguém, a vítima perde uma oportunidade de obter uma vantagem ou de afastar um prejuízo, ambas as situações dentro de um juízo de probabilidade e não de uma mera possibilidade. Trata-se, portanto, de teoria cuja efetiva aplicabilidade não admite conjecturas, de modo que o lesado, para auferir compensação pecuniária, deve demonstrar que, real e concretamente, perdeu uma boa chance. A alegação, calçada em acontecimento eventual e futuro que a vítima de acidente de trânsito poderia vir abrir um negócio próprio não fosse as lesões que sofreu, não enseja reparação calçada na teoria de uma chance, que deve ser, dentro de um juízo de probabilidade, real e certa. QUANTUM DEBEATUR DAS INDENIZAÇÕES POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. PAGA PECUNIÁRIA MAJORADA EM RELAÇÃO ÀQUELES E FIXADA, TAMBÉM DE ACORDO COM A EXTENSÃO DO DANO (ART. 944 DO CC), EM RELAÇÃO A ESTES. FUNÇÕES PEDAGÓGICA E COMPENSATÓRIA. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. Embora entregue ao livre arbítrio do Julgador (art. 944 do CC), já que não existem critérios objetivos em lei para o arbitramento do quantum indenizatório, alguns elementos devem ser ponderados em cada caso, a começar pelas funções que a paga pecuniária deve desempenhar, quais sejam, compensar a vítima, de certo modo, pela dor psíquica experimentada, e admoestar o agente causador do dano para que a prática ilícita não se reitere. Diversos critérios são esquadrinhados. As condições das partes são medidas, o seu nível social e grau de escolaridade são aquilatados, o prejuízo é mensurado, a intensidade do sofrimento e da culpa são verificados, etc. Todas estas balizadoras traçam uma verdadeira diretriz para que se possa arbitrar o quantum em respeito aos parâmetros de cada hipótese. JUROS DE MORA. ENCARGO QUE DEVE INCIDIR A PARTIR DA OCORRÊNCIA DO EVENTO DANOSO. APLICAÇÃO DA SUMULA Nº 54 DO STJ E DO ART. 398 DO CC. CORREÇÃO MONETÁRIA QUE FLUI A PARTIR DA DATA DA FIXAÇÃO DO VALOR EM CONDENAÇÃO. Tratando-se de ilícito gerador de dano moral, os juros de mora fluem a partir da ocorrência do evento danoso, consoante o enunciado da Súmula nº 54 do STJ e art. 398 do CC. A atualização monetária tem incidência a partir da data de fixação do valor estabelecido em condenação (Súmula nº 362 do STJ). IMPOSTO DE RENDA. AUSÊNCIA DE INCIDÊNCIA SOBRE VERBA DE CUNHO INDENIZATÓRIO. SÚMULA Nº 498 DO STJ. Não incide Imposto de Renda sobre indenização por danos morais e estéticos (Súmula nº 498 do STJ), visto que se trata de verba destinada a recuperar o patrimônio da vítima (status quo ante) e não de acréscimo patrimonial tributável. APELO DA SEGURADORA PARCIALMENTE PROVIDO, POR MAIORIA, VENCIDO, NO PONTO, O RELATOR. APELO DO AUTOR A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO, POR UNANIMIDADE. (TJSC, Apelação Cível n. 2013.038905-4, de Joinville, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 29-05-2014).
Data do Julgamento
:
29/05/2014
Classe/Assunto
:
Segunda Câmara de Direito Civil
Órgão Julgador
:
Ezequiel Rodrigo Garcia
Relator(a)
:
Gilberto Gomes de Oliveira
Comarca
:
Joinville
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