TJSC 2013.040748-6 (Acórdão)
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. SUJEIÇÃO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS ÀS CHAMADAS OPERAÇÕES SECUNDÁRIAS. ENTENDIMENTO DO EGRÉGIO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. "1. As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor. 2. "Consumidor", para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito. 3. O preceito veiculado pelo art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor deve ser interpretado em coerência com a Constituição, o que importa em que o custo das operações ativas e a remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras na exploração da intermediação de dinheiro na economia estejam excluídas da sua abrangência." (STF, ADI 2591, relator Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, DJ de 29-09-2006, p. 031) LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. EXEGESE DOS ARTS. 2, 17 E 29. EXTENSÃO DO CONCEITO DE CONSUMIDOR. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. FORNECEDOR. VÍCIO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. OPERAÇÕES BANCÁRIAS ACESSÓRIAS. COBRANÇA DE TAXA NA DEVOLUÇÃO DE CHEQUE. LIBERAÇÃO SEM QUALQUER CONTROLE DE TALONÁRIO. RISCO DA ATIVIDADE. ALCANÇE DO BANCO PARA RESPONDER. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. "Se, no sistema do CDC, todos estes "terceiros" hoje se incluem como "consumidores, consumidores stricto sensu do art. 2 (quem "utiliza um serviço"), consumidores equiparados do parágrafo único do art. 2 (coletividade de pessoas ainda que indetermináveis, que haja intervindo na relação de serviço), do art. 17 (todas as vítimas dos fatos do serviço, por exemplo os passantes na rua quando avião cai por defeito do serviço) e do art. 29 (todas as pessoas determináveis ou não expostas às praticas comerciais de oferta, contratos de adesão, publicidade, cobrança de dívidas, bancos de dados, sempre que vulneráveis in concreto), então temos que rever nossos conceitos sobre estipulações em favor de terceiro e, no processo, sobre legitimação destes terceiros para agir individual ou coletivamente". (Marques, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor, o novo regime das relações contratuais. 4ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2002) Revendo o conceito da legitimação, considerando o direito do consumidor como norma fundamental e princípio informador do ordenamento jurídico, é perfeitamente admissível, por meio de interpretação lógico-sistemática, considerar o recebedor de cheque sem fundo como consumidor vítima de serviço mal prestado por instituição financeira; e, por sua vez, a legitimidade passiva da casa bancária, considerada fornecedora, ao gerir as operações bancárias acessórias que revelam cunho de prestação de serviços secundários, sempre destinados a atrair clientes, principalmente com a cobrança da taxa de devolução de cheque à câmara de compensação o que evidencia, sem qualquer dúvida, a liberalidade e a ânsia desmedida do banco para, ao não impor qualquer limitação ao cliente no tocante a disponibilização de talões de cheques, cobrar mais e mais tarifas a fim de obter lucros estratosféricos. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. ANÁLISE DE MÉRITO COM BASE NO ART. 515, § 3º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. POSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. INDENIZAÇÃO. CHEQUE DEVOLVIDO SEM FUNDOS. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE DEVERIA SER DILIGENTE NA LIBERAÇÃO DE CHEQUES A SEUS CLIENTES. PRODUTO DEFEITUOSO. DEFEITO POR SEU MODO DE FORNECIMENTO E OS RISCOS DA FRUIÇÃO (ART. 14, § 1º, I E II, DO CDC). DEVER DE INDENIZAR. RECURSO PROVIDO. Inicialmente, tem-se que "O art. 515, § 3º, do CPC, incluído pela Lei 10.352/2001, veio para permitir que o Tribunal, nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito, pudesse julgar desde logo a lide, em se tratando de questão exclusivamente de direito ou quando devidamente instruído o feito ('causa madura'). Dispositivo que não contempla a hipótese em que foi afastada a prescrição no Tribunal de Apelação. Diferentemente, o art. 515, § 1º, do Diploma Processual Civil, autoriza que o Tribunal, após afastar a prescrição, prossiga no exame do mérito, sem que isso importe em supressão de instância" (STJ. Resp. n. 722410/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, DJU de 15-8-2005). Estabelecida a aplicabilidade da responsabilidade civil objetiva do fornecedor, prevista no Código de Defesa do Consumidor, necessário para a sua incidência no caso concreto comprovar tão-somente a existência do dano e do nexo de causalidade, pois irrelevante a conduta (dolo ou culpa) da instituição financeira. Ocorre dano ao consumidor, que recebe cheque sem provisão de fundos e fica privado do valor nele constante, e evidente o nexo etiológico entre este e a conduta do fornecedor de serviço, instituição financeira, que presta serviço defeituoso por seu modo de fornecimento e os riscos da fruição, quando o banco sem qualquer cuidado pela atividade que desenvolve, até para que não se eleve o risco do mercado financeiro, admite sem qualquer controle interno a liberação de vários talonários de cheques exigindo para tanto tão-somente documento de identificação (RG e CPF) e comprovante de residência, a teor do art. 14, § 1º, I e II, do Código de Defesa do Consumidor. Dessarte, verificado o dano e o nexo causal, exsurge a responsabilidade do banco pela reparação do dano ao prestar serviço defeituoso quando libera talões de cheques sem qualquer limitação e estes são devolvidos sem fundos. (TJSC, Apelação Cível n. 2013.040748-6, de Brusque, rel. Des. Carlos Prudêncio, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 03-12-2013).
Ementa
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. SUJEIÇÃO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS ÀS CHAMADAS OPERAÇÕES SECUNDÁRIAS. ENTENDIMENTO DO EGRÉGIO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. "1. As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor. 2. "Consumidor", para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito. 3. O preceito veiculado pelo art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor deve ser interpretado em coerência com a Constituição, o que importa em que o custo das operações ativas e a remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras na exploração da intermediação de dinheiro na economia estejam excluídas da sua abrangência." (STF, ADI 2591, relator Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, DJ de 29-09-2006, p. 031) LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. EXEGESE DOS ARTS. 2, 17 E 29. EXTENSÃO DO CONCEITO DE CONSUMIDOR. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. FORNECEDOR. VÍCIO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. OPERAÇÕES BANCÁRIAS ACESSÓRIAS. COBRANÇA DE TAXA NA DEVOLUÇÃO DE CHEQUE. LIBERAÇÃO SEM QUALQUER CONTROLE DE TALONÁRIO. RISCO DA ATIVIDADE. ALCANÇE DO BANCO PARA RESPONDER. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. "Se, no sistema do CDC, todos estes "terceiros" hoje se incluem como "consumidores, consumidores stricto sensu do art. 2 (quem "utiliza um serviço"), consumidores equiparados do parágrafo único do art. 2 (coletividade de pessoas ainda que indetermináveis, que haja intervindo na relação de serviço), do art. 17 (todas as vítimas dos fatos do serviço, por exemplo os passantes na rua quando avião cai por defeito do serviço) e do art. 29 (todas as pessoas determináveis ou não expostas às praticas comerciais de oferta, contratos de adesão, publicidade, cobrança de dívidas, bancos de dados, sempre que vulneráveis in concreto), então temos que rever nossos conceitos sobre estipulações em favor de terceiro e, no processo, sobre legitimação destes terceiros para agir individual ou coletivamente". (Marques, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor, o novo regime das relações contratuais. 4ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2002) Revendo o conceito da legitimação, considerando o direito do consumidor como norma fundamental e princípio informador do ordenamento jurídico, é perfeitamente admissível, por meio de interpretação lógico-sistemática, considerar o recebedor de cheque sem fundo como consumidor vítima de serviço mal prestado por instituição financeira; e, por sua vez, a legitimidade passiva da casa bancária, considerada fornecedora, ao gerir as operações bancárias acessórias que revelam cunho de prestação de serviços secundários, sempre destinados a atrair clientes, principalmente com a cobrança da taxa de devolução de cheque à câmara de compensação o que evidencia, sem qualquer dúvida, a liberalidade e a ânsia desmedida do banco para, ao não impor qualquer limitação ao cliente no tocante a disponibilização de talões de cheques, cobrar mais e mais tarifas a fim de obter lucros estratosféricos. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. ANÁLISE DE MÉRITO COM BASE NO ART. 515, § 3º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. POSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. INDENIZAÇÃO. CHEQUE DEVOLVIDO SEM FUNDOS. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE DEVERIA SER DILIGENTE NA LIBERAÇÃO DE CHEQUES A SEUS CLIENTES. PRODUTO DEFEITUOSO. DEFEITO POR SEU MODO DE FORNECIMENTO E OS RISCOS DA FRUIÇÃO (ART. 14, § 1º, I E II, DO CDC). DEVER DE INDENIZAR. RECURSO PROVIDO. Inicialmente, tem-se que "O art. 515, § 3º, do CPC, incluído pela Lei 10.352/2001, veio para permitir que o Tribunal, nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito, pudesse julgar desde logo a lide, em se tratando de questão exclusivamente de direito ou quando devidamente instruído o feito ('causa madura'). Dispositivo que não contempla a hipótese em que foi afastada a prescrição no Tribunal de Apelação. Diferentemente, o art. 515, § 1º, do Diploma Processual Civil, autoriza que o Tribunal, após afastar a prescrição, prossiga no exame do mérito, sem que isso importe em supressão de instância" (STJ. Resp. n. 722410/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, DJU de 15-8-2005). Estabelecida a aplicabilidade da responsabilidade civil objetiva do fornecedor, prevista no Código de Defesa do Consumidor, necessário para a sua incidência no caso concreto comprovar tão-somente a existência do dano e do nexo de causalidade, pois irrelevante a conduta (dolo ou culpa) da instituição financeira. Ocorre dano ao consumidor, que recebe cheque sem provisão de fundos e fica privado do valor nele constante, e evidente o nexo etiológico entre este e a conduta do fornecedor de serviço, instituição financeira, que presta serviço defeituoso por seu modo de fornecimento e os riscos da fruição, quando o banco sem qualquer cuidado pela atividade que desenvolve, até para que não se eleve o risco do mercado financeiro, admite sem qualquer controle interno a liberação de vários talonários de cheques exigindo para tanto tão-somente documento de identificação (RG e CPF) e comprovante de residência, a teor do art. 14, § 1º, I e II, do Código de Defesa do Consumidor. Dessarte, verificado o dano e o nexo causal, exsurge a responsabilidade do banco pela reparação do dano ao prestar serviço defeituoso quando libera talões de cheques sem qualquer limitação e estes são devolvidos sem fundos. (TJSC, Apelação Cível n. 2013.040748-6, de Brusque, rel. Des. Carlos Prudêncio, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 03-12-2013).
Data do Julgamento
:
03/12/2013
Classe/Assunto
:
Primeira Câmara de Direito Civil
Órgão Julgador
:
Cláudia Margarida Ribas Marinho
Relator(a)
:
Carlos Prudêncio
Comarca
:
Brusque
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