main-banner

Jurisprudência


TJSC 2014.063788-6 (Acórdão)

Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL. TRIBUNAL DO JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO. TENTATIVA. CÓDIGO PENAL, ART. 121, § 2.º, I, C/C ART. 14, II. ESTUPRO. CÓDIGO PENAL, ART. 213, C/C ART. 226, II. CONDENAÇÃO. RECURSO DEFENSIVO. PRETENDIDA A ANULAÇÃO DA DECISÃO EMANADA DO CONSELHO DE SENTENÇA. DECISÃO CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. NÃO OCORRÊNCIA. JURADOS QUE ATRIBUÍRAM A PRÁTICA DO CRIME AO ACUSADO. VEREDICTO ARRIMADO NA VERSÃO QUE LHES PARECEU MAIS CONVINCENTE. EXISTÊNCIA DE SUPORTE PROBATÓRIO. NULIDADE INEXISTENTE. DECISÃO MANTIDA. "Não cabe a anulação do julgamento, quando os jurados optam por uma das correntes de interpretação da prova possíveis de surgir. Não se trata de decisão manifestamente contrária à prova, mas se situa no campo da interpretação da prova, o que é bem diferente" (NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 396). Assim, se a decisão dos jurados encontra respaldo na prova testemunhal, como no presente caso, não há falar em nulidade por decisão contrária à prova dos autos. RECURSO MINISTERIAL. INJUSTIÇA NA APLICAÇÃO DA PENA. DOSIMETRIA. CRIME DE HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. PENA-BASE. CULPABILIDADE ACENTUADA. EXTERIORIZAÇÃO DO INTENTO HOMICIDA A DIVERSAS PESSOAS, INCLUSIVE MENORES DE IDADE. PRIMEIRO INCONFORMISMO DA VÍTIMA AO CIÚME DO ACUSADO. TENTATIVA DE HOMICÍDIO. REPRIMENDA ADEQUADA. No crime de homicídio, age com culpabilidade acentuada aquele que anuncia sua vontade de matar todos os presentes na residência, ocupada também por crianças e adolescentes, e investe contra a vítima em razão da sua primeira não resignação ao ciúme. CONDUTA SOCIAL. CONVÍVIO FAMILIAR. ABUSOS SEXUAIS. DISTORÇÃO DAS NOÇÕES MORAIS DE FAMÍLIA. VIOLÊNCIA E AGRESSÃO. INERENTES AO CRIME CONEXO E À QUALIFICADORA DO MOTIVO TORPE. CIÚME. IMPOSSIBILIDADE DE VALORAÇÃO. BIS IN IDEM. Não é permitida a valoração, para a fixação da pena-base, de circunstâncias judiciais que se confundem com a prática do crime conexo ou com a qualificadora do motivo torpe, sob pena de ocorrer duplo agravamento pelo mesmo fato. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. DESCOBRIMENTO DA PATERNIDADE PELOS FILHOS-NETOS. IRRELEVÂNCIA PARA O CRIME DE HOMICÍDIO. AUSÊNCIA DE CORRELAÇÃO. RECEIO DE NOVA PRÁTICA DE CONDUTA DOLOSA CONTRA A VIDA. CONSEQUÊNCIA INERENTE AO CRIME TENTADO. IMPOSSIBILIDADE DE VALORAÇÃO. O fato de os filhos-netos do acusado terem descoberto a paternidade em razão do crime doloso contra a vida não pode ser valorado para a fixação da pena basilar, pois em nada se relaciona com o crime. O temor de novo atentado contra a vida da vítima é inerente à prática do delito tentado e não pode, sem a presença de outros elementos, ser considerado para impor reprimenda mais severa. TENTATIVA. PATAMAR DE REDUÇÃO. ITER CRIMINIS PERCORRIDO. VÍTIMA ATINGIDA POR UMA FACADA. AUSÊNCIA DE RISCO DE MORTE. LESÃO LEVE. REDUÇÃO MÍNIMA INVIÁVEL. QUANTUM DE MINORAÇÃO DE 2/3 ALTERADO PARA 3/5. PENA ADEQUADA. É inviável a redução mínima pela prática do crime tentado quando o acusado atinge a vítima com uma facada, causando lesão leve, sem risco de morte, por conta da ação defensiva dela. No caso, a minoração em 3/5 mostra-se mais adequada, considerando o iter criminis percorrido. INJUSTIÇA NA APLICAÇÃO DA PENA. DOSIMETRIA. CRIME DE ESTUPRO. PENA-BASE. CULPABILIDADE ACENTUADA. ABUSOS SEXUAIS TRATADOS COMO RELACIONAMENTO AMOROSO. CASO INCESTUOSO. CIRCUNSTÂNCIA QUE EXTRAPOLA A NORMALIDADE DO TIPO PENAL. POSSIBILIDADE DE CONSIDERAÇÃO NO ESTABELECIMENTO DA PENA BASILAR. ADEQUAÇÃO. Apresenta culpabilidade acentuada o acusado que abusa sexualmente de sua filha, mediante violência e grave ameaça, e considera esses fatos como relacionamento amoroso consensual. CONDUTA SOCIAL. CONVÍVIO FAMILIAR. ABUSOS SEXUAIS. CONFUSÃO COM A PRÁTICA REITERADA DO DELITO. CONTINUIDADE DELITIVA. DISTORÇÃO DAS NOÇÕES MORAIS DE FAMÍLIA. PONDERAÇÃO NA CULPABILIDADE. BIS IN IDEM. VIOLÊNCIA E AGRESSÃO. ELEMENTAR DO TIPO PENAL. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS DE SUA EXTRAPOLAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE VALORAÇÃO. No caso concreto, o convívio familiar marcado pelos abusos sexuais praticados pelo acusado confunde-se com a própria prática reiterada do crime, que caracterizou a continuidade delitiva. Assim, para evitar bis in idem, tal fato deve ser considerado quando da determinação da fração de aumento de pena. A distorção das noções morais de família, caracterizada pelo relacionamento incestuoso, foi ponderada ao se valorar negativamente a culpabilidade. O crime de estupro se configura com a prática de conjunção carnal ou ato libidinoso contra a vontade da vítima, mediante violência ou grave ameaça. A valoração dessa elementar do tipo penal (violência ou grave ameaça) somente é permitida quando ela excede a sua normalidade, situação a qual não se verifica na hipótese em análise, em razão de elementos probatórios que permitam concluir acerca da sua extensão. MOTIVO DO CRIME. SUBSTITUIÇÃO DA ESPOSA PELA FILHA. VALORAÇÃO NA CULPABILIDADE. BIS IN IDEM. IMPOSSIBILIDADE DE VALORAÇÃO. A substituição da esposa pela filha como sua parceira foi ponderada na culpabilidade, o que não permite a sua consideração outra vez para fixar a pena-base, sob pena de duplo agravamento. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. PROLONGADA SUBMISSÃO DA VÍTIMA AOS ABUSOS. PONDERAÇÃO NA CONTINUIDADE DELITIVA. A prática prolongada dos abusos sexuais por parte do acusado confunde-se com a prática do delito em continuidade delitiva, devendo ser nessa oportunidade avaliada. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. VÍTIMA. TRAUMA DE SE RELACIONAR COM HOMENS. COGITAÇÃO DE SUICÍDIO. FATOS QUE FOGEM DA NORMALIDADE DO TIPO PENAL. VIABILIDADE DE CONSIDERAÇÃO AO SE FIXAR A REPRIMENDA BASILAR. ADEQUAÇÃO DA PENA. O abalo sofrido pela vítima de estupro, que chegou a pensar em se suicidar por vergonha de divulgação dos abusos e que gerou um trauma em se relacionar com homens, evidencia que as consequências do delito extrapolaram a normalidade, autorizando, assim, o aumento da pena-base. CONTINUIDADE DELITIVA. FRAÇÃO DE AUMENTO. PRETENDIDA A APLICAÇÃO MÁXIMA. COMPROVAÇÃO DE APENAS TRÊS CONDUTAS. APLICADA, NA SENTENÇA, A FRAÇÃO DE 1/4. QUANTUM INCOMPATÍVEL COM O CRITÉRIO PROGRESSIVO. CORREÇÃO DE OFÍCIO. ALTERAÇÃO PARA 1/5. Havendo a certeza da prática de três condutas ilícitas pelo acusado, em atenção ao critério progressivo, a pena deve ser majorada em 1/5 em razão da continuidade delitiva. DOSIMETRIA. MAJORAÇÃO DO PATAMAR UTILIZADO NA SENTENÇA. VALORAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS E DAS AGRAVANTES. GRAVIDADE QUE NÃO JUSTIFICA O SOPESAMENTO MAIS SEVERO PARA A APLICAÇÃO DA PENA. MANUTENÇÃO DO QUANTUM IMPINGIDO. Embora não haja patamares legais definidos para a valoração das circunstâncias judiciais e agravantes ou atenuantes, a jurisprudência pátria consolidou ser aplicável a fração de 1/6 quando essas balizas de aplicação da reprimenda não demonstrarem gravidade excessiva, a justificar uma maior reprovação e prevenção à conduta praticada. RECURSO DEFENSIVO NÃO PROVIDO E MINISTERIAL PARCIALMENTE PROVIDO. PENA ADEQUADA DE OFÍCIO. (TJSC, Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2014.063788-6, de São José, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, Quarta Câmara Criminal, j. 06-11-2014).

Data do Julgamento : 06/11/2014
Classe/Assunto : Quarta Câmara Criminal
Órgão Julgador : Otávio José Minatto
Relator(a) : Roberto Lucas Pacheco
Comarca : São José
Mostrar discussão