TJSC 2015.041409-2 (Acórdão)
CRIME CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL EM CONTINUIDADE DELITIVA. VÍTIMA MENOR DE 14 ANOS. INCIDÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA (ART. 217-A C/C ART. 226, II, TODOS DO CP, NA FORMA DOS ARTS. 5º E 7º DA LEI 11.340/2006). SENTENÇA CONDENATÓRIA QUE AFASTOU A CONTINUIDADE DELITIVA. RECURSO DEFENSIVO. PLEITO ABSOLUTÓRIO. FRAGILIDADE PROBATÓRIA. PRETENDIDA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. ALEGADA AUSÊNCIA DE PROVA DE MATERIALIDADE E AUTORIA. 1. MATERIALIDADE. DIVERGÊNCIA SOBRE A VIRGINDADE DA VÍTIMA. INOCORRÊNCIA. LAUDO PERICIAL QUE ATESTA NÃO SER A VÍTIMA VIRGEM E PRONTUÁRIO MÉDICO QUE ATESTA A NÃO REALIZAÇÃO DE EXAME GENITAL INTERNO POR SER A PACIENTE VIRGEM. CONTUDO, COMPLEMENTAÇÃO QUE CONSTATA A EXISTÊNCIA DE REENTRÂNCIA DA MEMBRANA HIMENAL, QUE PODE ESTAR RELACIONADA A TRAUMA POR TENTATIVA DE PENETRAÇÃO, E DE PEQUENA ROTURA. DEPOIMENTOS DA VÍTIMA, DAS TESTEMUNHAS E INFORMANTES QUE PERMITEM A CONVICÇÃO DA OCORRÊNCIA DO DELITO. MATERIALIDADE COMPROVADA. 2. AUTORIA. ALEGADA AUSÊNCIA DE PROVAS. NÃO COLHIMENTO. CRIME PRATICADO POR TIO CONTRA SOBRINHA. RÉU QUE SE VALEU DAS CONDIÇÕES DOMÉSTICAS E DOS HORÁRIOS EM QUE A OFENDIDA SE ENCONTRAVA SOZINHA EM CASA. ACUSADO QUE ADENTRA NO QUARTO DA VÍTIMA, REALIZA CARÍCIAS EM SEU CORPO E A CONSTRANGE À PRÁTICA DA CONJUNÇÃO CARNAL. INTENTO DE SATISFAÇÃO DA LASCÍVIA MANIFESTO. PALAVRA DA VÍTIMA. ESPECIAL RELEVÂNCIA NOS DELITOS CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. DECLARAÇÕES QUE ENCONTRAM CONFORTO NOS DEPOIMENTOS DE INFORMANTES E NOS DEMAIS ELEMENTOS DE PROVAS. AUTORIA DEMONSTRADA. Adolescente que expõe todos os fatos, sem entrar em contradição, de maneira clara, segura, relatando o abuso sexual, quando de acordo com outros elementos de prova, tem significativo valor probatório. A palavra da vítima, nos crimes sexuais, possui especial relevância, diante da natureza do delito, que dificilmente deixa vestígios em função de ser cometido às ocultas, ou em ambientes domésticos, sem a presença de testemunhas. 2.1 SUPOSTA APRESENTAÇÃO DE VERSÕES CONFLITANTES DA VÍTIMA NA DELEGACIA DE POLÍCIA E EM JUÍZO, ESPECIALMENTE QUANTO AO NÚMERO DE VEZES DAS RELAÇÕES SEXUAIS. LAPSO DE MAIS DE QUATRO ANOS ENTRE O PRIMEIRO DEPOIMENTO E O ÚLTIMO. ADEMAIS, VÍTIMA QUE À ÉPOCA, COM TREZE ANOS, COMPREENSÍVEL CONFUSÃO ENTRE AS CARÍCIAS ANTERIORMENTE FEITAS COM O ATO SEXUAL EM SI (CONJUNÇÃO CARNAL). ADEMAIS, FATO QUE NÃO ACARRETOU EM PREJUÍZO AO RÉU, POIS RESTOU RECONHECIDA A PRÁTICA SEXUAL EM SOMENTE UMA OPORTUNIDADE. A existência de pequenas contradições entre os depoimentos prestados pela vítima na Delegacia de Polícia em juízo justifica-se pelo longo lapso temporal transcorrido entre as declarações - mais de quatro anos - e não tem o condão de desnaturar o cometimento dos abusos, pois versam sobre fatos periféricos que não interferem na configuração dos abusos sexuais cometidos. 2.2 PLEITO DE AFASTAMENTO DA AUTORIA PELA NÃO COMPROVAÇÃO DE TER O ACUSADO A CHAVE DA CASA DA VÍTIMA. INSUBSISTÊNCIA. DEPOIMENTOS DANDO CONTA QUE O RÉU, QUE TINHA ACESSO A RESIDÊNCIA POR SER PARENTE DA VÍTIMA, TEVE, DE ALGUMA FORMA, ACESSO À CHAVE PARA ADENTRAR NA RESIDÊNCIA DA OFENDIDA. 2.3 ALEGADA EXISTÊNCIA DE RIXA ENTRE O ACUSADO E A TIA DA VÍTIMA. IRRELEVÂNCIA, DIANTE DO CONTEXTO PROBATÓRIO. ADEMAIS, BOLETIM DE OCORRÊNCIA E DEPOIMENTOS QUE DEMONSTRAM TER A TIA DA OFENDIDA SOFRIDO AMEAÇAS EM RAZÃO DA ACUSAÇÃO DO PRESENTE DELITO. 3. PLEITO SUBSIDIÁRIO. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL PARA CONTRAVENÇÃO PENAL DE PERTURBAÇÃO DA TRANQUILIDADE (ART. 65 DO DECRETO LEI 3.688/1941). TESE INCABÍVEL NO CASO CONCRETO. COMETIMENTO DE ILÍCITO COM O ESCOPO DA SATISFAÇÃO DA LASCÍVIA. TIPIFICAÇÃO ADEQUADA. Pratica o fato típico descrito no art. 217-A, caput, do Código Penal, não havendo falar em desclassificação para infração penal diversa, o agente que, com o fim de satisfazer sua própria lascívia, acaricia o corpo da adolescente e com ela tem conjunção carnal. 4. DOSIMETRIA DA PENA. 4.1 PRIMEIRA FASE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS NEGATIVAS. PRETENDIDA EXCLUSÃO DOS MAUS ANTECEDENTES. POSSIBILIDADE. CONDENAÇÃO CRIMINAL PRETÉRITA TRANSITADA EM JULGADO E EXTINTA HÁ MAIS DE VINTE E OITO ANOS. POSICIONAMENTO DESTE ÓRGÃO JULGADOR. READEQUAÇÃO DA PENA. "A fim de evitar uma perpétua valoração de condenação definitiva, esta Câmara Criminal passou a entender que os efeitos dos antecedentes criminais também devem ser limitados no tempo, a exemplo do que ocorre com a reincidência - a qual, aliás, não deixa de ser uma espécie de antecedente. Em homenagem ao princípio da proporcionalidade e da individualização da pena, as condenações transitadas em julgados que não se prestem à configuração da reincidência devem conservar seus efeitos, para fins de maus antecedentes, por mais cinco anos a contar da prescrição quinquenal prevista no art. 64, I, do Código Penal" (TJSC, Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2013.051862-4, de Palhoça, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, j. 16-10-2014). 4.2 PEDIDO DE AFASTAMENTO DAS CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. IMPOSSIBILIDADE. TRANSTORNOS PSICOLÓGICOS SOFRIDOS PELA VÍTIMA QUE EXTRAPOLARAM O TIPO PENAL. MANUTENÇÃO. "Não há como afastar a gravidade das consequências do crime, quando os abusos sexuais sofridos pela vítima lhe acarretaram sérias sequelas e abalos psicológicos" (TJSC, Apelação Criminal n. 2014.065695-8, de Ituporanga, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, j. 19-2-2015). 5. PLEITO DE RECORRER EM LIBERDADE. INVIABILIDADE. NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. MANUTENÇÃO DOS FUNDAMENTOS UTILIZADOS EM PRIMEIRO GRAU. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2015.041409-2, de São José, rel. Des. Jorge Schaefer Martins, Quarta Câmara Criminal, j. 19-11-2015).
Ementa
CRIME CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL EM CONTINUIDADE DELITIVA. VÍTIMA MENOR DE 14 ANOS. INCIDÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA (ART. 217-A C/C ART. 226, II, TODOS DO CP, NA FORMA DOS ARTS. 5º E 7º DA LEI 11.340/2006). SENTENÇA CONDENATÓRIA QUE AFASTOU A CONTINUIDADE DELITIVA. RECURSO DEFENSIVO. PLEITO ABSOLUTÓRIO. FRAGILIDADE PROBATÓRIA. PRETENDIDA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. ALEGADA AUSÊNCIA DE PROVA DE MATERIALIDADE E AUTORIA. 1. MATERIALIDADE. DIVERGÊNCIA SOBRE A VIRGINDADE DA VÍTIMA. INOCORRÊNCIA. LAUDO PERICIAL QUE ATESTA NÃO SER A VÍTIMA VIRGEM E PRONTUÁRIO MÉDICO QUE ATESTA A NÃO REALIZAÇÃO DE EXAME GENITAL INTERNO POR SER A PACIENTE VIRGEM. CONTUDO, COMPLEMENTAÇÃO QUE CONSTATA A EXISTÊNCIA DE REENTRÂNCIA DA MEMBRANA HIMENAL, QUE PODE ESTAR RELACIONADA A TRAUMA POR TENTATIVA DE PENETRAÇÃO, E DE PEQUENA ROTURA. DEPOIMENTOS DA VÍTIMA, DAS TESTEMUNHAS E INFORMANTES QUE PERMITEM A CONVICÇÃO DA OCORRÊNCIA DO DELITO. MATERIALIDADE COMPROVADA. 2. AUTORIA. ALEGADA AUSÊNCIA DE PROVAS. NÃO COLHIMENTO. CRIME PRATICADO POR TIO CONTRA SOBRINHA. RÉU QUE SE VALEU DAS CONDIÇÕES DOMÉSTICAS E DOS HORÁRIOS EM QUE A OFENDIDA SE ENCONTRAVA SOZINHA EM CASA. ACUSADO QUE ADENTRA NO QUARTO DA VÍTIMA, REALIZA CARÍCIAS EM SEU CORPO E A CONSTRANGE À PRÁTICA DA CONJUNÇÃO CARNAL. INTENTO DE SATISFAÇÃO DA LASCÍVIA MANIFESTO. PALAVRA DA VÍTIMA. ESPECIAL RELEVÂNCIA NOS DELITOS CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. DECLARAÇÕES QUE ENCONTRAM CONFORTO NOS DEPOIMENTOS DE INFORMANTES E NOS DEMAIS ELEMENTOS DE PROVAS. AUTORIA DEMONSTRADA. Adolescente que expõe todos os fatos, sem entrar em contradição, de maneira clara, segura, relatando o abuso sexual, quando de acordo com outros elementos de prova, tem significativo valor probatório. A palavra da vítima, nos crimes sexuais, possui especial relevância, diante da natureza do delito, que dificilmente deixa vestígios em função de ser cometido às ocultas, ou em ambientes domésticos, sem a presença de testemunhas. 2.1 SUPOSTA APRESENTAÇÃO DE VERSÕES CONFLITANTES DA VÍTIMA NA DELEGACIA DE POLÍCIA E EM JUÍZO, ESPECIALMENTE QUANTO AO NÚMERO DE VEZES DAS RELAÇÕES SEXUAIS. LAPSO DE MAIS DE QUATRO ANOS ENTRE O PRIMEIRO DEPOIMENTO E O ÚLTIMO. ADEMAIS, VÍTIMA QUE À ÉPOCA, COM TREZE ANOS, COMPREENSÍVEL CONFUSÃO ENTRE AS CARÍCIAS ANTERIORMENTE FEITAS COM O ATO SEXUAL EM SI (CONJUNÇÃO CARNAL). ADEMAIS, FATO QUE NÃO ACARRETOU EM PREJUÍZO AO RÉU, POIS RESTOU RECONHECIDA A PRÁTICA SEXUAL EM SOMENTE UMA OPORTUNIDADE. A existência de pequenas contradições entre os depoimentos prestados pela vítima na Delegacia de Polícia em juízo justifica-se pelo longo lapso temporal transcorrido entre as declarações - mais de quatro anos - e não tem o condão de desnaturar o cometimento dos abusos, pois versam sobre fatos periféricos que não interferem na configuração dos abusos sexuais cometidos. 2.2 PLEITO DE AFASTAMENTO DA AUTORIA PELA NÃO COMPROVAÇÃO DE TER O ACUSADO A CHAVE DA CASA DA VÍTIMA. INSUBSISTÊNCIA. DEPOIMENTOS DANDO CONTA QUE O RÉU, QUE TINHA ACESSO A RESIDÊNCIA POR SER PARENTE DA VÍTIMA, TEVE, DE ALGUMA FORMA, ACESSO À CHAVE PARA ADENTRAR NA RESIDÊNCIA DA OFENDIDA. 2.3 ALEGADA EXISTÊNCIA DE RIXA ENTRE O ACUSADO E A TIA DA VÍTIMA. IRRELEVÂNCIA, DIANTE DO CONTEXTO PROBATÓRIO. ADEMAIS, BOLETIM DE OCORRÊNCIA E DEPOIMENTOS QUE DEMONSTRAM TER A TIA DA OFENDIDA SOFRIDO AMEAÇAS EM RAZÃO DA ACUSAÇÃO DO PRESENTE DELITO. 3. PLEITO SUBSIDIÁRIO. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL PARA CONTRAVENÇÃO PENAL DE PERTURBAÇÃO DA TRANQUILIDADE (ART. 65 DO DECRETO LEI 3.688/1941). TESE INCABÍVEL NO CASO CONCRETO. COMETIMENTO DE ILÍCITO COM O ESCOPO DA SATISFAÇÃO DA LASCÍVIA. TIPIFICAÇÃO ADEQUADA. Pratica o fato típico descrito no art. 217-A, caput, do Código Penal, não havendo falar em desclassificação para infração penal diversa, o agente que, com o fim de satisfazer sua própria lascívia, acaricia o corpo da adolescente e com ela tem conjunção carnal. 4. DOSIMETRIA DA PENA. 4.1 PRIMEIRA FASE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS NEGATIVAS. PRETENDIDA EXCLUSÃO DOS MAUS ANTECEDENTES. POSSIBILIDADE. CONDENAÇÃO CRIMINAL PRETÉRITA TRANSITADA EM JULGADO E EXTINTA HÁ MAIS DE VINTE E OITO ANOS. POSICIONAMENTO DESTE ÓRGÃO JULGADOR. READEQUAÇÃO DA PENA. "A fim de evitar uma perpétua valoração de condenação definitiva, esta Câmara Criminal passou a entender que os efeitos dos antecedentes criminais também devem ser limitados no tempo, a exemplo do que ocorre com a reincidência - a qual, aliás, não deixa de ser uma espécie de antecedente. Em homenagem ao princípio da proporcionalidade e da individualização da pena, as condenações transitadas em julgados que não se prestem à configuração da reincidência devem conservar seus efeitos, para fins de maus antecedentes, por mais cinco anos a contar da prescrição quinquenal prevista no art. 64, I, do Código Penal" (TJSC, Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2013.051862-4, de Palhoça, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, j. 16-10-2014). 4.2 PEDIDO DE AFASTAMENTO DAS CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. IMPOSSIBILIDADE. TRANSTORNOS PSICOLÓGICOS SOFRIDOS PELA VÍTIMA QUE EXTRAPOLARAM O TIPO PENAL. MANUTENÇÃO. "Não há como afastar a gravidade das consequências do crime, quando os abusos sexuais sofridos pela vítima lhe acarretaram sérias sequelas e abalos psicológicos" (TJSC, Apelação Criminal n. 2014.065695-8, de Ituporanga, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, j. 19-2-2015). 5. PLEITO DE RECORRER EM LIBERDADE. INVIABILIDADE. NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. MANUTENÇÃO DOS FUNDAMENTOS UTILIZADOS EM PRIMEIRO GRAU. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2015.041409-2, de São José, rel. Des. Jorge Schaefer Martins, Quarta Câmara Criminal, j. 19-11-2015).
Data do Julgamento
:
19/11/2015
Classe/Assunto
:
Quarta Câmara Criminal
Órgão Julgador
:
Rafael Rabaldo Bottan
Relator(a)
:
Jorge Schaefer Martins
Comarca
:
São José
Mostrar discussão