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Jurisprudência


TRF2 0000024-74.2010.4.02.5112 00000247420104025112

Ementa
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÕES CÍVEIS. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. OMISSÃO NO MONITORAMENTO DA EXECUÇÃO DE OBRAS DE MANUTENÇÃO DE RODOVIAS FEDERAIS. LAVRATURA DE TERMOS ADITIVOS EM DESCONFORMIDADE COM A LEGISLAÇÃO. DANO AO ERÁRIO CONFIGURADO. CONDENAÇÃO DOS RÉUS. 1. Na origem, em sua petição inicial, afirmou o Ministério Público Federal, em síntese, que, apesar do repasse de mais de R$ 40 milhões ao DNIT pelo Governo Federal, para a manutenção da BR-356, a rodovia encontrava-se em péssimo estado de conservação, imputável, em tese, à má gestão dos contratos de manutenção/restauração firmados entre o DNIT e as empresas prestadoras de serviços, bem como à omissão no monitoramento e execução das obras contratadas por parte dos dirigentes da autarquia rodoviária. No entender do órgão ministerial, as condutas dos réus encontrariam moldura típica nos incisos VIII, XI e XII do art. 10 e no inciso II do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa. 2. Apontou o Parquet Federal, ao todo, 5 (cinco) irregularidades, quais sejam: (i) nos documentos apresentados pelo DNIT não há informações disponíveis que permitam relacionar o objeto da intervenção com o local de realização da obra; (ii) não houve atendimento às instruções normativas expedidas pelo Tribunal de Contas da União e pelo Departamento Nacional de Estrada de Rodagem (DNER) no que concerne aos contratos UT-7-012/02 e PD-7-038/99, inexistindo quaisquer relatórios que possibilitem a reconstituição do histórico da obra e a fiscalização do serviço contratado; (iii) a lavratura de termos aditivos aos contratos UT-7-012/02 e PD-7-038/99, que ultrapassam o limite de 25% (vinte e cinco por cento) previsto no art. 65, §1º, da Lei 8.666/93, sem qualquer justificativa para tanto, e extrapolação do prazo de duração previsto no art. 57 em relação ao contrato UT-7-012/02; (iv) os serviços contratados e que deveriam garantir a boa qualidade do trecho da estrada por 10 (dez) anos, apesar de pagos, não garantem a qualidade da pavimentação nem sequer por 5 (cinco) anos; e (v) serviços contratados e pagos sem a observâncias das normas técnicas expedidas pelo DNIT, com a realização do serviço de "tapa buracos" sem o uso das técnicas e equipamentos necessários à boa execução da obra. 3. No tocante à imputação das irregularidades ao demandados, estes, na condição de Superintendentes Regionais e/ou Supervisor de Unidade Local, "possuem/possuíam a responsabilidade pela correta gestão dos convênios firmados para manutenção das rodovias da sua região/unidade (onde está a BR-356), uma vez que têm/tinham o dever de zelar pela adequada aplicação dos recursos e administração do patrimônio público, fiscalizar e orientar a execução de serviços prestados por terceiros, dentre outras competências. 4. Quanto à primeira irregularidade, decidiu-se não ter restado devidamente demonstrada pelo MPF, uma vez que a perícia colacionada aos autos não foi realizada no trecho objeto da demanda. 5. Em relação à segunda irregularidade, o Autor demonstrou, por meio do Laudo Técnico nº 016/2009, o não atendimento às instruções normativas expedidas pelo Tribunal de Contas da União e pelo Departamento Nacional de Estrada de Rodagem, no tocante aos contratos PD-7-038/99, firmado em novembro/1999 e aditivos, o qual vigorou até 20/09/2004 (construção de acostamento na rodovia BR-356), e o UT-7-012/02, firmado em 2002 e aditivos, o qual vigorou até 20/11/2008 (manutenção da rodovia BR-356, fl. 197 do apenso), sendo certo que os documentos apresentados pelos réus não se mostraram aptos a afastar a conclusões do referido laudo. 6. No que concerne à terceira irregularidade, houve a comprovação da celebração de aditivos contratuais em inobservância do limite previsto no art. 65, §1º, da Lei 8.666/93, sem a apresentação de qualquer justificativa idônea pelos réus. Muito pelo contrário, no caso do contrato PD-7-038/99-0, havia, inclusive, cláusula expressa no sentido de que os preços contratuais não seriam reajustados. Já em relação ao contrato UT-7-012/02, não houve demonstração do aumento dos custos que ensejassem os consideráveis reajustes realizados, bem como se verificaram sucessivas prorrogações contratuais, sem qualquer base legal. A manutenção de rodovias não se enquadra na ideia de serviços continuados (art. 57, II, da Lei 8.666/93), porquanto é, na verdade, uma obra de conservação e recuperação que, uma vez realizada pode deixar de ser interrompida por determinado período de tempo sem comprometer a continuidade das atividades essenciais da Administração Pública. 7. A irregularidade 4 foi comprovada através do Relatório de Inspeção de Segurança Viária elaborado pelo Departamento de Engenharia Civil e Ambiental/FT da Universidade de Brasília, que ressaltou que, até 2005, data da perícia, quase nada havia sido realizado, tendo em vista a precariedade do trecho da rodovia. Outras provas que corroboraram a deficiência em relação à drenagem e pavimentação da rodovia consistem no Laudo de Exame de Obra de Engenharia, elaborado pelo Núcleo de Criminalística do Setor Técnico Científico da Superintendência Regional no Estado do Rio de Janeiro do Departamento de Polícia Federal, em 26/04/2007 e no Laudo Técnico 16/2009, da 5ª Câmara da Assessoria Técnico-Pericial da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão (Patrimônio Público e Social), do Ministério Público Federal, que evidenciam a precariedade da rodovia. Não se desconhece a existência de intempéries climáticas na região onde se encontra a rodovia, notadamente no ano de 2007, o que, por si só, não constitui motivo para justificar o estado precário da rodovia por longos anos, defluindo, ao revés, que a principal causa decorreu do mau gerenciamento dos contratos. 8. No tocante à irregularidade 5, observa-se que é incontroverso o fato de que os serviços contratados foram realizados em desconformidade com as normas técnicas editadas pelo DNIT. A controvérsia reside em aferir se tal conduta causou ou não prejuízo ao erário, a fim de enquadrá-la no disposto no art. 10 da Lei de Improbidade, com a condenação dos réus à pena de ressarcimento. Neste ponto, consoante farto material probatório apresentado pelo Ministério Público Federal, ficou evidenciado que o serviço de manutenção da rodovia foi realizado em dissonância com as orientações técnicas do DNIT, sem a utilização dos equipamentos e maquinários recomendáveis. Tal prática, inevitavelmente, compromete a vida útil da rodovia, gerando a necessidade de novos reparos em curto lapso temporal, o que deságua em prejuízo ao erário, conforme conclusão do Laudo Técnico nº 016/2009. De outro lado, os réus não se desincumbiram do ônus probatório que lhes competia, de acordo com o disposto no art. 333, II, do CPC/73 (equivalente ao atual art. 373, II, do CPC). A tese defensiva baseia-se apenas em ofício subscrito por um dos demandados, que não encontra qualquer amparo na prova dos autos. Não há qualquer documento que demonstre a posterior execução regular do serviço e que o pagamento tenha sido realizado apenas após o atendimento das orientações técnicas contidas nas IS 13/04 e 14/04. 9. Cabível a condenação dos réus à pena de ressarcimento do dano, uma vez que é certo o prejuízo ao erário, porquanto a conduta ilícita e ímproba dos réus levou a Administração à má alocação de recursos públicos, pois não demonstrada a devida aplicação das verbas nos objetos contratuais firmados e analisados no presente feito, além do dano social causado pelas suas más execuções. 10. A multa civil tem natureza punitiva e não ressarcitória, sendo certo que não deverá ser fixada em montante extremamente excessivo em razão da situação econômica do ímprobo, tampouco em montante irrisório, pois, nesse caso, nenhum efeito intimidativo ou corretivo seria produzido. No caso, na fixação da multa, deverá ser levada em consideração a culpabilidade, bem como a situação financeira dos réus. Diante da gravidade da conduta perpetrada pelos réus (negligência na fiscalização da execução de vultosos contratos, que resultou no sucateamento de rodovia federal, e lavratura de termos aditivos de contratos de valores elevados em desconformidade com a legislação), e não havendo elementos concretos acerca de suas situações financeiras, a condenação deve ser fixada em 10% (dez por cento) do valor do dano, com base no art. 12, II, da Lei de Improbidade Administrativa. E no que concerne ao terceiro réu, a multa civil deve ser fixada em 5% (cinco por cento) do valor do dano, tendo em vista que foi condenado apenas em relação às irregularidades 4 e 5. 11. A suspensão dos direitos políticos, durante determinado lapso temporal, a depender da infração cometida, é punição que retira do agente provisoriamente sua qualidade de cidadão, na medida em que não pode usufruir de seus direitos políticos, de votar e de ser votado, bem como de diversos direitos que são decorrentes da cidadania (p. ex., exercer cargo público, ajuizar ação popular). Quanto à mencionada pena, a lei prevê o prazo de 5 (cinco) a 8 (oito) anos (o inciso II do art. 12 do mencionado diploma legal), com relação à infração praticada (art. 10, caput e inciso I, da LIA). Nesse particular, diante das circunstâncias fáticas do caso concreto, mostra-se suficiente a fixação no prazo mínimo. 12. Conforme destaca a doutrina, a penalidade de perda do cargo público não se refere apenas àquele exercido quando da prática do ato de improbidade. Com efeito, não faz qualquer sentido permitir que agente público ímprobo permaneça nos quadros da Administração Pública tão somente por não ocupar mais o cargo que exercia quando da prática do ato. O objeto da penalidade é afastar o mal servidor público, qualquer que seja a função exercida, a fim de que não possa causar novos danos ao erário público ou praticar novas violações aos princípios constitucionais da Administração. Precedente do STJ. Lição de Emerson Garcia. 13. Considerando o alto valor da condenação, é razoável a fixação de honorários advocatícios no percentual de 5% (cinco por cento), com base no disposto no art. 20,§4º, do Código de Processo Civil vigente à época em que proferida a sentença recorrida. 14. Remessa necessária e recursos de apelação conhecidos e parcialmente providos. Agravos retidos não conhecidos.

Data do Julgamento : 29/09/2016
Classe/Assunto : APELAÇÃO CÍVEL
Órgão Julgador : 8ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a) : GUILHERME DIEFENTHAELER
Comarca : TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : JOSÉ ANTONIO NEIVA
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