TRF2 0000097-15.2011.4.02.5111 00000971520114025111
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. ILHA DO JORGE. ILHA COSTEIRA E TERRENO
DE MARINHA. PROPRIEDADE DA UNIÃO FEDERAL. COISA JULGADA PERANTE A JUSTIÇA
ESTADUAL. EFEITOS. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO DA UNIÃO FEDERAL. 1- Primeiramente,
por força da aplicação analógica do disposto no art.19 da Lei nº 4.717/1974-
" A sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da ação está
sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de
confirmada pelo tribunal; da que julgar a ação procedente caberá apelação, com
efeito suspensivo"-, há remessa necessária na hipótese dos autos. 2- A presente
Ação Civil Pública foi ajuizada pelo Ministério Público Federal contra com
vistas à condenação da parte ré a demolir "todas as construções irregulares
feitas" no lote 18-B do Condomínio Ilha do Jorge, área de domínio da União
Federal, situada na Ilha do Jorge em Angra dos Reis, que teriam causado
significativos danos à Área de Preservação Permanente e à APA de Tamoios. De
acordo com a inicial, as construções irregulares incluem uma residência de
dois pavimentos erguida sobre um aterro no costão rochoso e sobre o espelho
d´água, além de uma rampa para embarcações também sobre o referido costão
e o espelho d´água e de um píer e um deck. 3- Em relação as irregularidades
praticadas no local, o Município de Angra dos Reis teria ajuizado a ação civil
pública nº 2007.003.013428-9 contra a segunda ré perante a Justiça Estadual,
no curso da qual teria sido celebrado acordo para a extinção do processo
mediante o replantio de 20.000 metros quadrados de vegetação nativa. 4- Os
danos ambientais aqui apontados foram perpetrados em imóvel situado na chamada
Ilha do Jorge que, consoante decisão proferida nos autos da ação declaratória
nº 200951010147835, ajuizada pelo Escritório de Advocacia que tem o mesmo nome
do Réu da presente demanda, é ilha costeira de propriedade da União Federal
"eis que os Apelantes não lograram êxito em demonstrar a regularidade do início
da cadeia sucessória para ensejar o reconhecimento da aquisição dos terrenos
como objeto de propriedade privada/particular". 5- Além disso, os cadastros
da Secretaria de Patrimônio da União classificam o terreno em questão como
"marinha com nacional interior", havendo certidões nos autos confirmando
que, pelo menos parte daquelas terras, são de fato áreas de marinha (vide
certidão de fl.62). Não havendo controvérsia a respeito da constatação de
que as construções impugnadas foram erguidas diretamente na praia e sobre o
espelho d´água, sabidamente bem de uso comum do povo, e se estenderam para o
interior da Ilha, atingindo as áreas adjacentes compostas de acrescidos e de
terrenos de marinha.Exatamente em razão disso, ou seja, por se tratar de dano
ambiental ocorrido em área de propriedade da União Federal, houve atuação
do IBAMA na época, tendo aquele Instituto lavrado o auto de infração acima
mencionado. 1 6- Contudo, o notório interesse da União Federal não restou
preservado naquela Ação Civil Pública promovida pelo Município de Angra dos
Reis, apesar de, na citada demanda, o Município de Angra ter deduzido pretensão
contra a Ré Sônia Maria Paes Barreto Salomão fundada em causa de pedir cujos
fundamentos foram muito além do mero descumprimento do seu Código de Obras e
Plano Diretor. Abordou-se que as construções consubstanciaram crime ambiental,
que violariam o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, que resultaram na
criação de aterro em propriedade da União, que as construções teriam sido
realizadas em área não edificante da APA Estadual de Tamoios, tendo havido
supressão do espelho d´água e de acrescidos de marinha. Ao final, formulou-se
pleito dirigido à remoção de todas as construções, à condenação da parte ré
reparar os danos ambientais e a ressarcir os danos morais coletivos. 7- A
União Federal em momento algum foi intimada para manifestar eventual interesse
no deslinde daquela lide. Pior que isso. Sem que tivesse sequer sido aferida
a real extensão do dano, com a inauguração da fase de produção probatória, o
Município concordou com a extinção prematura demanda através de uma tratativa,
na qual a parte ré se isentaria de qualquer responsabilidade mediante o
plantio de 20.000 metros quadrados de vegetação nativa da mata atlântica,
acordo que foi devidamente homologada pela Justiça Estadual. 8- É certo que
indivisibilidade ínsita à tutela ambiental, aliada à legitimação extraordinária
concorrente e disjuntiva, nos levaria a concluir que a coisa julgada formada
naquela ação civil pública, ainda que ajuizada por apenas um legitimado,
alcançaria não só todos os substituídos processualmente, como também todos
os demais possíveis substitutos, dentre eles, a União Federal.Todavia, tal
extensão, conforme alerta do Saudoso Professor JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA,
não pode ocorrer de forma automática, sob pena de, na generalização açodada,
se cometer "óbvia" injustiça. Confira-se: Reveste-se a questão de maior
gravidade, quando o resultado do primeiro processo é desfavorável ao legitimado
(ou ao grupo de legitimados) que o instaurou, com o fim de obter proteção
para o interesse coletivo. De um lado, há que se considerar a "posição dos
restantes interessados", que permaneceram estranhos ao pleito e, por isso,
não tiveram oportunidade de apresentar razões nem provas. Podem eles ter
motivos para entender que o teor do julgamento proferido se explica não pela
debilidade intrínseca da causa, mas pela inabilidade na respectiva condução,
por parte de quem, ajuizando-a, não soube explorar os melhores argumentos, ou
produzir as provas mais convincentes. Nem fica sequer excluída a eventualidade
de conluio entre as partes do processo: o legitimado que se antecipou aos
outros, mancomunado com o adversário, provocou ele mesmo a própria derrota,
deixando intencionalmente de utilizar as armas de que dispunha. Em tais
condições, seria óbvia a injustiça privar os outros legitimados de obter novo
pronunciamento judicial sobre o litígio. Não se afigura recomendável, assim,
a extensão pura e simples da coisa julgada aos co-titulares do interesse
coletivo. (BARBOSA MOREIRA, José Carlos, Tutela Jurisdicional dos Interesses
Coletivos ou Difusos, Revista de Processo, v. 39, p.55, Jul/1985) 9- Se é assim
nos casos em que o mérito da controvérsia foi em sua inteireza examinado na
ação anterior, imagina na hipótese em exame, na qual houve abrupta extinção
do feito, sem que nenhuma evidência tivesse sido revolvida e nada tivesse
sido definido, contra ou a favor, da parte ré. O que se viu naqueles autos
está longe disso. Na citada Ação Civil Pública a composição foi alcançada
com concessões mútuas, notadamente por parte do Município, que efetivamente
renunciou às pretensões de demolição das construções, de recomposição do dano
e de indenização por dano moral coletivo, renunciando de forma indevida ao
próprio direito material, flagrantemente indisponível, e isso porque o ente
Municipal não detinha verdadeiro 2 interesse sobre a área de propriedade
da União 10- Assim, e independentemente de se aferir se há injustiça ou
não na decisão transitada em julgado, o prosseguimento da demanda perante à
Justiça Estadual sem que a União Federal tivesse sido instada a intervir na
relação processual teve o condão de, por si só, resultar na ineficácia do
provimento jurisdicional em relação àquele Ente Federal. 11-Tal conclusão
não decorre de eventual não observância de litisconsórcio, cuja natureza,
se necessário ou não, não precisa ser aqui enfrentada. Isso porque, ainda
que se afirme que o Município é, por si só, parte legítima para perseguir a
proteção do meio ambiente através do ajuizamento de uma Ação Civil Pública,
não se pode desconsiderar o interesse direto do substituído proprietário
da área atingida na solução da controvérsia, mormente quando se trata de
"interesse qualificado" pela natureza da parte interessada, no caso Ente
cuja presença, nos termos do art.109 da Constituição da República, resulta na
fixação da competência da Justiça Federal. 12- Se o Município, conforme relata
a inicial, apoiou as suas pretensões na alegação de que a área em questão
seria terreno de marinha, sendo também de notório conhecimento que o local
é uma Ilha Costeira, é indubitável que deveria ter requerido a intimação
da União Federal para manifestar o seu interesse na demanda. Entendimento
em sentido contrário resulta em flagrante burla à competência da Justiça
Federal sobre a matéria, permitindo que questões diretamente ligadas a
interesse da União Federal sejam solucionadas pela Justiça Estadual em lide
parcial e com prejuízo direto ao exercício do direito de defesa por aquele
Ente Federado. Note-se que o interesse em questão não se resume àquele
que colegitimaria a atuação genérica da União Federal na defesa do meio
ambiental. A respeito desse há coincidência entre o interesse da União e o do
Município, ambos no exercício da tutela ambiental. O interesse de que aqui se
trata vai além disso, ligando-se à condição da União Federal de substituída
proprietária da área afetada pelas intervenções. É, como dito, um interesse
qualificado, cuja observância requer o ingresso da União Federal na lide com
a consequente remessa dos autos à Justiça Federal. 13-Nessa linha, trecho
do voto do Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI no julgamento do RESp 44002/SE,
DJ 06.12.2004, que aborda, especificamente, a necessidade de se observar o
interesse da União Federal em ação civil pública ajuizada em decorrência de
dano ambiental. Confira-se: Na ação civil pública, a legitimação ativa é em
regime de substituição processual. Versando sobre direitos transindividuais,
com titulares indeterminados, não é possível, em regra, verificar a identidade
dos substituídos. Há casos, todavia, em que a tutela de direitos difusos
não pode ser promovida sem que, ao mesmo tempo, se promova a tutela de
direitos subjetivos de pessoas determinadas e perfeitamente. É o que ocorre
nas ações civis públicas em defesa do patrimônio público ou da probidade
administrativa, cuja sentença condenatória reverte em favor das pessoas
titulares do patrimônio lesado. Tais pessoas certamente compõem o rol dos
substituídos processuais. Havendo, entre elas, ente federal, fica definida a
legitimidade ativa do Ministério Público Federal. 14- Considerado tudo isso,
a coisa julgada formada na Justiça Estadual não atinge a União Federal, que
não teve naquela seara tutelado o seu direito subjetivo de proprietária da área
atingida, sendo certo que somente a Justiça Federal está constitucionalmente
habilitada a proferir sentença que vincule as pessoas mencionadas no
inciso I do art.109 da Constituição da República. Noutro eito, não altera
a conclusão acima o fato de o Ministério Público Estadual ter anuído com
a homologação do citado TAC. Além de ter atuado naqueles autos apenas na
condição de custos legis, é evidente que suas atribuições são diferentes
das do Ministério 3 Público Federal e não contemplam o ajuizamento de ação
civil pública destinada à reparação de danos ocorridos em área federal,
como é o caso. 15-Remessa necessária e apelos providos. Sentença anulada.
Ementa
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. ILHA DO JORGE. ILHA COSTEIRA E TERRENO
DE MARINHA. PROPRIEDADE DA UNIÃO FEDERAL. COISA JULGADA PERANTE A JUSTIÇA
ESTADUAL. EFEITOS. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO DA UNIÃO FEDERAL. 1- Primeiramente,
por força da aplicação analógica do disposto no art.19 da Lei nº 4.717/1974-
" A sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da ação está
sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de
confirmada pelo tribunal; da que julgar a ação procedente caberá apelação, com
efeito suspensivo"-, há remessa necessária na hipótese dos autos. 2- A presente
Ação Civil Pública foi ajuizada pelo Ministério Público Federal contra com
vistas à condenação da parte ré a demolir "todas as construções irregulares
feitas" no lote 18-B do Condomínio Ilha do Jorge, área de domínio da União
Federal, situada na Ilha do Jorge em Angra dos Reis, que teriam causado
significativos danos à Área de Preservação Permanente e à APA de Tamoios. De
acordo com a inicial, as construções irregulares incluem uma residência de
dois pavimentos erguida sobre um aterro no costão rochoso e sobre o espelho
d´água, além de uma rampa para embarcações também sobre o referido costão
e o espelho d´água e de um píer e um deck. 3- Em relação as irregularidades
praticadas no local, o Município de Angra dos Reis teria ajuizado a ação civil
pública nº 2007.003.013428-9 contra a segunda ré perante a Justiça Estadual,
no curso da qual teria sido celebrado acordo para a extinção do processo
mediante o replantio de 20.000 metros quadrados de vegetação nativa. 4- Os
danos ambientais aqui apontados foram perpetrados em imóvel situado na chamada
Ilha do Jorge que, consoante decisão proferida nos autos da ação declaratória
nº 200951010147835, ajuizada pelo Escritório de Advocacia que tem o mesmo nome
do Réu da presente demanda, é ilha costeira de propriedade da União Federal
"eis que os Apelantes não lograram êxito em demonstrar a regularidade do início
da cadeia sucessória para ensejar o reconhecimento da aquisição dos terrenos
como objeto de propriedade privada/particular". 5- Além disso, os cadastros
da Secretaria de Patrimônio da União classificam o terreno em questão como
"marinha com nacional interior", havendo certidões nos autos confirmando
que, pelo menos parte daquelas terras, são de fato áreas de marinha (vide
certidão de fl.62). Não havendo controvérsia a respeito da constatação de
que as construções impugnadas foram erguidas diretamente na praia e sobre o
espelho d´água, sabidamente bem de uso comum do povo, e se estenderam para o
interior da Ilha, atingindo as áreas adjacentes compostas de acrescidos e de
terrenos de marinha.Exatamente em razão disso, ou seja, por se tratar de dano
ambiental ocorrido em área de propriedade da União Federal, houve atuação
do IBAMA na época, tendo aquele Instituto lavrado o auto de infração acima
mencionado. 1 6- Contudo, o notório interesse da União Federal não restou
preservado naquela Ação Civil Pública promovida pelo Município de Angra dos
Reis, apesar de, na citada demanda, o Município de Angra ter deduzido pretensão
contra a Ré Sônia Maria Paes Barreto Salomão fundada em causa de pedir cujos
fundamentos foram muito além do mero descumprimento do seu Código de Obras e
Plano Diretor. Abordou-se que as construções consubstanciaram crime ambiental,
que violariam o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, que resultaram na
criação de aterro em propriedade da União, que as construções teriam sido
realizadas em área não edificante da APA Estadual de Tamoios, tendo havido
supressão do espelho d´água e de acrescidos de marinha. Ao final, formulou-se
pleito dirigido à remoção de todas as construções, à condenação da parte ré
reparar os danos ambientais e a ressarcir os danos morais coletivos. 7- A
União Federal em momento algum foi intimada para manifestar eventual interesse
no deslinde daquela lide. Pior que isso. Sem que tivesse sequer sido aferida
a real extensão do dano, com a inauguração da fase de produção probatória, o
Município concordou com a extinção prematura demanda através de uma tratativa,
na qual a parte ré se isentaria de qualquer responsabilidade mediante o
plantio de 20.000 metros quadrados de vegetação nativa da mata atlântica,
acordo que foi devidamente homologada pela Justiça Estadual. 8- É certo que
indivisibilidade ínsita à tutela ambiental, aliada à legitimação extraordinária
concorrente e disjuntiva, nos levaria a concluir que a coisa julgada formada
naquela ação civil pública, ainda que ajuizada por apenas um legitimado,
alcançaria não só todos os substituídos processualmente, como também todos
os demais possíveis substitutos, dentre eles, a União Federal.Todavia, tal
extensão, conforme alerta do Saudoso Professor JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA,
não pode ocorrer de forma automática, sob pena de, na generalização açodada,
se cometer "óbvia" injustiça. Confira-se: Reveste-se a questão de maior
gravidade, quando o resultado do primeiro processo é desfavorável ao legitimado
(ou ao grupo de legitimados) que o instaurou, com o fim de obter proteção
para o interesse coletivo. De um lado, há que se considerar a "posição dos
restantes interessados", que permaneceram estranhos ao pleito e, por isso,
não tiveram oportunidade de apresentar razões nem provas. Podem eles ter
motivos para entender que o teor do julgamento proferido se explica não pela
debilidade intrínseca da causa, mas pela inabilidade na respectiva condução,
por parte de quem, ajuizando-a, não soube explorar os melhores argumentos, ou
produzir as provas mais convincentes. Nem fica sequer excluída a eventualidade
de conluio entre as partes do processo: o legitimado que se antecipou aos
outros, mancomunado com o adversário, provocou ele mesmo a própria derrota,
deixando intencionalmente de utilizar as armas de que dispunha. Em tais
condições, seria óbvia a injustiça privar os outros legitimados de obter novo
pronunciamento judicial sobre o litígio. Não se afigura recomendável, assim,
a extensão pura e simples da coisa julgada aos co-titulares do interesse
coletivo. (BARBOSA MOREIRA, José Carlos, Tutela Jurisdicional dos Interesses
Coletivos ou Difusos, Revista de Processo, v. 39, p.55, Jul/1985) 9- Se é assim
nos casos em que o mérito da controvérsia foi em sua inteireza examinado na
ação anterior, imagina na hipótese em exame, na qual houve abrupta extinção
do feito, sem que nenhuma evidência tivesse sido revolvida e nada tivesse
sido definido, contra ou a favor, da parte ré. O que se viu naqueles autos
está longe disso. Na citada Ação Civil Pública a composição foi alcançada
com concessões mútuas, notadamente por parte do Município, que efetivamente
renunciou às pretensões de demolição das construções, de recomposição do dano
e de indenização por dano moral coletivo, renunciando de forma indevida ao
próprio direito material, flagrantemente indisponível, e isso porque o ente
Municipal não detinha verdadeiro 2 interesse sobre a área de propriedade
da União 10- Assim, e independentemente de se aferir se há injustiça ou
não na decisão transitada em julgado, o prosseguimento da demanda perante à
Justiça Estadual sem que a União Federal tivesse sido instada a intervir na
relação processual teve o condão de, por si só, resultar na ineficácia do
provimento jurisdicional em relação àquele Ente Federal. 11-Tal conclusão
não decorre de eventual não observância de litisconsórcio, cuja natureza,
se necessário ou não, não precisa ser aqui enfrentada. Isso porque, ainda
que se afirme que o Município é, por si só, parte legítima para perseguir a
proteção do meio ambiente através do ajuizamento de uma Ação Civil Pública,
não se pode desconsiderar o interesse direto do substituído proprietário
da área atingida na solução da controvérsia, mormente quando se trata de
"interesse qualificado" pela natureza da parte interessada, no caso Ente
cuja presença, nos termos do art.109 da Constituição da República, resulta na
fixação da competência da Justiça Federal. 12- Se o Município, conforme relata
a inicial, apoiou as suas pretensões na alegação de que a área em questão
seria terreno de marinha, sendo também de notório conhecimento que o local
é uma Ilha Costeira, é indubitável que deveria ter requerido a intimação
da União Federal para manifestar o seu interesse na demanda. Entendimento
em sentido contrário resulta em flagrante burla à competência da Justiça
Federal sobre a matéria, permitindo que questões diretamente ligadas a
interesse da União Federal sejam solucionadas pela Justiça Estadual em lide
parcial e com prejuízo direto ao exercício do direito de defesa por aquele
Ente Federado. Note-se que o interesse em questão não se resume àquele
que colegitimaria a atuação genérica da União Federal na defesa do meio
ambiental. A respeito desse há coincidência entre o interesse da União e o do
Município, ambos no exercício da tutela ambiental. O interesse de que aqui se
trata vai além disso, ligando-se à condição da União Federal de substituída
proprietária da área afetada pelas intervenções. É, como dito, um interesse
qualificado, cuja observância requer o ingresso da União Federal na lide com
a consequente remessa dos autos à Justiça Federal. 13-Nessa linha, trecho
do voto do Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI no julgamento do RESp 44002/SE,
DJ 06.12.2004, que aborda, especificamente, a necessidade de se observar o
interesse da União Federal em ação civil pública ajuizada em decorrência de
dano ambiental. Confira-se: Na ação civil pública, a legitimação ativa é em
regime de substituição processual. Versando sobre direitos transindividuais,
com titulares indeterminados, não é possível, em regra, verificar a identidade
dos substituídos. Há casos, todavia, em que a tutela de direitos difusos
não pode ser promovida sem que, ao mesmo tempo, se promova a tutela de
direitos subjetivos de pessoas determinadas e perfeitamente. É o que ocorre
nas ações civis públicas em defesa do patrimônio público ou da probidade
administrativa, cuja sentença condenatória reverte em favor das pessoas
titulares do patrimônio lesado. Tais pessoas certamente compõem o rol dos
substituídos processuais. Havendo, entre elas, ente federal, fica definida a
legitimidade ativa do Ministério Público Federal. 14- Considerado tudo isso,
a coisa julgada formada na Justiça Estadual não atinge a União Federal, que
não teve naquela seara tutelado o seu direito subjetivo de proprietária da área
atingida, sendo certo que somente a Justiça Federal está constitucionalmente
habilitada a proferir sentença que vincule as pessoas mencionadas no
inciso I do art.109 da Constituição da República. Noutro eito, não altera
a conclusão acima o fato de o Ministério Público Estadual ter anuído com
a homologação do citado TAC. Além de ter atuado naqueles autos apenas na
condição de custos legis, é evidente que suas atribuições são diferentes
das do Ministério 3 Público Federal e não contemplam o ajuizamento de ação
civil pública destinada à reparação de danos ocorridos em área federal,
como é o caso. 15-Remessa necessária e apelos providos. Sentença anulada.
Data do Julgamento
:
01/12/2017
Data da Publicação
:
07/12/2017
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
8ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
VERA LÚCIA LIMA
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
MARCELO PEREIRA DA SILVA
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