TRF2 0000803-28.2011.4.02.5101 00008032820114025101
Nº CNJ : 0000803-28.2011.4.02.5101 (2011.51.01.000803-9) RELATOR :
Desembargador Federal RICARDO PERLINGEIRO APELANTE : MARIA LUCIA RIBEIRO
E OUTRO ADVOGADO : ALBERTINHO POSSAMAI E OUTRO APELADO : OS MESMOS
ORIGEM : 21ª Vara Federal do Rio de Janeiro (00008032820114025101)
EME NTA ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PENSÃO POR MORTE. PAGAMENTO
A MAIOR. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA NÃO
CONFIGURADA. PRESCRIÇÃO. RECONHECIMENTO DA CONFIANÇA LEGÍTIMA. EFEITOS EX
TUNC. IMPOSSIBILIDADE DE DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO PARA RESTITUIÇÃO AO
E RÁRIO. 1. Pensão por morte paga a dependente de servidor público vinculado
ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios do extinto Estado
da Guanabara. Parâmetros de cálculo do benefício modificados por força da
edição da Lei 9.421/96. Pagamentos de funções comissionadas que passaram a
ter por base de cálculo o valor do Adicional de Padrão Judiciário (APJ) e da
Gratificação de Atividade Judiciária (GAJ). Critérios não observados pela
Administração Pública. Manutenção da sistemática de pagamento que vigorava
antes do advento da Lei 9.421/96. Posterior determinação do Tribunal de Contas
da União (TCU) para readequação do valor da pensão e respectiva devolução
aos cofres públicos do montante recebido a m aior. 2. Redução do benefício
e notificação da interessada em setembro de 2010 para ressarcimento dos
valores equivocadamente percebidos entre os anos de 2004 e 2010. Sentença
de primeiro grau que, ao argumento da boa-fé, afastou a obrigatoriedade de
restituição ao erário, autorizando, no entanto, que a Administração efetuasse
as modificações necessárias no benefício da interessada. 3. Decadência
administrativa não reconhecida. Instituto que não se aplica a qualquer
comportamento da Administração. Não incidência em relação a comportamentos que
digam respeito ao campo do direito privado ou que impliquem atos materiais,
meramente executórios de decisões e atos administrativos, tal como o pagamento
de um benefício. Caso vertente que envolve o pagamento a maior de determinadas
parcelas remuneratórias integrantes de uma pensão por morte. Ato de cunho
material, que não pressupõe uma atuação administrativa propriamente, tal
como ocorreria se o equívoco estivesse relacionado com a legitimidade da
concessão em si do benefício. Daí que, embora o erro no pagamento tenha
se protraído por q uase quinze anos, não há que se cogitar, na espécie,
do cômputo de prazo decadencial. 4. Aplicabilidade, por outro lado, dos
pressupostos da proteção da confiança legítima. As atuações administrativas
podem conter vícios de forma e de conteúdo, do ponto de vista fático ou
jurídico. A margem de apreciação das autoridades, quando equivocadamente
exercida, pode implicar diversos graus de invalidade: nulidade absoluta,
nulidade relativa, anulabilidade, irregularidade. Seja qual for o grau
de invalidade ou a natureza do vício - salvo para os atos inexistentes -,
deve a Administração Pública responder pelos danos que causar aos que nela
confiarem e merecerem proteção. 5. Reconhecimento que, todavia, não se
conduz unicamente por um critério objetivo, calcado na mera existência de
ato administrativo viciado que venha produzindo efeitos e traga vantagens
a certo particular. Constatação que exige sempre um juízo de apreciação
individual acerca do grau de cogniscibilidade/capacidade de reconhecimento
do erro pelo administrado, consideradas suas c aracterísticas pessoais e
as circunstâncias específicas do caso concreto. 6. Caso dos autos em que a
própria Administração reconheceu que "o Tribunal de Justiça do Distrito Federal
teve interpretação equivocada quando da aplicação da Lei 9.421/96 e da Lei
10475/02, o que ocasionou pagamento a maior dos proventos e pensões". Benefício
concedido em 1982, depreendendo-se dos autos que até o ano de 2010 persistia
a Administração realizando seu pagamento sem a observância da sistemática
de cálculo estabelecida a partir da Lei 9.421/96. Pagamento equivocado
que se protraiu por 1 q uase quinze anos. 7. Demanda que indubitavelmente
envolve valores patrimoniais significativos, uma vez que os rendimentos
da demandante, após a escorreita aplicação dos critérios da Lei 9.421/96,
passaram de aproximadamente R$ 26.000,00 (valor bruto) para R$ 14.000,00 (valor
bruto). No entanto, constata-se que o valor da pensão não sofreu variações ao
longo dos anos em virtude do erro administrativo verificado, ao contrário,
manteve-se em patamar compatível com o que sempre possui exatamente por
força de tal equívoco, uma vez que até o ano de 2010 persistia a autoridade
administrativa na utilização da forma de pagamento originária, ignorando os
novos parâmetros da Lei 9.641/96. Inexistência nos contracheques da demandante
de oscilação patrimonial que pudesse evidenciar a existência de algum erro,
tampouco de superveniente e abrupto incremento de remuneração, uma vez que,
em termos proporcionais, manteve-se o benefício em nível equivalente ao seu
valor de origem. Razoável presunção de que não estaria a seu alcance conhecer
tão profundamente as regras concernentes à previdência dos servidores públicos,
mormente tema de viés tão específico relacionado à base de cálculo utilizada
para o pagamento de funções c omissionadas, que suscitou dúvidas até para
a Administração. 8. Necessidade de distinção, no ponto, de duas hipóteses
em que poderia incorrer a Administração. No que diz respeito à constituição
de um benefício, o reconhecimento da confiança legítima implica não apenas
efeitos ex tunc, mas também efeitos ex nunc, na medida em que não estaria
na margem de discricionariedade da autoridade e tampouco de uma lei revogar
um benefício concedido. Porém, quando referente ao cálculo do valor das
prestações mensais (base de cálculo, critério de cálculo, cálculo aritmético),
as quais são suscetíveis de modificação futura, seja por ato administrativo,
seja por lei, sem que necessariamente haja ofensa a direito adquirido,
a confiança legítima surtiria efeitos tão somente ex tunc. (TRF2, 5ª
Turma Especializada, AC 201150010127180, Rel. Des. Fed. MARCUS ABRAHAM,
DJF2R 12.06.2015; TRF2, 5ª Turma Especializada, AC 200851010163241,
Rel. Des. Fed. RICARDO P ERLINGEIRO, DJF2R 17.03.2015). 9. Discussão
dos autos que refere-se a critério de cálculo de vantagem integrante de
uma pensão por morte. Circunstância na qual a Administração apenas fica
impedida de cobrar quaisquer valores recebidos anteriormente, não havendo
óbice, porém, para que proceda aos ajustes que se façam necessários na q
uantificação do benefício. 10. Manutenção da sentença impugnada, não se
reconhecendo a consumação de prazo decadencial para revisão do benefício da
interessada. Reconhecimento da existência de confiança legítima, tão somente
para impedir a realização de descontos em contracheque, autorizando-se à
Administração que empreenda as modificações necessárias no valor da pensão
da recorrente. 1 1. Remessa necessária e recurso de apelação não providos.
Ementa
Nº CNJ : 0000803-28.2011.4.02.5101 (2011.51.01.000803-9) RELATOR :
Desembargador Federal RICARDO PERLINGEIRO APELANTE : MARIA LUCIA RIBEIRO
E OUTRO ADVOGADO : ALBERTINHO POSSAMAI E OUTRO APELADO : OS MESMOS
ORIGEM : 21ª Vara Federal do Rio de Janeiro (00008032820114025101)
EME NTA ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PENSÃO POR MORTE. PAGAMENTO
A MAIOR. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA NÃO
CONFIGURADA. PRESCRIÇÃO. RECONHECIMENTO DA CONFIANÇA LEGÍTIMA. EFEITOS EX
TUNC. IMPOSSIBILIDADE DE DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO PARA RESTITUIÇÃO AO
E RÁRIO. 1. Pensão por morte paga a dependente de servidor público vinculado
ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios do extinto Estado
da Guanabara. Parâmetros de cálculo do benefício modificados por força da
edição da Lei 9.421/96. Pagamentos de funções comissionadas que passaram a
ter por base de cálculo o valor do Adicional de Padrão Judiciário (APJ) e da
Gratificação de Atividade Judiciária (GAJ). Critérios não observados pela
Administração Pública. Manutenção da sistemática de pagamento que vigorava
antes do advento da Lei 9.421/96. Posterior determinação do Tribunal de Contas
da União (TCU) para readequação do valor da pensão e respectiva devolução
aos cofres públicos do montante recebido a m aior. 2. Redução do benefício
e notificação da interessada em setembro de 2010 para ressarcimento dos
valores equivocadamente percebidos entre os anos de 2004 e 2010. Sentença
de primeiro grau que, ao argumento da boa-fé, afastou a obrigatoriedade de
restituição ao erário, autorizando, no entanto, que a Administração efetuasse
as modificações necessárias no benefício da interessada. 3. Decadência
administrativa não reconhecida. Instituto que não se aplica a qualquer
comportamento da Administração. Não incidência em relação a comportamentos que
digam respeito ao campo do direito privado ou que impliquem atos materiais,
meramente executórios de decisões e atos administrativos, tal como o pagamento
de um benefício. Caso vertente que envolve o pagamento a maior de determinadas
parcelas remuneratórias integrantes de uma pensão por morte. Ato de cunho
material, que não pressupõe uma atuação administrativa propriamente, tal
como ocorreria se o equívoco estivesse relacionado com a legitimidade da
concessão em si do benefício. Daí que, embora o erro no pagamento tenha
se protraído por q uase quinze anos, não há que se cogitar, na espécie,
do cômputo de prazo decadencial. 4. Aplicabilidade, por outro lado, dos
pressupostos da proteção da confiança legítima. As atuações administrativas
podem conter vícios de forma e de conteúdo, do ponto de vista fático ou
jurídico. A margem de apreciação das autoridades, quando equivocadamente
exercida, pode implicar diversos graus de invalidade: nulidade absoluta,
nulidade relativa, anulabilidade, irregularidade. Seja qual for o grau
de invalidade ou a natureza do vício - salvo para os atos inexistentes -,
deve a Administração Pública responder pelos danos que causar aos que nela
confiarem e merecerem proteção. 5. Reconhecimento que, todavia, não se
conduz unicamente por um critério objetivo, calcado na mera existência de
ato administrativo viciado que venha produzindo efeitos e traga vantagens
a certo particular. Constatação que exige sempre um juízo de apreciação
individual acerca do grau de cogniscibilidade/capacidade de reconhecimento
do erro pelo administrado, consideradas suas c aracterísticas pessoais e
as circunstâncias específicas do caso concreto. 6. Caso dos autos em que a
própria Administração reconheceu que "o Tribunal de Justiça do Distrito Federal
teve interpretação equivocada quando da aplicação da Lei 9.421/96 e da Lei
10475/02, o que ocasionou pagamento a maior dos proventos e pensões". Benefício
concedido em 1982, depreendendo-se dos autos que até o ano de 2010 persistia
a Administração realizando seu pagamento sem a observância da sistemática
de cálculo estabelecida a partir da Lei 9.421/96. Pagamento equivocado
que se protraiu por 1 q uase quinze anos. 7. Demanda que indubitavelmente
envolve valores patrimoniais significativos, uma vez que os rendimentos
da demandante, após a escorreita aplicação dos critérios da Lei 9.421/96,
passaram de aproximadamente R$ 26.000,00 (valor bruto) para R$ 14.000,00 (valor
bruto). No entanto, constata-se que o valor da pensão não sofreu variações ao
longo dos anos em virtude do erro administrativo verificado, ao contrário,
manteve-se em patamar compatível com o que sempre possui exatamente por
força de tal equívoco, uma vez que até o ano de 2010 persistia a autoridade
administrativa na utilização da forma de pagamento originária, ignorando os
novos parâmetros da Lei 9.641/96. Inexistência nos contracheques da demandante
de oscilação patrimonial que pudesse evidenciar a existência de algum erro,
tampouco de superveniente e abrupto incremento de remuneração, uma vez que,
em termos proporcionais, manteve-se o benefício em nível equivalente ao seu
valor de origem. Razoável presunção de que não estaria a seu alcance conhecer
tão profundamente as regras concernentes à previdência dos servidores públicos,
mormente tema de viés tão específico relacionado à base de cálculo utilizada
para o pagamento de funções c omissionadas, que suscitou dúvidas até para
a Administração. 8. Necessidade de distinção, no ponto, de duas hipóteses
em que poderia incorrer a Administração. No que diz respeito à constituição
de um benefício, o reconhecimento da confiança legítima implica não apenas
efeitos ex tunc, mas também efeitos ex nunc, na medida em que não estaria
na margem de discricionariedade da autoridade e tampouco de uma lei revogar
um benefício concedido. Porém, quando referente ao cálculo do valor das
prestações mensais (base de cálculo, critério de cálculo, cálculo aritmético),
as quais são suscetíveis de modificação futura, seja por ato administrativo,
seja por lei, sem que necessariamente haja ofensa a direito adquirido,
a confiança legítima surtiria efeitos tão somente ex tunc. (TRF2, 5ª
Turma Especializada, AC 201150010127180, Rel. Des. Fed. MARCUS ABRAHAM,
DJF2R 12.06.2015; TRF2, 5ª Turma Especializada, AC 200851010163241,
Rel. Des. Fed. RICARDO P ERLINGEIRO, DJF2R 17.03.2015). 9. Discussão
dos autos que refere-se a critério de cálculo de vantagem integrante de
uma pensão por morte. Circunstância na qual a Administração apenas fica
impedida de cobrar quaisquer valores recebidos anteriormente, não havendo
óbice, porém, para que proceda aos ajustes que se façam necessários na q
uantificação do benefício. 10. Manutenção da sentença impugnada, não se
reconhecendo a consumação de prazo decadencial para revisão do benefício da
interessada. Reconhecimento da existência de confiança legítima, tão somente
para impedir a realização de descontos em contracheque, autorizando-se à
Administração que empreenda as modificações necessárias no valor da pensão
da recorrente. 1 1. Remessa necessária e recurso de apelação não providos.
Data do Julgamento
:
09/02/2017
Data da Publicação
:
14/02/2017
Classe/Assunto
:
APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e
do Trabalho
Órgão Julgador
:
5ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
RICARDO PERLINGEIRO
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
RICARDO PERLINGEIRO
Mostrar discussão