TRF2 0001108-23.2008.4.02.5002 00011082320084025002
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10 E 11
DA LEI 8.429/92. VERBAS PÚBLICAS RECEBIDAS ATRAVÉS DE CONVÊNIO PARA AQUISIÇÃO
DE UNIDADE MÓVEL DE SAÚDE. MÁFIA DAS AMBULÂNCIAS. BURLA AO PROCEDIMENTO DE
LICITAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM EM FACE DE DECISÃO DO TCU. APELAÇÕES
DOS RÉUS DESPROVIDAS. REMESSA NECESSÁRIA C ONHECIDA E PROVIDA. 1. Trata-se
de Ação Civil Pública ajuizada pelo MPF, sob o argumento que os Requeridos,
na condição de Prefeito de Ibitirama/ES e Presidente da Comissão de
Licitação, ofenderam Princípios da Administração Pública, ante a realização
de procedimento licitatório para a aquisição de unidade móvel de saúde com
inúmeras ilegalidades e afrontas à Lei 8.666/93; bem como causaram prejuízo
ao erário, o que configura os atos de improbidade a dministrativa previstos
nos artigos 10 e 11 da Lei 8.429/92; 2. Não há que se falar em prescrição,
uma vez que a presente Ação Civil Público restou ajuizada em 02/09/2008
e o mandato (de Prefeito) do primeiro Demandado acabou em 31/12/2004, não
tendo, assim, decorrido os 5 (cinco) anos indicados na legislação aplicável
( art. 23, I da Lei 8.429/92). 3. Da mesma forma, não há como se acolher a
prescrição suscitada pelo segundo Requerido, uma vez que sequer informou
a data em que teria se afastado do cargo, bem como nada trouxe aos autos
com vistas à comprovação de suas alegações, limitando-se a mencionar que
"ocupou provisoriamente o cargo de confiança concernente à Presidência da
Comissão de Licitação da PMI, desocupando-o antes mesmo do término do mandato
eletivo do primeiro requerido junto à Chefia do Poder Executivo". Assim,
cabia ao Apelante juntar aos autos elementos suficientes a comprovar tal
afirmação, o que não fez, deixando de observar o d isposto no artigo 373,
inciso II, do Código de Processo Civil/2015. 4. Está suficientemente
demonstrada a existência de inúmeras irregularidades e ilegalidades no
procedimento licitatório relacionado ao convênio em questão, dentre as
quais destaco: (a) Fracionamento indevido do valor do convênio 1057/2002,
para realização de licitação pela modalidade convite, ferindo o disposto
no art. 23, II da Lei 8.666/93; (b) Direcionamento das licitações, através
de cartas-convite, às empresas participantes do esquema criminoso chamado
"Máfia das Ambulâncias"; (c) Ausência de pesquisas de preço, conforme exigido
no art. 15, V e § 1º e no art. 40, § 2º da Lei 8.666/93; (d) Aquisição da 1
a mbulância com sobrepreço. 5. Além de estar suficientemente demonstrada a
existência das inúmeras ilegalidades referidas, no procedimento licitatório
em questão, os Demandados não indicaram provas e/ou elementos capazes de
afastar as referidas ilegalidades, limitando-se a alegar, em suas razões
recursais, a ausência dolo ou mesmo culpa grave pelo resultado danoso do
objeto da ação de improbidade administrativa, numa tentativa de afastar suas
responsabilidades pelos f atos narrados. 6. É incontroverso que os Demandados,
na condição de Chefe do Poder Executivo Municipal e de Presidente da Comissão
de Licitações, têm o dever de agir pautado nos Princípios Constitucionais
essenciais ao Estado Democrático de Direito, previstos no art. 37 da Carta
Magna, o que não se percebe no caso dos autos, uma vez que infringiram
normas legais (Legalidade); favoreceram, intencionalmente, determinadas
empresas que faziam parte do esquema criminoso (Impessoalidade); deixaram de
publicizar os procedimentos licitatórios ao adotar a modalidade incorreta
(Publicidade); não permitiram a ampla concorrência, o que proporcionaria a
aquisição de uma unidade móvel de saúde por menos preço e/ou melhor q ualidade
(Eficiência). 7. Se não bastasse, quem atua na condição de gerir/receber verbas
públicas deve manter conduta ética, agindo sempre dentro da verdade em busca
do bem da coletividade, o que não ocorreu no caso em apreço, tendo os Réus
violado o Princípio da Moralidade, ofendendo, ainda, os deveres inerentes
aos cargos ocupados, de Honestidade e Lealdade à instituição q ue servem
(art. 11, caput da Lei 8.429/92). 8. É evidente a materialização do dolo,
especialmente quando se tem em conta que, pela própria função exercida pelos
Réus, sabiam da inadmissibilidade de fracionamento do objeto a licitar,
para fugir da modalidade escorreita de licitação, e da obrigatoriedade de
realização de pesquisa de preços para apuração do parâmetro de mercado como
forma de e vitar aquisições com sobrepreço. 9. Quanto ao ato ímprobo de dano
ao erário indicado na inicial, previsto no art. 10 da LIA, incontroversa
sua prática pelos Demandados/Recorrentes, uma vez que a lesão ao patrimônio
público mostra-se patente, uma vez que o montante da verba destinada a despesa
específica (aquisição de unidade móvel de saúde) foi mal empregado, ante a
ausência de pesquisa de valores, e a consequente aquisição da ambulância com
sobrepreço; o que basta para d emonstração de dano ao erário pelos Réus. 10. A
configuração do dano ao erário como ato de improbidade administrativa não
exige a ocorrência do enriquecimento ilícito por parte do agente ímprobo
(modalidade específica de i mprobidade administrativa prevista no art. 9º
da LIA). 11. Não prospera a alegação dos Réus/Apelantes, de existência de
bis in idem, em razão de já terem sido condenados na esfera extrajudicial
(Tribunal de Contas da União), uma vez que a Ação de Improbidade Administrativa
possui natureza civil (STF, ADI 2797, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence,
Tribunal Pleno, j. em 15/09/2005); e, sendo um ato de natureza civil e,
considerando a independência existente entre as instâncias, nada impede que
a prática deste ato irradie efeitos nas três esferas jurídicas: penal, cível
e administrativa, razão pela qual inexiste o bis in idem alegado, nos exatos
termos do disposto no parágrafo 4º do artigo 37 da Constituição da República
(TRF2, Oitava Turma, AG 0012653-17.2015.4.02.0000, Rel. Des. Fed. Marcelo
Pereira, j. em 05/10/2016, por u nanimidade). 12. Não há motivos para acolher
as arguições formulados pelo Réu P.L.B., referentes à multa aplicada, uma vez
que não há que se falar em sentença extra petita, ou em 2 desproporcionalidade
do valor da multa aplicada (R$ 34.466,40 - trinta e quatro mil e quatrocentos
e sessenta e seis reais e quarenta centavos), uma vez que o Juízo a quo
respeitou os limites indicados na Lei 8.429/92, aplicando a multa no valor
equivalente ao dano (art. 12, II: "pagamento de multa civil de até duas
vezes o valor do dano") e; considerando que tal sanção tem fins punitivos,
o montante fixado observou a gravidade dos f atos e a reprovabilidade das
ações perpetradas pelos Réus. 13. Considerando o disposto no art. 398, CC,
não prospera a alegação do Réu, de que "não lhe é justo transferir a pecha
de responsabilidade da atualização monetária", e que esta não pode retroagir
a data do evento danoso, porquanto se trata de condenação decorrente de
a to ilícito. 14. Embora tenha constado no dispositivo na sentença que o
processo foi julgado "procedente", verifico que, na verdade, houve "parcial
procedência" dos pedidos constantes n a inicial, porquanto a Magistrada
de 1º Grau não aplicou todas as penas cabíveis ao caso. 15. In casu,
levando-se em conta a gravidade do ilícito e a extensão do dano causado,
mister incluir a punição de perda da função pública aos Réus, uma vez que
assenta a doutrina que a pena tem por finalidade extirpar da Administração
Pública aquele que se mostrou inidôneo moralmente e com desvio ético para
o exercício da função pública, abrangendo qualquer a tividade que o agente
esteja exercendo ao tempo da condenação irrecorrível. 1 6. Apelações dos
Réus conhecidas e desprovidas. Remessa Necessária conhecida e provida.
Ementa
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10 E 11
DA LEI 8.429/92. VERBAS PÚBLICAS RECEBIDAS ATRAVÉS DE CONVÊNIO PARA AQUISIÇÃO
DE UNIDADE MÓVEL DE SAÚDE. MÁFIA DAS AMBULÂNCIAS. BURLA AO PROCEDIMENTO DE
LICITAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM EM FACE DE DECISÃO DO TCU. APELAÇÕES
DOS RÉUS DESPROVIDAS. REMESSA NECESSÁRIA C ONHECIDA E PROVIDA. 1. Trata-se
de Ação Civil Pública ajuizada pelo MPF, sob o argumento que os Requeridos,
na condição de Prefeito de Ibitirama/ES e Presidente da Comissão de
Licitação, ofenderam Princípios da Administração Pública, ante a realização
de procedimento licitatório para a aquisição de unidade móvel de saúde com
inúmeras ilegalidades e afrontas à Lei 8.666/93; bem como causaram prejuízo
ao erário, o que configura os atos de improbidade a dministrativa previstos
nos artigos 10 e 11 da Lei 8.429/92; 2. Não há que se falar em prescrição,
uma vez que a presente Ação Civil Público restou ajuizada em 02/09/2008
e o mandato (de Prefeito) do primeiro Demandado acabou em 31/12/2004, não
tendo, assim, decorrido os 5 (cinco) anos indicados na legislação aplicável
( art. 23, I da Lei 8.429/92). 3. Da mesma forma, não há como se acolher a
prescrição suscitada pelo segundo Requerido, uma vez que sequer informou
a data em que teria se afastado do cargo, bem como nada trouxe aos autos
com vistas à comprovação de suas alegações, limitando-se a mencionar que
"ocupou provisoriamente o cargo de confiança concernente à Presidência da
Comissão de Licitação da PMI, desocupando-o antes mesmo do término do mandato
eletivo do primeiro requerido junto à Chefia do Poder Executivo". Assim,
cabia ao Apelante juntar aos autos elementos suficientes a comprovar tal
afirmação, o que não fez, deixando de observar o d isposto no artigo 373,
inciso II, do Código de Processo Civil/2015. 4. Está suficientemente
demonstrada a existência de inúmeras irregularidades e ilegalidades no
procedimento licitatório relacionado ao convênio em questão, dentre as
quais destaco: (a) Fracionamento indevido do valor do convênio 1057/2002,
para realização de licitação pela modalidade convite, ferindo o disposto
no art. 23, II da Lei 8.666/93; (b) Direcionamento das licitações, através
de cartas-convite, às empresas participantes do esquema criminoso chamado
"Máfia das Ambulâncias"; (c) Ausência de pesquisas de preço, conforme exigido
no art. 15, V e § 1º e no art. 40, § 2º da Lei 8.666/93; (d) Aquisição da 1
a mbulância com sobrepreço. 5. Além de estar suficientemente demonstrada a
existência das inúmeras ilegalidades referidas, no procedimento licitatório
em questão, os Demandados não indicaram provas e/ou elementos capazes de
afastar as referidas ilegalidades, limitando-se a alegar, em suas razões
recursais, a ausência dolo ou mesmo culpa grave pelo resultado danoso do
objeto da ação de improbidade administrativa, numa tentativa de afastar suas
responsabilidades pelos f atos narrados. 6. É incontroverso que os Demandados,
na condição de Chefe do Poder Executivo Municipal e de Presidente da Comissão
de Licitações, têm o dever de agir pautado nos Princípios Constitucionais
essenciais ao Estado Democrático de Direito, previstos no art. 37 da Carta
Magna, o que não se percebe no caso dos autos, uma vez que infringiram
normas legais (Legalidade); favoreceram, intencionalmente, determinadas
empresas que faziam parte do esquema criminoso (Impessoalidade); deixaram de
publicizar os procedimentos licitatórios ao adotar a modalidade incorreta
(Publicidade); não permitiram a ampla concorrência, o que proporcionaria a
aquisição de uma unidade móvel de saúde por menos preço e/ou melhor q ualidade
(Eficiência). 7. Se não bastasse, quem atua na condição de gerir/receber verbas
públicas deve manter conduta ética, agindo sempre dentro da verdade em busca
do bem da coletividade, o que não ocorreu no caso em apreço, tendo os Réus
violado o Princípio da Moralidade, ofendendo, ainda, os deveres inerentes
aos cargos ocupados, de Honestidade e Lealdade à instituição q ue servem
(art. 11, caput da Lei 8.429/92). 8. É evidente a materialização do dolo,
especialmente quando se tem em conta que, pela própria função exercida pelos
Réus, sabiam da inadmissibilidade de fracionamento do objeto a licitar,
para fugir da modalidade escorreita de licitação, e da obrigatoriedade de
realização de pesquisa de preços para apuração do parâmetro de mercado como
forma de e vitar aquisições com sobrepreço. 9. Quanto ao ato ímprobo de dano
ao erário indicado na inicial, previsto no art. 10 da LIA, incontroversa
sua prática pelos Demandados/Recorrentes, uma vez que a lesão ao patrimônio
público mostra-se patente, uma vez que o montante da verba destinada a despesa
específica (aquisição de unidade móvel de saúde) foi mal empregado, ante a
ausência de pesquisa de valores, e a consequente aquisição da ambulância com
sobrepreço; o que basta para d emonstração de dano ao erário pelos Réus. 10. A
configuração do dano ao erário como ato de improbidade administrativa não
exige a ocorrência do enriquecimento ilícito por parte do agente ímprobo
(modalidade específica de i mprobidade administrativa prevista no art. 9º
da LIA). 11. Não prospera a alegação dos Réus/Apelantes, de existência de
bis in idem, em razão de já terem sido condenados na esfera extrajudicial
(Tribunal de Contas da União), uma vez que a Ação de Improbidade Administrativa
possui natureza civil (STF, ADI 2797, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence,
Tribunal Pleno, j. em 15/09/2005); e, sendo um ato de natureza civil e,
considerando a independência existente entre as instâncias, nada impede que
a prática deste ato irradie efeitos nas três esferas jurídicas: penal, cível
e administrativa, razão pela qual inexiste o bis in idem alegado, nos exatos
termos do disposto no parágrafo 4º do artigo 37 da Constituição da República
(TRF2, Oitava Turma, AG 0012653-17.2015.4.02.0000, Rel. Des. Fed. Marcelo
Pereira, j. em 05/10/2016, por u nanimidade). 12. Não há motivos para acolher
as arguições formulados pelo Réu P.L.B., referentes à multa aplicada, uma vez
que não há que se falar em sentença extra petita, ou em 2 desproporcionalidade
do valor da multa aplicada (R$ 34.466,40 - trinta e quatro mil e quatrocentos
e sessenta e seis reais e quarenta centavos), uma vez que o Juízo a quo
respeitou os limites indicados na Lei 8.429/92, aplicando a multa no valor
equivalente ao dano (art. 12, II: "pagamento de multa civil de até duas
vezes o valor do dano") e; considerando que tal sanção tem fins punitivos,
o montante fixado observou a gravidade dos f atos e a reprovabilidade das
ações perpetradas pelos Réus. 13. Considerando o disposto no art. 398, CC,
não prospera a alegação do Réu, de que "não lhe é justo transferir a pecha
de responsabilidade da atualização monetária", e que esta não pode retroagir
a data do evento danoso, porquanto se trata de condenação decorrente de
a to ilícito. 14. Embora tenha constado no dispositivo na sentença que o
processo foi julgado "procedente", verifico que, na verdade, houve "parcial
procedência" dos pedidos constantes n a inicial, porquanto a Magistrada
de 1º Grau não aplicou todas as penas cabíveis ao caso. 15. In casu,
levando-se em conta a gravidade do ilícito e a extensão do dano causado,
mister incluir a punição de perda da função pública aos Réus, uma vez que
assenta a doutrina que a pena tem por finalidade extirpar da Administração
Pública aquele que se mostrou inidôneo moralmente e com desvio ético para
o exercício da função pública, abrangendo qualquer a tividade que o agente
esteja exercendo ao tempo da condenação irrecorrível. 1 6. Apelações dos
Réus conhecidas e desprovidas. Remessa Necessária conhecida e provida.
Data do Julgamento
:
19/10/2018
Data da Publicação
:
26/10/2018
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
8ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
GUILHERME DIEFENTHAELER
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
GUILHERME DIEFENTHAELER
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