TRF2 0001401-15.2016.4.02.5001 00014011520164025001
CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. CONTRATO CELEBRADO NO ÂMBITO
DO PROGRAMA "MINHA CASA MINHA VIDA". CONSTRUÇÃO DE EMPREENDIMENTO COM
RECURSOS DO FGTS. ENTIDADE ORGANIZADORA. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CAIXA
ECONÔMICA FEDERAL. CONSTRUTORA. RESPONSABILDIADE SOLIDÁRIA. INDENIZAÇÃO
POR DANOS MORAIS. TAXA DE JUROS DE OBRA. GASTOS COM ALUGUEL E
CONDOMÍNIO. RESSARCIMENTO. 1. Trata-se de apelação contra sentença
que reconheceu a ilegitimidade passiva da Caixa Econômica Federal, para
responder por perdas e danos decorrentes do atraso na entrega de imóvel
objeto de contrato celebrado entre as partes; excluiu as construtoras do
polo passivo da demanda; e julgou improcedente o pedido de devolução dos
valores pagos à CEF a título de juros de obra. 2. A legitimidade passiva da
Caixa Econômica Federal, por vícios de construção ou atraso na entrega da
obra, segundo orientação jurisprudencial firmada pelo Superior Tribunal de
Justiça (REsp n. 1102539, Rel. Min. Maria Isabel Galotti, Quarta Turma),
é no sentido de que dependerá das circunstâncias em que se verifica sua
intervenção nos seguintes termos: a) inexistirá, se atuar como agente
financeiro em sentido estrito; b) existirá, se atuar como agente executor
de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa ou
baixíssima renda. 3. As hipóteses de responsabilização da CEF, no âmbito
do "Minha Casa, Minha Vida", são limitadas à participação da escolha da
construtora, o que, atualmente, ocorre de duas formas: (i) a CEF habilita
uma Entidade Organizadora para que construa as unidades habitacionais; ou
(ii) atua na condição de representante do Fundo de Arrendamento Residencial -
FAR, a quem pertencem os imóveis inicialmente construídos para finalidade de
arrendamento, com opção de compra. 4. In casu, além de o contrato contar com a
participação de "Entidade Organizadora", que também atuou como Interveniente
Construtora, o empreendimento foi construído com recursos do FGTS, de modo
que a atuação da Caixa Econômica Federal é mais ampla do que a de mera
financiadora. 5. Com efeito, antes do "Termo de Cooperação e Parceria", para
implementação de financiamentos no âmbito do Programa Carta de Crédito - FGTS,
na forma coletiva, a Caixa Econômica Federal verifica a idoneidade da Entidade
Organizadora, no sentido da regularidade da situação cadastral da empresa,
da aprovação nas análises de risco de crédito e capacidade de pagamento, da
regularidade junto ao INSS, FGTS e Receita Federal, bem como a 1 formalização
do termo de cooperação e parceria com a empresa pública federal, nos termo da
Resolução n. 460/518 do Conselho Curador do FGTS. 6. Além da coparticipação
com a Entidade Organizadora no empreendimento, a CEF também exerce uma função
que extrapola a de um mero agente financeiro, pois tem a responsabilidade
de fiscalizar o prazo da construção do empreendimento, podendo, inclusive,
substituir a construtora em caso de descumprimento injustificado dos prazos
de construção. 7. A orientação jurisprudencial é firme no sentido de que a
CEF, juntamente com a construtora, possuem responsabilidade solidária por
eventual descumprimento contratual consistente no atraso da entrega do imóvel
financiado. 8. In casu, considerando que restou incontroverso nos autos que,
estabelecido prazo de entrega da unidade residencial do apelante em agosto
de 2013, e o imóvel somente foi entregue em junho de 2015, as rés devem
responder solidariamente pelos danos decorrentes de tal atraso. 9. A conduta
negligente das rés ocasionou o atraso de quase dois anos na entrega do imóvel,
o que extrapolou a normalidade da relação contratual, o que gera ao apelante
o direito à indenização por danos morais, que deve corresponder à lesão de
caráter não patrimonial sofrida que implique em transtorno psicológico ou
relativo à sua reputação. 10. Sopesando o evento danoso e a sua repercussão
na esfera do ofendido, tem-se como proporcional e adequado que o valor da
indenização por danos morais seja fixado no montante de R$ 10.000,00 (dez
mil reais), que efetivamente concilia a pretensão compensatória, pedagógica
e punitiva da indenização com o princípio da vedação do enriquecimento sem
causa. 11. Inexiste previsão contratual de penalidade similar aplicada
ao mutuário, que possa ser aplicada à parte ré, como, por exemplo, as
penalidades incidentes em caso de impontualidade por parte do mutuário no
pagamento dos encargos contratuais. 12. A Segunda Seção do Superior Tribunal
de Justiça, no julgamento do EREsp n. 670.117/PB, pacificou entendimento
no sentido da legalidade da cobrança do chamado "juros de obra" durante a
fase de construção do imóvel. Não obstante, a cobrança dos juros de obra
somente se legitima durante a fase de construção do imóvel, de modo que,
expirado o aludido prazo, mesmo que a obra ainda se encontre inacabada,
deve ser iniciada a fase de amortização do mútuo contratado ou então
suspensa a cobrança dos mencionados juros em desfavor do mutuário. 13. São
devidos ao apelante os valores desembolsados a título de alugueis e taxas
condominiais, no período de agosto de 2013 (mês inicialmente previsto para
entrega da obra) a junho de 2015 (data da entrega do imóvel), nos limites
do comprovado nos autos mediante recibo, a ser apurado em liquidação de
sentença. 14. Sentença reformada para, reconhecendo a legitimidade passiva
da Caixa Econômica Federal, bem como a responsabilidade solidária desta
com as construtoras Stalc Construtora e Incorporadora Ltda e Decottignies
Construtora e Incorporadora Ltda, condená-las solidariamente: a) a pagarem ao
autor, ora apelante, indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00
(dez mil reais), sobre o qual deverá incidir correção monetária pelo IPCA-E
a partir da data do acórdão (Súmula 362 do STJ), cumulado com juros de mora
de 1% ao mês desde a data em que deveria ter sido entregue o imóvel; b)
a ressarcirem o autor os valores pagos a título de "juros de obra", previsto
na cláusula sétima, relativo ao período de agosto de 2013 a junho de 2015,
bem como os valores gastos com aluguel no período que compreende o término 2
do prazo contratual para conclusão da obra, a serem comprovados nos autos, e
sobre os quais incidirão correção monetária pelo IPCA-E e juros de mora de 1%
(um por cento), a partir da citação; c) ao pagamento das custas e honorários
advocatícios no percentual de 10% do valor da condenação, pro rata, nos
termos do disposto no art. 85, § 2º, do CPC, face à mínima sucumbência do
ora apelante. 15. Apelação parcialmente provida.
Ementa
CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. CONTRATO CELEBRADO NO ÂMBITO
DO PROGRAMA "MINHA CASA MINHA VIDA". CONSTRUÇÃO DE EMPREENDIMENTO COM
RECURSOS DO FGTS. ENTIDADE ORGANIZADORA. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CAIXA
ECONÔMICA FEDERAL. CONSTRUTORA. RESPONSABILDIADE SOLIDÁRIA. INDENIZAÇÃO
POR DANOS MORAIS. TAXA DE JUROS DE OBRA. GASTOS COM ALUGUEL E
CONDOMÍNIO. RESSARCIMENTO. 1. Trata-se de apelação contra sentença
que reconheceu a ilegitimidade passiva da Caixa Econômica Federal, para
responder por perdas e danos decorrentes do atraso na entrega de imóvel
objeto de contrato celebrado entre as partes; excluiu as construtoras do
polo passivo da demanda; e julgou improcedente o pedido de devolução dos
valores pagos à CEF a título de juros de obra. 2. A legitimidade passiva da
Caixa Econômica Federal, por vícios de construção ou atraso na entrega da
obra, segundo orientação jurisprudencial firmada pelo Superior Tribunal de
Justiça (REsp n. 1102539, Rel. Min. Maria Isabel Galotti, Quarta Turma),
é no sentido de que dependerá das circunstâncias em que se verifica sua
intervenção nos seguintes termos: a) inexistirá, se atuar como agente
financeiro em sentido estrito; b) existirá, se atuar como agente executor
de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa ou
baixíssima renda. 3. As hipóteses de responsabilização da CEF, no âmbito
do "Minha Casa, Minha Vida", são limitadas à participação da escolha da
construtora, o que, atualmente, ocorre de duas formas: (i) a CEF habilita
uma Entidade Organizadora para que construa as unidades habitacionais; ou
(ii) atua na condição de representante do Fundo de Arrendamento Residencial -
FAR, a quem pertencem os imóveis inicialmente construídos para finalidade de
arrendamento, com opção de compra. 4. In casu, além de o contrato contar com a
participação de "Entidade Organizadora", que também atuou como Interveniente
Construtora, o empreendimento foi construído com recursos do FGTS, de modo
que a atuação da Caixa Econômica Federal é mais ampla do que a de mera
financiadora. 5. Com efeito, antes do "Termo de Cooperação e Parceria", para
implementação de financiamentos no âmbito do Programa Carta de Crédito - FGTS,
na forma coletiva, a Caixa Econômica Federal verifica a idoneidade da Entidade
Organizadora, no sentido da regularidade da situação cadastral da empresa,
da aprovação nas análises de risco de crédito e capacidade de pagamento, da
regularidade junto ao INSS, FGTS e Receita Federal, bem como a 1 formalização
do termo de cooperação e parceria com a empresa pública federal, nos termo da
Resolução n. 460/518 do Conselho Curador do FGTS. 6. Além da coparticipação
com a Entidade Organizadora no empreendimento, a CEF também exerce uma função
que extrapola a de um mero agente financeiro, pois tem a responsabilidade
de fiscalizar o prazo da construção do empreendimento, podendo, inclusive,
substituir a construtora em caso de descumprimento injustificado dos prazos
de construção. 7. A orientação jurisprudencial é firme no sentido de que a
CEF, juntamente com a construtora, possuem responsabilidade solidária por
eventual descumprimento contratual consistente no atraso da entrega do imóvel
financiado. 8. In casu, considerando que restou incontroverso nos autos que,
estabelecido prazo de entrega da unidade residencial do apelante em agosto
de 2013, e o imóvel somente foi entregue em junho de 2015, as rés devem
responder solidariamente pelos danos decorrentes de tal atraso. 9. A conduta
negligente das rés ocasionou o atraso de quase dois anos na entrega do imóvel,
o que extrapolou a normalidade da relação contratual, o que gera ao apelante
o direito à indenização por danos morais, que deve corresponder à lesão de
caráter não patrimonial sofrida que implique em transtorno psicológico ou
relativo à sua reputação. 10. Sopesando o evento danoso e a sua repercussão
na esfera do ofendido, tem-se como proporcional e adequado que o valor da
indenização por danos morais seja fixado no montante de R$ 10.000,00 (dez
mil reais), que efetivamente concilia a pretensão compensatória, pedagógica
e punitiva da indenização com o princípio da vedação do enriquecimento sem
causa. 11. Inexiste previsão contratual de penalidade similar aplicada
ao mutuário, que possa ser aplicada à parte ré, como, por exemplo, as
penalidades incidentes em caso de impontualidade por parte do mutuário no
pagamento dos encargos contratuais. 12. A Segunda Seção do Superior Tribunal
de Justiça, no julgamento do EREsp n. 670.117/PB, pacificou entendimento
no sentido da legalidade da cobrança do chamado "juros de obra" durante a
fase de construção do imóvel. Não obstante, a cobrança dos juros de obra
somente se legitima durante a fase de construção do imóvel, de modo que,
expirado o aludido prazo, mesmo que a obra ainda se encontre inacabada,
deve ser iniciada a fase de amortização do mútuo contratado ou então
suspensa a cobrança dos mencionados juros em desfavor do mutuário. 13. São
devidos ao apelante os valores desembolsados a título de alugueis e taxas
condominiais, no período de agosto de 2013 (mês inicialmente previsto para
entrega da obra) a junho de 2015 (data da entrega do imóvel), nos limites
do comprovado nos autos mediante recibo, a ser apurado em liquidação de
sentença. 14. Sentença reformada para, reconhecendo a legitimidade passiva
da Caixa Econômica Federal, bem como a responsabilidade solidária desta
com as construtoras Stalc Construtora e Incorporadora Ltda e Decottignies
Construtora e Incorporadora Ltda, condená-las solidariamente: a) a pagarem ao
autor, ora apelante, indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00
(dez mil reais), sobre o qual deverá incidir correção monetária pelo IPCA-E
a partir da data do acórdão (Súmula 362 do STJ), cumulado com juros de mora
de 1% ao mês desde a data em que deveria ter sido entregue o imóvel; b)
a ressarcirem o autor os valores pagos a título de "juros de obra", previsto
na cláusula sétima, relativo ao período de agosto de 2013 a junho de 2015,
bem como os valores gastos com aluguel no período que compreende o término 2
do prazo contratual para conclusão da obra, a serem comprovados nos autos, e
sobre os quais incidirão correção monetária pelo IPCA-E e juros de mora de 1%
(um por cento), a partir da citação; c) ao pagamento das custas e honorários
advocatícios no percentual de 10% do valor da condenação, pro rata, nos
termos do disposto no art. 85, § 2º, do CPC, face à mínima sucumbência do
ora apelante. 15. Apelação parcialmente provida.
Data do Julgamento
:
08/02/2019
Data da Publicação
:
14/02/2019
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
5ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES
Observações
:
alteração classe/livre redistribuição, fl. 127. Redistribuição - fls. 384.
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