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Jurisprudência


TRF2 0001696-75.2009.4.02.5105 00016967520094025105

Ementa
AÇÃO DE IMPROBIDADE. PREFEITURA DE NOVA FRIBURGO. LICITAÇÃO. DISPENSA. AUSENCIA DE REQUISITOS. CONTRATAÇAO DIRETA. SUPERFATURAMENTO. ATO ÍMPROBO. APELAÇÕES DESPROVIDAS. 1. Na presente ação o que se pleiteia, em síntese, é a condenação dos réus, na forma do artigo 12 da Lei nº 8.429/1992, pela prática de ato ímprobo que importou em dano ao erário ao frustrar a licitude dos processos licitatórios e o caráter competitivo desses. 2. O MPF visa à condenação dos envolvidos em supostas fraudes ocorridas no curso de contratações, mediante dispensa de licitação, de empresas para a realização de exames laboratoriais no Município de Nova Friburgo. Segundo o MPF, os atos de improbidade consistiram: a) na indevida dispensa de licitação; b) no expressivo sobrepreço em relação aos valores que haviam sido previamente estimados; c) na irregular prestação dos serviços contratados. 3. Prejudicados os embargos de declaração de fls. 1817/1819 onde se pretendia, mediante efeitos infringentes, fosse modificada a decisão de fls. 1811 (que havia determinado o sobrestamento do feito, em virtude do RE 852.475) para prosseguimento do feito e consequente julgamento dos recursos, haja vista que, diante da regra posta no §10 do artigo 1035 do CPC, o presente processo retomou seu curso normal sendo incluído em p auta para julgamento. 4. Não conhecidas as apelações de Marcelo Leone Riguetti (que deixou de ratificar seu recurso de fls. 1665/1695 após o julgamento dos embargos de declaração de fls. 1698/1699, à luz do CPC/73) e de Biomedix Diagnóstica Ltda, em relação a qual não h ouve o devido preparo do recurso, conforme decisão de fls. 1744. 5. A legitimidade da ré STELLA COMÉRCIO, REPRESENTAÇÃO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA para figurar no polo passivo da presente ação por ato de improbidade administrativa se mostra evidente haja vista que figura na lide, na qualidade de empresa que supostamente se beneficiou dos pagamentos decorrentes da dispensa da licitação. Ressalte-se, igualmente, na esteira do entendimento do STJ, que apenas estaria afastada a legitimidade passiva da pessoa jurídica caso o agente público não fosse incluído no polo passivo da lide. Na hipótese vertente, entretanto, os agentes públicos 1 responsáveis pela dispensa da licitação a qual teria beneficiado a ora apelante também c onstam do polo passivo da demanda, a legitimar a sua presença no polo passivo. 6. Nesse sentido, os fatos que originaram a presente pretensão são nitidamente afetos à hipótese de improbidade administrativa, porquanto relativos a vantagens indevidas auferidas por empresas beneficiadas por contratação direta decorrente de dispensa de l icitação. 7. O Juízo a quo julgou improcedente o pedido autoral em relação à ré MARIA DA SAUDADE MEDEIROS BRAGA, e procedente o pedido para condenar os réus ABEL MARTINEZ DOMINGUES, MARCELO LEONE RIGUETTI, STELLA COMÉRCIO, REPRESENTAÇÃO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA e BIO MEDIX DIAGNOSTICA LTDA na obrigação solidária de ressarcimento integral do dano aos erários federal e municipal, na proporção do montante de recursos oriundos de verbas federais e do orçamento do município, limitada a responsabilidade de cada réu aos seguintes v alores, os quais deverão ser corrigidos monetariamente quando do efetivo pagamento. 8. A apelante STELLA COMÉRCIO, REPRESENTAÇÃO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA entende que a data do fim do mandato da ex-prefeita MARIA DA SAUDADE não poderia ter sido considerada para fins de contagem do prazo prescricional, uma vez que foi absolvida das acusações contidas na presente ação, de forma que o aludido prazo d everia ser contado a partir do suposto ilícito praticado, expirando no ano de 2008. 9. É certo que a permanência de pessoa jurídica no polo passivo de demanda em que se discute ato de improbidade administrativa depende da presença de agente público causador do ato. Nesse aspecto, o Juízo a quo concluiu, em decisão de fl. 748 que "a administração da ré MARIA DA SAUDADE MEDEIROS BRAGA somente encerrou-se em dezembro de 2008, devendo essa data, por conseguinte, nortear o prazo prescricional em relação aos demais réus que não sejam agentes públicos, os quais não respondem de forma isolada pelos atos de improbidade. Como a ação foi proposta em 10/11/09, não há se falar, em princípio, em expiração do lustro prescricional." Evidente que a análise aqui a ser feita está diretamente relacionada às sanções do artigo 12 da Lei n. 8429/92, exceto o ressarcimento ao erário, porque este como já analisado anteriormente tem-se por imprescritível, como também esclareceu o Juízo a quo em sua sentença: "Naquela decisão restou afastada, outrossim, a prejudicial de prescrição em relação aos réus que não ostentavam a condição de agentes públicos, haja vista que a administração da ré MARIA DA SAUDADE MEDEIROS BRAGA somente se encerrou em dezembro de 2008, sendo esta a data inicial do respectivo prazo prescricional. Quanto ao ressarcimento ao erário, ali também restou asseverada sua imprescritibilidade, nos termos do art. 37, §5º, da C onstituição Federal, e na esteira da jurisprudência do STJ." 10. Assim, assevere-se que o Juízo a quo condenou a apelante STELLA COMÉRCIO, REPRESENTAÇÃO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA apenas ao ressarcimento ao erário, haja vista que julgou improcedente os pedidos em relação à ex-prefeita MARIA DA SAUDADE, de forma que, em princípio pouco importaria a data do fim do mandato da ex- prefeita MARIA DA SAUDADE para fins de contagem do prazo prescricional. 2 11. O argumento do Juízo a quo para justificar o afastamento das demais sanções às empresas envolvidas, levou em conta o fato de que "Na cominação das sanções às empresas envolvidas, porém, não se justifica o estabelecimento de uma reprimenda superior àquela fixada para os agentes públicos, dos quais se espera um conhecimento mais aprofundado das normas que regem as contratações pelos entes públicos. Na verdade, o próprio MPF, ao requerer a cominação de outras sanções às empresas, além do ressarcimento ao erário, fê-lo em razão de no polo passivo também constar a ex- prefeita, em relação à qual não estariam prescritas essas sanções, e essa mesma contagem do lustro se aplicaria àquelas. A responsabilidade direta da ex-prefeita, contudo, restou afastada na presente sentença, o que corrobora a limitação da responsabilidade das empresas ao mesmo patamar imputado aos demais agentes públicos, em obséquio ao p rincípio da razoabilidade". 12. O MPF apelou alegando justamente a necessidade que sejam cominadas todas as sanções do artigo 12 da Lei 8.429/92 às empresas envolvidas em virtude de que "tanto os agentes públicos quanto a empresa STELLA encontram-se incursos simultaneamente nos atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário e atentam contra os princípios da Administração Pública previstos no art. 10, caput e incisos V e VIII, e no art. 11, caput e incisos I e II, todos da Lei n. 8429/92. Bem assim, os mesmos agentes públicos e a empresa BIO MEDIX enquadram-se concomitantemente no art. 10, caput e inciso VIII, e no art. 11, caput e incisos I e II, ambos do diploma citado.", requerendo, outrossim, a reforma da sentença e a consequente condenação da ré MARIA DA S AUDADE às sanções do artigo 12 da Lei n. 8429/92. 13. Embora a análise da prescrição seja matéria prejudicial de mérito, no caso específico dos autos, este exame apenas poderá ser aferido depois do julgamento do recurso de apelação do MPF que enfrenta a questão concernente à existência ou não de ato de improbidade por parte de Maria da Saudade Medeiros Braga. Isso porque justamente por força dos ditames do artigo 23 da LIA a conduta da ré STELLA, na qualidade de agente que não é servidor público apenas poderá sofrer as sanções do artigo 12 da LIA (exceto o ressarcimento ao erário) se o agente público que também praticou o ato for condenado, caso contrário resta inviável impingir a terceiros, sanções em relação as quais o agente n ão foi condenado, por força, com visto do princípio da razoabilidade. 14. No mesmo sentido Abel Martinez Domingues sustentou a inadequação da via eleita para fins de ressarcimento ao erário em virtude da ocorrência da prescrição. Entende que por ter deixado em 31.03.2003, o cargo em comissão que ocupava, teria ocorrido a prescrição, pois a demanda apenas foi ajuizada em 10.11.2009, depois de ultrapassado o prazo de cinco anos a que se refere o inciso I do artigo 23 da Lei n. 8.429/92. Contudo, aludido artigo não está diretamente relacionado ao ressarcimento ao erário. Ainda que se considere a prescritibilidade com base no prazo de cinco anos, em vista do disposto no inciso I do art. 23 da Lei n. 8.429/92, esta apenas se deu em relação às demais penas de previstas nos incisos do artigo 12 da mesma lei, haja vista a imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário, por ato de improbidade. Assim, no que toca ao ressarcimento 3 a o erário, aplica-se o art. 37, §5º, da Constituição Federal. 15. Do conjunto probatório fazem parte o Relatório do Conselho Municipal de Saúde acerca das ilicitudes verificadas, o parecer final da Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara Municipal concluindo pela responsabilidade dos gestores, o acórdão do Tribunal de Contas da União que condenou o ex-Secretário Municipal de Saúde ao pagamento de multa, além d o relatório de auditoria do DENASUS que constatou a irregularidade das contratações. 16. Os atos de improbidade consistiram na indevida dispensa de licitação, no expressivo sobrepreço em relação aos valores que haviam sido previamente estimados e na irregular prestação dos serviços contratados, pretendendo o MPF enquadrar a conduta dos réus, tanto no disposto no art. 10, incisos V e VIII (em que se admite atuação culposa), como no art. 11, incisos I e II (para o qual é imprescindível a demonstração de dolo), ambos da Lei n º 8.429/92: 17. Constata-se que teria sido frustrado procedimento licitatório mediante dispensa de licitação, culminando com a contratação direta das empresas BIOMEDIX DIAGNÓSTICA (itens do Grupo II da licitação anterior, no valor de R$ 395.959,30) e STELLA COMÉRCIO (itens dos Grupos I e III, no valor de 180.000,00 e 318.495,00). O solicitante da contratação direta, o réu Marcelo Leone Riguetti, utilizou-se como embasamento legal o art. 24, V, da Lei nº 8.666/93, para os itens dos Grupos II e III, e o art. 24, VII, da mesma l ei, para os itens do Grupo I. 18. No que toca à contratação direta da BIO MEDIX apenas importa destacar que o réu Marcelo Leone tenta justificar a dispensa da licitação por ocasião da Concorrência n. 001/2002, onde se buscava contratar empresa especializada para realização de diversos exames, com fornecimento de equipamentos para automação de exames em hematologia, sorologia e bioquímica, com base no artigo 24, incisos IV e V, da Lei n. 8666/93[9], não se podendo olvidar que tais dispositivos legais tratam especificamente acerca da ausência de interessados e de situação emergencial ou de calamidade pública. Como os recursos de apelação interpostos pela empresa BIOMEDIX e por Marcelo Leone não foram conhecidos, configurada está a prática de ato de improbidade decorrente, no caso específico destes réus, da solicitação do então Chefe do Departamento Administrativo Financeiro MARCELO LEONE RIGUETTI, ao então Secretário Municipal de Saúde, ABEL MARTINEZ DOMINGUES que autorizou a contratação direta, por dispensa de licitação, das empresas STELLA COMÉRCIO, REPRESENTAÇÃO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA e BIO MEDIX DIAGNOSTICA LTDA, tal qual restou decidido em sentença já transitada em julgado para BIOMEDIX e MARCELO LEONE RIGUETTI, sendo t otalmente desinfluente, portanto, que se prossiga com esta análise. 19. Em relação à contratação da empresa STELLA COMÉRCIO, REPRESENTAÇÃO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA. restou evidente a violação a diversos dispositivos legais da Lei n. 8666/93. Com efeito, no que toca aos itens do Grupo I, tal e qual previstos no edital da licitação ora analisada, a empresa TEST FAR foi desclassificada por ter apresentado proposta contendo valores acima da estimativa inicial (fls. 213/216 do apenso I). Entretanto deveria ter sido aberto prazo para que pudesse apresentar nova proposta 4 dentro dos limites legais, nos exatos termos dos artigos 24, VII e 48, §3º[10] da Lei n. 8666/93 ao invés da realização de contratação direta. Cumpre afirmar que a própria contratação direta da empresa STELLA se deu em valor superior (R$ 180.000,00) em r elação ao preço estimado de R$ 72.000,00 (fl. 02/07 do apenso I). 20. No que toca aos itens do Grupo III, diante da ausência de interessados, cabível, nos moldes do inciso V do artigo 24 da lei n. 8666/93, já mencionado acima, a dispensa de licitação, se esta, justificadamente, não puder ser repetida sem prejuízo para a Administração, mantidas, neste caso, todas as condições preestabelecidas. In casu, entretanto, ainda que não fosse viável refazer-se a licitação, certo é que deveria, ao menos, ter sido respeitado o valor de R$ 283.098,30, inicialmente estabelecido (conforme fls. 02/07 do apenso I), não se podendo acolher o valor de R$ 318.495,00, objeto da c ontratação direta. 21. Em ambas as hipóteses como bem analisou o Juízo a quo (fl.223): "deixou de ser cumprido o art. 26 da lei nº 8.666/93, o qual prevê a publicação, na imprensa oficial, no prazo de cinco dias, das justificativas para a dispensa de licitação. Tal regramento não foi observado, assim como a explicitação dos motivos que levaram à escolha da empresa STELLA, a qual sequer apresentara proposta na licitação precedente. No documento de fls. 3v do Apenso III nota-se que a publicação sobre a dispensa de licitação ocorreu entre os dias 08 e 14/02/03, data posterior ao início da prestação de serviços pela empresa STELLA (documentos de fls. 73/91 do Apenso II). E, quanto ao critério de escolha do f ornecedor, também não houve qualquer justificativa do ente público contratante. 22. No caso específico, o MPF em suas contrarrazões (fls. 1771/1772) ressalta que "o dano ao erário não decorre unicamente da fraude na licitação, tendo em vista que houve inexecução parcial dos contratos. Os serviços prestados pelas empresas foram inadequados ao fim a que se destinavam. As falhas na prestação do serviço foram constatadas em diversas instâncias, como a própria Fundação Municipal de Saúde, que em seu ‘Relatório de Visita ao Laboratório da Biomedix e Stella no Posto de Saúde Sílvio H. Brune - Suspiro e no Hospital Municipal Raul Sertã - 16/06/03’ (volume principal do procedimento - fls. 26/27 e 29/32, 1º volume), constatou a situação reproduzida na inicial. Os depoimentos em sede judicial confirmaram a constatação (fls. 1227/1228). O mesmo verifica-se no relatório de auditoria do DENASUS. Houve constatação quanto aos equipamentos e instalações físicas inadequados, com qualidade imprópria e sem a regularidade de tempo exigida, como imputado(...) Em razão das legalidades que envolveram a contratação das pessoas jurídicas requeridas, bem como das graves constatações acima citadas, o Conselho Municipal de Saúde, que irregularmente havia deixado de ser consultado sobre as avenças firmadas com aquelas empresas, deliberou p ela suspensão imediata dos serviços (Volume principal, fls. 03/11, 1º volume). 23. Restou evidente, de outro lado, o superfaturamento, uma vez que como visto acima houve expressiva desproporção entre os valores inicialmente estimados e aqueles realmente praticados, não procedendo o argumento segundo o qual não teria havido prejuízo ao erário, e nem sobrelevação de preços, mas sim reajuste econômico-financeiro, pois o 5 e dital foi publicado em 2001 e a contratação realizada em 2002. 24. Embora razoável a realização de atualização monetária dos valores praticados, no caso, como destacou o MPF em suas contrarrazões (fl. 1772/1773), "não há nos autos do processo de dispensa de licitação qualquer motivação que autorizasse a atualização dos preços estimados, sendo que a desproporcional diferença entre os limites inicialmente adotados e os valores ao final praticados, a qual mostra-se superior a 40%, revela que h ouve aumento efetivo, em vez de simples correção monetária." 25. A empresa em questão não demonstrou ter a necessária qualificação técnica exigida para a contratação, uma vez que não tem dentre as atividades previstas em seu contrato social a realização de exames. Para esse fim, reproduzo trecho da sentença, às fls. 223/224, dos autos eletrônicos que tão bem elucidou a questão: "E a escolha da empresa STELLA COMÉRCIO se mostra ainda mais temerária quando se percebe a ausência de qualificação técnica para o objeto da contratação. Como já mencionado, a contratação direta visava suprir o malogro do procedimento licitatório precedente, o qual tinha por objeto a "contratação de empresa especializada para realização de diversos exames, com fornecimento de equipamentos para automação de exames em hematologia, sorologia e em bioquímica." E a realização de exames não se inclui entre as atividades previstas no contrato social da referida empresa, cujo objetivo consiste em "representação comercial por conta de terceiros, comercialização, importação e exportação de produtos em geral, exercer as atividades de locação de mão de obra, manutenção de máquinas e equipamentos, execução de serviços de alvenaria, reformas prediais e construções em geral. Sinale-se, a propósito, que a própria Assessoria Técnica da Fundação Municipal de Saúde concluiu pela deficiência nos serviços prestados pelas empresas STELLA COMÉRCIO e BIO MEDIX DIAGNOSTICA, sugerindo ao presidente da referida fundação a imediata suspensão dos pagamentos e da prestação dos serviços (fls. 28/32 do procedimento administrativo em apenso). Corroborando a presença de tais irregularidades se posicionou o Relatório do Departamento Nacional de Auditoria do SUS - DENASUS (fls. 148/167) e também o Tribunal de Contas da União, este especificamente em relação à contratação para os itens do Grupo I, o que obviamente não vincula a atuação do J udiciário, haja vista a independência entre as duas instâncias." 26. Ressalte-se que a análise das contas por órgãos de controle interno ou por Tribunais de Contas, não tem o condão de inviabilizar a apreciação judicial e a condenação por ato de improbidade administrativa em virtude da independência das esferas administrativa e j udicial. 27. De acordo com o apenso II, fl. 02, o réu MARCELO LEONE, como Chefe do Departamento Administrativo e Financeiro solicitou a ABEL MARTINEZ RODRIGUES autorização para a contratação direta das empresas STELLA e BIOMEDIX, sem mencionar a razão da escolha. O réu ABEL MARTINEZ RODRIGUES, na qualidade de Secretário Municipal de Saúde era quem autorizava, mediante ratificação pela ex-prefeita MARIA DA SAUDADE MEDEIROS BRAGA, a realização das contratações diretas bem como quem ordenava os pagamentos às empresas contratadas. A sua atuação como 6 ordenador de despesas também é inequívoca, constando sua assinatura nas Notas de A utorização de Despesa. 28. Constata-se claramente a conduta no mínimo desidiosa do réu ABEL, que não pode ter afastada a sua responsabilidade pelos fatos ora analisados que culminaram com a dispensa da licitação e a autorização de contratação direta, uma vez que não se mostra aceitável que referido agente público ocupante do cargo de Secretário Municipal de Saúde e também de Presidente da Fundação Municipal de Saúde não tivesse o mínimo discernimento sobre os requisitos legais a serem observados, não se mostrando viável que a atuação dos servidores limitar-se-ia à averiguação de aspectos meramente formais d as licitações. 29. Nota-se, com isso, um grande descaso quanto à obediência dos preceitos legais que regem as licitações, uma vez que os procedimentos licitatórios não seguem corretamente as regras estabelecidas na Lei 8.666/93, havendo pagamentos efetuados indevidamente, não havendo preocupação de obediência a alguns princípios básicos da eficiência, t ransparência e economicidade. 30. Os atos ímprobos praticados pelos réus configuram atos que causaram prejuízo ao erário. Além do mais, a frustração da licitude do processo licitatório (inciso VIII do artigo 10), já caracteriza a lesão, não se mostrando necessária nem mesmo a comprovação de s uperfaturamento. 31. A realização de contratação direta, como forma de burlar a legislação e a exigência de r ealização de licitação, configura ato de improbidade administrativa. 32. In casu, como houve fraude à licitação, eis que comprovada a má-fé das empresas e a desídia dos agentes públicos, excluindo-se demais participantes do certame, conclui-se pela ilegalidade do pagamento efetuado, devendo o ressarcimento ao erário se dar de f orma integral. 33. Inexiste enriquecimento ilícito do Poder Público, ao contrário, cuida-se de recompor o estado de moralidade e o interesse de toda a coletividade, os quais restaram s ensivelmente afetados pela atuação ímproba dos envolvidos. 34. Os apelantes réus não podem se eximir da responsabilidade pelos atos praticados os quais frustraram a adequada utilização de recursos públicos. Com efeito, ainda que não restasse demonstrado que as condutas não tenham ensejado prejuízos ao Erário não se mostra aceitável que os agentes públicos ora réus, não tivessem o mínimo discernimento sobre os requisitos legais a serem observados, não se mostrando relevante, por outro lado, nem mesmo que não tivesse havido prova de favorecimento a terceiros, pois não serviria para afastá-los de qualquer responsabilidade, bastando para a caracterização do ato ímprobo a conduta irresponsável e causadora de dano ao Erário, o que, como se viu, foi sobejamente demonstrada. De fato, tal ofensa permanece, independentemente da constatação de efetivo prejuízo financeiro ao erário, pois mesmo que as contratações tivessem se dado dentro de patamares de mercado, o dano permanece, em virtude da conduta ímproba dos agentes públicos afastada no caso da satisfação do interesse público. 7 35. Quanto ao enquadramento na hipótese do art.10, VIII, da Lei nº 8.429/92, foi suficientemente demonstrado que os réus agiram de forma livre e consciente, cometendo o ato ímprobo que lhe está sendo imputado, previsto no referido dispositivo legal, pois causaram dano ao Erário ao dispensarem a licitação sem a observância de certos requistos, deixando-se de empregar uma série de mecanismos de controle, beneficiando contratados ilegitimamente. De fato, a realização de contratação direta, como forma de burlar a legislação e a exigência de realização de licitação, é apta a configurar os tipos dos a rtigos 10 e 11 da Lei n. 8.429/92. 36. No que toca à ré MARIA DA SAUDADE MEDEIROS BRAGA, é certo que na qualidade de Chefe do Poder Executivo Municipal de Nova Friburgo ostentava a condição natural de ordenadora de despesas municipais (fl. 03/verso, do apenso III) e independente da alegada autonomia da Fundação Municipal de Saúde, há registro específico de depoimento do apelante ABEL MARTINEZ, ex-presidente da Fundação Municipal de Saúde perante comissão parlamentar de inquérito instaurada para apuração dos mesmos fatos, afirmando seu conhecimento acerca dos fatos objeto da lide (fls. 355/358). O Juízo a quo concluiu que apesar da ex-prefeita ser ratificadora das despesas empregadas na contratação impugnada, não consta sua assinatura em qualquer documento relativo à contratação em questão. De fato, destaca que "no documento de fls. 03 do Apenso III (4º volume dos autos judiciais) consta o réu ABEL como ordenador de despesa e no verso aparece a ré MARIA DA SAUDADE como ratificadora, embora não apareça a assinatura da última. A mesma situação se verifica no Apenso IV (5º volume), fls. 02." O Juízo a quo afastou a responsabilidade da aludida ré nos seguintes termos: "No depoimento prestado junto à Câmara Municipal o réu ABEL afirmou que a prefeita tinha conhecimento dos serviços prestados, pois duas reuniões específicas haviam sido realizadas com ela para avaliá-los. O réu, contudo, não soube explicar o motivo de a então prefeita ter feito denúncia junto ao Ministério Público justamente sobre os serviços em questão. O MPF alega que a autorização para a abertura do processo licitatório que antecedeu as contratações diretas foi encaminhada pelo então presidente da Fundação Municipal de Saúde à Comissão de Licitação do Gabinete da Prefeita, bem como que as comunicações do TCE sobre aquele certame foram sempre dirigidas diretamente à prefeita MARIA DA SAUDADE. Tal fato, contudo, não enseja necessariamente a responsabilização da então prefeita pela contratação direta ocorrida posteriormente. Como se sabe, a licitação mencionada (Concorrência nº 001/02) restou frustrada, e o que se impugna na presente ação é a contratação direta ocorrida posteriormente. A circunstância de a Chefe do Poder Executivo ter tomado conhecimento dos problemas ocorridos no certame anterior não significa que ela tenha participado diretamente da contratação posterior, a qual, ao que tudo indica, teve os réus MARCELO LEONE e ABEL MARTINEZ como principais mentores. Ademais, a Procuradoria Geral do Município, acolhendo determinação da prefeita municipal, encaminhou cópia do parecer crítico referente aos serviços em questão ao Ministério Público (fls. 33 do PA, em apenso), o que denota o interesse daquela na apuração dos fatos. Note-se que tal encaminhamento possui data de 27/06/03, ou seja, 8 três dias após a apresentação do relatório conclusivo emitido pela Assessoria Técnica da FMS apontando as irregularidades. Nesse panorama, não se pode imputar à então prefeita uma conduta ímproba, pelo simples fatos de ocupar esse cargo, à míngua de outros elementos de prova que estabeleçam um liame entre suas ações e os atos ilícitos praticados. A gravidade de uma condenação por improbidade administrativa reclama a presença de indicativos consistentes no sentido de que o acusado tenha efetivamente participado de forma relevante nos fatos que ensejaram a configuração do ilícito, não se mostrando razoável supor que o ocupante do cargo mais alto na Administração se mantenha constantemente numa posição de onisciência absoluta em relação a todos os a tos praticados por seus subordinados." 37. O Ministério Público Federal não foi capaz de trazer argumentos fortes o suficiente para sustentar sua tese condenatória. Com efeito, o simples fato da Chefe do Poder Executivo do Município de Nova Friburgo, quando da prática dos atos aqui impugnados, aliado à alegação genérica de que na qualidade de gestora dos recursos públicos seria ela responsável pelos atos de seu Secretário de Saúde, atribuindo-lhe a culpa in vigilando e in eligendo, muito embora tenha ela constado como ratificadora das despesas, não é c apaz de, por si, só, atrai-lhe um decreto condenatório. 38. Não se pode concluir, pela prova dos autos, que a ex-prefeita tenha praticado qualquer ato no bojo da contratação direta em que identificadas as irregularidades descritas na petição inicial da ação de improbidade administrativa originária, não tendo sequer assinado a ratificação das despesas empregadas na contratação impugnada, momento final em que deve a autoridade administrativa zelar pela licitude e verificar a regularidade d a contratação. 39. In casu, as sanções aplicadas pelo Juízo a quo são por demais razoáveis, ressaltando- se, outrossim, a necessidade de afastar-se a aplicação das demais sanções constantes do artigo 12 da LIA às empresas STELLA e BIOMEDIX, em virtude da improcedência do pedido em relação a ré MARIA DA SAUDADE agora confirmada em sede de recurso do MPF, bem como por conta da prescrição destas sanções em relação aos agentes públicos A BEL E MARCELO, em obediência ao princípio da razoabilidade. 40. Prejudicados os embargos de declaração de fls. 1817/1819, opostos pelo MPF. Conhecidas e improvidas as apelações de Abel Martinez Domingues, Stella Comércio, Representação, Importação e Exportação Ltda e do MPF. Não conhecidas as apelações d e Marcelo Leone Riguetti.

Data do Julgamento : 29/05/2018
Data da Publicação : 05/06/2018
Classe/Assunto : AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador : 5ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a) : ALCIDES MARTINS
Comarca : TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : ALCIDES MARTINS
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