TRF2 0001966-38.2014.4.02.5101 00019663820144025101
ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. ENSINO SUPERIOR. CURSO DE PÓS-
GRADUAÇÃO. DESLIGAMENTO DE ESTUDANTE DE PROGRAMA DE RESIDÊNCIA
MULTIDISCIPLINAR. AUSÊNCIA DE PRÉVIO PROCESSO ADMINISTRATIVO. INOBSERVÂNCIA
DO EXERCÍCIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Mandado
de Segurança visando a assegurar à impetrante, liminarmente, o reingresso
imediato no Curso de Residência Multidisciplinar em Políticas de Gênero e
Direitos Humanos da UFRJ, com matrícula ativa, restabelecimento de bolsa de
estudos e pagamento integral referente ao mês de fevereiro/2014. No mérito,
a anulação de seu desligamento do Programa, com ratificação da liminar. 2. A
impetrante defende a tese de que deveria ter ciência prévia das eventuais
deficiências acadêmicas que motivariam seu desligamento do curso, com a devida
formalização do procedimento administrativo e observância do contraditório
naquela via, a fim de exercer efetivamente sua defesa antes da exclusão,
ressaltando nunca ter sido "informada seja formal ou informalmente sobre
a quebra de regras/leis/regulamentos ou coisa semelhante durante toda
a residência". 3. A Constituição Federal/88 conferiu às universidades
autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira
e patrimonial, consoante artigo 207, caput, da CRFB/88. Por seu turno,
estabelece a Lei nº 9.394/96 que a educação superior abrangerá cursos e
programas de pós-graduação, abertos a candidatos diplomados em cursos de
graduação e que atendam às exigências das instituições de ensino. 4. O Curso
de Residência Multidisciplinar em Políticas de Gênero e Direitos Humanos da
UFRJ constitui-se em especialização (pós-graduação lato sensu) na modalidade
de residência multidisciplinar (instituída pela Lei 11.129/2005), que "tem
a particularidade de realizar treinamento em serviço, com experimentação
de metodologias de atenção interdisciplinar e integral à mulher", conforme
Edital Público nº 02 lançado pela Universidade para seleção de interessados,
com aprovação da impetrante em 2º lugar. 5. Aplicando normas do Regulamento
do Curso e da Coordenação de Residências Multidisciplinares-COREMU, a UFRJ
procedeu ao desligamento da aluna do aludido curso, amparando-se em avaliações
dos docentes e pareceres técnicos salientando a " inadequabilidade do perfil da
impetrante às atividades inerentes ao curso", ausência de empenho e interesse
na participação das atividades propostas, além de resistência à execução 1
de trabalhos em equipe, considerando-se na trajetória da aluna situações
que relatam impontualidade e participação insuficiente nas atividades
pedagógicas. 6. Apesar de descaber ao Poder Judiciário interferência nos
critérios de formulação e avaliação adotados pela universidade (pois são
questões inseridas em sua autonomia administrativa), limitando-se sua atuação
ao exame da regularidade dos atos administrativos e legalidade (artigo
37, caput, da CRFB/88), o fato é que somente em 19/02/2014, após o efetivo
desligamento da residente, formalizado por escrito em 04/02/2014 em virtude da
fruição de suas férias, instaurou- se o procedimento administrativo a partir
do recurso por ela interposto. 7. Na sentença, o Juízo a quo, sem adentrar
na esfera da autonomia universitária (mérito da questão), buscou assegurar
à demandante as garantias constitucionais da ampla defesa e contraditório
no procedimento administrativo (artigo 5º, incisos LIV e LV, da CRFB/88),
possibilitando-lhe contestar e afastar previamente ao seu desligamento do
curso as razões que, em tese, o motivariam. 8. Entendimento que se mostra em
harmonia com a orientação jurisprudencial do STJ, que, apreciando hipótese
concernente ao jubilamento de aluno por faltas, decidiu ser ilegítimo o ato
administrativo de desligamento sem que ao estudante fosse possibilitado
o exercício do direito de defesa (REsp 1.442.390 / CE, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 31/03/2015), ressaltando-se no voto
condutor que "independentemente da autonomia administrativa de estabelecer
a organização da atividade acadêmica, não pode a instituição de ensino,
vinculada à Administração, determinar o jubilamento de aluno, sem que haja
atendimento ao princípio do contraditório e da ampla defesa, cânone relevante
do Estado Democrático de Direito". 9. Julgados das Cortes Regionais (TRF1R,
REOMS 0025935-62.2014.4.01.3500, Rel. Desembargador Federal NÉVITON GUEDES,
QUINTA TURMA, e-DJF1 17/12/2015; TRF4R, AG 5000236-58.2013.4.04.0000,
Rel. Desembargador Federal CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, QUARTA TURMA,
D.E. 08/03/2013; TRF2R, AC 0001676-08.2009.4.02.5001, Rel. Desembargador
Federal GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA, SEXTA TURMA ESPECIALIZADA,
publ. 21/02/2011, e AC 2003.5101.026994-0, Rel. Desembargador Federal POUL
ERIK DYRLUND, OITAVA TURMA ESPECIALIZADA, DJU 04/04/2006). 10. Remessa
necessária conhecida e desprovida.
Ementa
ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. ENSINO SUPERIOR. CURSO DE PÓS-
GRADUAÇÃO. DESLIGAMENTO DE ESTUDANTE DE PROGRAMA DE RESIDÊNCIA
MULTIDISCIPLINAR. AUSÊNCIA DE PRÉVIO PROCESSO ADMINISTRATIVO. INOBSERVÂNCIA
DO EXERCÍCIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Mandado
de Segurança visando a assegurar à impetrante, liminarmente, o reingresso
imediato no Curso de Residência Multidisciplinar em Políticas de Gênero e
Direitos Humanos da UFRJ, com matrícula ativa, restabelecimento de bolsa de
estudos e pagamento integral referente ao mês de fevereiro/2014. No mérito,
a anulação de seu desligamento do Programa, com ratificação da liminar. 2. A
impetrante defende a tese de que deveria ter ciência prévia das eventuais
deficiências acadêmicas que motivariam seu desligamento do curso, com a devida
formalização do procedimento administrativo e observância do contraditório
naquela via, a fim de exercer efetivamente sua defesa antes da exclusão,
ressaltando nunca ter sido "informada seja formal ou informalmente sobre
a quebra de regras/leis/regulamentos ou coisa semelhante durante toda
a residência". 3. A Constituição Federal/88 conferiu às universidades
autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira
e patrimonial, consoante artigo 207, caput, da CRFB/88. Por seu turno,
estabelece a Lei nº 9.394/96 que a educação superior abrangerá cursos e
programas de pós-graduação, abertos a candidatos diplomados em cursos de
graduação e que atendam às exigências das instituições de ensino. 4. O Curso
de Residência Multidisciplinar em Políticas de Gênero e Direitos Humanos da
UFRJ constitui-se em especialização (pós-graduação lato sensu) na modalidade
de residência multidisciplinar (instituída pela Lei 11.129/2005), que "tem
a particularidade de realizar treinamento em serviço, com experimentação
de metodologias de atenção interdisciplinar e integral à mulher", conforme
Edital Público nº 02 lançado pela Universidade para seleção de interessados,
com aprovação da impetrante em 2º lugar. 5. Aplicando normas do Regulamento
do Curso e da Coordenação de Residências Multidisciplinares-COREMU, a UFRJ
procedeu ao desligamento da aluna do aludido curso, amparando-se em avaliações
dos docentes e pareceres técnicos salientando a " inadequabilidade do perfil da
impetrante às atividades inerentes ao curso", ausência de empenho e interesse
na participação das atividades propostas, além de resistência à execução 1
de trabalhos em equipe, considerando-se na trajetória da aluna situações
que relatam impontualidade e participação insuficiente nas atividades
pedagógicas. 6. Apesar de descaber ao Poder Judiciário interferência nos
critérios de formulação e avaliação adotados pela universidade (pois são
questões inseridas em sua autonomia administrativa), limitando-se sua atuação
ao exame da regularidade dos atos administrativos e legalidade (artigo
37, caput, da CRFB/88), o fato é que somente em 19/02/2014, após o efetivo
desligamento da residente, formalizado por escrito em 04/02/2014 em virtude da
fruição de suas férias, instaurou- se o procedimento administrativo a partir
do recurso por ela interposto. 7. Na sentença, o Juízo a quo, sem adentrar
na esfera da autonomia universitária (mérito da questão), buscou assegurar
à demandante as garantias constitucionais da ampla defesa e contraditório
no procedimento administrativo (artigo 5º, incisos LIV e LV, da CRFB/88),
possibilitando-lhe contestar e afastar previamente ao seu desligamento do
curso as razões que, em tese, o motivariam. 8. Entendimento que se mostra em
harmonia com a orientação jurisprudencial do STJ, que, apreciando hipótese
concernente ao jubilamento de aluno por faltas, decidiu ser ilegítimo o ato
administrativo de desligamento sem que ao estudante fosse possibilitado
o exercício do direito de defesa (REsp 1.442.390 / CE, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 31/03/2015), ressaltando-se no voto
condutor que "independentemente da autonomia administrativa de estabelecer
a organização da atividade acadêmica, não pode a instituição de ensino,
vinculada à Administração, determinar o jubilamento de aluno, sem que haja
atendimento ao princípio do contraditório e da ampla defesa, cânone relevante
do Estado Democrático de Direito". 9. Julgados das Cortes Regionais (TRF1R,
REOMS 0025935-62.2014.4.01.3500, Rel. Desembargador Federal NÉVITON GUEDES,
QUINTA TURMA, e-DJF1 17/12/2015; TRF4R, AG 5000236-58.2013.4.04.0000,
Rel. Desembargador Federal CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, QUARTA TURMA,
D.E. 08/03/2013; TRF2R, AC 0001676-08.2009.4.02.5001, Rel. Desembargador
Federal GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA, SEXTA TURMA ESPECIALIZADA,
publ. 21/02/2011, e AC 2003.5101.026994-0, Rel. Desembargador Federal POUL
ERIK DYRLUND, OITAVA TURMA ESPECIALIZADA, DJU 04/04/2006). 10. Remessa
necessária conhecida e desprovida.
Data do Julgamento
:
11/05/2016
Data da Publicação
:
18/05/2016
Classe/Assunto
:
REOAC - Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
7ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
JOSÉ ANTONIO NEIVA
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
JOSÉ ANTONIO NEIVA
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