TRF2 0002076-37.2014.4.02.5101 00020763720144025101
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONVERSÃO EM INDENIZAÇÃO
POR PERDAS E DANOS. POSSIBILIDADE. ART. 499 DO CPC. IMÓVEL SEM CONDIÇÕES
DE HABITABILIDADE E COM RISCO POTENCIAL DE COLAPSO ESTRUTURAL. LAUDO
PERICIAL. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Trata-se de
Apelações Cíveis interpostas pela CAIXA SEGURADORA S/A e pela CAIXA ECONÔMICA
FEDERAL e de Recurso Adesivo interposto pela PARTE AUTORA, tendo por objeto
sentença, prolatada nos autos de ação ajuizada em face da Caixa Econômica
Federal e da Caixa Seguradora S/A, objetivando a condenação das rés para
que promovam as obras necessárias para tornar habitável o imóvel adquirido,
o recebimento de indenização por danos morais e ainda a declaração de nulidade
da cláusula sétima do contrato firmado entre as partes. 2. O Superior Tribunal
de Justiça tem entendimento assente no sentido de que a conversão do "pedido"
de obrigação de fazer em indenização por perdas e danos não configura
julgamento extra petita (STJ, Quarta Turma, AgInt no AREsp 971279/SP,
rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 24/08/2018). 3. Em 20 de agosto de 2013,
foi celebrado contrato particular de compra e venda de unidade isolada e mútuo
com obrigações e alienação fiduciária entre os autores e a CEF, para aquisição
de imóvel situado à Rua Suruí 356, casa 2. 4. De acordo com a cláusula décima,
juntamente com o pagamento das prestações, compostas da parcela de amortização
e juros, devem ser pagos os acessórios, dentre os quais se incluem os prêmios
de seguro. 5. Às fls. 91, verifica-se uma vistoria de emergência realizada
pela Defesa Civil, em 16/02/2014, onde alerta-se pela necessidade de realizar
obras de manutenção e recuperação do imóvel, pois o mesmo apresenta risco
potencial de colapso estrutural. 6. Quando o contrato foi celebrado entre
os autores e a CEF, esta já era sabedora de que o mesmo apresentava diversos
vícios, uma vez que foi citada, juntamente com a seguradora, em ação ajuizada
pela mutuária anterior (Sra. Iracildes). Posteriormente, a CEF foi excluída
da lide e os autos remetidos à Justiça Estadual, conforme se verifica às
fls. 38/40. 7. Independentemente do desfecho do processo que tramitou na
Justiça Estadual, não há dúvidas de que tanto a CEF quanto a Seguradora tiveram
efetiva ciência dos danos que 1 recaíam sobre o imóvel, tais como rachaduras e
infiltrações, o que moveu a ação da mutuária anterior objetivando a obtenção
da cobertura do seguro pelos danos no imóvel. 8. Tal fato é de extrema
importância na resolução do presente caso, uma vez que se a CEF celebrou
o contrato de compra e venda e a seguradora aceitou receber os prêmios do
seguro, sabedoras de que o imóvel encontrava-se em condições de ruína, não
podem invocar as restrições contratuais para se eximirem da responsabilidade
de indenizar. 9. A solução dessa controvérsia demanda, necessariamente, a
aplicação de um dos princípios fundamentais do direito privado, qual seja,
o princípio da boa-fé objetiva, previsto no art. 422 do Código Civil, cuja
função é estabelecer um padrão ético de conduta para as partes ao longo de
todas as fases da relação obrigacional. 10. No caso concreto, a CEF alienou
imóvel mediante novo financiamento sem a avaliação cuidadosa das condições
do mesmo. Ciente do seu estado de depreciação, falhou a CEF ao não informar
as condições reais do imóvel ofertado à venda, afrontando deveres anexos de
colaboração, conforme bem salientado pelo juízo a quo. 11. O estado do imóvel
indica que a própria finalidade do negócio jurídico acabou restando frustrada,
pois não se trata de mera necessidade de fazimento de obras necessárias para
tornar habitável o imóvel adquirido. 12. O laudo pericial de fls. 244/256
atesta que o imóvel encontra-se tão deteriorado, que a melhor obra a se
fazer é a demolição total do mesmo e refazê-lo. Em resposta ao quesito 2 da
Caixa Seguradora, o perito afasta qualquer hipótese de vício de construção,
entendendo como causa principal o possível rompimento na rede de esgoto,
por não existir rede de águas pluviais independente, sendo sua captação
desviada para a de esgoto, contribuindo que os danos fossem agravados mesmo
sem a ocupação do imóvel. 13. Tendo em vista que o imóvel encontra-se tão
deteriorado, conforme se pode verificar nas fotos anexadas ao laudo pericial
(fls. 250/256), a sua reforma se torna inviável, ou seja, impossível de
realizar. 14. Como demolição não constitui reforma, cabível a conversão do
pedido do item 5 da inicial para a resolução do contrato, restabelecendo as
partes ao estado anterior da contratação, com a consequente devolução de todas
as quantias pagas pelos requerentes e desfazimento dos respectivos registros
contratuais. 15. Não é razoável exigir que os autores aguardem a demolição do
imóvel e a sua reconstrução enquanto pagam as prestações do mesmo, inclusive
os encargos do seguro, se desde o início da celebração do contrato houve
violação ao princípio da boa-fé objetiva. 16. Com a resolução do contrato,
desnecessário pronunciar a nulidade da cláusula sétima. 17. No que tange
ao dano moral, os autores sofreram um abalo psicológico, que ultrapassou
o mero dissabor, pois nenhuma pessoa normal fica indiferente a situação de
pagar prestações por um imóvel sem condições de habitabilidade, insalubre
e com risco potencial de colapso estrutural, conforme vistoria realizada
pela Defesa Civil (fls. 91). 18. No tocante à indenização, a mesma deve ser
fixada em termos razoáveis, não se 2 justificando que a reparação venha a
constituir-se em enriquecimento indevido, com manifestos abusos e exageros,
devendo o arbitramento se operar com moderação. 19. Assim sendo, atento que a
fixação do valor do dano moral tem duplo conteúdo, de sanção e compensação,
entendo por bem fixá-lo em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). 20. O artigo 85,
§ 2º, do CPC preconiza que os honorários serão fixados entre o mínimo de
dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito
econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado
da causa. 21. Considerando que o contrato foi celebrado em agosto de 2013
e os autores levariam 20 anos para pagar as prestações, verifica-se que a
base de cálculo da verba honorária fixada na sentença se mostra excessiva,
uma vez que o valor do benefício econômico está limitado à repetição dos
valores pagos e à condenação em danos morais. 22. Assim, a base de cálculo
da verba honorária deve ser o valor da condenação. 23. Apelações da CEF
e da Caixa Seguradora S/A parcialmente providas apenas para fixar a verba
honorária em 15% sobre o valor da condenação. 24. Recurso adesivo da parte
autora provido para condenar as rés ao pagamento de danos morais no valor
de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Ementa
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONVERSÃO EM INDENIZAÇÃO
POR PERDAS E DANOS. POSSIBILIDADE. ART. 499 DO CPC. IMÓVEL SEM CONDIÇÕES
DE HABITABILIDADE E COM RISCO POTENCIAL DE COLAPSO ESTRUTURAL. LAUDO
PERICIAL. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Trata-se de
Apelações Cíveis interpostas pela CAIXA SEGURADORA S/A e pela CAIXA ECONÔMICA
FEDERAL e de Recurso Adesivo interposto pela PARTE AUTORA, tendo por objeto
sentença, prolatada nos autos de ação ajuizada em face da Caixa Econômica
Federal e da Caixa Seguradora S/A, objetivando a condenação das rés para
que promovam as obras necessárias para tornar habitável o imóvel adquirido,
o recebimento de indenização por danos morais e ainda a declaração de nulidade
da cláusula sétima do contrato firmado entre as partes. 2. O Superior Tribunal
de Justiça tem entendimento assente no sentido de que a conversão do "pedido"
de obrigação de fazer em indenização por perdas e danos não configura
julgamento extra petita (STJ, Quarta Turma, AgInt no AREsp 971279/SP,
rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 24/08/2018). 3. Em 20 de agosto de 2013,
foi celebrado contrato particular de compra e venda de unidade isolada e mútuo
com obrigações e alienação fiduciária entre os autores e a CEF, para aquisição
de imóvel situado à Rua Suruí 356, casa 2. 4. De acordo com a cláusula décima,
juntamente com o pagamento das prestações, compostas da parcela de amortização
e juros, devem ser pagos os acessórios, dentre os quais se incluem os prêmios
de seguro. 5. Às fls. 91, verifica-se uma vistoria de emergência realizada
pela Defesa Civil, em 16/02/2014, onde alerta-se pela necessidade de realizar
obras de manutenção e recuperação do imóvel, pois o mesmo apresenta risco
potencial de colapso estrutural. 6. Quando o contrato foi celebrado entre
os autores e a CEF, esta já era sabedora de que o mesmo apresentava diversos
vícios, uma vez que foi citada, juntamente com a seguradora, em ação ajuizada
pela mutuária anterior (Sra. Iracildes). Posteriormente, a CEF foi excluída
da lide e os autos remetidos à Justiça Estadual, conforme se verifica às
fls. 38/40. 7. Independentemente do desfecho do processo que tramitou na
Justiça Estadual, não há dúvidas de que tanto a CEF quanto a Seguradora tiveram
efetiva ciência dos danos que 1 recaíam sobre o imóvel, tais como rachaduras e
infiltrações, o que moveu a ação da mutuária anterior objetivando a obtenção
da cobertura do seguro pelos danos no imóvel. 8. Tal fato é de extrema
importância na resolução do presente caso, uma vez que se a CEF celebrou
o contrato de compra e venda e a seguradora aceitou receber os prêmios do
seguro, sabedoras de que o imóvel encontrava-se em condições de ruína, não
podem invocar as restrições contratuais para se eximirem da responsabilidade
de indenizar. 9. A solução dessa controvérsia demanda, necessariamente, a
aplicação de um dos princípios fundamentais do direito privado, qual seja,
o princípio da boa-fé objetiva, previsto no art. 422 do Código Civil, cuja
função é estabelecer um padrão ético de conduta para as partes ao longo de
todas as fases da relação obrigacional. 10. No caso concreto, a CEF alienou
imóvel mediante novo financiamento sem a avaliação cuidadosa das condições
do mesmo. Ciente do seu estado de depreciação, falhou a CEF ao não informar
as condições reais do imóvel ofertado à venda, afrontando deveres anexos de
colaboração, conforme bem salientado pelo juízo a quo. 11. O estado do imóvel
indica que a própria finalidade do negócio jurídico acabou restando frustrada,
pois não se trata de mera necessidade de fazimento de obras necessárias para
tornar habitável o imóvel adquirido. 12. O laudo pericial de fls. 244/256
atesta que o imóvel encontra-se tão deteriorado, que a melhor obra a se
fazer é a demolição total do mesmo e refazê-lo. Em resposta ao quesito 2 da
Caixa Seguradora, o perito afasta qualquer hipótese de vício de construção,
entendendo como causa principal o possível rompimento na rede de esgoto,
por não existir rede de águas pluviais independente, sendo sua captação
desviada para a de esgoto, contribuindo que os danos fossem agravados mesmo
sem a ocupação do imóvel. 13. Tendo em vista que o imóvel encontra-se tão
deteriorado, conforme se pode verificar nas fotos anexadas ao laudo pericial
(fls. 250/256), a sua reforma se torna inviável, ou seja, impossível de
realizar. 14. Como demolição não constitui reforma, cabível a conversão do
pedido do item 5 da inicial para a resolução do contrato, restabelecendo as
partes ao estado anterior da contratação, com a consequente devolução de todas
as quantias pagas pelos requerentes e desfazimento dos respectivos registros
contratuais. 15. Não é razoável exigir que os autores aguardem a demolição do
imóvel e a sua reconstrução enquanto pagam as prestações do mesmo, inclusive
os encargos do seguro, se desde o início da celebração do contrato houve
violação ao princípio da boa-fé objetiva. 16. Com a resolução do contrato,
desnecessário pronunciar a nulidade da cláusula sétima. 17. No que tange
ao dano moral, os autores sofreram um abalo psicológico, que ultrapassou
o mero dissabor, pois nenhuma pessoa normal fica indiferente a situação de
pagar prestações por um imóvel sem condições de habitabilidade, insalubre
e com risco potencial de colapso estrutural, conforme vistoria realizada
pela Defesa Civil (fls. 91). 18. No tocante à indenização, a mesma deve ser
fixada em termos razoáveis, não se 2 justificando que a reparação venha a
constituir-se em enriquecimento indevido, com manifestos abusos e exageros,
devendo o arbitramento se operar com moderação. 19. Assim sendo, atento que a
fixação do valor do dano moral tem duplo conteúdo, de sanção e compensação,
entendo por bem fixá-lo em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). 20. O artigo 85,
§ 2º, do CPC preconiza que os honorários serão fixados entre o mínimo de
dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito
econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado
da causa. 21. Considerando que o contrato foi celebrado em agosto de 2013
e os autores levariam 20 anos para pagar as prestações, verifica-se que a
base de cálculo da verba honorária fixada na sentença se mostra excessiva,
uma vez que o valor do benefício econômico está limitado à repetição dos
valores pagos e à condenação em danos morais. 22. Assim, a base de cálculo
da verba honorária deve ser o valor da condenação. 23. Apelações da CEF
e da Caixa Seguradora S/A parcialmente providas apenas para fixar a verba
honorária em 15% sobre o valor da condenação. 24. Recurso adesivo da parte
autora provido para condenar as rés ao pagamento de danos morais no valor
de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Data do Julgamento
:
01/02/2019
Data da Publicação
:
06/02/2019
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
POUL ERIK DYRLUND
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
POUL ERIK DYRLUND
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