TRF2 0005064-37.2016.4.02.0000 00050643720164020000
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DOENÇA RARA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO
NA¿O PADRONIZADO. AUSÊNCIA DE REGISTRO NA ANVISA. ALTÍSSIMO CUSTO. PREVISÃO
DE INFRAÇÃO PENAL. 1. O agravado, paciente de 29 anos de idade, portador
de hemoglobinúria paroxística noturna (HPN), pleiteia o fornecimento
do medicamento ECULIZUMAB, cujo nome comercial é SOLIRIS®, sendo este
"medicamento órfão" (que trata de doenças graves e raras). 2. O referido
medicamento não se encontra disponível na Relação Nacional de Medicamentos
Essenciais - RENAME, tampouco possui registro na ANVISA, o que de início já
seria um empecilho à determinação pelo Poder Judiciário ao seu fornecimento,
nos moldes dos artigos 19-M, 19-P, 19-Q e 19-R e 19-T, todos da Lei nº
8.080/90, além de ir de encontro à orientação firmada no enunciado nº 6
da I Jornada de Direito da Saúde, como também às considerações feitas pelo
i. Min. Gilmar Mendes no julgamento das suspensões de tutela antecipada nos
175 e 178. 3. O art. 12 da Lei 6.360/762, que dispõe sobre a vigilância
sanitária a que ficam sujeitos os medicamentos, proíbe que os fármacos,
inclusive os importados, sejam entregues a consumo antes do registro e,
para tanto, devem os mesmos ser reconhecidos como seguros e eficazes
para o uso a que se propõem (art. 16, II, da Lei 6.360/76) e, quanto aos
importados, deve haver comprovação de registro no país de origem (art. 18 da
Lei 6.360/76). Tal determinação pretende resguardar e proteger a saúde dos
pacientes, garantindo a segurança e eficácia do medicamento. 4. A entrega
a consumo de medicamento sem registro no órgão de Vigilância Sanitária
constitui infração penal prevista no art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal, com
a gravíssima pena de reclusão de 10 a 15 anos e multa. 5. Se o Ministério da
Saúde não recomenda a padronização do medicamento, não aprovado pela Anvisa,
"que devido às limitações de 1 evidências de eficácia, da escassez de dados
de segurança, do alto custo do medicamento", não cabe ao Judiciário relegar
a não-recomendação e impor a dispensação, à custa de outros tratamentos
incluídos em políticas públicas. 6. Trata-se de medicamento de altíssimo
custo, talvez um dos tratamentos mais caros atualmente, havendo menção na
inicial do agravo a gastos de milhões de reais. Como "direitos não nascem
em árvores" (Flávio Galdino) e os orçamentos são limitados, a dispensação
de medicamento não incluído em política pública representa a não aquisição
e prestação de outros que atendem melhor às necessidades-possibilidades da
sociedade, conforme os estudos técnicos dos órgãos próprios e, por isso,
já incorporados ao sistema de saúde. Por isso, a ponderação cabível é:
"O que está em jogo é o direito à vida e à saúde de uns versus o direito à
vida e à saúde de outros". 7. O art. 196 da Constituição Federal é expresso:
"Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante
políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de
outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para
sua promoção, proteção e recuperação", mas o acesso universal e igualitário
não se faz por decisões judiciais que assegurem tratamentos individuais
de altíssimo custo, sem efetivo reconhecimento de custo-efetividade,
em detrimento de políticas públicas já insuficientes. 8. Conclui-se que
o deferimento de liminares em casos semelhantes ao presente, beneficiando
apenas um indivíduo, prejudica a formulação de políticas públicas aptas a
englobar todos os portadores de doenças raras, como também compromete ainda
mais o já limitado orçamento da União. 9. Recurso provido.
Ementa
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DOENÇA RARA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO
NA¿O PADRONIZADO. AUSÊNCIA DE REGISTRO NA ANVISA. ALTÍSSIMO CUSTO. PREVISÃO
DE INFRAÇÃO PENAL. 1. O agravado, paciente de 29 anos de idade, portador
de hemoglobinúria paroxística noturna (HPN), pleiteia o fornecimento
do medicamento ECULIZUMAB, cujo nome comercial é SOLIRIS®, sendo este
"medicamento órfão" (que trata de doenças graves e raras). 2. O referido
medicamento não se encontra disponível na Relação Nacional de Medicamentos
Essenciais - RENAME, tampouco possui registro na ANVISA, o que de início já
seria um empecilho à determinação pelo Poder Judiciário ao seu fornecimento,
nos moldes dos artigos 19-M, 19-P, 19-Q e 19-R e 19-T, todos da Lei nº
8.080/90, além de ir de encontro à orientação firmada no enunciado nº 6
da I Jornada de Direito da Saúde, como também às considerações feitas pelo
i. Min. Gilmar Mendes no julgamento das suspensões de tutela antecipada nos
175 e 178. 3. O art. 12 da Lei 6.360/762, que dispõe sobre a vigilância
sanitária a que ficam sujeitos os medicamentos, proíbe que os fármacos,
inclusive os importados, sejam entregues a consumo antes do registro e,
para tanto, devem os mesmos ser reconhecidos como seguros e eficazes
para o uso a que se propõem (art. 16, II, da Lei 6.360/76) e, quanto aos
importados, deve haver comprovação de registro no país de origem (art. 18 da
Lei 6.360/76). Tal determinação pretende resguardar e proteger a saúde dos
pacientes, garantindo a segurança e eficácia do medicamento. 4. A entrega
a consumo de medicamento sem registro no órgão de Vigilância Sanitária
constitui infração penal prevista no art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal, com
a gravíssima pena de reclusão de 10 a 15 anos e multa. 5. Se o Ministério da
Saúde não recomenda a padronização do medicamento, não aprovado pela Anvisa,
"que devido às limitações de 1 evidências de eficácia, da escassez de dados
de segurança, do alto custo do medicamento", não cabe ao Judiciário relegar
a não-recomendação e impor a dispensação, à custa de outros tratamentos
incluídos em políticas públicas. 6. Trata-se de medicamento de altíssimo
custo, talvez um dos tratamentos mais caros atualmente, havendo menção na
inicial do agravo a gastos de milhões de reais. Como "direitos não nascem
em árvores" (Flávio Galdino) e os orçamentos são limitados, a dispensação
de medicamento não incluído em política pública representa a não aquisição
e prestação de outros que atendem melhor às necessidades-possibilidades da
sociedade, conforme os estudos técnicos dos órgãos próprios e, por isso,
já incorporados ao sistema de saúde. Por isso, a ponderação cabível é:
"O que está em jogo é o direito à vida e à saúde de uns versus o direito à
vida e à saúde de outros". 7. O art. 196 da Constituição Federal é expresso:
"Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante
políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de
outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para
sua promoção, proteção e recuperação", mas o acesso universal e igualitário
não se faz por decisões judiciais que assegurem tratamentos individuais
de altíssimo custo, sem efetivo reconhecimento de custo-efetividade,
em detrimento de políticas públicas já insuficientes. 8. Conclui-se que
o deferimento de liminares em casos semelhantes ao presente, beneficiando
apenas um indivíduo, prejudica a formulação de políticas públicas aptas a
englobar todos os portadores de doenças raras, como também compromete ainda
mais o já limitado orçamento da União. 9. Recurso provido.
Data do Julgamento
:
01/08/2016
Data da Publicação
:
29/08/2016
Classe/Assunto
:
AG - Agravo de Instrumento - Agravos - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
7ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
LUIZ PAULO DA SILVA ARAUJO FILHO
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
LUIZ PAULO DA SILVA ARAUJO FILHO
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