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Jurisprudência


TRF2 0006266-92.2004.4.02.5101 00062669220044025101

Ementa
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRESÍDIO ARY FRANCO. PRESO ESTRANGEIRO SOB CUSTÓDIA DA JUSTIÇA FEDERAL. AGENTES PENITENCIÁRIOS. TORTURA. CONDUTA ÍMPROBA CONFIGURADA. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. I MPROVIMENTO. 1. O art. 1022 do novo código de processo civil elenca os casos em que cabe a interposição de embargos de d eclaração. 2. Alega-se que o acórdão não teria se manifestado sobre o fato de a sentença apenas ter afirmado a existência de prova de conduta omissiva de CARLOS ALBERTO DE SOUZA RODRIGUES, nos autos do processo penal n. 2003.5101515770-1, bem como que não teria enfrentado o principio da individualização da pena, ignorando o fato de que foram imputadas aos agentes condutas comissivas e omissivas, e a ofensa aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Em que pese seus argumentos, do conjunto probatório presente aos autos logrou-se demonstrar a prática de ato omissivo por parte do ora embargante, mencionando-se a conclusão a que chegou o Juízo a quo "Da análise dos documentos acostados, verifica-se que restou provado nos autos do processo penal (nº 2003.5101515770- 1), fls. 121/210, que os ferimentos que levaram à morte de Chang não foram por ele causados, mas sim pelos réus, Ricardo Duarte Pires Valério, Everson Azevedo Motta e Ricardo Wagner Sarmento Alves, que o torturaram, sendo ainda comprovado o ato omissivo dos réus Carlos Alberto de Souza Rodrigues, Raul Broglio Junior e Carlos Luiz Correia que, mesmo diante da violência perpetrada, nada fizeram para dar um fim ao evento criminoso." Destacou-se o que foi decidido no Juízo criminal cujo teor é o seguinte: "os co-acusados Alberto, Raul e Correia confirmam em interrogatório judicial terem presenciado todo o evento que resultou na morte de Chang. Mas, insistem na tese da auto-lesão da vitima, ou seja, de que tudo não passou de um surto psicótico do prisioneiro." O acórdão ora recorrido, ainda levou em consideração o voto do eminente Desembargador Federal André Fontes nos autos da Apelação Criminal nº 2003.51.01.515770-1, no tocante ao apelo de Carlos Alberto de Souza Rodrigues: " Em relação à valoração da prova testemunhal, reafirmo que não há nos autos nada de concreto que possa abalar a credibilidade dos depoimentos de FABIANO e ALEXANDER, senão meras alegações tendenciosas desprovidas de qualquer suporte probatório, razão pela qual as declarações ali contidas se prestam, sim, a embasar a condenação dos réus. De fato, se por um lado os depoimentos de FABIANO e ALEXANDER divergem em determinados pontos, por outro é certo que apontam na direção de que ALBERTO esteve presente no cenário do crime em boa parte do tempo em que ocorreu a barbárie. O próprio réu, inclusive, em nenhum momento negou a sua presença no local dos fatos. Assim, deve-se perquirir se ALBERTO efetivamente agrediu CHANG ou permaneceu inerte diante da tortura perpetrada principalmente pelo agente MOTTA Pois bem. FABIANO, em seu depoimento de fls. 401-406, em momento algum afirma que CARLOS ALBERTO agrediu CHANG; veja-se: "(...); QUE pode observar que próximos a Chang e Mota estava o agente penitenciário Valério, e um pouco mais a frente, junto ao balcão da sala da inspetoria, vendo também o que se passava, os agentes penitenciários Correia e Alberto, sendo certo que nenhum desses agentes esboçara qualquer reação em defesa de Chang; (...)" (grifo nosso) ALEXANDER, por 1 sua vez, foi categórico em declarar que ALBERTO agrediu a vítima juntamente com os demais agentes. No confronto entre o relato dos fatos feito pelas referidas testemunhas e o depoimento de ALBERTO, ressoa incontroverso que ele esteve presente no cenário do crime em boa parte do tempo em que ocorreu a barbárie, nada tendo feito para impedir as agressões a CHANG. Nesse sentido, assim afirmou FABIANO: "(...); QUE pode observar que próximos a Chang e Mota estava o agente penitenciário Valério, e um pouco mais a frente, junto ao balcão da sala da inspetoria, vendo também o que se passava, os agentes penitenciários Correia e Alberto, sendo certo que nenhum desses agentes esboçara qualquer reação em defesa de Chang; (...)" (grifo nosso) Portanto, correta a aplicação do princípio do favor rei pelo magistrado sentenciante, bem como a imputação de conduta omissiva, já que, reitere-se, exsurge dos autos, de forma induvidosa, que CARLOS ALBERTO nada fez para impedir as agressões a CHANG. Inaplicável, portanto, o princípio do in dubio pro reo, tal como pretende a sua defesa técnica". Concluiu o acórdão que "o papel de mero espectador dos fatos criminosos, não se coaduna com a condição de agentes penitenciários, desautorizando-se a tese de que os mesmos não podem ser responsabilizados pelos atos de comissão praticados pelos demais." Ainda restou esclarecido que "a responsabilidade dos citados réus decorre do fato de que não foram adotadas quaisquer providências com aptidão para minimizar ou impedir o sofrimento imposto a vítima, caracterizando omissão juridicamente r elevante." 3. Acerca da conduta omissiva de Carlos Alberto de Souza Rodrigues, destacou-se que "ainda que se possa discutir se existia ou não existia dolo das pessoas que se omitiram na guarda do detento, é certo que tanto o seu cliente quanto os outros demais que se omitiram praticaram condutas relevantes do ponto de vista do Direito Administrativo". Asseverou-se também que "não se estabeleceu uma punição diferenciada para cada um dos réus. Ora, não existe essa diferenciação na medida em que se está julgado a omissão sob o ponto de vista da improbidade."Até porque não se faz distinção entre a conduta omissiva e comissiva para os fins do artigo 11 da Lei n. 8429/92, não havendo que se perquerir acerca de ofensa aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, muito menos em violação aos demais dispositivos l egais e constitucionais mencionados. 4. Raul Bróglio Junior entende, ainda, haver contradição no julgado uma vez que "a conduta ímproba trata-se da violação do patrimônio público e da moralidade, ambos como preservação do bem jurídico tutelado que é o poder público e não os direitos e garantais fundamentais do particular, mesmo que esse esteja custodiado/preso." A contradição na lição de José Carlos Barbosa Moreira é verificada "quando no acórdão se incluem proposições entre si inconciliáveis" (Comentários ao Código de Processo Civil, 10ª ed., Rio de Janeiro: Forense, v. V, p. 548), o que não ocorre na hipótese presente. O acórdão ora recorrido caracterizou a tortura como ato de improbidade, restando explicitado ser inadmissível: "a tese de que a tortura não se enquadraria no conceito de conduta ímproba, uma vez que o artigo 11 da Lei n. 8.429/92, ao estabelecer como ato de improbidade aquele que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de lealdade às instituições, estabelece como sendo de interesse público e, portanto da própria Administração, a proteção da imagem das instituições. Desta forma, atos que atentem contra a vida e a liberdade de particular, por parte de agentes públicos, considerados pela sociedade como a própria personificação do Estado, em relação ao quais, inclusive os indivíduos depositam toda a sua confiança, traduzem-se em interesses caros à Administração em geral, às instituições de segurança pública em especial, e ao próprio Estado Democrático de Direito. Isso porque " os agentes públicos, ora apelantes tem como missão garantir o respeito à ordem e a lei, e ao descumprirem com suas obrigações atentaram, não apenas o indivíduo, mas sim toda a coletividade e a própria corporação a que pertence."Destacando, ainda, que o "o STJ, ao julgar o Recurso Especial nº 1.177.910-SE, de relatoria do Ministro Herman Benjamin, concluiu que "a tortura de preso custodiado em delegacia, praticada por policial, constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os p rincípios da administração pública". 5. O MPF entende haver nos autos "farto lastro probatório a demonstrar que, de fato, o Embargado LUIZ GUSTAVO MATIAS SILVA, enquanto Diretor do Presídio Ary Franco, omitiu-se quanto à tortura 2 praticada contra Chan Kim Chang, detento custodiado no Presídio Ary Franco, no dia 27/08/2003", o que caracterizaria violação aos dispositivos legais e constitucionais antes mencionados. Entretanto, o julgado ora embargado foi expresso ao corroborar os fundamentos do Juízo criminal para absolver o apelado Luiz Gustavo Matias Silva, nos seguintes termos: "No concernente a recalcitrância no cumprimento do alvará de soltura, o máximo que pode ter havido fora um descuido ou negligência do co-réu. Isto porque ao invés de ter presumido que, ao avistar a chegada da viatura do SOE, Chang já estaria sendo removido para o Hospital Penitenciário, poderia o réu ter se certificado disto pessoalmente, o que não fez. Ao assinalar no verso do alvará de soltura de fl.21 que Chang foi conduzido (alias a expressão foi conduzido encontra justificativa na fl. 2314, além da prova testemunhal de Fabiano, o qual disse na fl. 1239 ter acreditado que o Major Matias falou que a vítima não estava no presídio porque de seu gabinete ele deve ter visto a viatura do SOE chegando e deve ter pensado que a vítima havia sido transferida para o Hospital Penitenciário) pelo SOE para o Hospital e depois para a 24ª DP e que na sequencia disto tudo iria encaminhá-lo para a DELDIA para cumprimento do alvará, não vejo como caracterizado o elemento subjetivo específico do tipo penal insculpido no art. 299 do CP, consistente na vontade de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. Ao encontro de tal entendimento, cito a iniciativa do acusado em telefonar para a Diretora de Secretaria da 5ª Vara Federal Criminal, repassando o ocorrido. Tenho tal circunstância como comprobatória da falta de dolo. A testemunha Sonia Bockmann relatou um dado importante na fl. 932 ao dizer que o Major Matias estaria preocupado com o estado físico de Chang, tendo inclusive chamado a SOE para prestar-lhe socorro médico. A depoente segue dizendo que sugeriu para o Major que se a Polícia Federal, a qual já estava a caminho chegasse primeiro, Chang seria solto e prestado atendimento utilizando-se a própria viatura policial. A resposta do Major segundo a testemunha foi positiva, não havendo discordância deste. Por derradeiro, reporto-me ao depoimento prestado pelo Juiz Federal Cassio Murilo Monteiro Granzinoli na fl. 1352, mormente na parte final quando o mesmo diz expressamente que em nenhum momento houve n egativa do Major Matias em cumprir o alvará de soltura." 6. Assim, estando a irresignação relacionada ao posicionamento adotado, deve ser impugnada através da espécie recursal própria, não sendo os embargos de declaração afetos ao combate dos fundamentos m eritórios do exposto no julgado. 7. O julgado apreciou suficientemente toda a matéria posta ao seu exame e de relevância para a composição da lide, não trazendo qualquer omissão, contradição, obscuridade ou erro material sobre q ualquer matéria que tivesse o condão de modificar o entendimento nele esposado. 8. Os embargantes objetivam rediscutir a substância do voto, o que se afigura inadmissível em sede de e mbargos de declaração. 9. Nítido se mostra que os embargos de declaração não se constituem como via recursal adequada para suscitar a revisão na análise fático-jurídica decidida no acórdão e, mesmo para efeitos de prequestionamento, os embargos de declaração só podem ser acolhidos se presentes qualquer um dos v ícios elencados no art. 1022 do Código de Processo Civil, o que não se constata na situação vertente. 10. Improvidos todos os Embargos de declaração. ACÓR DÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas: Decidem os membros da 5ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, negar p rovimento aos três embargos de declaração, na forma do voto do Relator. Rio de Janeiro, 21 de agosto de 2018 (data do julgamento). 3 ALCIDES MARTINS Desembarga dor Federal Rel ator 4

Data do Julgamento : 27/08/2018
Data da Publicação : 31/08/2018
Classe/Assunto : AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador : 5ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a) : ALCIDES MARTINS
Comarca : TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : ALCIDES MARTINS
Observações : 2º RECURSO.