TRF2 0007619-55.2013.4.02.5101 00076195520134025101
ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE. ATUAÇÃO DO
PODER JUDICIÁRIO. TRATAMENTO MÉDICO. POSSIBILIDADE. INTO. DANOS MORAIS. C
ORREÇÃO MONETÁRIA. 1. A devolução cinge-se ao cabimento da condenação da
União providenciar a realização da cirurgia necessária ao tratamento da doença
degenerativa da coluna cervical - artrodese que acomete o autor no Instituto
Nacional de Traumatologia e Ortopedia (INTO), onde já se encontrava cadastrado
na fila de espera desde 2006, bem como ao pagamento de compensação por dano
moral no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), monetariamente corrigido a
partir da sentença e acrescido de juros de mora desde a citação, através da
aplicação da taxa SELIC e ao pagamento de honorários de sucumbência, fixados
em 10% sobre o valor da c ondenação. 2. O art. 196 da Constituição da República
assevera que a saúde é direito de todos e dever do Estado, competindo, na forma
do art. 197, primordialmente ao Poder Público, a execução das ações e serviços
que g arantam ao cidadão, em última análise, o seu direito à vida. 3. Sendo o
direito à saúde bem constitucionalmente tutelado, não é possível que a norma
programática do art. 196 da constituição seja interpretada de modo a tornar-se
uma "promessa constitucional inconsequente", pois além de qualificar-se como
direito fundamental que assiste a todas as pessoas, representa consequência
constitucional indissociável do direito à vida, intrinsecamente ligado,
ainda, ao princípio da dignidade da p essoa humana, que é a razão, o centro
gravitacional do sistema jurídico-constitucional em vigor. 4. Embora o Poder
Judiciário não possa editar leis ou adentrar na esfera das políticas públicas,
deve buscar a efetividade da norma constitucional e a fiscalização do seu
cumprimento, ainda que para assegurar o seu m ínimo existencial, qual seja,
as condições básicas da existência humana. 5. O Plenário do Supremo Tribunal
Federal, nos autos do Agravo Regimental na Suspensão da Tutela Antecipada nº
175, de Relatoria do Ministro Gilmar Mendes, assentou a possibilidade de, após
a análise minuciosa das circunstâncias de cada caso concreto e a realização de
juízo de ponderação, o Poder Judiciário garantir o direito à saúde por meio
do fornecimento de medicamento ou tratamento indispensável para o aumento
de sobrevida e a melhoria da qualidade de vida do paciente da rede pública
de saúde. 6. Com efeito, o argumento teórico fundado na política geral de
saúde pública do país não pode servir como fator de imunidade judicial que
impeça o exercício do direito à saúde constitucionalmente previsto. 7. Na
hipótese vertente, de acordo com os documentos acostados aos autos, o autor
foi encaminhado ao serviço d e triagem do INTO em 22/02/2005 e ao serviço
de coluna em 08/09/2006. 8. Em 17/11/2006 firmou termo de consentimento de
procedimento cirúrgico no INTO (fls. 13/14), 1 c omparecendo ao hospital
nos dias 18/10/2007 e 05/11/2007 (fls. 15/16). 9. Em 25/03/2013 ocupava
a 2ª posição na fila de espera da referida instituição, subfila "doença
degenerativa c ervical - artrodese", com 195 pacientes inscritos, com situação
"pronto para cirurgia" (fl. 28). 10. É de conhecimento deste Juízo que o
Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia presta seus serviços através
da composição de filas de esperas, organizadas de acordo com os procedimentos
indicados para cada p aciente, inclusive por fator de idade, separado por
especialidades ou grupos ortopédicos. 11. Apesar da necessidade de serem
observados as normas e procedimentos internos para a observância da fila de
espera, em consonância com o princípio da isonomia, esta deve ser feita de
forma razoável, eis que a longa p ermanência da espera pode comprometer a
eficácia do tratamento almejado. 12. O autor está inscrito na fila de espera
de pacientes do INTO para realização de cirurgia de coluna desde 2006, e,
apenas após decorridos sete anos, passou a ocupar a 2ª posição (em 2013), o que
demonstra a ineficiência d a Administração na prestação de assistência à saúde
de forma efetiva e adequada. 13. A apelante foi incapaz de apresentar qualquer
justificativa para tais atrasos ou apresentar alguma espécie de d ocumento,
uma excepcional lista de espera que justificasse o ocorrido. 14. Encontra-se
caracterizada a omissão estatal pela falta de serviço, que ocasionou
o agravamento do estado de saúde do autor após injustificável atraso na
realização de cirurgia em sua coluna, inafastável pela genérica a legação do
princípio da reserva do possível. 15. Sob outro prisma, o dano moral resulta
do grande sofrimento físico e psíquico vivenciado pela autora, derivando
inexoravelmente do próprio fato ofensivo, in res ipsa, potencializado pela
dor física sofrida e nquanto não recebeu a prestação do Estado compatível
com a sua necessidade. 16. (TRF2 - AC 0002844-27.2012.4.02.5167- 7ª TURMA
ESPECIALIZADA- Rel. JOSÉ ANTONIO NEIVA. Julg: 23/02/2017 - DJe 03/03/2017;
AC 0003085-32.2011.4.02.5168 - 6ª TURMA ESPECIALIZADA - J ulg:09/07/2012 -
Dje 17/07/2012 - Rel.Des. Fed. GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA) 17. O
arbitramento da condenação em danos morais no valor de R$ 2.000,00(dois mil
reais), por sua vez, se m ostra adequado e razoável diante das circunstâncias
do caso e com jurisprudência desta Corte. 18. Nas condenações impostas à
Fazenda Pública, em relação à correção monetária, a partir da data do início
da vigência da Lei nº 11.960/09, que modificou a redação do art. 1.º-F da
Lei nº 9.494/97, a atualização deve ser feita segundo a Taxa Referencial
- TR, até a inscrição do débito em precatório, momento em que incidirá o
Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E mensal, do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística, o qual persistirá até o efetivo
pagamento pela Fazenda Nacional, corrigindo-se as diferenças da d ata de
cada parcela devida, acrescido de juros moratórios de 0,5% (meio por cento)
a partir da citação. 19. Deste modo, a sentença, que determinou incidência
da Taxa SELIC, deve ser reformada quanto a esse a specto. 20. Ante o exposto,
dou parcial provimento à remessa e à apelação da União Federal para reformar
a sentença no tocante à correção monetária, que deverá observar o art. 1º-F
da Lei 9.494/97, com redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/09, acrescida
de juros moratórios na forma da fundamentação, sem alteração na condenação
em honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da
condenação, ante a sucumbência m ínima do autor. 2
Ementa
ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE. ATUAÇÃO DO
PODER JUDICIÁRIO. TRATAMENTO MÉDICO. POSSIBILIDADE. INTO. DANOS MORAIS. C
ORREÇÃO MONETÁRIA. 1. A devolução cinge-se ao cabimento da condenação da
União providenciar a realização da cirurgia necessária ao tratamento da doença
degenerativa da coluna cervical - artrodese que acomete o autor no Instituto
Nacional de Traumatologia e Ortopedia (INTO), onde já se encontrava cadastrado
na fila de espera desde 2006, bem como ao pagamento de compensação por dano
moral no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), monetariamente corrigido a
partir da sentença e acrescido de juros de mora desde a citação, através da
aplicação da taxa SELIC e ao pagamento de honorários de sucumbência, fixados
em 10% sobre o valor da c ondenação. 2. O art. 196 da Constituição da República
assevera que a saúde é direito de todos e dever do Estado, competindo, na forma
do art. 197, primordialmente ao Poder Público, a execução das ações e serviços
que g arantam ao cidadão, em última análise, o seu direito à vida. 3. Sendo o
direito à saúde bem constitucionalmente tutelado, não é possível que a norma
programática do art. 196 da constituição seja interpretada de modo a tornar-se
uma "promessa constitucional inconsequente", pois além de qualificar-se como
direito fundamental que assiste a todas as pessoas, representa consequência
constitucional indissociável do direito à vida, intrinsecamente ligado,
ainda, ao princípio da dignidade da p essoa humana, que é a razão, o centro
gravitacional do sistema jurídico-constitucional em vigor. 4. Embora o Poder
Judiciário não possa editar leis ou adentrar na esfera das políticas públicas,
deve buscar a efetividade da norma constitucional e a fiscalização do seu
cumprimento, ainda que para assegurar o seu m ínimo existencial, qual seja,
as condições básicas da existência humana. 5. O Plenário do Supremo Tribunal
Federal, nos autos do Agravo Regimental na Suspensão da Tutela Antecipada nº
175, de Relatoria do Ministro Gilmar Mendes, assentou a possibilidade de, após
a análise minuciosa das circunstâncias de cada caso concreto e a realização de
juízo de ponderação, o Poder Judiciário garantir o direito à saúde por meio
do fornecimento de medicamento ou tratamento indispensável para o aumento
de sobrevida e a melhoria da qualidade de vida do paciente da rede pública
de saúde. 6. Com efeito, o argumento teórico fundado na política geral de
saúde pública do país não pode servir como fator de imunidade judicial que
impeça o exercício do direito à saúde constitucionalmente previsto. 7. Na
hipótese vertente, de acordo com os documentos acostados aos autos, o autor
foi encaminhado ao serviço d e triagem do INTO em 22/02/2005 e ao serviço
de coluna em 08/09/2006. 8. Em 17/11/2006 firmou termo de consentimento de
procedimento cirúrgico no INTO (fls. 13/14), 1 c omparecendo ao hospital
nos dias 18/10/2007 e 05/11/2007 (fls. 15/16). 9. Em 25/03/2013 ocupava
a 2ª posição na fila de espera da referida instituição, subfila "doença
degenerativa c ervical - artrodese", com 195 pacientes inscritos, com situação
"pronto para cirurgia" (fl. 28). 10. É de conhecimento deste Juízo que o
Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia presta seus serviços através
da composição de filas de esperas, organizadas de acordo com os procedimentos
indicados para cada p aciente, inclusive por fator de idade, separado por
especialidades ou grupos ortopédicos. 11. Apesar da necessidade de serem
observados as normas e procedimentos internos para a observância da fila de
espera, em consonância com o princípio da isonomia, esta deve ser feita de
forma razoável, eis que a longa p ermanência da espera pode comprometer a
eficácia do tratamento almejado. 12. O autor está inscrito na fila de espera
de pacientes do INTO para realização de cirurgia de coluna desde 2006, e,
apenas após decorridos sete anos, passou a ocupar a 2ª posição (em 2013), o que
demonstra a ineficiência d a Administração na prestação de assistência à saúde
de forma efetiva e adequada. 13. A apelante foi incapaz de apresentar qualquer
justificativa para tais atrasos ou apresentar alguma espécie de d ocumento,
uma excepcional lista de espera que justificasse o ocorrido. 14. Encontra-se
caracterizada a omissão estatal pela falta de serviço, que ocasionou
o agravamento do estado de saúde do autor após injustificável atraso na
realização de cirurgia em sua coluna, inafastável pela genérica a legação do
princípio da reserva do possível. 15. Sob outro prisma, o dano moral resulta
do grande sofrimento físico e psíquico vivenciado pela autora, derivando
inexoravelmente do próprio fato ofensivo, in res ipsa, potencializado pela
dor física sofrida e nquanto não recebeu a prestação do Estado compatível
com a sua necessidade. 16. (TRF2 - AC 0002844-27.2012.4.02.5167- 7ª TURMA
ESPECIALIZADA- Rel. JOSÉ ANTONIO NEIVA. Julg: 23/02/2017 - DJe 03/03/2017;
AC 0003085-32.2011.4.02.5168 - 6ª TURMA ESPECIALIZADA - J ulg:09/07/2012 -
Dje 17/07/2012 - Rel.Des. Fed. GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA) 17. O
arbitramento da condenação em danos morais no valor de R$ 2.000,00(dois mil
reais), por sua vez, se m ostra adequado e razoável diante das circunstâncias
do caso e com jurisprudência desta Corte. 18. Nas condenações impostas à
Fazenda Pública, em relação à correção monetária, a partir da data do início
da vigência da Lei nº 11.960/09, que modificou a redação do art. 1.º-F da
Lei nº 9.494/97, a atualização deve ser feita segundo a Taxa Referencial
- TR, até a inscrição do débito em precatório, momento em que incidirá o
Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E mensal, do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística, o qual persistirá até o efetivo
pagamento pela Fazenda Nacional, corrigindo-se as diferenças da d ata de
cada parcela devida, acrescido de juros moratórios de 0,5% (meio por cento)
a partir da citação. 19. Deste modo, a sentença, que determinou incidência
da Taxa SELIC, deve ser reformada quanto a esse a specto. 20. Ante o exposto,
dou parcial provimento à remessa e à apelação da União Federal para reformar
a sentença no tocante à correção monetária, que deverá observar o art. 1º-F
da Lei 9.494/97, com redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/09, acrescida
de juros moratórios na forma da fundamentação, sem alteração na condenação
em honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da
condenação, ante a sucumbência m ínima do autor. 2
Data do Julgamento
:
31/08/2017
Data da Publicação
:
06/09/2017
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
5ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
ALCIDES MARTINS
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
ALCIDES MARTINS
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