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Jurisprudência


TRF2 0007717-42.2015.4.02.5110 00077174220154025110

Ementa
REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ACESSO À INFORMAÇÃO. TRANSPARÊNCIA. PRINCÍPIO DA MÁXIMA DIVULGAÇÃO. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. DESCUMPRIMENTO DA LEI 12.527/2011 E DA LEI COMPLEMENTAR 131/2009 POR ENTE MUNICIPAL. PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. SENTENÇA QUE INDEFERE A TUTELA ANTECIPADA. FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA CARACTERIZADOS. DIREITO FUNDAMENTAL. PROVIMENTO. 1. Apelação contra sentença que julgou procedentes os pedidos veiculados em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face de Município, determinando a adoção de providências efetivas no sentido cumprir a Lei 12.527/11 (Lei de Acesso à Informação) e a LC 131/2009 (Lei da Transparência), sob pena de multa diária de R$ 1.000,00. Sentença que indefere o pedido de antecipação de tutela ao f undamento de inexistência de periculum in mora. 2. Antes de ser regulamentado pela legislação infraconstitucional, o direito de acesso à informação já vinha previsto em vários dispositivos da Constituição Federal (art. 5º, XXXIII; art. 37, § 3º, II ; art. 216, § 2º). Segundo a doutrina, "a importância crescente do princípio da transparência para a realização do Estado constitucional democrático se deve, de uma parte, ao impacto das novas tecnologias de informação na cultura de comunicação e de formação de opinião da sociedade, e de outra, à necessidade de fortalecer a posição dos cidadãos frente a um sistema político-administrativo sempre mais complexo e sofisticado. A informação sobre o funcionamento das instituições e os atores responsáveis (transparência institucional), sobre os processos de formação da vontade (transparência procedimental) e sobre o conteúdo das decisões e seus motivos (transparência material) ajudam aos particulares a controlar melhor a atuação dos órgãos públicos, a participar nos assuntos públicos e a facilitar a realização de seus direitos" (SOMMERMANN, Karl-Peter. La exigencia de una Administración transparente en la perspectiva de los principios de democracia y del Estado de Derecho. In: GARCIA MACHO, Ricardo (org.). Derecho administrativo de la información y administración transparente. Madrid: Marcial Pons, 2010, p. 11-25). No mesmo sentido, o Comitê Jurídico Interamericano expôs que "os órgãos públicos devem difundir informação sobre suas funções e atividades - incluindo sua política, oportunidades de consultas, atividades que afetam o público, orçamentos, subsídios, benefícios e contratos - de forma rotineira e proativa, mesmo na ausência de um pedido específico, e de maneira que assegure que a informação seja acessível e compreensível" (Precedente: TRF2, 5ª Turma Especializada, AG 00051406120164020000, Rel. Des. Fed. RICARDO P ERLINGEIRO, E-DJF2R 24.8.2016). 3. Para a Corte Interamericana de Direitos Humanos, em uma sociedade democrática, é indispensável que o Estado se mova pelo princípio da máxima divulgação, que estabelece a presunção de que toda informação é acessível e sujeita a um sistema restrito de exceções. (Princípios sobre o direito de acesso à informação oficial na América Latina. Revista de Investigações Constitucionais, Curitiba, vol. 3, n. 2, p. 143-197, maio/ago. 2016. Disponível em: <http:// http://bit.ly/2cZtQl1 >). Se as recentes Lei 12.527/2011 e LC 131/2009 estabelecem a divulgação das informações de interesse coletivo como regra e, ao mesmo 1 tempo, preveem as restrições a tal premissa, não caberá às autoridades ressalvar o que a lei não ressalvou ou optar pelo cumprimento apenas parcial das disposições legais que garantem o acesso à informação, c omo pretende o Município. 4. A concessão de tutela antecipada requer a existência de probabilidade do direito, que convença o magistrado da verossimilhança das alegações, e de perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, desde que não haja perigo de irreversibilidade do comando emergencial postulado, nos termos do art. 300, do CPC/2015 (antigo art. 273, do CPC/73). O fumus boni iuris está evidenciado pela existência das Leis 12.527/2011 e LC 131/2009. A primeira, publicada em novembro de 2011e com vacatio legis de 180 dias, entrou em vigor em junho de 2012. A segunda alterou e acrescentou dispositivos à LC 101/2000, estabelecendo que a transparência da gestão fiscal será assegurada pela "liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público" (art. 48, II, da LC 101/2000). O periculum in mora, por sua vez, decorre da perpetuação da lesão ao direito fundamental de acesso à informação, insuscetível de reparação até que informações sejam efetivamente disponibilizadas, de acordo com o que a legislação impõe. Em que pese o prazo de 1 ano para se adequasse às referidas leis e o recebimento de duas recomendações originárias do MPF em sede de inquérito civil, o Município permaneceu inerte, de modo que o descumprimento da legislação é inconteste. A iminência de risco de dano irreparável é caracterizada em função do tempo - regular mas insuficiente - para a conclusão do processo principal de cognição plena ou para a execução da decisão correspondente. A não concessão da tutela de urgência prejudicará ainda mais o direito dos administrados de terem acesso às informações públicas, até porque, em se tratando de um direito fundamental, o dano se protrairá no tempo, haja vista o caráter continuativo e permanente da relação entre a coletividade e o Poder Público. A medida provisória antecipatória implica a execução imediata das obrigações de fazer referentes à implementação e à regularização do direito de acesso às informações públicas pelos cidadãos. Deve preponderar o interesse público consubstanciado na efetivação do acesso universal à informação, uma vez que a lesão a esse direito c onstitucionalmente assegurado é irreparável e impassível de conversão em perdas e danos. 5. A imposição de multa cominatória só encontra sentido se for direcionada àquele que, verdadeiramente, detenha meios de dar efetividade ao comando judicial. A Fazenda Pública [ente abstrato] está sujeita ao regime de precatório, tornando-se, por isso, evidente a ineficácia da multa como procedimento de coação, sob pena de tal medida constritiva servir apenas para onerar ainda mais a sociedade, a qual arca com o custo de seu pagamento (Precedentes: TRF2, 6a Turma Especializada, AC 00002336320074025107, Rel. Des. Fed. GUILHERME COUTO DE CASTRO, DJE 28.1.2015; TRF2, 3a Turma, AG 00290663819974020000, Rel. Juiz Fed. Conv. RICARDO PERLINGEIRO, DJE 21.8.2001). A fim de efetivar a tutela jurisdicional, deve ser mantida a multa fixada pelo juízo monocrático, com a ressalva de que incidirá contra a autoridade pública responsável pelo eventual descumprimento da decisão, o que será a purado em sede de execução. 6. Nas ações civis públicas, a questão da verba honorária foge às regras do CPC, sendo disciplinada pelas normas próprias da Lei 7.347/85. A jurisprudência do STJ é pacífica ao afirmar que, em sede de ação civil pública, a condenação do Ministério Público ao pagamento de honorários advocatícios, custas processuais e ônus da sucumbência somente é cabível quando for comprovada e inequívoca a má-fé. Assim, em observância ao princípio da simetria, bem como à luz da interpretação sistemática do ordenamento, não pode o Parquet se beneficiar dos honorários de sucumbência (STJ, 2ª Turma, REsp 1.422.427, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJe 18.12.2013¿ STJ, 2ª Turma, REsp 1.354.802, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 26.9.2013¿ TRF2, 5ª Turma Especializada, AC 20055102.0049075, Rel. Juiz Fed. C onv. FLÁVIO OLIVEIRA LUCAS, E-DJF2R 18.8.2014). 7 . Remessa necessária não provida e apelação provida. 2 ACÓR DÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a 5ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa necessária e dar provimento à apelação, nos termos do relatório e do voto constantes dos autos, que passam a integrar o presente julgado. Rio de Janeiro, 22 de novembro de 2016 (data do julgamento). RICARDO PE RLINGEIRO Desembarga dor Federal 3

Data do Julgamento : 28/11/2016
Data da Publicação : 02/12/2016
Classe/Assunto : APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador : 5ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a) : RICARDO PERLINGEIRO
Comarca : TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : RICARDO PERLINGEIRO
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