TRF2 0010208-26.2015.4.02.0000 00102082620154020000
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEIO AMBIENTE. ARTIGO
14 DA LEI 7.347/85. EFEITO SUSPENSIVO AO RECURSO DE APELAÇÃO. OPE
JUDICIS. DANO AMBIENTAL. PROVA PERICIAL. PROVA DOCUMENTAL DOS ÓRGÃOS DA
ADMINISTRAÇÃO. PRINCÍPIOS DA PREVENÇÃO E DA PRECAUÇÃO. ATIVIDADE POTENCIALMENTE
POLUIDORA. PARCIAL PROVIMENTO. 1. De acordo com o disposto no artigo 14,
da Lei nº 7.347/85, nas ações coletivas, em regra, o recurso de apelação
interposto deve ser recebido apenas no efeito devolutivo, sendo que,
excepcionalmente, pode o magistrado conferir efeito suspensivo ao recurso,
sempre que demonstrada a probabilidade de ocorrência de dano irreparável (REsp
1.125.494/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe 23/4/2010; TRF2,
Sexta Turma Especializada, Processo nº 201302010141081, Relatora Juíza Federal
Convocada CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA, publicado em 03/12/2013; TRF2, Sétima
Turma Especializada, Processo nº 201202010154629, Relator Des. Federal LUIZ
PAULO DA SILVA ARAUJO FILHO, publicado em 15/04/2013). 2. No caso em comento,
a sentença condenou o ora Agravante nas obrigações de fazer consistentes: i)
na desocupação da Ilha Duas Irmãs no prazo de trinta dias; ii) na abstenção
de efetuar qualquer tipo de construção na área situada na Ilha Duas Irmãs;
iii) na demolição de todas as construções existentes na ilha, bem como a
retirada dos materiais resultantes da demolição da construção, prazo de 30
(trinta dias), sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000 (mil reais);
iv) na reparação do dano ambiental causado, através da apresentação de PRAD -
Projeto de Recuperação de Área Degradada, aprovado pelos órgãos ambientais,
no prazo de 60 (sessenta dias), sob pena de multa a ser fixada pelo juízo;
e na obrigação de dar, consistente v) na indenização pelos danos morais
causados à coletividade no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), a ser
destinado ao Fundo Federal de Defesa dos Direitos Difusos. 3. Por entender que
a perícia seria frágil, inconsistente e até mesmo dotada de parcialidade,
o juízo a quo expressamente indicou que a prova não mereceria grande
consideração ao seu juízo de valor para o julgamento da demanda. Desse modo,
baseando-se nos seguintes documentos: auto de infração do IBAMA, embargos
às obras de construção dos nove bangalôs, Termo de Inspeção, Relatório
de Vistoria da UNIÃO, Laudo Técnico da APA Cairuçu n. 19/2004 e Laudo de
Vistoria Técnica n. 13/2007 do IBAMA, entendeu pela irregularidade tanto
das construções já existentes (do cais e do aterro) como daquelas iniciadas
pelos réus (construção dos nove bangalôs), que estariam pautadas em licenças
ambientais ilegais, e que teriam causado danos e infrações ambientais à área,
a justificar a imediata demolição de todas as edificações. 4. Tendo optado
pela maior valoração dos documentos constantes dos autos em detrimento
da 1 prova pericial, verifica-se que o juízo considerou exclusivamente a
documentação trazida pelos órgãos públicos para formar seu convencimento,
entendendo pela presença de dano ambiental e de irregularidade em todas as
construções, o que reputou suficiente para ensejar a procedência de todos
os pleitos autorais (anulação do registro de ocupação e desocupação do
bem, demolição das construções, feitura de projeto de recuperação da área
degradada e pagamento de danos morais coletivos). 5. Ainda que o magistrado
tenha por inexatos e conflituosos os termos do laudo pericial realizado, ou
que considere mais precisos os estudos técnicos produzidos unilateralmente
por órgãos da Administração, tais circunstâncias não autorizam prescindir da
garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa, notadamente diante
da necessidade de realização de prova pericial, imparcial conclusiva, visando
responder aos quesitos das partes, com exame de todos os aspectos técnicos
envolvendo a demanda, que poderá, inclusive, confirmar ou não as conclusões
dos peritos dos órgãos da Administração responsáveis pela proteção do meio
ambiente (TRF2, AC 0000048-57.2004.4.02.5001, Sétima Turma Especializada,
Rel. Juiz Federal Convocado EUGÊNIO ROSA DE ARAUJO, DJe 14/08/2013). 6. A
fundamentação trazida em sentença, além de não ter se valido das conclusões
periciais, a elas se mostra diametralmente oposta. De fato, o juízo prolator
dispõe de livre convencimento para valorar o acervo probatório, contudo é
necessário atentar para os aspectos técnicos, mormente quando se trata de
demanda ambiental. 7. Se há documentos que demonstram serem as construções
irregulares e também posteriores à criação da APA Cairuçu pelo Decreto
n. 89.242/83, como fundamentado em sentença, por outro lado, há também
documentos que colocam em dúvida essas afirmações (Ofício do Ministério da
Fazenda/SPU nº 345/97, Pedido de Inscrição na Ilha Duas Irmãs e Certidão de
Inscrição de Ocupação nº 194/89, Despacho nº 0152, de 14.07.1994 da Diretoria
de Hidrografia e Navegação do Ministério da Marinha, Ofício nº 2488, da
Diretoria de Portos e Costas do Ministério da Marinha, Certidão de inscrição
de Ocupação nº 17/1997, Parecer Técnico do IBAMA nº 101/97, Ofício nº 992/97 -
GAB/SUPES/RJ). 8. Por isso, no que tange à anulação da inscrição de ocupação
da Ilha, sua desocupação e demolição de todas as construções nela existentes,
mostrar-se-ia temerário que o recurso de apelação fosse recebido apenas
com o efeito devolutivo, deixando-se que o decidido em sentença produzisse
regulares efeitos quando, na verdade, ainda há questões que não parecem bem
esclarecidas, tornando mais segura a suspensão de efeitos executórios das
obrigações de fazer por ela determinadas. 9. No que tange especialmente
à demolição de todas as construções existentes na ilha, tal determinação
traz nítido caráter de irreversibilidade caso executada provisoriamente,
ensejando danos irreparáveis à parte. Precedentes. 10. Quanto à elaboração
de Projeto de Recuperação de Área Degradada (PRAD) no prazo de sessenta
dias, tendo em vista a dúvida quanto aos possíveis elementos degradantes
(implantação e exploração do Restaurante Kontiki, construção de píer sobre
costão rochoso e lâmina d’água e promoção do aterramento hidráulico
anteriormente ocupada pelo mar), mostra- se prematura a determinação de que
seja de imediato realizado. Em consequência, ante o desconhecimento exato
quanto à extensão do dano causado, também prudente que não seja executada
a determinação de pagamento imediato de danos morais coletivos no valor
de R$ 100.000,00, ante o entendimento recorrente do eg. STJ de que não é
qualquer atentado aos interesses da coletividade que pode acarretar dano
moral difuso, de maneira que é preciso que 2 a conduta lesiva seja grave o
suficiente para produzir verdadeiros sofrimentos, intranquilidade social
e alterações relevantes na ordem extrapatrimonial coletiva, devendo ser
efetivamente demonstrado o efetivo dano aos interesses extrapatrimoniais
dos membros de um grupo ou da coletividade a ensejar indenização por danos
morais coletivos. 11. No que diz respeito à determinação para que fossem de
imediato cessadas as atividades desenvolvidas na Ilha Duas Irmãs, a despeito do
confronto de documentos trazidos por ambas as partes, cuja análise aprofundada
não tem espaço neste momento processual, fato é que existem indícios acerca
do dano ambiental causado, que se pode constatar, dentre outros, do Laudo de
Vistoria Técnica n. 13/2007 elaborado pelo IBAMA. 12. À luz dos princípios da
indisponibilidade do interesse público na proteção ambiental e da prevenção de
danos e degradações ambientais, tendo em vista a possibilidade de que, com a
permanência das atividades do hotel e restaurante, haja risco à preservação
do meio ambiente e continuidade de sua degradação, mostra-se razoável a
permanência da suspensão das atividades na Ilha. Essa determinação se mostra
a mais acertada não pela certeza ou contundência dos danos causados e de sua
extensão, verificação essa que não é cabível neste momento, mas exatamente
porque essa falta de convicção absoluta quanto à ocorrência de danos graves
e irreversíveis não deve ser respaldo ao adiamento da adoção de medidas
potencialmente eficazes para impedir a degradação ambiental, ainda que
haja controvérsias quanto aos efeitos nocivos da atividade que, por isso,
deve ser evitada, conforme preconiza o princípio da precaução. 13. Agravo
de instrumento parcialmente provido.
Ementa
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEIO AMBIENTE. ARTIGO
14 DA LEI 7.347/85. EFEITO SUSPENSIVO AO RECURSO DE APELAÇÃO. OPE
JUDICIS. DANO AMBIENTAL. PROVA PERICIAL. PROVA DOCUMENTAL DOS ÓRGÃOS DA
ADMINISTRAÇÃO. PRINCÍPIOS DA PREVENÇÃO E DA PRECAUÇÃO. ATIVIDADE POTENCIALMENTE
POLUIDORA. PARCIAL PROVIMENTO. 1. De acordo com o disposto no artigo 14,
da Lei nº 7.347/85, nas ações coletivas, em regra, o recurso de apelação
interposto deve ser recebido apenas no efeito devolutivo, sendo que,
excepcionalmente, pode o magistrado conferir efeito suspensivo ao recurso,
sempre que demonstrada a probabilidade de ocorrência de dano irreparável (REsp
1.125.494/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe 23/4/2010; TRF2,
Sexta Turma Especializada, Processo nº 201302010141081, Relatora Juíza Federal
Convocada CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA, publicado em 03/12/2013; TRF2, Sétima
Turma Especializada, Processo nº 201202010154629, Relator Des. Federal LUIZ
PAULO DA SILVA ARAUJO FILHO, publicado em 15/04/2013). 2. No caso em comento,
a sentença condenou o ora Agravante nas obrigações de fazer consistentes: i)
na desocupação da Ilha Duas Irmãs no prazo de trinta dias; ii) na abstenção
de efetuar qualquer tipo de construção na área situada na Ilha Duas Irmãs;
iii) na demolição de todas as construções existentes na ilha, bem como a
retirada dos materiais resultantes da demolição da construção, prazo de 30
(trinta dias), sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000 (mil reais);
iv) na reparação do dano ambiental causado, através da apresentação de PRAD -
Projeto de Recuperação de Área Degradada, aprovado pelos órgãos ambientais,
no prazo de 60 (sessenta dias), sob pena de multa a ser fixada pelo juízo;
e na obrigação de dar, consistente v) na indenização pelos danos morais
causados à coletividade no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), a ser
destinado ao Fundo Federal de Defesa dos Direitos Difusos. 3. Por entender que
a perícia seria frágil, inconsistente e até mesmo dotada de parcialidade,
o juízo a quo expressamente indicou que a prova não mereceria grande
consideração ao seu juízo de valor para o julgamento da demanda. Desse modo,
baseando-se nos seguintes documentos: auto de infração do IBAMA, embargos
às obras de construção dos nove bangalôs, Termo de Inspeção, Relatório
de Vistoria da UNIÃO, Laudo Técnico da APA Cairuçu n. 19/2004 e Laudo de
Vistoria Técnica n. 13/2007 do IBAMA, entendeu pela irregularidade tanto
das construções já existentes (do cais e do aterro) como daquelas iniciadas
pelos réus (construção dos nove bangalôs), que estariam pautadas em licenças
ambientais ilegais, e que teriam causado danos e infrações ambientais à área,
a justificar a imediata demolição de todas as edificações. 4. Tendo optado
pela maior valoração dos documentos constantes dos autos em detrimento
da 1 prova pericial, verifica-se que o juízo considerou exclusivamente a
documentação trazida pelos órgãos públicos para formar seu convencimento,
entendendo pela presença de dano ambiental e de irregularidade em todas as
construções, o que reputou suficiente para ensejar a procedência de todos
os pleitos autorais (anulação do registro de ocupação e desocupação do
bem, demolição das construções, feitura de projeto de recuperação da área
degradada e pagamento de danos morais coletivos). 5. Ainda que o magistrado
tenha por inexatos e conflituosos os termos do laudo pericial realizado, ou
que considere mais precisos os estudos técnicos produzidos unilateralmente
por órgãos da Administração, tais circunstâncias não autorizam prescindir da
garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa, notadamente diante
da necessidade de realização de prova pericial, imparcial conclusiva, visando
responder aos quesitos das partes, com exame de todos os aspectos técnicos
envolvendo a demanda, que poderá, inclusive, confirmar ou não as conclusões
dos peritos dos órgãos da Administração responsáveis pela proteção do meio
ambiente (TRF2, AC 0000048-57.2004.4.02.5001, Sétima Turma Especializada,
Rel. Juiz Federal Convocado EUGÊNIO ROSA DE ARAUJO, DJe 14/08/2013). 6. A
fundamentação trazida em sentença, além de não ter se valido das conclusões
periciais, a elas se mostra diametralmente oposta. De fato, o juízo prolator
dispõe de livre convencimento para valorar o acervo probatório, contudo é
necessário atentar para os aspectos técnicos, mormente quando se trata de
demanda ambiental. 7. Se há documentos que demonstram serem as construções
irregulares e também posteriores à criação da APA Cairuçu pelo Decreto
n. 89.242/83, como fundamentado em sentença, por outro lado, há também
documentos que colocam em dúvida essas afirmações (Ofício do Ministério da
Fazenda/SPU nº 345/97, Pedido de Inscrição na Ilha Duas Irmãs e Certidão de
Inscrição de Ocupação nº 194/89, Despacho nº 0152, de 14.07.1994 da Diretoria
de Hidrografia e Navegação do Ministério da Marinha, Ofício nº 2488, da
Diretoria de Portos e Costas do Ministério da Marinha, Certidão de inscrição
de Ocupação nº 17/1997, Parecer Técnico do IBAMA nº 101/97, Ofício nº 992/97 -
GAB/SUPES/RJ). 8. Por isso, no que tange à anulação da inscrição de ocupação
da Ilha, sua desocupação e demolição de todas as construções nela existentes,
mostrar-se-ia temerário que o recurso de apelação fosse recebido apenas
com o efeito devolutivo, deixando-se que o decidido em sentença produzisse
regulares efeitos quando, na verdade, ainda há questões que não parecem bem
esclarecidas, tornando mais segura a suspensão de efeitos executórios das
obrigações de fazer por ela determinadas. 9. No que tange especialmente
à demolição de todas as construções existentes na ilha, tal determinação
traz nítido caráter de irreversibilidade caso executada provisoriamente,
ensejando danos irreparáveis à parte. Precedentes. 10. Quanto à elaboração
de Projeto de Recuperação de Área Degradada (PRAD) no prazo de sessenta
dias, tendo em vista a dúvida quanto aos possíveis elementos degradantes
(implantação e exploração do Restaurante Kontiki, construção de píer sobre
costão rochoso e lâmina d’água e promoção do aterramento hidráulico
anteriormente ocupada pelo mar), mostra- se prematura a determinação de que
seja de imediato realizado. Em consequência, ante o desconhecimento exato
quanto à extensão do dano causado, também prudente que não seja executada
a determinação de pagamento imediato de danos morais coletivos no valor
de R$ 100.000,00, ante o entendimento recorrente do eg. STJ de que não é
qualquer atentado aos interesses da coletividade que pode acarretar dano
moral difuso, de maneira que é preciso que 2 a conduta lesiva seja grave o
suficiente para produzir verdadeiros sofrimentos, intranquilidade social
e alterações relevantes na ordem extrapatrimonial coletiva, devendo ser
efetivamente demonstrado o efetivo dano aos interesses extrapatrimoniais
dos membros de um grupo ou da coletividade a ensejar indenização por danos
morais coletivos. 11. No que diz respeito à determinação para que fossem de
imediato cessadas as atividades desenvolvidas na Ilha Duas Irmãs, a despeito do
confronto de documentos trazidos por ambas as partes, cuja análise aprofundada
não tem espaço neste momento processual, fato é que existem indícios acerca
do dano ambiental causado, que se pode constatar, dentre outros, do Laudo de
Vistoria Técnica n. 13/2007 elaborado pelo IBAMA. 12. À luz dos princípios da
indisponibilidade do interesse público na proteção ambiental e da prevenção de
danos e degradações ambientais, tendo em vista a possibilidade de que, com a
permanência das atividades do hotel e restaurante, haja risco à preservação
do meio ambiente e continuidade de sua degradação, mostra-se razoável a
permanência da suspensão das atividades na Ilha. Essa determinação se mostra
a mais acertada não pela certeza ou contundência dos danos causados e de sua
extensão, verificação essa que não é cabível neste momento, mas exatamente
porque essa falta de convicção absoluta quanto à ocorrência de danos graves
e irreversíveis não deve ser respaldo ao adiamento da adoção de medidas
potencialmente eficazes para impedir a degradação ambiental, ainda que
haja controvérsias quanto aos efeitos nocivos da atividade que, por isso,
deve ser evitada, conforme preconiza o princípio da precaução. 13. Agravo
de instrumento parcialmente provido.
Data do Julgamento
:
28/03/2016
Data da Publicação
:
01/04/2016
Classe/Assunto
:
AG - Agravo de Instrumento - Agravos - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
5ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES
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