TRF2 0010891-97.1989.4.02.5101 00108919719894025101
APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA OFICIAL EM AÇÃO POPULAR. DESAPROPRIAÇÃO DE ÁREA PARA A
CONSTRUÇÃO DO PORTO DE SEPETIBA. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO BILIONÁRIA INDEVIDA
AO MUNICÍPIO DE ITAGUAÍ PELA COMPANHIA DOCAS DO RIO DE JANEIRO. QUESTÕES
PROCESSUAIS ALEGADAS. CERCEAMENTO DE DEFESA, INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
FEDERAL. COISA JULGADA NA ESFERA CRIMINAL. INÉPCIA DA INICIAL E AUSÊNCIA
DE LITISCONSORTES PASSIVOS NECESSÁRIOS. INOCORRÊNCIA. NULIDADE DOS CONTRATOS
FIRMADOS POR DESVIO DE FINALIDADE, V ÍCIOS DE FORMA E COMPETÊNCIA. CONHECIMENTO
E DESPROVIMENTO DOS RECURSOS E DA REMESSA NECESSÁRIA. 1. Trata-se de ação
popular, com o posterior ingresso da UNIÃO FEDERAL, em que se pede declaração
de nulidade de contrato celebrado em 27/01/1986 entre a COMPANHIA DOCAS DO RIO
DE JANEIRO - CDRJ E O MUNICÍPIO DE ITAGUAÍ; e condenação dos Réus, MUNICÍPIO DE
ITAGUAÍ , EMMANUEL MARTINS DA CRUZ, SEBASTIAO RIBEIRO DA MOTTA, NORIEL AZULAY,
ARIO WOLZ THEODORO, REGINA MARIA DA CRUZ BAZIN, ASSEJUR - ASSESSORIA JURIDICA
PROJETOS PLANEJAMENTOS E CONSULTORIA LTDA, OTONI ROCHA e FERNANDO ANTONIO
CORREA DE ARAUJO, com exceção da CDRJ, a, solidariamente, ressarcirem tal
Companhia dos valores pagos por esta ao Município de Itaguaí, por força da
avença mencionada, acrescendo-se juros e correção monetária incidentes desde
o pagamento reputado ilegal. Pretende-se, ademais, declaração de nulidade
de contrato de prestação de serviços profissionais firmado, em 04/12/1985,
entre o Município de Itaguaí e os advogados Noriel Azulay e Sebastião Ribeiro
da Motta, posteriormente aditado em favor da ASSEJUR; e condenação dos Réus,
com exceção da CDRJ, a, solidariamente, ressarcirem o Município de Itaguaí
dos valores pagos por força de tal pacto, acrescendo-se juros e correção
monetária incidentes desde o pagamento reputado ilegal. Postula-se, ainda,
condenação dos Réus ao pagamento de ônus sucumbências e de perdas e danos. O
Autor solicita, ainda, expedição de ofício à CDRJ, com vistas à obtenção de
cópia dos cheques referentes aos pagamentos efetuados em favor do Município
de Itaguaí, para que, posteriormente, expeçam-se ofícios aos bancos onde os
mesmos foram depositados, visando à identificação das contas beneficiadas,
remetendo-se a Juízo extratos das aludidas contas até a retirada do numerário
sobre que versa a demanda, informando o destino dos cheques. Pleiteia-se
expedição de ofício ao Instituto Brasileiro de Administração Municipal -
IBAM, solicitando cópia de parecer emitido por ocasião da ação penal que
tratou dos fatos que fundamentam esta ação popular. Requer o Autor, por fim,
o apensamento da ação executiva ajuizada pelo Município de Itaguaí em face
da 1 CDRJ, em curso no Juízo de Direito da Comarca de Itaguaí. 2. Questões
Processuais. Propedeuticamente, devem ser afastadas todas as alegações
dos recorrentes acerca da nulidade da sentença. A ação popular em voga,
ajuizada há mais de vinte anos, tramitou regularmente, nos moldes do devido
processo legal, com ampla oportunidade de defesa e de contraditório a todas
as partes. A alegação de cerceamento de defesa ora formulada por alguns
recorrentes mostra-se descabida e nitidamente protelatória, já que não foi
arguido qualquer prejuízo que possa ter advindo do julgamento antecipado
da lide. Ressalte-se que apenas os réus Fernando Antônio Corrêa de Araújo
e Município de Itaguaí se manifestaram acerca do despacho de fls. 1508,
que instou as partes a especificarem provas. O princípio processual da
instrumentalidade das formas, sintetizado pelo brocardo pas de nullité
sans grief e positivado nos arts. 249 e 250 , ambos do CPC /73 (arts. 282
e 283 do NCPC ), impede a anulação de atos inquinados de invalidade quando
deles não tenham decorrido prejuízos concretos. 3. Acerca do interesse
da União na lide, os recorrentes fundamentam sua irresignação em recente
julgado do Superior Tribunal de Justiça que reconheceu que a intervenção
anômala daquele ente federativo, na forma do parágrafo único do artigo
5º, da Lei no 9.469/97, quando justificada por mero interesse econômico,
não é suficiente para deslocar a competência para a Justiça Federal. Com
efeito, não se desconhece que a jurisprudência daquela Corte Superior vem
se firmando nesse sentido, contudo o caso concreto não se confunde com os
precedentes citados, sendo inaplicável tal entendimento ao caso em tela -
ação popular que versa sobre a anulação de contratos lesivos ao patrimônio
público e à moralidade administrativa. Bom elucidar que não há que se falar
em simples interesse econômico da União no deslinde da controvérsia, mas
sim em verdadeiro interesse jurídico na defesa da moralidade administrativa
no âmbito da administração pública indireta federal, já que não se está
diante de mera ação de cobrança. Ao contrário, a ação popular, instrumento
constitucional de tutela coletiva, envolve, além da simples recomposição
do erário, a anulação dos atos lesivos ao patrimônio público e à moralidade
administrativa, assim como a responsabilização dos agentes envolvidos. Nos
termos do inciso LXXIII do art. 5º da Constituição Federal, a ação popular é
o meio processual colocado à disposição de qualquer cidadão para questionar
judicialmente a validade de atos que considere lesivos ao patrimônio público
ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao
meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. 4. Imperioso apontar
que que a União, às fls. 1405 e 1499/1501, manifestou inequívoco interesse
em intervir no feito, o que foi deferido à fl. 1407; solicitou diligências
às fls. 1431/1432; e ainda apresentou contrarrazões às fls. 1874/1881,
reiterando seu interesse em defender decisão que lhe foi favorável, o que,
também segundo a interpretação dada pela jurisprudência à parte final do
parágrafo único do artigo 5º da Lei no 9.469/97, caracteriza sua posição
de parte e justifica a competência da Justiça Federal. "Se a União detém o
capital majoritário da sociedade de economia mista, naturalmente, é do seu
interesse a apuração de atos ilícitos praticados pelos seus dirigentes que
importem prejuízo patrimonial à sociedade empresarial." (STJ, AgRg no CC
122.629/ES). Como se não bastasse, a competência da Justiça Federal no caso
em tela se mostra incontestável diante da regra específica aplicável às ações
populares, prevista no artigo 5º, caput e parágrafos primeiro e segundo,
da Lei n° 4.717/65, dado que os contratos atacados pelo demandante foram
firmados por sociedade de economia mista criada pela União e da qual ela é
acionista majoritária. Demais disso, em se tratando de instrumento de tutela
coletiva que discute suposto desvio de verbas públicas, com repercussão no
orçamento 2 federal, por óbvio a União Federal, representando a coletividade,
apresenta interesse no deslinde da causa. É, pois, deste juízo federal a
competência para processar e julgar a causa. 5. Destaque-se que não procede
a alegação do Réu Otoni Rocha, em fls. 977/984, no sentido de ser o Poder
Judiciário Federal incompetente para processar e julgar a presente ação em
vista da disposição do art. 29, X, da Constituição da República, vez que a
causa não trata unicamente de atos praticados por prefeito, sendo a União
Federal interessada na causa, conforme já esclarecido acima. Bom registrar,
ainda, que reconhecer a nulidade da sentença nesse momento processual,
mais de 20 anos após o ajuizamento da ação e do deferimento da intervenção
da União como assistente do autor, consistiria em verdadeiro atentado à
efetividade da prestação jurisdicional e ao princípio constitucional da
razoável duração do processo. 6. Tocantemente à questão da existência
de coisa julgada na esfera penal, tem-se que os fatos narrados na ação
popular foram também objeto de denúncia oferecida pelo Ministério Público
do Estado do Rio de Janeiro, que imputou aos réus a conduta tipificada
no artigo 171 do Código Penal. Em julgamento de habeas corpus (processo
nº 9.268), a 3ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de
Janeiro determinou o trancamento da ação penal, em virtude da atipicidade da
conduta dos réus. Da leitura do mencionado decisum (fls. 506/509), nota-se
que a argumentação dos apelantes carece de respaldo jurídico, uma vez que
aquela Corte Criminal não reconheceu a inexistência do fato nem afastou a sua
autoria, mas apenas restringiu o aspecto criminal da tipicidade das condutas
imputadas aos demandados, consignando que tais condutas não se enquadrariam
no tipo penal descrito no artigo 171 do Código Penal. Assim, pelo princípio
independência das instâncias que vige em nosso ordenamento, incontestável
que a decisão proferida no Juízo Criminal em nada interfere na apuração
da responsabilidade dos agentes nas esferas cível ou administrativa, como
preconizam os artigos 66 e 67 do Código de Processo Penal. O tangenciamento
das instâncias civil e criminal somente é admitida quando negada a existência
material do fato ou a autoria do crime e reconhecida excludente de ilicitude,
não se aplicando quando a sentença criminal absolutória está fundada na
inexistência de provas do fato criminoso. O art. 935 do Código Civil reforça
a independência das instâncias civil e criminal, ressalvando apenas que o
Juízo Cível não contrarie a existência do fato e a autoria firmadas pelo Juízo
criminal. As instâncias administrativa, civil e criminal são independentes,
exceto na hipótese em que seja reconhecida a existência (ou inexistência)
dos fatos, ou quem seja o seu autor, pelo juízo criminal, nos termos do
artigo 935 do Código Civil. 7. Outrossim, não há que se falar em inépcia da
petição inicial, já que a peça de fls. 02/32 preenche todos os requisitos do
artigo 282 do Código de Processo Civil de 1973, descrevendo a participação de
cada um dos requeridos nas irregularidades narradas. Os fatos relatados pela
parte autora tem a necessária e clara relação lógica com o pedido, estando a
petição inteligível e desprovida de qualquer vício que possa causar inépcia,
oportunizando aos réus regular direito de defesa. Não deve ser reconhecida como
inepta petição inicial, que proporciona a ampla defesa e exato conhecimento
do pedido pretendido. Tocantemente à dita ausência de citação de todos os
litisconsortes passivos, tampouco assiste razão aos apelantes. Com efeito,
consoante prova dos autos, os demandados foram efetivamente os responsáveis
pela celebração dos contratos lesivos ao patrimônio público, como bem exposto
na sentença, não sendo exigível que todas as pessoas ligadas à Docas ou ao
Município de Itaguaí à época sejam chamadas a integrar o polo passivo da
demanda, dado que suas condutas não foram determinantes para a realização
dos atos impugnados. 3 8. Ao contrário do que tenta fazer crer o recorrente
às fls. 1739/1742, sua responsabilização não se deu por ter praticado atos
de mero expediente, mas sim porque ocupava a função de Diretor- Chefe do
Departamento Jurídico de Docas (fl. 116) e, nessa qualidade, teve atuação
essencial para o desfecho do processo administrativo que embasou o pagamento
da irregular indenização ao Município de Itaguaí, pois, como consignado
às fls. 116, 143, 146, 150 e 160, ele foi o responsável por dar o impulso
oficial, sempre levando o processo aos demais órgãos responsáveis pela
aprovação e consulta, o que resultou na conclusão de todo o procedimento
em menos de um mês. A participação do Sr. Emmanuel Martins da Cruz está
patentemente demonstrada nos autos e é descrita às fls. 1703/1704 com clareza,
não restando dúvidas de que sua atuação, assim como a dos demais réus, foi
determinante para a celebração dos contratos anulados. No que tange ao apelo
de Regina Maria da Cruz Bazin, não merece prosperar a alegação de sentença
ultra petita, uma vez que a sua participação no esquema - recebimento dos
valores como representante da ASSEJUR - está devidamente descrita na inicial
(fls. 20/22); comprovada nos. autos (fls. 162; 404/406; 514/544; 1456/1458);
e minudentemente analisada às fls. 1701/1704 da sentença. 9. Cumpre explicitar
que a CDRJ deve figurar no pólo passivo da demanda por ter celebrado, com o
Município de Itaguaí, contrato cuja nulidade se postula, motivo pelo qual,
não pugnando pela assistência ao autor em que pese a alegação de também
desejar o desfazimento do negócio, e sendo certo que tem de integrar o feito,
haja vista a repercussão que ensejará para a mesma a procedência da ação,
indispensável se faz sua manutenção no pólo passivo da ação. O Município de
Itaguaí deve ser mantido também no pólo passivo, tanto por força do despacho
de fls. 1.552, que indeferiu o pedido de assistência formulado por esta parte,
quanto em decorrência de sua derradeira manifestação, em fls. 1.623/1.627,
pela improcedência da pretensão autoral. 10. Ario Wolz Theodoro é legitimado
passivo para figurar no feito por ter se desligado da administração da CDRJ
somente em 14/02/1986, sendo Diretor-Presidente da sociedade á época dos fatos,
atentando, ainda para o fato do ofício do Prefeito de Itaguaí encaminhado a
Presidência da CDRJ, que deu início às tratativas que culminaram na celebração
do contrato objeto da lide, em 27/01/1986 (fls. 140/141), ter sido enviado
em 23/12/1985 (fls. 104/106), aos seus cuidados, anteriormente, portanto, ao
desligamento desse réu da Companhia, sendo que o referido contrato foi ainda
assinado sob sua administração (fls. 152/154). Por fim, Fernando Antonio
Corrêa de Araújo, que também defendeu sua ilegitimidade passiva ad causam,
deve figurar como réu no processo em julgamento, vez que participava da
direção da CDRJ quando da celebração do contrato em questão, sendo certo
que manifestou-se favoravelmente perante o Conselho de Administração, como
bem demonstra seu parecer de fls. 121/123, dando por devido o pagamento
exigido, e fls. 144/145, em contrariedade a laudo encomendado pela própria
Docas para a ação de desapropriação em face dos particulares. O mesmo seja
dito da participação de Emmanuel Cruz, que sugeriu parcelamento à Prefeitura
(fls. 139) e encaminhou, de forma arrojada e incrivelmente célere, o processo
administrativo, cuja tramitação tomou menos de um mês (vide fls. 116; 143;
146; 150 e 160). 11. Vale notar que não é pelo simples fato de integrar a
diretoria de Docas à época dos fatos que estariam os referidos réus legitimados
para atuar no feito; a legitimidade advém do fato de que foram estes os
responsáveis por apoiar com o pagamento da peculiar indenização, atuando de
modo determinante face o cargo de direção que ocupavam. Quanto ao ex-Prefeito,
sua legitimidade reside no fato de haver participado de ambos os contratos
contestados: por todos, 4 vide manifestações de fls. 104/106; 140/141; 152/154;
156, e, em especial manifestação de fls. 278/281, de modo que improcede a
defesa acerca de eventual ilegitimidade. 12. Do Mérito. Cumpre destacar a
inocorrência da prejudicial ao mérito, atinente à prescrição qüinqüenal da
pretensão autoral, também matéria de defesa de alguns réus. Os contratos,
cuja declaração de nulidade se postula, datam de 27/01/1986 e de 04/12/1985,
tendo sido a ação popular em apreciação proposta em 29/06/1989, dentro do
lustro legal, portanto, tampouco cabendo alegar prescrição intercorrente,
posto que o processo, há muito, se encontra no ponto de sentença,
não podendo o autor ser onerado pelo retardo na tramitação do feito, em
especial por nunca haver abandonado a causa. 13. Com efeito, impende aqui
reiterar os fundamentos alinhavados no bem exarado parecer ministerial de
fls. 1631/1662, da lavra do Procurador da República Vinícius Panetto do
Nascimento, a respeito das absurdas irregularidades que geraram o pagamento
pela Companhia Docas do Rio de Janeiro ao Município de Itaguaí de vultosa
quantia a título de desapropriações de supostos bens municipais, de impostos
e taxas supostamente devidos àquele município e, ainda, do generoso percentual
recebido pelos Procuradores Municipais à guisa de honorários advocatícios pela
celebração do primeiro acordo. Eis parte do parecer ministerial: "Como restou
demonstrado, o acordo celebrado entre o Município de Itaguaí é a CDRJ violou
frontalmente as regras de competência, na medida seus representantes legais
não possuíam atribuição para dispor sobre as verbas públicas, eis que eram
meros administradores das mesmas, tendo o dever de zelar por sua aplicação
em consonância com os ditames legais legais (sic). Ademais, a contratação
dos advogados e da empresa ASSEJUR, por parte do Município de Itaguaí, além
da ilegalidade constatada em virtude da ausência de regular procedimento
licitatório, traz certa perplexidade, pois de um lado temos o ex-Prefeito
de Itaguaí justificando a assinatura do ilegal acordo com a CDRJ em razão da
difícil situação financeira da municipalidade. Por outro lado, os contratados
procuradores do Município de Itaguaí embolsaram 30% (trinta por cento)
dessa verba. É muita generosidade para quem estava passando por dificuldades
financeiras " 14. No que toca ao pagamento realizado por Docas ao Município de
Itaguaí a título de indenização por supostas desapropriações de bens públicos
municipais, nota-se que o Decreto nº 77.089/76, que declarou de utilidade
pública, para fins de desapropriação, os bens que especifica, refere-se,
tão-somente, à desapropriação de propriedades particulares, até porque a
desapropriação de bens públicos depende de prévia autorização legislativa,
como estabelece o art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº 3.365/41. Decreto Municipal
nº 77.089/76 (fls. 773/774) Art. 1º Ficam declaradas de utilidade pública,
para fins de desapropriação, pela Companhia Docas da Guanabara (C.D.G.),
nos termos dos artigos 3º e 5º, alínea h e 6º, do Decreto-Lei nº 3.365,
de 21 de junho de 1941, as áreas tituladas a diversos particulares, com
respectivas benfeitorias, e as benfeitorias de particulares existentes
em terrenos de marinha, aproximadamente com 1.040ha (um mil e quarenta
hectares), localizadas no Município de Itaguaí, Estado do Rio de Janeiro,
a seguir discriminadas, de acordo com a planta constante do processo MT
número 13.057-75: (...) Decreto-Lei nº 3.365/41 Art. 2º Mediante declaração
de utilidade pública, todos os bens poderão ser desapropriados pela União,
pelos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios. (...) § 2º Os bens
do domínio dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios poderão
ser desapropriados pela União, e os dos Municípios pelos Estados, mas, em
qualquer caso, ao ato deverá preceder autorização legislativa. 15. Analisando
os artigos acima, conclui-se não ter sido objeto de desapropriação eventuais 5
bens públicos existentes nas áreas mencionadas no Decreto expropriatório. Não
poderia, dessarte, ser objeto de avença entre a CDRJ e o Município de Itaguaí
o pagamento de indenização pela desapropriação de bens públicos municipais,
bens públicos, estes, aliás, cuja existência é mesmo controversa. Com efeito,
analisando o feito, nota-se que, em 1980, à época do ajuizamento da ação de
desapropriação do loteamento denominado Vilar dos Coqueiros pela CDRJ em
face dos particulares (fls. 893/894 - 3o volume), com base no Decreto nº
77.089/76, foi apresentado laudo elaborado por assistente técnico da CDRJ
(fls. 898/907), datado de 31/05/1982, apontando a precariedade da área: "O
seu fraco progresso deve-se às más condições do solo pois a área loteada é
baixa sem possibilidade de escoamento das águas da chuva e, ainda, sujeita
a influência da variação de maré". "a maioria dos lotes permanecem nas
condições primitivas, abrejados ou encharcados". "Não conta o loteamento
Vilar dos Coqueiros com nenhum benefício de urbanização (...) Não tem assim
galeria de águas pluviais, meios-fios, pavimentação e redes de água potável
e de energia elétrica. (Grifei) Portanto, as condições desfavoráveis do solo
aliadas a falta de infraestrutura urbanística são as responsáveis pelo fraco
crescimento do bairro residencial em pauta. Não possui nenhuma benfeitoria,
estando nas condições iniciais, tomado por extenso matagal constituído de
vegetações próprias de terreno abrejado, como capim angola, tiririca, lírio
do brejo e outros". 16. Na prova documental de fls. 107/112, entretanto,
o Município de Itaguaí, ao listar as áreas desapropriadas pela CDRJ, por
força do Decreto nº 77.089/76, para fins de celebração do aludido contrato
com tal Companhia, apresenta dados sobre o mesmo loteamento, acusando a
existência de praças e logradouros (fls. 110). Observa-se que a CDRJ, a fim
de calcular a indenização devida aos expropriados particulares, utilizou-se
de laudo próprio, que não acusava qualquer infraestrutura urbana para,
posteriormente, ignorá-lo, por ocasião da celebração do aludido acordo,
agora com o Município de Itaguaí, reconhecendo a existência dos referidos
"equipamentos urbanos" que, consoante seu próprio laudo técnico, encomendado
por ocasião da ação de desapropriação em face dos particulares, nunca
existiu, e, observe-se, sequer para o próprio Município, que desapropriou a
área em face de particulares, sem se sujeitar à autorização do Legislativo
Municipal, justamente, por inexistir os ditos "equipamentos", que, ao cabo
de 10 anos, veio alegar. E, mesmo diante do decurso do prazo e do laudo da
própria sociedade, sua diretoria, ignorando quaisquer indícios, em nenhum
momento questionou o referido acordo; muito ao contrário, o aprovou em uma
tramitação rápida da proposta, em pouco menos de 1 mês. 17. Com efeito,
para análise da postulação da Municipalidade, instaurou-se procedimento
administrativo em Docas (fls. 104/158), em cujo curso se observa que nenhum
dos diretores da Companhia, responsáveis por apreciar e aprovar a proposta,
cuidaram no sentido de avaliar a real existência dos logradouros públicos,
praças, escolas e equipamentos urbanos reclamados pelo Município de Itaguaí
(fls. 107/112) sequer mediante exame do laudo por eles mesmos encomendados
para instruir a ação de desapropriação alguns anos antes. E isso, diante da
vultosa soma exigida pelo Município. Tal atitude por parte de Docas levou a
instauração de inquérito administrativo pela diretoria seguinte (fls. 185/194),
objetivando concluir, dentre outros pontos, se, no procedimento administrativo
que terminou por acatar a proposta do Município, foram aferidos a metragem dos
logradouros públicos desapropriados e os valores dos débitos cobrados. Consta,
de fls. 189, informações colhidas no curso do inquérito administrativo em
questão, nos seguintes termos: "A alegação de que "a metragem desapropriada
é bem superior ao conhecido pela Prefeitura" e que a Docas "desapropriou
até dezembro de 1985, 6 12.737.969m2, desapropriando conseqüentemente
2.337.976m2 a mais em áreas do Município" data vênia também não procede,
uma vez que os quadros estatísticos mensais do Setor de Desapropriações,
assim como o respectivo relatório anual demonstram que a área desapropriada
até 31.12.85 foi de 9.213.804m2; nas mesmas fontes, figura que a área
pendente de desapropriação, até aquela data, era de 1.030.762m2, restando,
por regularizar 2.496.873m2, de terrenos de marinha e logradouros públicos,
prevendo-se acréscimo na área original em conseqüência das observações
contidas no referido informe. (...) E, ressalta-se, a apreciação sobre a
metragem realizada anteriormente não satisfaz àquilo que foi sugerido pelo
DEPAUD, i. e., "proceder-se a aferição da metragem dos logradouros públicos
desapropriados e os valores dos débitos cobrados". Tudo indica que não
houve aferição das áreas descritas no processo, como também não consta haver
avaliação das mesmas por parte de profissionais habilitados". 18. Destaque-se,
ainda, o seguinte trecho do referido inquérito administrativo, que questiona a
lisura do procedimento administrativo instaurado com a finalidade de analisar
a proposta do Município de Itaguaí quanto às desapropriações levadas a
cabo por Docas para construção do Porto de Sepetiba e concernentemente à
revisão da isenção tributária concedida à Companhia: "o tempo recorde de
tramitação do pedido desde a sua entrada até a sua concretização: (...) em
apenas 1 (um) mês tudo já estava sacramentado e se tratava de um acordo,
envolvendo quantia vultosa para os cofres da Companhia" 19. Tal ponto,
relativo a extrema celeridade do procedimento, em confronto com o próprio
pleito descabido do Município e o valor extremamente alto exigido, salta
aos olhos, dado que não houve qualquer espécie de questionamento por parte
dos dirigentes da empresa, responsáveis pela defesa de seus interesses,
senão uma ignominiosa contraproposta de parcelamento, prontamente aceita
pelo Município. E quando se observa a rapidez da tramitação, sempre se vê
presente os mesmos "personagens", quais sejam, os 3 diretores ora arrolados
como réus, em especial o Sr. Emannuel Martins da Cruz que, aparentemente,
era o responsável por dar o impulso administrativo, sempre levando o
processo de um lado para o outro dos órgãos responsáveis pela aprovação e
consulta. (fls. 116; 139; 143; 146; 150 e 160). 20. Tocantemente aos pontos
levantados pelos ex-integrantes da Diretoria de Docas, e ora réus, cada um,
a seu modo, alegando insuficiência de poderes para implantar o acordo sozinho,
sujeição das propostas a órgãos colegiados, função meramente de consultoria,
entre outras justificações que tem por fim quase que menosprezar suas próprias
atribuições dentro daquela Companhia. Cabe anotar que os referidos réus eram
seus funcionários, seja lá sob qual condição funcional, devendo, portanto,
no mínimo, zelar por suas finanças. Alegar que não tinham poderes e que não
agiam sozinhos é uma tentativa vã de se eximir de qualquer responsabilidade
por seus cargos. Causa estranheza que em momento algum nenhum deles, todos
integrantes dos cargos mais elevados de direção da sociedade, não tenham
ao menos aventado a enormidade da indenização pleiteada após quase 10 anos
de um decreto expropriatório que mais se assemelhava a uma doação, face não
apenas a isenção tributária prometida e sacramentada por decreto municipal,
mas às próprias razões exaradas a justificar a indigitada expropriação
em favor de Docas: em última análise, a construção do Porto de Sepetiba
e o retorno econômico que daí adviria para o Município. 21. Desta feita,
ainda que considerasse devida a indenização, como alegou em sua defesa o ex-
diretor da área de administração e ex-Procurador do Estado, responsável, como
ele mesmo reconhece, por apresentar a proposta ao Conselho de Administração,
com base no parecer 7 técnico de Docas, por que jamais aventou a abusividade
dos valores cobrados, em observância ao próprio laudo pericial encomendado por
Docas (fls. 861/892) e que dava conta de que nada ali havia que justificasse
a indenização de "equipamentos municipais" pelo singelo fato de que os mesmos
inexistiam? E quanto à alegação de Emannuel Martins da Cruz no sentido de que
exercia função meramente consultiva, que espécie de consultoria era esta que o
impedia de aferir tais aspectos e produzir um parecer técnico que ressaltasse
tais abusividades e iniqüidades? Cabe notar, mais uma vez, que tais pessoas
prestavam serviços a Docas e não ao Município de Itaguaí, devendo, portanto,
atentar para o interesse da empresa que representavam e não de terceiros
22.Concluído inquérito administrativo, a CDRJ suspendeu o pagamento das
parcelas objeto do acordo pactuado com o Município de Itaguaí (fls. 276/277),
o que deu azo a manifestação do então Prefeito de Itaguaí, Réu Otoni Rocha,
mencionando relacionamentos políticos e pessoais: "Na qualidade de Prefeito
Municipal do Município de Itaguaí, como autoridade pública, não só tinha como
ainda tenho conhecimento de ordem pessoal e político com todos os Dirigentes
dessa CDRJ". Outrossim, foi bem destacado na sentença que: "Com efeito, o que
dizer da menção feita às fls. 279 na referida correspondência encaminhada pelo
então prefeito de Itaguaí, o aqui réu OTONI ROCHA, a nova Diretoria de Docas,
contra a decisão de fls. 276/277, que suspendeu o acordo bilionário, quase
que chamando-a à razão, ao fazer menção ao conhecimento "não só que tinha
como ainda tenho" com dirigentes dessa Docas e da Portobrás, incluindo-se na
relação de amizades pessoais, dentre outros, o onipresente, e, àquele tempo,
Presidente da República, Sr. JOSE SARNEY? Com que intuito foi feita menção
a indigitadas amizades, inclusive nominando expressamente algumas delas? No
que tais amizades se mostram de tamanha relevância a justificar sua menção em
correspondência oficial ? No que tais aspectos de cunho subjetivo poderiam
alterar a decisão já tomada pela nova Administração? Por que o ex-Prefeito,
que insiste em sua inocência, faz menção a tais pessoas, cada vez mais em
destaque nas páginas dos jornais? A quem interessa quem ele conhece e com
que finalidade o alardeia?" 23. No que atine ao pagamento de impostos e taxas
municipais pela CDRJ ao Município de Itaguaí, também previsto no contrato ora
em discussão, nota-se que tal estipulação desconsiderou o constante da Lei
Municipal nº 706/77, que concedeu, por 15 anos, a contar de janeiro de 1978,
isenção tributária à CDRJ quanto ao imposto predial e territorial urbano -
IPTU - e respectivas taxas, incidentes sobre os imóveis que foram objeto da
desapropriação para fins de construção do Porto de Sepetiba (fls. 392). Pela
análise do art. 178 do CTN, com redação conferida pela Lei Complementar nº
24/75 vigente à época, somente a isenção, que não esteja sujeita a determinadas
condições e concedida a prazo certo, é passível de revogação ou modificação
a qualquer tempo. Sendo a isenção no caso em tela a prazo certo somente,
mas não condicionada, seria, de fato, possível sua revogação a qualquer
tempo, por não cumprida a duplicidade dos requisitos, desde que o fosse por
lei municipal, vez que sua concessão deu-se através daquele instrumento,
em observância, portanto, ao princípio da reserva legal e da simetria
das formas. Art. 178 - A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em
função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei,
a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104. (Redação
dada pela Lei Complementar nº 24, de 7.1.1975) 24. Ainda, mesmo que tivesse
sido editada lei municipal para revogar a referida isenção, tal revogação
jamais poderia retroagir, sob pena de violar direito adquirido, tutelado
pelo art. 5º, XXXVI, da Constituição da República e nos termos do § 2º do
art. 41 do Atos das Disposições 8 Constitucionais Transitórias. Conclui-se,
nesse ponto, que o Município de Itaguaí e a CDRJ não poderiam ter acordado
sobre a revogação da aludida isenção nem sobre o recolhimento retroativo de
tributos antes objeto de isenção. As partes contratantes agiram em ofensa ao
princípio da reserva legal e ao direito adquirido, dispondo indevidamente
acerca de verbas públicas. 25. Uma vez mais, nota-se que Docas acatou a
proposta apresentada pelo Município de Itaguaí sem, ao menos, questioná-la. Tal
questionamento, curiosamente inexistente, teria sido mais que natural, vez que
a isenção favorável à Companhia era assegurada por 15 anos, nos termos da Lei
Municipal nº 706/77. De fato, por mais de seis anos, a CDRJ, amparada por essa
lei, beneficiou-se da referida isenção; em 1985, proposto, pelo Município,
o pagamento amigável, houve pronta concordância por parte da Companhia,
que sequer cogitou em argüir a prescrição qüinqüenal da aludida cobrança
tributária. Diante de tais evidências, é, de fato, inexplicável que nenhum
dos réus ex-funcionários de Docas, nem mesmo seu então Diretor-Presidente
tenha oposto a situação de isenção tributária que foi graciosamente concedida
pelo Município, como elemento a justificar, ao menos, alguma redução dos
valores cobrados: concordaram em pagar o valor então bilionário sem qualquer
oposição e tramitando o processo administrativo de modo mais do que célere,
em menos de um mês, dentro de uma estrutura que, em especial àquele tempo,
nos idos dos anos 80, era marcada pela burocracia e pelo retardo. 26. E,
note-se que aqui não se entra sequer no aspecto de que a dita isenção era
a prazo certo e não apresentava qualquer condicionante, aspecto este também
importante para refutar a defesa do Município réu no sentido de que a cobrança
se justificava, pois o Porto de Sepetiba não tinha sido implementado ainda
àquele tempo: a isenção não previa a construção do porto como condicionante
a sua ratificação Por todos, vide os termos do Decreto Municipal 706/77
(fls. 392). E dentro deste contexto, ainda que a isenção fosse revogada,
como pôde Docas, através de seus dirigentes aceitar pagar valores atrasados
de tributos? Que a isenção fosse revogada, possibilidade legal já verificada,
não se discute, mas como aceitar pagar valores retroativos, referentes a
período durante o qual a dita isenção ainda vigia? Imperioso reconhecer a
ilegalidade do contrato firmado entre a Docas e o Município de Itaguaí, também
neste ponto atinente a cobrança retroativa de impostos e taxas municipais,
e a conseqüente responsabilidade advinda para os responsáveis pela proposta
e sua aprovação. 27. Discute-se, ainda, nesta ação popular, a validade do
contrato de prestação de serviços advocatícios, celebrado em 04/12/1985,
entre o Município de Itaguaí e os advogados Noriel Azulay e Sebastião Ribeiro
da Motta, estipulando honorários devidos em decorrência do pacto ilegal
firmado entre a CDRJ e o Município de Itaguaí (fls. 400/403). Tal contrato de
prestação de serviços profissionais tem por escopo, tão-somente, a cobrança
destes valores, conforme se deflui da redação do contrato infra-transcrita: "o
recebimento de valor referente à perda da receita municipal, de ressarcimento
ou de indenização decorrentes da desapropriação feita pela COMPANHIA
DOCAS DO RIO DE JANEIRO, dos logradouros públicos, praças, escolas, ruas e
equipamentos urbanos pertencentes ao Município de Itaguaí". 28. Tocantemente
à remuneração a ser paga aos advogados, inserta no contrato em voga, nota-
se que seria variável de acordo com os valores recebidos pelo Município de
Itaguaí da CDRJ - de 5%, caso o montante pago ao Município chegasse a Cr$
5.000.000.000,00, até 30%, caso o montante pago ao Município alcançasse,
no mínimo, Cr$ 15.000.000.000,00. Aponte-se que o contrato celebrado
entre a CDRJ e o Município de Itaguaí estipulava o pagamento total de Cr$
24.800.000.000,00, o que garantiria aplicação do exorbitante percentual de
30% para cálculo de 9 honorários advocatícios, alcançando, então de Cr$
7.440.000.000,00. Impende anotar que o contrato de prestação de serviços
advocatícios foi assinado em 04/12/1985 (fls. 400/403) entre o Município
de Itaguai e os advogados Noriel Azulay e Sebastião Ribeiro da Motta, os
quais, posteriormente, em 14/02/1986, aditaram-no, cedendo-o, com anuência
do Município de Itaguaí, a empresa ASSEJUR, sociedade empresária constituída
pelos referidos advogados (fls. 403-v), cuja existência remonta a 31/01/1986,
quando registrada no Registro Civil de Pessoas Jurídicas (fls. 519) e que,
dali a alguns meses, passaria a ser integrada por Regina Bazin, por força de
cessão das cotas de Noriel Azulay àquela que seria irmã de um dos diretores
de Docas e que passa a integrar a referida sociedade em 08/04/1986, data do
registro dessa alteração no Registro Civil das Pessoas Jurídicas (fls. 406),
em que pese a alteração ter sido redigida com data de 17/02/1986, ou seja,
menos de um mês da cessão do contrato bilionário a referida sociedade de
advogados por seus titulares iniciais. 29. A prestadora de serviço ASSEJUR e
seus sócios opõem, em sua defesa, que foram pagos pelos serviços prestados
e, de fato, nada mais justo do que receber pelo seu trabalho. A questão
está em que trabalho seria esse a justificar honorários tão fabulosos,
correspondentes a 30% de um contrato bilionário, para o qual a própria
ASSEJUR assegura que não participou da fomentação. Aponte-se que, consoante
a ASSEJUR, esta não poderia ser responsabilizada pois já prestava serviços
a Municipalidade antes mesmo do indigitado contrato, e, quanto ao mesmo,
não foi responsável por sua elaboração, limitando-se a serviços de cobrança
dos devedores. E por tal trabalho que, nos termos em que o apresenta em
sua peça de bloqueio, seria de tão ínfima relevância, receberia, caso o
Município percebesse a integralidade dos valores acordados (ou seja, vinte
quatro bilhões e oitocentos milhões de cruzeiros), a soma de SETE BILHÕES
QUATROCENTOS E QUARENTA MILHÕES DE CRUZEIROS. E isto apenas para cobrar tais
valores, o que foi feito, ainda que apenas parcialmente, como demonstrado
pelas fotocópias dos cheques de fls. 1452, enviados pela Policia Federal. De
fato, nada como ser remunerado por seu trabalho. E a questão está em quanto
vale o trabalho de cada um. 30. O serviço da ASSEJUR foi prestado, conforme
mostram os indigitados cheques de fls. 1452, nos valores de DOIS MILHÕES,
QUATROCENTOS E OITENTA MIL CRUZADOS; e OITOCENTOS E SESSENTA E UM MIL,
QUINHENTOS E SESSENTA E UM CRUZADOS E OITENTA E UM CENTAVOS, ambos em nome do
Município réu, e sacados por ASSEJUR, na pessoa de seus sócios, dentre eles,
Regina Maria Bazin, ré nesta ação, "não pelo simplório fato de que Regina
era irmã de Emmanuel" (peça de bloqueio fls. 1188), um dos Diretores de Docas
envolvido e também réu nesta ação, posto que, tal como alegado em sua peça de
contestação "ninguém, por ter um parente, ou um familiar, ou uma pessoa com
quem mantenha ligações mais estreitas, estará marginalizado na luta pela sua
sobrevivência e submetido ao ridículo de receber aquiescência de outrem para
poder tomar as decisões que lhe sejam de interesse (...) - fls. 1188". 31. A
questão aqui examinada é quando este interesse fere, independentemente de
quem seja o irmão do interessado, o erário público. São estes os aspectos
aqui examinados, relativos aos contratos fomentados, e o prejuízo imposto
a Administração em função de interesses particulares, e não as relações de
parentesco de quem quer que seja, tal como pretende desvirtuar a indigitada
ré. No caso, a relação de irmandade é apenas uma das várias peculiaridades do
referido contrato em favor da empresa da ré, contratada aliás, sem qualquer
licitação, por valores bilionários, e apenas para cobrar uma dívida que veio
a existir pelo aval dos Diretores de Docas, dentre eles, um irmão da sócia
beneficiária, e que apenas se tornou 10 sócia após fomentado do dito acordo
ilegal. Se não fosse por tal conjunto de peculiaridades e coincidências,
certamente a relação de parentesco sequer seria mencionada. E, note-se,
apenas como uma curiosidade a mais, posto que o pronunciamento do Tribunal de
Contas da União acerca das irregularidades do dito contrato de prestação de
serviços e honorários (fls. 514/544) dispensa, por si só, qualquer atenção à
relação de parentesco como necessária para anular o referido contrato. 32. E
estranhamente esta mesma Sra., Dra. Regina, recebe os valores atinentes ao
referido contrato, consoante guias de pagamento por ela assinadas, datadas a
contar de 27/02/1986 (fls. 1456/1458) quando sequer era sócia da empresa ainda,
pois apenas passou a integrar formalmente a sociedade, por cessão de cotas,
em abril do mesmo ano, tudo conforme apurado pelo Tribunal de Contas da União
e demonstrado pelo contrato de fls. 404/406. A irregularidade da contratação em
tela advém, assim, não apenas dos valores bilionários contratados para serviço
que a própria ré apresenta como insignificantes ante a magnitude do acordo,
mas pela espantosa falta de procedimento licitatório prévio, ao argumento de
que tratar-se-ia de hipótese de dispensa de licitação, notadamente quanto à
"notória especialização" para serviços de, repita-se, mera cobrança. 33. Eis
as conclusões do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro - TCE/RJ,
nos autos do processo nº 201.940/86 (fls. 514/544), quando arremata que
"firmas como a que foi contratada existem muitas, justificando-se, pois a
necessidade da licitação" (fls. 518), além de não ter sido observado o disposto
no art. 137, § 1º, "c", da Lei Orgânica dos Municípios, que exige comprovação
de notória especialização para fins de dispensa de licitação. Registra o
TCE/RJ, ainda, irregularidade quanto aos atestados de notória espacialização,
datados de 15 e 26 de janeiro de 1986, sendo que a ASSEJUR só passou a existir
juridicamente a partir de 31/01/1986, quando registrada no Registro Civil de
Pessoas Jurídicas (fls. 519). Outrossim, o TCE/RJ, informa que, inobstante
ter o Município de Itaguaí recebido da CDRJ menos que Cr$ 15.000.000.000,00,
foram efetuados pagamentos à ASSEJUR correspondentes a 30% do valor recebido
pela Municipalidade, em descumprimento ao contratado (fls. 516): com efeito,
em que pese o contrato ser de êxito e não haver êxito integral posto que o
Município recebera apenas 5 das 10 prestações acordadas, ante a suspensão
determinada com a mudança da Diretoria de Docas, ainda assim, tal não
constituiu óbice ao adimplemento do contrato de honorários, pelo percentual
cheio de 30%, de modo que a referida sociedade limitada de advogados recebeu
os 30% do que arrecadara, ainda que não tenha finalizado o serviço para o qual
fora contratada, qual seja, "apenas" - como ressalvado em sua peça de bloqueio
- de cobrança do valores bilionários do acordo ilegal. 34. No que pertine à Ré
Regina Maria da Cruz Bazin, veja-se trecho do relatório elaborado pela Corte
de Contas: "Indagado sobre o fato da assinatura da signatária da proposta
de fls. 04 não coincidir com as dos representantes legais da firma ASSEJUR,
informou-nos o Prefeito que a referida pessoa, Regina Maria da Cruz Bazin,
pertencia à firma, fornecendo cópia da primeira alteração do Contrato Social
respectivo (fls. 144/146), através da qual retirou-se o sócio Noriel Azulay,
que cedeu e transferiu à nova sócia as suas cotas. Ocorre que o doc. de
fls. 04 foi assinado a 12 de fevereiro de 1986 e a referida Dra. Regina
Maria da Cruz Bazin só passou a integrar a firma a partir do dia 08 de
abril de 1986, data do registro dessa alteração no Registro Civil das Pessoas
Jurídicas. Confirma-se, pois, a irregularidade já apontada no exame inicial do
processo. A Dra. Regina Bazin não possuía, em 12 de fevereiro, condição legal
para firmar o doc. de fls. 04, em nome da ASSEJUR" (fls. 517/518).(grifos
nossos)". O 11 TCE/RJ aponta, ainda, inúmeras outras irregularidades no
contrato em questão, concluindo por sua ilegalidade (fls. 543/544). 35. Por
fim, cabe volver ao começo, quando o fundamento de toda esta celeuma foi,
justamente, as alegadas dificuldades financeiras enfrentadas pelo Município
de Itaguaí, a justificar a cobrança por "equipamentos municipais" sobre área
expropriada, cuja existência nunca foi demonstrada, e retroatividade da isenção
tributária concedida, revogada "para trás", em uma interpretação inédita da
legislação tributária que ensejou alcançar fatos passados há quase 10 anos,
e isso independentemente de qualquer prescrição tributária, e tudo para, ao
fim e ao cabo, com o único intuito de concretizar tal cobrança bilionária,
assinar-se um contrato de honorários, também este bilionário, posto que
reservava 30% da dívida ao indigitados contratados, sem licitação, ante a
notória especialização em cobrança, que, todavia, não restou demonstrada
sequer aos olhos do Tribunal de Contas do Estado, donde se conclui que a
justificativa para todo o acordo ilegal se perdeu, não apenas por todas as
irregularidades e arbitrariedades verificadas, mas certamente pelo dispêndio
com os advogados que sequer lograram cumprir a integralidade do contrato de
prestação de serviço, em que pese a "notória especialização" ventilada, sem
qualquer prejuízo a esta firma, senão ao próprio Município, posto que os 30%
do arrecadado foi repassado a sociedade de advogados, mesmo sem cumprimento
integral do serviço. 36. De outro lado, vale apontar a conclusão apresentada
pelo Ministério Público Federal, em seu parecer de fls. 1.631/1.662: "COMO
RESTOU DEMONSTRADO, O ACORDO CELEBRADO ENTRE O MUNICÍPIO DE ITAGUAÍ E A
CDRJ VIOLOU FRONTALMENTE AS REGRAS DE COMPETÊNCIA, NA MEDIDA EM QUE SEUS
REPRESENTANTES LEGAIS NÃO POSSUÍAM ATRIBUIÇÃO PARA DISPOR SOBRE AS VERBAS
PÚBLICAS, EIS QUE ERAM MEROS ADMINISTRADORES DAS MESMAS, TENDO O DEVER DE
ZELAR POR SUA APLICAÇÃO EM CONSONÂNCIA COM OS DITAMES LEGAIS. ADEMAIS, A
CONTRATAÇÃO DOS ADVOGADOS E DA EMPRESA ASSEJUR, POR PARTE DO MUNICÍPIO DE
ITAGUAÍ, ALÉM DA ILEGALIDADE CONSTATADA EM VIRTUDE DA AUSÊNCIA DE REGULAR
PROCEDIMENTO LICITATÓRIO, TRAZ CERTA PERPLEXIDADE, POIS DE UM LADO TEMOS O
EX-PREFEITO DE ITAGUAÍ JUSTIFICANDO A ASSINATURA DO ILEGAL ACORDO COM A CDRJ
EM RAZÃO DA DIFÍCIL SITUAÇÃO FINANCEIRA DA MUNICIPALIDADE. POR OUTRO LADO,
OS CONTRATADOS PROCURADORES DO MUNICÍPIO DE ITAGUAÍ EMBOLSARAM 30% (TRINTA
POR CENTO) DESSA VERBA. É MUITA GENEROSIDADE PARA QUEM ESTAVA PASSANDO POR
DIFICULDADES FINANCEIRAS " (fls. 1.662)" 37. O modus operandi foi, portanto,
o seguinte: a proposta de acordo é enviada por Município de Itaguai, na pessoa
do Prefeito Otoni Rocha, em 23/12/1985, véspera de Natal, ao então Diretor-
Presidente de Docas, Ario Wolz Theodoro (fls. 104/106). Paralelamente a isso,
em 04/12/1985, já havia sido fomentado um contrato de prestação de serviços
advocatícios, entre o mesmo prefeito e os Drs. Noriel Azulay e Sebastião
Ribeiro da Motta (fls. 400/403) para "prestação de serviços profissionais
advocatícios o recebimento de valor referente á perda de receita municipal,
de ressarcimento ou de indenização decorrentes da desapropriação feita
pela COMPANHIA DOCAS DO RIO DE JANEIRO, dos logradouros públicos, praças,
escolas, ruas e equipamentos urbanos pertencentes ao Município de Itaguaí".O
pleito foi repassado a Emmanuel Cruz, em 06/01/1986, como Diretor-Chefe do
Departamento Jurídico de Docas (fls. 116) que solicitou parecer técnico datado
do mesmo dia (fls. 119), sendo que dali a dois dias, 12 em 08/01/1986, já havia
manifestação do Diretor da Área Administrativa, Dr. Fernando Correa de Araújo,
dando pela procedência da pretensão do Município de Itaguaí, e sujeitando a
matéria ao Conselho Administrativo (fls. 121/123) no mesmo dia, na pessoa
do Diretor-Presidente já mencionado (fls. 123). Em parecer de 10/01/1986,
outro departamento, o DEPAUD analisa as manifestações anteriores e conclui
que (fls. 124/126) o DEPJUR dirigido por Emmanuel Cruz concluiu pela perda de
receita para o Município e pela desapropriação de áreas por Docas, sugerindo a
submissão da matéria a Diretoria Executiva; ao que o Diretor de Administração
supra arrolado se manifestou favoravelmente quanto á obrigatoriedade de
pagar os referidos impostos, salvo se houvesse "alguma disposição legal
isentando-o do pagamento, o que é pouco provável" (fls. 125). Ressaltou,
ainda, o exame dos informes quanto a metragem e valores de indenização e
impostos. È feita sugestão a instar o DEPJUR acerca de dispositivo legal
isentando Docas dos impostos, e sobre a medição da área de desapropriação
e valores de indenização, e APENAS caso não houvesse a referida isenção
legal, aceitar a cobrança amigável e parcelá-la. Daí, o Presidente Ario
enviou a Emannuel, em 13/01 o processo e este repassou, no dia seguinte a
outro Departamento, DICOSO (fls. 127). Independentemente da manifestação
deste Departamento, já em 10/01, o mesmo diretor do DEPJUR, Emmanuel Cruz,
envia ao Prefeito, Otoni Rocha proposta de parcelamento (fls. 139), ignorando,
portanto, a manifestação do DEPAUD datado daquele mesmo dia. Sete dias depois,
em 17/01, o Prefeito envia Carta ao Diretor-Presidente sobre a proposta de
acordo (fls. 140/141). Em 21/01 nova manifestação de Emmanuel afirmando que
fez a proposta de parcelamento em conformidade com o sugerido pelo DEPAUD,
o que não corresponde a realidade, posto que aquele departamento condicionou
dita proposta a declaração de inexistência de dispositivo legal que isentasse
Docas de tais tributos - o que existia, conforme Lei municipal 706/77 - e a
previa aferição da área desapropriada, o que apenas se deu com a manifestação
da DICOSO em 15/01 (fls. 138). Antes disso, porém o Diretor da DEPJUR,
em antecipação áquela manifestação, e antes mesmo que o Diretor-Presidente
enviasse o processo administrativo a ele (fls. 127), já havia feito a carta
ao prefeito. O diretor Presidente remete o pedido do Diretor do Jurídico ao
Diretor de Administração (os três aqui arrolados como réus) no mesmo dia,
em 21/01 (fls. 143) que aceita a proposta feita pela prefeitura no mesmo
dia 21/01 (fls. 144/145) devolvendo a Direção do DEPJUR no mesmo dia para
redigir o acordo bilionário (fls. 145). Diante da inexistência de dotação
orçamentária, o mesmo Diretor Emanuel, após a aprovação do Diretor Fernando,
solicita, em 23/01, que o Diretor Presidente envie o Processo ao Diretor
Financeiro, o que é feito no mesmo dia (fls. 147). Com e resposta, mais
uma vez Emannuel determina o registro em 29/01 (fls. 150) sendo que antes
mesmo disso, já em 27/01, foi assinado o acordo entre Docas, na pessoa do
Diretor_Presidente Ario, e a Prefeitura de Itaguaí, através do prefeito
em 27/01/1986 (fls. 152/154). O primeiro pagamento data dali a três dias,
em 30/01 (fls. 159), já recebido por ASSEJUR, em que pese a firma ter seu
registro realizado apenas em 31/01, conforme apurado pelo TCE (fls. 519),
sendo que o termo de aditamento de fls. 403-verso que repassava a ASSEJUR o
contrato de honorários bilionário sequer é datado. Logo em seguida, entra em
cena Regina Bazin, por acaso irmã do Diretor de Docas, Emmanuel Cruz e que
vem a substituir Noriel Azylay por cessão de suas cotas dentro da sociedade
ASSEJUR, por alteração societária datada de 17/02/1987, mas que apenas foi
registrada - e passou a existir juridicamente - em 08/04/1986 (fls. 404/406)
passando, então já a segunda parcela a ser recebida pela própria Dra. Regina
(fls. 162) em 21/02, em que pese sequer integrar a sociedade formalmente,
e, coincidentemente, sempre mediante impulso de seu irmão Emannuel (fls. 160
entre outras). 13 38. Esclareça-se, por derradeiro, que o pedido autoral de
condenação dos Réus ao pagamento de indenização por perdas e danos coincide
com o pedido de ressarcimento dos prejuízos suportados pela CDRJ e pelo
Município de Itaguaí, em razão dos contratos ilegais pactuados. Ainda,
a requerida expedição de ofícios foi atendida no curso do feito, restando
provados, nos autos, os pagamentos ilegalmente efetuados, mediante resposta
aos ofícios enviados a Policia Federal, bem assim pelas conclusões do próprio
TCE e documentação colacionada. Quanto aos demais pedidos formulados pelo
autor popular no intuito de melhor instruir o processo, não foram acatados,
em vista de a obtenção de provas suplementares não ter sido necessária ao
acolhimento do pedido principal. 39. No que se refere ao recurso do Município
de Itaguaí, não há qualquer quantia devida a ser compensada em sede de
execução, porquanto demonstrado à saciedade que não houve desapropriação
de áreas municipais, haja vista que: i). o Decreto no 77.089/76 referiu-se
tão- somente à desapropriação de propriedades particulares; ii) a suposta
desapropriação de bens públicos dependeria de autorização legislativa, na
forma do parágrafo segundo do artigo 2° do Decreto-Lei n° 3.365/41 e iii)
o laudo de fls. 898/907 comprova que à época da desapropriação o loteamento
não contava com qualquer benefício de urbanização, não tendo galeria de águas
pluviais, meio-fios, pavimentação ou redes de água potável ou de energia
elétrica. 40. Bom explicitar que a corrupção é um câncer que compromete a
sobrevivência e o desenvolvimento do país: retira a comida dos pratos das
famílias; esvazia os bancos escolares e mina a qualidade da educação; fecha
leitos, ambulatórios e hospitais, fulminando a saúde das pessoas; enfim, corrói
os pilares que sustentam o ideal de civilidade e desenvolvimento. Ela merece
total repúdio e combate pelo Poder Judiciário Brasileiro. 41. Finalmente,
quanto aos honorários advocatícios, também não procede a irresignação dos
apelantes, já que foram razoavelmente fixados pela Juíza de primeiro grau,
no patamar de dez por cento do valor da condenação. Considerando a natureza
da causa, os honorários advocatícios arbitrados pelo magistrado de primeiro
grau, com fundamento no art. 20 do CPC de 1973, é suficiente para remunerar
o trabalho do advogado. 42. Negado provimento aos recursos interpostos e à
remessa necessária.
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA OFICIAL EM AÇÃO POPULAR. DESAPROPRIAÇÃO DE ÁREA PARA A
CONSTRUÇÃO DO PORTO DE SEPETIBA. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO BILIONÁRIA INDEVIDA
AO MUNICÍPIO DE ITAGUAÍ PELA COMPANHIA DOCAS DO RIO DE JANEIRO. QUESTÕES
PROCESSUAIS ALEGADAS. CERCEAMENTO DE DEFESA, INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
FEDERAL. COISA JULGADA NA ESFERA CRIMINAL. INÉPCIA DA INICIAL E AUSÊNCIA
DE LITISCONSORTES PASSIVOS NECESSÁRIOS. INOCORRÊNCIA. NULIDADE DOS CONTRATOS
FIRMADOS POR DESVIO DE FINALIDADE, V ÍCIOS DE FORMA E COMPETÊNCIA. CONHECIMENTO
E DESPROVIMENTO DOS RECURSOS E DA REMESSA NECESSÁRIA. 1. Trata-se de ação
popular, com o posterior ingresso da UNIÃO FEDERAL, em que se pede declaração
de nulidade de contrato celebrado em 27/01/1986 entre a COMPANHIA DOCAS DO RIO
DE JANEIRO - CDRJ E O MUNICÍPIO DE ITAGUAÍ; e condenação dos Réus, MUNICÍPIO DE
ITAGUAÍ , EMMANUEL MARTINS DA CRUZ, SEBASTIAO RIBEIRO DA MOTTA, NORIEL AZULAY,
ARIO WOLZ THEODORO, REGINA MARIA DA CRUZ BAZIN, ASSEJUR - ASSESSORIA JURIDICA
PROJETOS PLANEJAMENTOS E CONSULTORIA LTDA, OTONI ROCHA e FERNANDO ANTONIO
CORREA DE ARAUJO, com exceção da CDRJ, a, solidariamente, ressarcirem tal
Companhia dos valores pagos por esta ao Município de Itaguaí, por força da
avença mencionada, acrescendo-se juros e correção monetária incidentes desde
o pagamento reputado ilegal. Pretende-se, ademais, declaração de nulidade
de contrato de prestação de serviços profissionais firmado, em 04/12/1985,
entre o Município de Itaguaí e os advogados Noriel Azulay e Sebastião Ribeiro
da Motta, posteriormente aditado em favor da ASSEJUR; e condenação dos Réus,
com exceção da CDRJ, a, solidariamente, ressarcirem o Município de Itaguaí
dos valores pagos por força de tal pacto, acrescendo-se juros e correção
monetária incidentes desde o pagamento reputado ilegal. Postula-se, ainda,
condenação dos Réus ao pagamento de ônus sucumbências e de perdas e danos. O
Autor solicita, ainda, expedição de ofício à CDRJ, com vistas à obtenção de
cópia dos cheques referentes aos pagamentos efetuados em favor do Município
de Itaguaí, para que, posteriormente, expeçam-se ofícios aos bancos onde os
mesmos foram depositados, visando à identificação das contas beneficiadas,
remetendo-se a Juízo extratos das aludidas contas até a retirada do numerário
sobre que versa a demanda, informando o destino dos cheques. Pleiteia-se
expedição de ofício ao Instituto Brasileiro de Administração Municipal -
IBAM, solicitando cópia de parecer emitido por ocasião da ação penal que
tratou dos fatos que fundamentam esta ação popular. Requer o Autor, por fim,
o apensamento da ação executiva ajuizada pelo Município de Itaguaí em face
da 1 CDRJ, em curso no Juízo de Direito da Comarca de Itaguaí. 2. Questões
Processuais. Propedeuticamente, devem ser afastadas todas as alegações
dos recorrentes acerca da nulidade da sentença. A ação popular em voga,
ajuizada há mais de vinte anos, tramitou regularmente, nos moldes do devido
processo legal, com ampla oportunidade de defesa e de contraditório a todas
as partes. A alegação de cerceamento de defesa ora formulada por alguns
recorrentes mostra-se descabida e nitidamente protelatória, já que não foi
arguido qualquer prejuízo que possa ter advindo do julgamento antecipado
da lide. Ressalte-se que apenas os réus Fernando Antônio Corrêa de Araújo
e Município de Itaguaí se manifestaram acerca do despacho de fls. 1508,
que instou as partes a especificarem provas. O princípio processual da
instrumentalidade das formas, sintetizado pelo brocardo pas de nullité
sans grief e positivado nos arts. 249 e 250 , ambos do CPC /73 (arts. 282
e 283 do NCPC ), impede a anulação de atos inquinados de invalidade quando
deles não tenham decorrido prejuízos concretos. 3. Acerca do interesse
da União na lide, os recorrentes fundamentam sua irresignação em recente
julgado do Superior Tribunal de Justiça que reconheceu que a intervenção
anômala daquele ente federativo, na forma do parágrafo único do artigo
5º, da Lei no 9.469/97, quando justificada por mero interesse econômico,
não é suficiente para deslocar a competência para a Justiça Federal. Com
efeito, não se desconhece que a jurisprudência daquela Corte Superior vem
se firmando nesse sentido, contudo o caso concreto não se confunde com os
precedentes citados, sendo inaplicável tal entendimento ao caso em tela -
ação popular que versa sobre a anulação de contratos lesivos ao patrimônio
público e à moralidade administrativa. Bom elucidar que não há que se falar
em simples interesse econômico da União no deslinde da controvérsia, mas
sim em verdadeiro interesse jurídico na defesa da moralidade administrativa
no âmbito da administração pública indireta federal, já que não se está
diante de mera ação de cobrança. Ao contrário, a ação popular, instrumento
constitucional de tutela coletiva, envolve, além da simples recomposição
do erário, a anulação dos atos lesivos ao patrimônio público e à moralidade
administrativa, assim como a responsabilização dos agentes envolvidos. Nos
termos do inciso LXXIII do art. 5º da Constituição Federal, a ação popular é
o meio processual colocado à disposição de qualquer cidadão para questionar
judicialmente a validade de atos que considere lesivos ao patrimônio público
ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao
meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. 4. Imperioso apontar
que que a União, às fls. 1405 e 1499/1501, manifestou inequívoco interesse
em intervir no feito, o que foi deferido à fl. 1407; solicitou diligências
às fls. 1431/1432; e ainda apresentou contrarrazões às fls. 1874/1881,
reiterando seu interesse em defender decisão que lhe foi favorável, o que,
também segundo a interpretação dada pela jurisprudência à parte final do
parágrafo único do artigo 5º da Lei no 9.469/97, caracteriza sua posição
de parte e justifica a competência da Justiça Federal. "Se a União detém o
capital majoritário da sociedade de economia mista, naturalmente, é do seu
interesse a apuração de atos ilícitos praticados pelos seus dirigentes que
importem prejuízo patrimonial à sociedade empresarial." (STJ, AgRg no CC
122.629/ES). Como se não bastasse, a competência da Justiça Federal no caso
em tela se mostra incontestável diante da regra específica aplicável às ações
populares, prevista no artigo 5º, caput e parágrafos primeiro e segundo,
da Lei n° 4.717/65, dado que os contratos atacados pelo demandante foram
firmados por sociedade de economia mista criada pela União e da qual ela é
acionista majoritária. Demais disso, em se tratando de instrumento de tutela
coletiva que discute suposto desvio de verbas públicas, com repercussão no
orçamento 2 federal, por óbvio a União Federal, representando a coletividade,
apresenta interesse no deslinde da causa. É, pois, deste juízo federal a
competência para processar e julgar a causa. 5. Destaque-se que não procede
a alegação do Réu Otoni Rocha, em fls. 977/984, no sentido de ser o Poder
Judiciário Federal incompetente para processar e julgar a presente ação em
vista da disposição do art. 29, X, da Constituição da República, vez que a
causa não trata unicamente de atos praticados por prefeito, sendo a União
Federal interessada na causa, conforme já esclarecido acima. Bom registrar,
ainda, que reconhecer a nulidade da sentença nesse momento processual,
mais de 20 anos após o ajuizamento da ação e do deferimento da intervenção
da União como assistente do autor, consistiria em verdadeiro atentado à
efetividade da prestação jurisdicional e ao princípio constitucional da
razoável duração do processo. 6. Tocantemente à questão da existência
de coisa julgada na esfera penal, tem-se que os fatos narrados na ação
popular foram também objeto de denúncia oferecida pelo Ministério Público
do Estado do Rio de Janeiro, que imputou aos réus a conduta tipificada
no artigo 171 do Código Penal. Em julgamento de habeas corpus (processo
nº 9.268), a 3ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de
Janeiro determinou o trancamento da ação penal, em virtude da atipicidade da
conduta dos réus. Da leitura do mencionado decisum (fls. 506/509), nota-se
que a argumentação dos apelantes carece de respaldo jurídico, uma vez que
aquela Corte Criminal não reconheceu a inexistência do fato nem afastou a sua
autoria, mas apenas restringiu o aspecto criminal da tipicidade das condutas
imputadas aos demandados, consignando que tais condutas não se enquadrariam
no tipo penal descrito no artigo 171 do Código Penal. Assim, pelo princípio
independência das instâncias que vige em nosso ordenamento, incontestável
que a decisão proferida no Juízo Criminal em nada interfere na apuração
da responsabilidade dos agentes nas esferas cível ou administrativa, como
preconizam os artigos 66 e 67 do Código de Processo Penal. O tangenciamento
das instâncias civil e criminal somente é admitida quando negada a existência
material do fato ou a autoria do crime e reconhecida excludente de ilicitude,
não se aplicando quando a sentença criminal absolutória está fundada na
inexistência de provas do fato criminoso. O art. 935 do Código Civil reforça
a independência das instâncias civil e criminal, ressalvando apenas que o
Juízo Cível não contrarie a existência do fato e a autoria firmadas pelo Juízo
criminal. As instâncias administrativa, civil e criminal são independentes,
exceto na hipótese em que seja reconhecida a existência (ou inexistência)
dos fatos, ou quem seja o seu autor, pelo juízo criminal, nos termos do
artigo 935 do Código Civil. 7. Outrossim, não há que se falar em inépcia da
petição inicial, já que a peça de fls. 02/32 preenche todos os requisitos do
artigo 282 do Código de Processo Civil de 1973, descrevendo a participação de
cada um dos requeridos nas irregularidades narradas. Os fatos relatados pela
parte autora tem a necessária e clara relação lógica com o pedido, estando a
petição inteligível e desprovida de qualquer vício que possa causar inépcia,
oportunizando aos réus regular direito de defesa. Não deve ser reconhecida como
inepta petição inicial, que proporciona a ampla defesa e exato conhecimento
do pedido pretendido. Tocantemente à dita ausência de citação de todos os
litisconsortes passivos, tampouco assiste razão aos apelantes. Com efeito,
consoante prova dos autos, os demandados foram efetivamente os responsáveis
pela celebração dos contratos lesivos ao patrimônio público, como bem exposto
na sentença, não sendo exigível que todas as pessoas ligadas à Docas ou ao
Município de Itaguaí à época sejam chamadas a integrar o polo passivo da
demanda, dado que suas condutas não foram determinantes para a realização
dos atos impugnados. 3 8. Ao contrário do que tenta fazer crer o recorrente
às fls. 1739/1742, sua responsabilização não se deu por ter praticado atos
de mero expediente, mas sim porque ocupava a função de Diretor- Chefe do
Departamento Jurídico de Docas (fl. 116) e, nessa qualidade, teve atuação
essencial para o desfecho do processo administrativo que embasou o pagamento
da irregular indenização ao Município de Itaguaí, pois, como consignado
às fls. 116, 143, 146, 150 e 160, ele foi o responsável por dar o impulso
oficial, sempre levando o processo aos demais órgãos responsáveis pela
aprovação e consulta, o que resultou na conclusão de todo o procedimento
em menos de um mês. A participação do Sr. Emmanuel Martins da Cruz está
patentemente demonstrada nos autos e é descrita às fls. 1703/1704 com clareza,
não restando dúvidas de que sua atuação, assim como a dos demais réus, foi
determinante para a celebração dos contratos anulados. No que tange ao apelo
de Regina Maria da Cruz Bazin, não merece prosperar a alegação de sentença
ultra petita, uma vez que a sua participação no esquema - recebimento dos
valores como representante da ASSEJUR - está devidamente descrita na inicial
(fls. 20/22); comprovada nos. autos (fls. 162; 404/406; 514/544; 1456/1458);
e minudentemente analisada às fls. 1701/1704 da sentença. 9. Cumpre explicitar
que a CDRJ deve figurar no pólo passivo da demanda por ter celebrado, com o
Município de Itaguaí, contrato cuja nulidade se postula, motivo pelo qual,
não pugnando pela assistência ao autor em que pese a alegação de também
desejar o desfazimento do negócio, e sendo certo que tem de integrar o feito,
haja vista a repercussão que ensejará para a mesma a procedência da ação,
indispensável se faz sua manutenção no pólo passivo da ação. O Município de
Itaguaí deve ser mantido também no pólo passivo, tanto por força do despacho
de fls. 1.552, que indeferiu o pedido de assistência formulado por esta parte,
quanto em decorrência de sua derradeira manifestação, em fls. 1.623/1.627,
pela improcedência da pretensão autoral. 10. Ario Wolz Theodoro é legitimado
passivo para figurar no feito por ter se desligado da administração da CDRJ
somente em 14/02/1986, sendo Diretor-Presidente da sociedade á época dos fatos,
atentando, ainda para o fato do ofício do Prefeito de Itaguaí encaminhado a
Presidência da CDRJ, que deu início às tratativas que culminaram na celebração
do contrato objeto da lide, em 27/01/1986 (fls. 140/141), ter sido enviado
em 23/12/1985 (fls. 104/106), aos seus cuidados, anteriormente, portanto, ao
desligamento desse réu da Companhia, sendo que o referido contrato foi ainda
assinado sob sua administração (fls. 152/154). Por fim, Fernando Antonio
Corrêa de Araújo, que também defendeu sua ilegitimidade passiva ad causam,
deve figurar como réu no processo em julgamento, vez que participava da
direção da CDRJ quando da celebração do contrato em questão, sendo certo
que manifestou-se favoravelmente perante o Conselho de Administração, como
bem demonstra seu parecer de fls. 121/123, dando por devido o pagamento
exigido, e fls. 144/145, em contrariedade a laudo encomendado pela própria
Docas para a ação de desapropriação em face dos particulares. O mesmo seja
dito da participação de Emmanuel Cruz, que sugeriu parcelamento à Prefeitura
(fls. 139) e encaminhou, de forma arrojada e incrivelmente célere, o processo
administrativo, cuja tramitação tomou menos de um mês (vide fls. 116; 143;
146; 150 e 160). 11. Vale notar que não é pelo simples fato de integrar a
diretoria de Docas à época dos fatos que estariam os referidos réus legitimados
para atuar no feito; a legitimidade advém do fato de que foram estes os
responsáveis por apoiar com o pagamento da peculiar indenização, atuando de
modo determinante face o cargo de direção que ocupavam. Quanto ao ex-Prefeito,
sua legitimidade reside no fato de haver participado de ambos os contratos
contestados: por todos, 4 vide manifestações de fls. 104/106; 140/141; 152/154;
156, e, em especial manifestação de fls. 278/281, de modo que improcede a
defesa acerca de eventual ilegitimidade. 12. Do Mérito. Cumpre destacar a
inocorrência da prejudicial ao mérito, atinente à prescrição qüinqüenal da
pretensão autoral, também matéria de defesa de alguns réus. Os contratos,
cuja declaração de nulidade se postula, datam de 27/01/1986 e de 04/12/1985,
tendo sido a ação popular em apreciação proposta em 29/06/1989, dentro do
lustro legal, portanto, tampouco cabendo alegar prescrição intercorrente,
posto que o processo, há muito, se encontra no ponto de sentença,
não podendo o autor ser onerado pelo retardo na tramitação do feito, em
especial por nunca haver abandonado a causa. 13. Com efeito, impende aqui
reiterar os fundamentos alinhavados no bem exarado parecer ministerial de
fls. 1631/1662, da lavra do Procurador da República Vinícius Panetto do
Nascimento, a respeito das absurdas irregularidades que geraram o pagamento
pela Companhia Docas do Rio de Janeiro ao Município de Itaguaí de vultosa
quantia a título de desapropriações de supostos bens municipais, de impostos
e taxas supostamente devidos àquele município e, ainda, do generoso percentual
recebido pelos Procuradores Municipais à guisa de honorários advocatícios pela
celebração do primeiro acordo. Eis parte do parecer ministerial: "Como restou
demonstrado, o acordo celebrado entre o Município de Itaguaí é a CDRJ violou
frontalmente as regras de competência, na medida seus representantes legais
não possuíam atribuição para dispor sobre as verbas públicas, eis que eram
meros administradores das mesmas, tendo o dever de zelar por sua aplicação
em consonância com os ditames legais legais (sic). Ademais, a contratação
dos advogados e da empresa ASSEJUR, por parte do Município de Itaguaí, além
da ilegalidade constatada em virtude da ausência de regular procedimento
licitatório, traz certa perplexidade, pois de um lado temos o ex-Prefeito
de Itaguaí justificando a assinatura do ilegal acordo com a CDRJ em razão da
difícil situação financeira da municipalidade. Por outro lado, os contratados
procuradores do Município de Itaguaí embolsaram 30% (trinta por cento)
dessa verba. É muita generosidade para quem estava passando por dificuldades
financeiras " 14. No que toca ao pagamento realizado por Docas ao Município de
Itaguaí a título de indenização por supostas desapropriações de bens públicos
municipais, nota-se que o Decreto nº 77.089/76, que declarou de utilidade
pública, para fins de desapropriação, os bens que especifica, refere-se,
tão-somente, à desapropriação de propriedades particulares, até porque a
desapropriação de bens públicos depende de prévia autorização legislativa,
como estabelece o art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº 3.365/41. Decreto Municipal
nº 77.089/76 (fls. 773/774) Art. 1º Ficam declaradas de utilidade pública,
para fins de desapropriação, pela Companhia Docas da Guanabara (C.D.G.),
nos termos dos artigos 3º e 5º, alínea h e 6º, do Decreto-Lei nº 3.365,
de 21 de junho de 1941, as áreas tituladas a diversos particulares, com
respectivas benfeitorias, e as benfeitorias de particulares existentes
em terrenos de marinha, aproximadamente com 1.040ha (um mil e quarenta
hectares), localizadas no Município de Itaguaí, Estado do Rio de Janeiro,
a seguir discriminadas, de acordo com a planta constante do processo MT
número 13.057-75: (...) Decreto-Lei nº 3.365/41 Art. 2º Mediante declaração
de utilidade pública, todos os bens poderão ser desapropriados pela União,
pelos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios. (...) § 2º Os bens
do domínio dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios poderão
ser desapropriados pela União, e os dos Municípios pelos Estados, mas, em
qualquer caso, ao ato deverá preceder autorização legislativa. 15. Analisando
os artigos acima, conclui-se não ter sido objeto de desapropriação eventuais 5
bens públicos existentes nas áreas mencionadas no Decreto expropriatório. Não
poderia, dessarte, ser objeto de avença entre a CDRJ e o Município de Itaguaí
o pagamento de indenização pela desapropriação de bens públicos municipais,
bens públicos, estes, aliás, cuja existência é mesmo controversa. Com efeito,
analisando o feito, nota-se que, em 1980, à época do ajuizamento da ação de
desapropriação do loteamento denominado Vilar dos Coqueiros pela CDRJ em
face dos particulares (fls. 893/894 - 3o volume), com base no Decreto nº
77.089/76, foi apresentado laudo elaborado por assistente técnico da CDRJ
(fls. 898/907), datado de 31/05/1982, apontando a precariedade da área: "O
seu fraco progresso deve-se às más condições do solo pois a área loteada é
baixa sem possibilidade de escoamento das águas da chuva e, ainda, sujeita
a influência da variação de maré". "a maioria dos lotes permanecem nas
condições primitivas, abrejados ou encharcados". "Não conta o loteamento
Vilar dos Coqueiros com nenhum benefício de urbanização (...) Não tem assim
galeria de águas pluviais, meios-fios, pavimentação e redes de água potável
e de energia elétrica. (Grifei) Portanto, as condições desfavoráveis do solo
aliadas a falta de infraestrutura urbanística são as responsáveis pelo fraco
crescimento do bairro residencial em pauta. Não possui nenhuma benfeitoria,
estando nas condições iniciais, tomado por extenso matagal constituído de
vegetações próprias de terreno abrejado, como capim angola, tiririca, lírio
do brejo e outros". 16. Na prova documental de fls. 107/112, entretanto,
o Município de Itaguaí, ao listar as áreas desapropriadas pela CDRJ, por
força do Decreto nº 77.089/76, para fins de celebração do aludido contrato
com tal Companhia, apresenta dados sobre o mesmo loteamento, acusando a
existência de praças e logradouros (fls. 110). Observa-se que a CDRJ, a fim
de calcular a indenização devida aos expropriados particulares, utilizou-se
de laudo próprio, que não acusava qualquer infraestrutura urbana para,
posteriormente, ignorá-lo, por ocasião da celebração do aludido acordo,
agora com o Município de Itaguaí, reconhecendo a existência dos referidos
"equipamentos urbanos" que, consoante seu próprio laudo técnico, encomendado
por ocasião da ação de desapropriação em face dos particulares, nunca
existiu, e, observe-se, sequer para o próprio Município, que desapropriou a
área em face de particulares, sem se sujeitar à autorização do Legislativo
Municipal, justamente, por inexistir os ditos "equipamentos", que, ao cabo
de 10 anos, veio alegar. E, mesmo diante do decurso do prazo e do laudo da
própria sociedade, sua diretoria, ignorando quaisquer indícios, em nenhum
momento questionou o referido acordo; muito ao contrário, o aprovou em uma
tramitação rápida da proposta, em pouco menos de 1 mês. 17. Com efeito,
para análise da postulação da Municipalidade, instaurou-se procedimento
administrativo em Docas (fls. 104/158), em cujo curso se observa que nenhum
dos diretores da Companhia, responsáveis por apreciar e aprovar a proposta,
cuidaram no sentido de avaliar a real existência dos logradouros públicos,
praças, escolas e equipamentos urbanos reclamados pelo Município de Itaguaí
(fls. 107/112) sequer mediante exame do laudo por eles mesmos encomendados
para instruir a ação de desapropriação alguns anos antes. E isso, diante da
vultosa soma exigida pelo Município. Tal atitude por parte de Docas levou a
instauração de inquérito administrativo pela diretoria seguinte (fls. 185/194),
objetivando concluir, dentre outros pontos, se, no procedimento administrativo
que terminou por acatar a proposta do Município, foram aferidos a metragem dos
logradouros públicos desapropriados e os valores dos débitos cobrados. Consta,
de fls. 189, informações colhidas no curso do inquérito administrativo em
questão, nos seguintes termos: "A alegação de que "a metragem desapropriada
é bem superior ao conhecido pela Prefeitura" e que a Docas "desapropriou
até dezembro de 1985, 6 12.737.969m2, desapropriando conseqüentemente
2.337.976m2 a mais em áreas do Município" data vênia também não procede,
uma vez que os quadros estatísticos mensais do Setor de Desapropriações,
assim como o respectivo relatório anual demonstram que a área desapropriada
até 31.12.85 foi de 9.213.804m2; nas mesmas fontes, figura que a área
pendente de desapropriação, até aquela data, era de 1.030.762m2, restando,
por regularizar 2.496.873m2, de terrenos de marinha e logradouros públicos,
prevendo-se acréscimo na área original em conseqüência das observações
contidas no referido informe. (...) E, ressalta-se, a apreciação sobre a
metragem realizada anteriormente não satisfaz àquilo que foi sugerido pelo
DEPAUD, i. e., "proceder-se a aferição da metragem dos logradouros públicos
desapropriados e os valores dos débitos cobrados". Tudo indica que não
houve aferição das áreas descritas no processo, como também não consta haver
avaliação das mesmas por parte de profissionais habilitados". 18. Destaque-se,
ainda, o seguinte trecho do referido inquérito administrativo, que questiona a
lisura do procedimento administrativo instaurado com a finalidade de analisar
a proposta do Município de Itaguaí quanto às desapropriações levadas a
cabo por Docas para construção do Porto de Sepetiba e concernentemente à
revisão da isenção tributária concedida à Companhia: "o tempo recorde de
tramitação do pedido desde a sua entrada até a sua concretização: (...) em
apenas 1 (um) mês tudo já estava sacramentado e se tratava de um acordo,
envolvendo quantia vultosa para os cofres da Companhia" 19. Tal ponto,
relativo a extrema celeridade do procedimento, em confronto com o próprio
pleito descabido do Município e o valor extremamente alto exigido, salta
aos olhos, dado que não houve qualquer espécie de questionamento por parte
dos dirigentes da empresa, responsáveis pela defesa de seus interesses,
senão uma ignominiosa contraproposta de parcelamento, prontamente aceita
pelo Município. E quando se observa a rapidez da tramitação, sempre se vê
presente os mesmos "personagens", quais sejam, os 3 diretores ora arrolados
como réus, em especial o Sr. Emannuel Martins da Cruz que, aparentemente,
era o responsável por dar o impulso administrativo, sempre levando o
processo de um lado para o outro dos órgãos responsáveis pela aprovação e
consulta. (fls. 116; 139; 143; 146; 150 e 160). 20. Tocantemente aos pontos
levantados pelos ex-integrantes da Diretoria de Docas, e ora réus, cada um,
a seu modo, alegando insuficiência de poderes para implantar o acordo sozinho,
sujeição das propostas a órgãos colegiados, função meramente de consultoria,
entre outras justificações que tem por fim quase que menosprezar suas próprias
atribuições dentro daquela Companhia. Cabe anotar que os referidos réus eram
seus funcionários, seja lá sob qual condição funcional, devendo, portanto,
no mínimo, zelar por suas finanças. Alegar que não tinham poderes e que não
agiam sozinhos é uma tentativa vã de se eximir de qualquer responsabilidade
por seus cargos. Causa estranheza que em momento algum nenhum deles, todos
integrantes dos cargos mais elevados de direção da sociedade, não tenham
ao menos aventado a enormidade da indenização pleiteada após quase 10 anos
de um decreto expropriatório que mais se assemelhava a uma doação, face não
apenas a isenção tributária prometida e sacramentada por decreto municipal,
mas às próprias razões exaradas a justificar a indigitada expropriação
em favor de Docas: em última análise, a construção do Porto de Sepetiba
e o retorno econômico que daí adviria para o Município. 21. Desta feita,
ainda que considerasse devida a indenização, como alegou em sua defesa o ex-
diretor da área de administração e ex-Procurador do Estado, responsável, como
ele mesmo reconhece, por apresentar a proposta ao Conselho de Administração,
com base no parecer 7 técnico de Docas, por que jamais aventou a abusividade
dos valores cobrados, em observância ao próprio laudo pericial encomendado por
Docas (fls. 861/892) e que dava conta de que nada ali havia que justificasse
a indenização de "equipamentos municipais" pelo singelo fato de que os mesmos
inexistiam? E quanto à alegação de Emannuel Martins da Cruz no sentido de que
exercia função meramente consultiva, que espécie de consultoria era esta que o
impedia de aferir tais aspectos e produzir um parecer técnico que ressaltasse
tais abusividades e iniqüidades? Cabe notar, mais uma vez, que tais pessoas
prestavam serviços a Docas e não ao Município de Itaguaí, devendo, portanto,
atentar para o interesse da empresa que representavam e não de terceiros
22.Concluído inquérito administrativo, a CDRJ suspendeu o pagamento das
parcelas objeto do acordo pactuado com o Município de Itaguaí (fls. 276/277),
o que deu azo a manifestação do então Prefeito de Itaguaí, Réu Otoni Rocha,
mencionando relacionamentos políticos e pessoais: "Na qualidade de Prefeito
Municipal do Município de Itaguaí, como autoridade pública, não só tinha como
ainda tenho conhecimento de ordem pessoal e político com todos os Dirigentes
dessa CDRJ". Outrossim, foi bem destacado na sentença que: "Com efeito, o que
dizer da menção feita às fls. 279 na referida correspondência encaminhada pelo
então prefeito de Itaguaí, o aqui réu OTONI ROCHA, a nova Diretoria de Docas,
contra a decisão de fls. 276/277, que suspendeu o acordo bilionário, quase
que chamando-a à razão, ao fazer menção ao conhecimento "não só que tinha
como ainda tenho" com dirigentes dessa Docas e da Portobrás, incluindo-se na
relação de amizades pessoais, dentre outros, o onipresente, e, àquele tempo,
Presidente da República, Sr. JOSE SARNEY? Com que intuito foi feita menção
a indigitadas amizades, inclusive nominando expressamente algumas delas? No
que tais amizades se mostram de tamanha relevância a justificar sua menção em
correspondência oficial ? No que tais aspectos de cunho subjetivo poderiam
alterar a decisão já tomada pela nova Administração? Por que o ex-Prefeito,
que insiste em sua inocência, faz menção a tais pessoas, cada vez mais em
destaque nas páginas dos jornais? A quem interessa quem ele conhece e com
que finalidade o alardeia?" 23. No que atine ao pagamento de impostos e taxas
municipais pela CDRJ ao Município de Itaguaí, também previsto no contrato ora
em discussão, nota-se que tal estipulação desconsiderou o constante da Lei
Municipal nº 706/77, que concedeu, por 15 anos, a contar de janeiro de 1978,
isenção tributária à CDRJ quanto ao imposto predial e territorial urbano -
IPTU - e respectivas taxas, incidentes sobre os imóveis que foram objeto da
desapropriação para fins de construção do Porto de Sepetiba (fls. 392). Pela
análise do art. 178 do CTN, com redação conferida pela Lei Complementar nº
24/75 vigente à época, somente a isenção, que não esteja sujeita a determinadas
condições e concedida a prazo certo, é passível de revogação ou modificação
a qualquer tempo. Sendo a isenção no caso em tela a prazo certo somente,
mas não condicionada, seria, de fato, possível sua revogação a qualquer
tempo, por não cumprida a duplicidade dos requisitos, desde que o fosse por
lei municipal, vez que sua concessão deu-se através daquele instrumento,
em observância, portanto, ao princípio da reserva legal e da simetria
das formas. Art. 178 - A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em
função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei,
a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104. (Redação
dada pela Lei Complementar nº 24, de 7.1.1975) 24. Ainda, mesmo que tivesse
sido editada lei municipal para revogar a referida isenção, tal revogação
jamais poderia retroagir, sob pena de violar direito adquirido, tutelado
pelo art. 5º, XXXVI, da Constituição da República e nos termos do § 2º do
art. 41 do Atos das Disposições 8 Constitucionais Transitórias. Conclui-se,
nesse ponto, que o Município de Itaguaí e a CDRJ não poderiam ter acordado
sobre a revogação da aludida isenção nem sobre o recolhimento retroativo de
tributos antes objeto de isenção. As partes contratantes agiram em ofensa ao
princípio da reserva legal e ao direito adquirido, dispondo indevidamente
acerca de verbas públicas. 25. Uma vez mais, nota-se que Docas acatou a
proposta apresentada pelo Município de Itaguaí sem, ao menos, questioná-la. Tal
questionamento, curiosamente inexistente, teria sido mais que natural, vez que
a isenção favorável à Companhia era assegurada por 15 anos, nos termos da Lei
Municipal nº 706/77. De fato, por mais de seis anos, a CDRJ, amparada por essa
lei, beneficiou-se da referida isenção; em 1985, proposto, pelo Município,
o pagamento amigável, houve pronta concordância por parte da Companhia,
que sequer cogitou em argüir a prescrição qüinqüenal da aludida cobrança
tributária. Diante de tais evidências, é, de fato, inexplicável que nenhum
dos réus ex-funcionários de Docas, nem mesmo seu então Diretor-Presidente
tenha oposto a situação de isenção tributária que foi graciosamente concedida
pelo Município, como elemento a justificar, ao menos, alguma redução dos
valores cobrados: concordaram em pagar o valor então bilionário sem qualquer
oposição e tramitando o processo administrativo de modo mais do que célere,
em menos de um mês, dentro de uma estrutura que, em especial àquele tempo,
nos idos dos anos 80, era marcada pela burocracia e pelo retardo. 26. E,
note-se que aqui não se entra sequer no aspecto de que a dita isenção era
a prazo certo e não apresentava qualquer condicionante, aspecto este também
importante para refutar a defesa do Município réu no sentido de que a cobrança
se justificava, pois o Porto de Sepetiba não tinha sido implementado ainda
àquele tempo: a isenção não previa a construção do porto como condicionante
a sua ratificação Por todos, vide os termos do Decreto Municipal 706/77
(fls. 392). E dentro deste contexto, ainda que a isenção fosse revogada,
como pôde Docas, através de seus dirigentes aceitar pagar valores atrasados
de tributos? Que a isenção fosse revogada, possibilidade legal já verificada,
não se discute, mas como aceitar pagar valores retroativos, referentes a
período durante o qual a dita isenção ainda vigia? Imperioso reconhecer a
ilegalidade do contrato firmado entre a Docas e o Município de Itaguaí, também
neste ponto atinente a cobrança retroativa de impostos e taxas municipais,
e a conseqüente responsabilidade advinda para os responsáveis pela proposta
e sua aprovação. 27. Discute-se, ainda, nesta ação popular, a validade do
contrato de prestação de serviços advocatícios, celebrado em 04/12/1985,
entre o Município de Itaguaí e os advogados Noriel Azulay e Sebastião Ribeiro
da Motta, estipulando honorários devidos em decorrência do pacto ilegal
firmado entre a CDRJ e o Município de Itaguaí (fls. 400/403). Tal contrato de
prestação de serviços profissionais tem por escopo, tão-somente, a cobrança
destes valores, conforme se deflui da redação do contrato infra-transcrita: "o
recebimento de valor referente à perda da receita municipal, de ressarcimento
ou de indenização decorrentes da desapropriação feita pela COMPANHIA
DOCAS DO RIO DE JANEIRO, dos logradouros públicos, praças, escolas, ruas e
equipamentos urbanos pertencentes ao Município de Itaguaí". 28. Tocantemente
à remuneração a ser paga aos advogados, inserta no contrato em voga, nota-
se que seria variável de acordo com os valores recebidos pelo Município de
Itaguaí da CDRJ - de 5%, caso o montante pago ao Município chegasse a Cr$
5.000.000.000,00, até 30%, caso o montante pago ao Município alcançasse,
no mínimo, Cr$ 15.000.000.000,00. Aponte-se que o contrato celebrado
entre a CDRJ e o Município de Itaguaí estipulava o pagamento total de Cr$
24.800.000.000,00, o que garantiria aplicação do exorbitante percentual de
30% para cálculo de 9 honorários advocatícios, alcançando, então de Cr$
7.440.000.000,00. Impende anotar que o contrato de prestação de serviços
advocatícios foi assinado em 04/12/1985 (fls. 400/403) entre o Município
de Itaguai e os advogados Noriel Azulay e Sebastião Ribeiro da Motta, os
quais, posteriormente, em 14/02/1986, aditaram-no, cedendo-o, com anuência
do Município de Itaguaí, a empresa ASSEJUR, sociedade empresária constituída
pelos referidos advogados (fls. 403-v), cuja existência remonta a 31/01/1986,
quando registrada no Registro Civil de Pessoas Jurídicas (fls. 519) e que,
dali a alguns meses, passaria a ser integrada por Regina Bazin, por força de
cessão das cotas de Noriel Azulay àquela que seria irmã de um dos diretores
de Docas e que passa a integrar a referida sociedade em 08/04/1986, data do
registro dessa alteração no Registro Civil das Pessoas Jurídicas (fls. 406),
em que pese a alteração ter sido redigida com data de 17/02/1986, ou seja,
menos de um mês da cessão do contrato bilionário a referida sociedade de
advogados por seus titulares iniciais. 29. A prestadora de serviço ASSEJUR e
seus sócios opõem, em sua defesa, que foram pagos pelos serviços prestados
e, de fato, nada mais justo do que receber pelo seu trabalho. A questão
está em que trabalho seria esse a justificar honorários tão fabulosos,
correspondentes a 30% de um contrato bilionário, para o qual a própria
ASSEJUR assegura que não participou da fomentação. Aponte-se que, consoante
a ASSEJUR, esta não poderia ser responsabilizada pois já prestava serviços
a Municipalidade antes mesmo do indigitado contrato, e, quanto ao mesmo,
não foi responsável por sua elaboração, limitando-se a serviços de cobrança
dos devedores. E por tal trabalho que, nos termos em que o apresenta em
sua peça de bloqueio, seria de tão ínfima relevância, receberia, caso o
Município percebesse a integralidade dos valores acordados (ou seja, vinte
quatro bilhões e oitocentos milhões de cruzeiros), a soma de SETE BILHÕES
QUATROCENTOS E QUARENTA MILHÕES DE CRUZEIROS. E isto apenas para cobrar tais
valores, o que foi feito, ainda que apenas parcialmente, como demonstrado
pelas fotocópias dos cheques de fls. 1452, enviados pela Policia Federal. De
fato, nada como ser remunerado por seu trabalho. E a questão está em quanto
vale o trabalho de cada um. 30. O serviço da ASSEJUR foi prestado, conforme
mostram os indigitados cheques de fls. 1452, nos valores de DOIS MILHÕES,
QUATROCENTOS E OITENTA MIL CRUZADOS; e OITOCENTOS E SESSENTA E UM MIL,
QUINHENTOS E SESSENTA E UM CRUZADOS E OITENTA E UM CENTAVOS, ambos em nome do
Município réu, e sacados por ASSEJUR, na pessoa de seus sócios, dentre eles,
Regina Maria Bazin, ré nesta ação, "não pelo simplório fato de que Regina
era irmã de Emmanuel" (peça de bloqueio fls. 1188), um dos Diretores de Docas
envolvido e também réu nesta ação, posto que, tal como alegado em sua peça de
contestação "ninguém, por ter um parente, ou um familiar, ou uma pessoa com
quem mantenha ligações mais estreitas, estará marginalizado na luta pela sua
sobrevivência e submetido ao ridículo de receber aquiescência de outrem para
poder tomar as decisões que lhe sejam de interesse (...) - fls. 1188". 31. A
questão aqui examinada é quando este interesse fere, independentemente de
quem seja o irmão do interessado, o erário público. São estes os aspectos
aqui examinados, relativos aos contratos fomentados, e o prejuízo imposto
a Administração em função de interesses particulares, e não as relações de
parentesco de quem quer que seja, tal como pretende desvirtuar a indigitada
ré. No caso, a relação de irmandade é apenas uma das várias peculiaridades do
referido contrato em favor da empresa da ré, contratada aliás, sem qualquer
licitação, por valores bilionários, e apenas para cobrar uma dívida que veio
a existir pelo aval dos Diretores de Docas, dentre eles, um irmão da sócia
beneficiária, e que apenas se tornou 10 sócia após fomentado do dito acordo
ilegal. Se não fosse por tal conjunto de peculiaridades e coincidências,
certamente a relação de parentesco sequer seria mencionada. E, note-se,
apenas como uma curiosidade a mais, posto que o pronunciamento do Tribunal de
Contas da União acerca das irregularidades do dito contrato de prestação de
serviços e honorários (fls. 514/544) dispensa, por si só, qualquer atenção à
relação de parentesco como necessária para anular o referido contrato. 32. E
estranhamente esta mesma Sra., Dra. Regina, recebe os valores atinentes ao
referido contrato, consoante guias de pagamento por ela assinadas, datadas a
contar de 27/02/1986 (fls. 1456/1458) quando sequer era sócia da empresa ainda,
pois apenas passou a integrar formalmente a sociedade, por cessão de cotas,
em abril do mesmo ano, tudo conforme apurado pelo Tribunal de Contas da União
e demonstrado pelo contrato de fls. 404/406. A irregularidade da contratação em
tela advém, assim, não apenas dos valores bilionários contratados para serviço
que a própria ré apresenta como insignificantes ante a magnitude do acordo,
mas pela espantosa falta de procedimento licitatório prévio, ao argumento de
que tratar-se-ia de hipótese de dispensa de licitação, notadamente quanto à
"notória especialização" para serviços de, repita-se, mera cobrança. 33. Eis
as conclusões do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro - TCE/RJ,
nos autos do processo nº 201.940/86 (fls. 514/544), quando arremata que
"firmas como a que foi contratada existem muitas, justificando-se, pois a
necessidade da licitação" (fls. 518), além de não ter sido observado o disposto
no art. 137, § 1º, "c", da Lei Orgânica dos Municípios, que exige comprovação
de notória especialização para fins de dispensa de licitação. Registra o
TCE/RJ, ainda, irregularidade quanto aos atestados de notória espacialização,
datados de 15 e 26 de janeiro de 1986, sendo que a ASSEJUR só passou a existir
juridicamente a partir de 31/01/1986, quando registrada no Registro Civil de
Pessoas Jurídicas (fls. 519). Outrossim, o TCE/RJ, informa que, inobstante
ter o Município de Itaguaí recebido da CDRJ menos que Cr$ 15.000.000.000,00,
foram efetuados pagamentos à ASSEJUR correspondentes a 30% do valor recebido
pela Municipalidade, em descumprimento ao contratado (fls. 516): com efeito,
em que pese o contrato ser de êxito e não haver êxito integral posto que o
Município recebera apenas 5 das 10 prestações acordadas, ante a suspensão
determinada com a mudança da Diretoria de Docas, ainda assim, tal não
constituiu óbice ao adimplemento do contrato de honorários, pelo percentual
cheio de 30%, de modo que a referida sociedade limitada de advogados recebeu
os 30% do que arrecadara, ainda que não tenha finalizado o serviço para o qual
fora contratada, qual seja, "apenas" - como ressalvado em sua peça de bloqueio
- de cobrança do valores bilionários do acordo ilegal. 34. No que pertine à Ré
Regina Maria da Cruz Bazin, veja-se trecho do relatório elaborado pela Corte
de Contas: "Indagado sobre o fato da assinatura da signatária da proposta
de fls. 04 não coincidir com as dos representantes legais da firma ASSEJUR,
informou-nos o Prefeito que a referida pessoa, Regina Maria da Cruz Bazin,
pertencia à firma, fornecendo cópia da primeira alteração do Contrato Social
respectivo (fls. 144/146), através da qual retirou-se o sócio Noriel Azulay,
que cedeu e transferiu à nova sócia as suas cotas. Ocorre que o doc. de
fls. 04 foi assinado a 12 de fevereiro de 1986 e a referida Dra. Regina
Maria da Cruz Bazin só passou a integrar a firma a partir do dia 08 de
abril de 1986, data do registro dessa alteração no Registro Civil das Pessoas
Jurídicas. Confirma-se, pois, a irregularidade já apontada no exame inicial do
processo. A Dra. Regina Bazin não possuía, em 12 de fevereiro, condição legal
para firmar o doc. de fls. 04, em nome da ASSEJUR" (fls. 517/518).(grifos
nossos)". O 11 TCE/RJ aponta, ainda, inúmeras outras irregularidades no
contrato em questão, concluindo por sua ilegalidade (fls. 543/544). 35. Por
fim, cabe volver ao começo, quando o fundamento de toda esta celeuma foi,
justamente, as alegadas dificuldades financeiras enfrentadas pelo Município
de Itaguaí, a justificar a cobrança por "equipamentos municipais" sobre área
expropriada, cuja existência nunca foi demonstrada, e retroatividade da isenção
tributária concedida, revogada "para trás", em uma interpretação inédita da
legislação tributária que ensejou alcançar fatos passados há quase 10 anos,
e isso independentemente de qualquer prescrição tributária, e tudo para, ao
fim e ao cabo, com o único intuito de concretizar tal cobrança bilionária,
assinar-se um contrato de honorários, também este bilionário, posto que
reservava 30% da dívida ao indigitados contratados, sem licitação, ante a
notória especialização em cobrança, que, todavia, não restou demonstrada
sequer aos olhos do Tribunal de Contas do Estado, donde se conclui que a
justificativa para todo o acordo ilegal se perdeu, não apenas por todas as
irregularidades e arbitrariedades verificadas, mas certamente pelo dispêndio
com os advogados que sequer lograram cumprir a integralidade do contrato de
prestação de serviço, em que pese a "notória especialização" ventilada, sem
qualquer prejuízo a esta firma, senão ao próprio Município, posto que os 30%
do arrecadado foi repassado a sociedade de advogados, mesmo sem cumprimento
integral do serviço. 36. De outro lado, vale apontar a conclusão apresentada
pelo Ministério Público Federal, em seu parecer de fls. 1.631/1.662: "COMO
RESTOU DEMONSTRADO, O ACORDO CELEBRADO ENTRE O MUNICÍPIO DE ITAGUAÍ E A
CDRJ VIOLOU FRONTALMENTE AS REGRAS DE COMPETÊNCIA, NA MEDIDA EM QUE SEUS
REPRESENTANTES LEGAIS NÃO POSSUÍAM ATRIBUIÇÃO PARA DISPOR SOBRE AS VERBAS
PÚBLICAS, EIS QUE ERAM MEROS ADMINISTRADORES DAS MESMAS, TENDO O DEVER DE
ZELAR POR SUA APLICAÇÃO EM CONSONÂNCIA COM OS DITAMES LEGAIS. ADEMAIS, A
CONTRATAÇÃO DOS ADVOGADOS E DA EMPRESA ASSEJUR, POR PARTE DO MUNICÍPIO DE
ITAGUAÍ, ALÉM DA ILEGALIDADE CONSTATADA EM VIRTUDE DA AUSÊNCIA DE REGULAR
PROCEDIMENTO LICITATÓRIO, TRAZ CERTA PERPLEXIDADE, POIS DE UM LADO TEMOS O
EX-PREFEITO DE ITAGUAÍ JUSTIFICANDO A ASSINATURA DO ILEGAL ACORDO COM A CDRJ
EM RAZÃO DA DIFÍCIL SITUAÇÃO FINANCEIRA DA MUNICIPALIDADE. POR OUTRO LADO,
OS CONTRATADOS PROCURADORES DO MUNICÍPIO DE ITAGUAÍ EMBOLSARAM 30% (TRINTA
POR CENTO) DESSA VERBA. É MUITA GENEROSIDADE PARA QUEM ESTAVA PASSANDO POR
DIFICULDADES FINANCEIRAS " (fls. 1.662)" 37. O modus operandi foi, portanto,
o seguinte: a proposta de acordo é enviada por Município de Itaguai, na pessoa
do Prefeito Otoni Rocha, em 23/12/1985, véspera de Natal, ao então Diretor-
Presidente de Docas, Ario Wolz Theodoro (fls. 104/106). Paralelamente a isso,
em 04/12/1985, já havia sido fomentado um contrato de prestação de serviços
advocatícios, entre o mesmo prefeito e os Drs. Noriel Azulay e Sebastião
Ribeiro da Motta (fls. 400/403) para "prestação de serviços profissionais
advocatícios o recebimento de valor referente á perda de receita municipal,
de ressarcimento ou de indenização decorrentes da desapropriação feita
pela COMPANHIA DOCAS DO RIO DE JANEIRO, dos logradouros públicos, praças,
escolas, ruas e equipamentos urbanos pertencentes ao Município de Itaguaí".O
pleito foi repassado a Emmanuel Cruz, em 06/01/1986, como Diretor-Chefe do
Departamento Jurídico de Docas (fls. 116) que solicitou parecer técnico datado
do mesmo dia (fls. 119), sendo que dali a dois dias, 12 em 08/01/1986, já havia
manifestação do Diretor da Área Administrativa, Dr. Fernando Correa de Araújo,
dando pela procedência da pretensão do Município de Itaguaí, e sujeitando a
matéria ao Conselho Administrativo (fls. 121/123) no mesmo dia, na pessoa
do Diretor-Presidente já mencionado (fls. 123). Em parecer de 10/01/1986,
outro departamento, o DEPAUD analisa as manifestações anteriores e conclui
que (fls. 124/126) o DEPJUR dirigido por Emmanuel Cruz concluiu pela perda de
receita para o Município e pela desapropriação de áreas por Docas, sugerindo a
submissão da matéria a Diretoria Executiva; ao que o Diretor de Administração
supra arrolado se manifestou favoravelmente quanto á obrigatoriedade de
pagar os referidos impostos, salvo se houvesse "alguma disposição legal
isentando-o do pagamento, o que é pouco provável" (fls. 125). Ressaltou,
ainda, o exame dos informes quanto a metragem e valores de indenização e
impostos. È feita sugestão a instar o DEPJUR acerca de dispositivo legal
isentando Docas dos impostos, e sobre a medição da área de desapropriação
e valores de indenização, e APENAS caso não houvesse a referida isenção
legal, aceitar a cobrança amigável e parcelá-la. Daí, o Presidente Ario
enviou a Emannuel, em 13/01 o processo e este repassou, no dia seguinte a
outro Departamento, DICOSO (fls. 127). Independentemente da manifestação
deste Departamento, já em 10/01, o mesmo diretor do DEPJUR, Emmanuel Cruz,
envia ao Prefeito, Otoni Rocha proposta de parcelamento (fls. 139), ignorando,
portanto, a manifestação do DEPAUD datado daquele mesmo dia. Sete dias depois,
em 17/01, o Prefeito envia Carta ao Diretor-Presidente sobre a proposta de
acordo (fls. 140/141). Em 21/01 nova manifestação de Emmanuel afirmando que
fez a proposta de parcelamento em conformidade com o sugerido pelo DEPAUD,
o que não corresponde a realidade, posto que aquele departamento condicionou
dita proposta a declaração de inexistência de dispositivo legal que isentasse
Docas de tais tributos - o que existia, conforme Lei municipal 706/77 - e a
previa aferição da área desapropriada, o que apenas se deu com a manifestação
da DICOSO em 15/01 (fls. 138). Antes disso, porém o Diretor da DEPJUR,
em antecipação áquela manifestação, e antes mesmo que o Diretor-Presidente
enviasse o processo administrativo a ele (fls. 127), já havia feito a carta
ao prefeito. O diretor Presidente remete o pedido do Diretor do Jurídico ao
Diretor de Administração (os três aqui arrolados como réus) no mesmo dia,
em 21/01 (fls. 143) que aceita a proposta feita pela prefeitura no mesmo
dia 21/01 (fls. 144/145) devolvendo a Direção do DEPJUR no mesmo dia para
redigir o acordo bilionário (fls. 145). Diante da inexistência de dotação
orçamentária, o mesmo Diretor Emanuel, após a aprovação do Diretor Fernando,
solicita, em 23/01, que o Diretor Presidente envie o Processo ao Diretor
Financeiro, o que é feito no mesmo dia (fls. 147). Com e resposta, mais
uma vez Emannuel determina o registro em 29/01 (fls. 150) sendo que antes
mesmo disso, já em 27/01, foi assinado o acordo entre Docas, na pessoa do
Diretor_Presidente Ario, e a Prefeitura de Itaguaí, através do prefeito
em 27/01/1986 (fls. 152/154). O primeiro pagamento data dali a três dias,
em 30/01 (fls. 159), já recebido por ASSEJUR, em que pese a firma ter seu
registro realizado apenas em 31/01, conforme apurado pelo TCE (fls. 519),
sendo que o termo de aditamento de fls. 403-verso que repassava a ASSEJUR o
contrato de honorários bilionário sequer é datado. Logo em seguida, entra em
cena Regina Bazin, por acaso irmã do Diretor de Docas, Emmanuel Cruz e que
vem a substituir Noriel Azylay por cessão de suas cotas dentro da sociedade
ASSEJUR, por alteração societária datada de 17/02/1987, mas que apenas foi
registrada - e passou a existir juridicamente - em 08/04/1986 (fls. 404/406)
passando, então já a segunda parcela a ser recebida pela própria Dra. Regina
(fls. 162) em 21/02, em que pese sequer integrar a sociedade formalmente,
e, coincidentemente, sempre mediante impulso de seu irmão Emannuel (fls. 160
entre outras). 13 38. Esclareça-se, por derradeiro, que o pedido autoral de
condenação dos Réus ao pagamento de indenização por perdas e danos coincide
com o pedido de ressarcimento dos prejuízos suportados pela CDRJ e pelo
Município de Itaguaí, em razão dos contratos ilegais pactuados. Ainda,
a requerida expedição de ofícios foi atendida no curso do feito, restando
provados, nos autos, os pagamentos ilegalmente efetuados, mediante resposta
aos ofícios enviados a Policia Federal, bem assim pelas conclusões do próprio
TCE e documentação colacionada. Quanto aos demais pedidos formulados pelo
autor popular no intuito de melhor instruir o processo, não foram acatados,
em vista de a obtenção de provas suplementares não ter sido necessária ao
acolhimento do pedido principal. 39. No que se refere ao recurso do Município
de Itaguaí, não há qualquer quantia devida a ser compensada em sede de
execução, porquanto demonstrado à saciedade que não houve desapropriação
de áreas municipais, haja vista que: i). o Decreto no 77.089/76 referiu-se
tão- somente à desapropriação de propriedades particulares; ii) a suposta
desapropriação de bens públicos dependeria de autorização legislativa, na
forma do parágrafo segundo do artigo 2° do Decreto-Lei n° 3.365/41 e iii)
o laudo de fls. 898/907 comprova que à época da desapropriação o loteamento
não contava com qualquer benefício de urbanização, não tendo galeria de águas
pluviais, meio-fios, pavimentação ou redes de água potável ou de energia
elétrica. 40. Bom explicitar que a corrupção é um câncer que compromete a
sobrevivência e o desenvolvimento do país: retira a comida dos pratos das
famílias; esvazia os bancos escolares e mina a qualidade da educação; fecha
leitos, ambulatórios e hospitais, fulminando a saúde das pessoas; enfim, corrói
os pilares que sustentam o ideal de civilidade e desenvolvimento. Ela merece
total repúdio e combate pelo Poder Judiciário Brasileiro. 41. Finalmente,
quanto aos honorários advocatícios, também não procede a irresignação dos
apelantes, já que foram razoavelmente fixados pela Juíza de primeiro grau,
no patamar de dez por cento do valor da condenação. Considerando a natureza
da causa, os honorários advocatícios arbitrados pelo magistrado de primeiro
grau, com fundamento no art. 20 do CPC de 1973, é suficiente para remunerar
o trabalho do advogado. 42. Negado provimento aos recursos interpostos e à
remessa necessária.
Data do Julgamento
:
24/01/2019
Data da Publicação
:
04/02/2019
Classe/Assunto
:
APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e
do Trabalho
Órgão Julgador
:
8ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
MARCELO DA FONSECA GUERREIRO
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
MARCELO DA FONSECA GUERREIRO
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