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Jurisprudência


TRF2 0013243-37.2003.4.02.5101 00132433720034025101

Ementa
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO (SFH). MÚTUO HABITACIONAL. SUCESSÃO DOS MUTUÁRIOS ORIGINAIS POR SEUS RESPECTIVOS ESPÓLIOS. REVISÃO CONTRATUAL. CESSÃO PARTICULAR DOS CRÉDITOS À EMGEA ALEGADA E NÃO COMPROVADA. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA CEF. LITISCONSORCIO PASSIVO NECESSÁRIO COM CAIXA SEGUROS S/A. ATENDIMENTO NA PETIÇÃO INICIAL. COBERTURA SECURITÁRIA POR MORTE DO MUTUÁRIO ORIGINÁRIO PRINCIPAL. FATO NOVO NOS AUTOS. CONTRADITÓRIO GARANTIDO À CEF. NECESSIDADE DE APRECIAÇÃO IN CASU. COBERTURA SECURITÁRIA VÁLIDA. QUITAÇÃO DO SALDO DEVEDOR NA DATA DO ÓBITO DO MUTUÁRIO. CABIMENTO. APLICAÇÃO DO CDC. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA ALEGADA ABUSIVIDADE. ÔNUS DO MUTUÁRIO. SISTEMÁTICA DE AMORTIZAÇÃO CORRETA. JUROS NOMINAIS E EFETIVOS. LEGALIDADE. COEFICIENTE DE EQUIPARAÇÃO SALARIAL (CES). REGULARIDADE DA COBRANÇA. FUNDHAB NÃO COBRADO NO CONTRATO. EXPURGOS PLANOS COLLOR E REAL. REGULARIDADE E LEGALIDADE NA APLICAÇÃO AO CONTRATO. EXAME DA PROVA PERICIAL. ANATOCISMO CONSTATADO. PES INCORRETAMENTE APLICADO. NECESSIDADE DE REELABORAÇÃO DOS CÁLCULOS. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. APELAÇÃO DA CEF DESPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA ATACADA. 1. Ação de Conhecimento, ajuizada em 09.06.2003 por casal de mutuários (hoje falecidos e ora sucedidos por seus respectivos Espólios, representados pela mesma Inventariante) em face da CEF, objetivando, em síntese, ampla revisão do contrato nº 1.0188.8000.405-1, celebrado em 25.07.1988, com vistas a financiar imóvel situado na Rua Colômbia, nº 595, Quitandinha, Petrópolis-RJ, pelo sistema PES/PRICE, sem FCVS e pagamento em 180 meses, com a "manutenção de algumas garantias legais e contratuais; pleiteando a exclusão e a readequação do contrato em outros pontos; e pleiteando, ainda, a devolução de todas as quantias pagas a maior durante todo o período contratual". 2. Ilegitimidade passiva ad causam alegada pela CEF que não se vislumbra, já que a alegada cessão particular de crédito á EMGEA não foi comprovada, havendo entendimento jurisprudencial pacífico no sentido de que, firmado com a CEF o contrato de mútuo cujas cláusulas impugna a ora Apelante, é a CEF - e não a EMGEA - que deve figurar no pólo passivo da lide, nenhuma irregularidade havendo na sentença ora atacada quanto a esse ponto. Precedentes: AC nº 199951010189652 (TRF-2ª Reg., 8ª T.E., Relator: De. Fed. MARCELO PEREIRA DA SILVA, DJU 24.03.2011); e AG nº 200502010112941 (TRF-2ª Reg., 8ª T.E., Relator: Des. Fed. GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA, DJU 31.03.2006). 3. Alegação de existência de litisconsórcio necessário com a Caixa Seguros S/A, também pela CEF, que não se justifica in casu, já que a Caixa Seguros S/A foi incluída, pelos Autores originários, como Ré na presente ação. 4. Alegações da parte autora no sentido de que "em virtude do falecimento do mutuário titular do 1 financiamento [João Afonso de Resende], do regular pagamento das prestações, inclusive em valores superiores ao efetivamente devido, e de expressa previsão contratual, o financiamento encontra-se devidamente quitado, razão pela qual requer seja declarada a quitação do contrato de financiamento objeto da lide", anteriormente alegado nos autos de Ação Cautelar (processo nº 2003.51.01.028552-0, autos apensos) após o óbito do mutuário originário e controvertido pela CEF e pela Caixa Seguros S/A, que constituem efetivo fato novo na lide, razão pela qual impõe-se a sua apreciação in casu. 5. Apólice de seguro acostada aos autos que se limita a enunciar, como uma das coberturas disponíveis, a de "Morte, qualquer que seja a causa", sem estabelecer restrições adicionais, razão pela qual não cabem as alegações da parte ré no sentido de que a referida cobertura securitária só seria aplicável durante o tempo de duração do contrato (180 meses), e sendo certo que, conforme enunciado na sentença prolatada nos autos da Ação de Conhecimento nº 2009.51.01.007667-1 (em que se acabou por reconhecer a ilegitimidade ativa de um dos herdeiros para ajuizar a ação, em lugar do Espólio, com que estava em litígio), "houve aditivo contratual impondo pagamento de eventual saldo devedor em até 48 meses, através de prestações mensais e sucessivas, conforme parágrafo primeiro da cláusula trigésima nona [...] [e sendo que] o parágrafo segundo da cláusula trigésima nona manteve intactas todas as outras "condições aqui contratadas", sendo certo então que as cláusulas décima e décima primeira podem ser aplicadas o saldo residual. Sendo assim, aplica-se à hipótese o seguro aludido no contrato de mútuo habitacional firmado entre as partes, devendo ser declarado como quitado o saldo devedor relativo ao contrato de mútuo habitacional desde julho de 2006, data do óbito do mutuário, em relação ao imóvel objeto da presente ação", impondo-se reconhecer a obrigação da CEF de quitar o saldo devedor a partir de 05.07.2006, data do óbito do mutuário principal. 6. Em que pese firme jurisprudência do STJ no sentido de admitir a aplicação do CDC aos contratos de financiamento habitacional (REsp nº 756.973/RS, STJ, 3ª T., Relator: Min. CASTRO FILHO, DJe 16.04.2007), não é possível concluir-se automaticamente pela ocorrência de abusividade, devendo haver prova mínima da conduta lesiva alegada pela parte autora, ônus este que lhe cabe quanto ao fato constitutivo do seu direito, por força do disposto no Artigo 373, I, CPC/2015 (antigo Artigo 333, I, CPC/1973), apenas cabendo a inversão prevista no Artigo 6º, VIII, CDC quando constatada a hipossuficiência do consumidor e a existência de indícios da verossimilhança das suas alegações, não sendo automática a sua decretação, tampouco, para toda e qualquer relação de consumo. 7. No que tange à sistemática de amortização, configura-se legítimo o procedimento feito pela CEF, ou seja, primeiramente deve o agente financeiro reajustar o saldo devedor, para depois amortizar a dívida com a prestação paga naquela data pelo mutuário, porquanto a inversão desta sistemática implicaria, em última análise, que o dinheiro relativo à prestação ficasse emprestado ao mutuário pelo período de trinta dias ou pelo período anterior à última capitalização sem que incidisse correção monetária. Precedente: TRF-2ª Reg., 8ª T.E., AC 200851010163538, Relator: Des. Fed. MARCELO PEREIRA DA SILVA, E-DJF2R 19.12.2014. 8. Conforme se verifica das condições do contrato sob exame, foram previstas taxas de juros nominal (de 10,5%) e efetiva (de 11,0203%) - esta última correspondente aos juros compostos impugnados -, sendo que "a [simples] previsão de juros nominais e juros efetivos nominais e juros efetivos não configura cobrança de juros capitalizados, mas são formas distintas de se verificar a taxa, que tem um limite anual e com incidência mensal sobre o saldo devedor" (TRF-2ª Reg., 8ª T., AC 418.983, Relator: Des. Fed. RALDÊNIO BONIFÁCIO COSTA, DJU 08.09.2009, p. 172/173). Deste modo, inexiste a alegada violação ao disposto na Súmula nº 121/STF ("É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada"). 9. O Coeficiente de Equiparação Salarial (CES) foi expressamente previsto em cláusula contratual (39ª) e 2 decorre da adoção do Plano de Equivalência Salarial, que tem previsão contratual, não existindo, assim, nenhuma ilegalidade na sua cobrança. Precedentes: TRF-2ª Reg., 8ª T.E., AC 0023752-17.2009.4.02.5101, Relator: Des. Fed. MARCELO PEREIRA DA SILVA, E-DJF2R 20.10.2016; TRF-2ª Reg., 7ª T.E., AC 200851010045785, Relator: Des. Fed. JOSÉ ANTONIO NEIVA, E-DJF2R 13.05.2015; TRF-2ª Reg., 6ª T.E., AC 200051010176078, Relator: Des. Fed. FERNANDO MARQUES, DJU 26.03.2007. 10. No que tange à contribuição ao Fundo de Assistência Habitacional - FUNDHAB, determina o Decreto nº 89.248, de 10.01.1984, que seu pagamento é imputado ao mutuário no caso de financiamento destinado à reforma ou construção de imóvel, sendo que, tratando-se de financiamento para aquisição de imóvel já construído, como no caso dos autos, o encargo é de responsabilidade do vendedor. No entanto, o exame dos autos e o laudo pericial produzido na Ação Cautelar em apenso evidenciam que não houve qualquer cobrança a este título in casu, razão pela qual o pedido formulado não faz sentido. 11. No que tange à não-aplicação dos expurgos inflacionários referentes ao Plano Real (URV - Unidade Real de Valor), nos meses de março a junho/1994, deve ser observado o entendimento prevalente em reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual "a incidência da URV nas prestações do contrato não rende ensejo a ilegalidade, porquanto, na época em que vigente, era quase que uma moeda de curso forçado, funcionando como indexador geral da economia, inclusive dos salários, sendo certo, nesse contexto, que a sua aplicação, antes de causar prejuízos, mantém, na verdade, o equilíbrio entre as parcelas do mútuo e a renda, escopo maior do PES". (STJ, 4ª T., RESP 576638/RS, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, DJU 23.05.2005, p. 292). 12. Quanto ao índice de 84,32% aplicado, no mês de março de 1990, ao saldo devedor dos contratos imobiliários firmados com a CEF, entendimento do STJ vai no sentido da legalidade, conforme EREsp 218426/SP, Rel. Min. VICENTE LEAL, DJU 19.04.2004, p. 148. 13. Prova pericial, produzida em sede de Ação Cautelar (processo nº 2003.51.01.028552-0) e devidamente contraditada por ambas as partes no feito, que evidencia a ocorrência de anatocismo, bem como de aplicação incorreta do PES, com "cobranças a maior do que o devido, [...] [posto que] acima do percentual de reajuste do mutuário", gerando saldo devedor maior do que o efetivamente devido e ensejando a necessidade de elaboração de novos cálculos, em sede de liquidação de sentença, conforme os seguintes critérios: (i) atendimento ao PES, segundo os índices de reajuste salarial do mutuário originário principal, constantes à fl. 77 dos autos, no que diz respeito às 180 (cento e oitenta) prestações originariamente contratadas; (ii) eliminação do anatocismo constatado na perícia contábil produzida nos autos da Ação Cautelar em apenso; (iii) desconto dos depósitos efetuados pelos mutuários nos autos; (iv) quitação do saldo devedor, por força da aplicação do seguro contratado, a partir de 05.07.2006, data do óbito do mutuário originário principal; e (v) os valores eventualmente pagos a maior devem ser obrigatoriamente compensados com eventual saldo devedor remanescente assim calculado e, apenas se não houver saldo devedor a ser pago, é que caberá o ressarcimento, na forma simples, à parte autora. 14. Apelação da CEF desprovida. Apelação dos Espólios Autores parcialmente provida, apenas para, reformando em parte a sentença atacada, determinar que o saldo devedor relativo ao contrato de mútuo habitacional nº 1.0188.8000.405-1 seja calculado, em sede de liquidação de sentença, conforme os critérios anteriormente enumerados.

Data do Julgamento : 22/11/2018
Data da Publicação : 30/11/2018
Classe/Assunto : AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador : 8ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a) : MARCELO PEREIRA DA SILVA
Comarca : TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : MARCELO PEREIRA DA SILVA
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