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Jurisprudência


TRF2 0014103-52.2014.4.02.5101 00141035220144025101

Ementa
DIREITO ADMINISTRATIVO E PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO CIVIL DE ALIMENTOS DECORRENTE DE SEPARAÇÃO CONSENSUAL. PENSÃO POR MORTE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO REGISTRADO INCORRETAMENTE. VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. INVIABILIDADE. BOA-FÉ DA BENEFICIÁRIA. PAGAMENTO DE DIFERENÇAS DEVIDAS. INVIABILIDADE. NECESSIDADE DE PEDIDO ADMINISTRATIVO. INEXISTÊNCIA DE DIREITO AUTOMÁTICO AO BENEFÍCIO. INOCORRÊNCIA DE DANOS MORAIS. RECURSOS DESPROVIDOS. 1. Tratam-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e por CLÁUDIO SARMENTO TOSI nos autos da ação ordinária por esta proposta em face daquele, objetivando a declaração de nulidade de débito no valor de R$ 60.937,66 (sessenta mil, novecentos e trinta e sete reais, e sessenta e seis centavos) e a condenação do réu ao pagamento de diferenças supostamente devidas à autora, correspondente a 2/3 do benefício originário, no período de 07/08/2000 a 17/09/2014, bem como a condenação à compensação por danos morais. 2. Narra a autora que em 1979, foi homologado, por sentença, acordo de separação consensual entre ela e seu então esposo, Paulo Sérgio dos Santos Coelho, que destinaria 1/3 do valor do seu benefício de auxílio-doença a título de pensão alimentícia. Esclarece que em 1983 o benefício foi convertido em aposentadoria por invalidez, mas que houve erro administrativo que resultou no cadastramento da pensão alimentícia como aposentadoria por invalidez (NB 077.631.123-9). Com o óbito do segurado, houve a cessação da aposentadoria por invalidez por ele então percebida (NB 000.973.854-1), em 07/08/2000 e, segundo afirma, tal benefício continuou a ser pago até 2014, sem que ela percebesse o equívoco. Ocorre que no mesmo ano, em 04/08/2014, formulou novo requerimento de pensão por morte (NB 168.212.921-4), o qual veio a ser indeferido ao argumento de que a autora já estaria recebendo benefício de pensão por morte sob o nº 169.264.307-7, desde 07/08/2000. Também em 2014, o benefício NB 077.631.123-9 veio a ser cancelado em processo administrativo de apuração de irregularidades, resultando em débito de R$ 60.937,66, cobrado pela autarquia previdenciária na esfera administrativa. Dessa forma, sustentando que esteve de boa-fé, não pode ser compelida ao pagamento dos valores supostamente devidos, e, ademais, faz jus ao recebimento da pensão por morte no valor integral que deixou de ser paga durante todos esses anos. 3. Inicialmente, observa-se da cronologia dos fatos que houve erro administrativo por parte da autarquia previdenciária, no momento em que o auxílio-doença percebido pelo falecido se convolou em aposentadoria por invalidez. Tendo em vista que os pagamentos em favor da autora eram realizados a título de pensão alimentícia, resultante de acordo homologado 1 judicialmente de separação consensual, deveria ela receber verba do INSS correspondente a 1/3 da aposentadoria por invalidez do seu ex-cônjuge, mas, por equívoco no registro do banco de dados da Previdência Social, passou a receber valores como se fosse um benefício autônomo de aposentadoria por invalidez. 4. Tendo em vista que houve, à toda evidência, um erro por parte da Administração Pública, deve ser aqui prestigiado o entendimento, já consolidado na jurisprudência dos Tribunais Superiores, no sentido de que o administrado que recebeu valores de boa-fé não pode ser compelido a ressarcir o erário. Trata-se, aqui, de valorização do princípio da confiança, pois a atuação do Poder Público criou na beneficiária a legítima expectativa acerca do direito à percepção de tais valores a título de pensão civil, não surgindo o dever de repetição dos valores recebidos indevidamente. 5. Malgrado o entendimento cristalizado no REsp 1244182/PB, julgado em 2012 pelo Superior Tribunal de Justiça, sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema nº 531) faça expressa referência à aplicação equivocada da lei pela Administração Pública, mais recentemente vem se entendendo que é descabida a devolução ao Erário de valores recebidos pelo servidor, nos casos em que o pagamento reputado indevido se deu por erro de cálculo ou operacional da Administração, uma vez que também aqui há boa-fé do servidor público. O acórdão paradigma foi conduzido pelo Min. Herman Benjamin no MS nº 19.260/DF, o qual resultou em julgamento unânime da Corte Especial, merecendo destaque os seguintes pontos: "Primeira Seção consolidou o entendimento de que, tanto para verbas recebidas por antecipação de tutela posteriormente revogada (REsp 1.384.418/SC), quanto para verbas recebidas administrativamente pelo servidor público (REsp 1.244.182/PB), deve ser considerada a boa-fé objetiva de quem recebeu as parcelas. Esse aprofundamento sobre o tema, em que a situação é analisada à luz da boa-fé objetiva, foi consagrado primeiramente no já citado REsp 1.244.182/PB, julgado pela Primeira Seção sob o rito dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC). Naquele caso, o objeto da discussão foi a devolução de valores recebidos administrativamente de forma indevida pelo servidor público, seguindo a mesma linha da apreciação da boa-fé objetiva e especificamente em relação à definitividade da parcela recebida. (...) Voltando aos pressupostos fáticos informados pela autoridade impetrada, há suporte suficiente para a incidência da tese que afasta a reposição ao Erário de verbas recebidas a maior, pois o pagamento reputado indevido foi por alegado erro de cálculo da Administração. Tal situação, como acima fundamentado, evidencia a boa-fé objetiva do servidor no recebimento da verba alimentar culminante na irrepetibilidade dos valores auferidos." A orientação ainda recentemente vem sendo reiterada, como se vê no AREsp 106145/ES, em decisão de lavra do Min. Mauro Campbell Marques, de 02/03/2017, que alude expressamente ao precedente acima citado. O mesmo raciocínio vem sendo esposado em acórdãos desta ínclita Corte de Justiça Federal. Confira-se o julgado abaixo transcrito, o qual, a despeito de tratar de benefício previdenciário, se aplica por analogia, já que a tese jurídica é idêntica: TRF-2 - 0094652-15.2015.4.02.5101 (2015.51.01.094652-5) - 1ª Turma Especializada - Rel. Des. Fed. PAULO ESPÍRITO SANTO - Data de decisão: 22/03/2018 - Data de disponibilização: 27/03/2018. 6. Por outro lado, desse raciocínio não deflui conclusão favorável à autora em relação aos seus demais pedidos, no sentido de que ela teria direito à percepção de quaisquer diferenças entre o valor real e o valor efetivamente pago. No regime jurídico previdenciário, exige-se o expresso e formal pedido na seara administrativa para que a Administração Pública apure o preenchimento 2 dos requisitos legais e, só então, passe a efetuar o pagamento. Por determinação legal, a data de início do benefício (DIB) só coincidirá com a data do óbito do instituidor da pensão por morte se o pedido fosse formulado em até 30 (trinta) dias após o falecimento do de cujus. Nesse sentido dispunha o artigo 74 da Lei nº 8.213/1991, com redação dada pela Lei nº 9.528/1997. 7. Dessa forma, ainda que se reconheça ter havido equívoco material da Administração Previdenciária no registro e no pagamento do benefício, que induziu a beneficiária a erro a respeito de sua situação jurídica, isso não muda o fato de que, para que possa haver o efeito retroativo do benefício previdenciário, o pedido administrativo deve ser formulado dentro de determinado período. Trata-se de requisito objetivo, que independe de considerações acerca do estado anímico da parte interessada. No mais, deve-se ressaltar que, ainda que o equívoco tenha sido, inicialmente, do INSS, não se pode exonerar a autora de culpa pela situação de irregularidade, uma vez que percebeu o benefício por longo período de tempo, sendo esperado que uma pessoa de diligência normal pudesse ter, mediante simples averiguação na esfera administrativa, ter constatado a irregularidade das circunstâncias. Percuciente e elucidativa a fundamentação do magistrado sentenciante acerca dessa questão. 8. E, de fato, ainda que não tivesse ocorrido erro acerca da situação jurídica da autora, ela seria titular de mera expectativa de direito antes da formulação do pedido administrativo e da concessão do benefício, de modo que não faz jus, neste procedimento, ao recebimento de quaisquer diferenças, uma vez que não há direito subjetivo a percepção de valores anteriores àqueles devidos após o requerimento formal. 9. Por sua vez, não se vislumbra a ocorrência de dano moral, assim consideradas as lesões graves aos direitos da personalidade, que afetam condições e situações existenciais da pessoa humana. A autora durante todos esses anos percebeu valores indevidamente, de forma que não se pode cogitar de qualquer direito oriundo dessa situação, ao passo que a cessação do benefício se deu ao cabo de processo administrativo regular, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Não há, assim, dano moral indenizável que autorize a condenação do ente público. 10. Negado provimento às apelações interpostas. Tendo em vista que ambas as partes sucumbiram, as respectivas condenações em honorários advocatícios devem ser majoradas no percentual de 1% (um por cento), cada uma, na forma do artigo 85, § 11, do CPC/2015, observada, contudo, a gratuidade de justiça em favor da autora (artigo 98, § 3º, do CPC/2015).

Data do Julgamento : 15/02/2019
Data da Publicação : 20/02/2019
Classe/Assunto : AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador : 6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a) : POUL ERIK DYRLUND
Comarca : TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : POUL ERIK DYRLUND
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