TRF2 0049700-53.2012.4.02.5101 00497005320124025101
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RECONHECIMENTO DA CONDIÇÃO DE
"ANISTIADO". EMPREGADO DISPENSADO DURANTE O GOVERNO COLLOR. ARTIGO 19 DO
ADCT. LEI Nº 8.878/94. LEI Nº 10.790/03. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO
DE ANISTIADO. EMPREGADO DE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO. INEXISTÊNCIA
DE CERCEAMENTO DE DEFESA. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DO DIREITO. RECURSO
DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta por ANTÔNIO CARLOS JATOBÁ nos
autos da ação ordinária por ele proposta em face da PETRÓLEO BRASILEIRO S.A. -
PETROBRÁS, da UNIÃO FEDERAL e de ARLANXEO BRASIL S/A, objetivando a declaração
de nulidade do ato de demissão do autor, por inobservância ao artigo 19 do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), bem assim a condenação
ao pagamento das vantagens em caráter retroativo. Alternativamente, requer sua
reintegração funcional com base nas normas coletivas de trabalho editadas desde
2005 e ratificados nos atos subsequentes, cumulado com pedido de condenação
solidária dos réus no pagamento de salários vencidos e vincendos, inclusive
férias acrescidas de terço constitucional, décimo terceiro a partir de 2005
e de condenação solidária dos réus no pagamento de quinhentos salários
mínimos a título de danos morais. 2. Inicialmente, aventa a parte autora
nulidade do feito julgado por cerceamento de defesa, isto é, por violação
às garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da
ampla defesa, ao argumento de que há necessidade de produção de prova oral,
consistente em colheita dos depoimentos pessoais dos representantes das
pessoas jurídicas rés e de declarações de testemunhas. Ocorre que a questão
jurídica controvertida nos autos é essencialmente de direito, vez que seu
ponto nevrálgico não diz respeito às circunstâncias ou razões da demissão
do autor, mas sim à incidência ou não do regime jurídico estatuído pelas
Lei nºs 8.878/94 e 10.790/03. A aferição da condição de "anistiado" a que
se refere o primeiro dos citados diplomas legais se dá com a constatação
do preenchimento dos requisitos nela previsto, e tanto pode ser verificado
por prova documental, tendo sido coligido farto material probatório para
instruir o feito. A eventual confirmação das alegações do autor, de que teria
ocorrido a readmissão de diversos ex-empregados demitidos na mesma época,
em nada contribui para o deslinde da controvérsia, eis que não influi na
verificação da aplicação do regime jurídico das leis supracitadas, vez que a
situação jurídica do "anistiado" é personalíssima. Revelando-se despicienda
e inconsequente a colheita de prova oral, agiu corretamente o Juízo singular
em indeferir a diligência (fl. 428), forte no artigo 370, parágrafo único,
do CPC/15. Observa-se, ainda, que, após ter o autor reiterado o pedido
de provas (fls. 429 e 450/451), o magistrado oportunizou ao postulante
que indicasse justificadamente os fatos 1 controvertidos que pretendesse
esclarecer pela realização de audiência (fls. 453 e 481), motivo pelo qual
veio a ser reconhecida a preclusão em primeira instância (fl. 488). Inviável,
portanto, o reconhecimento de cerceamento de defesa ou qualquer nulidade
processual. 3. As teses aventadas pelo recorrente não infirmam as conclusões
da sentença impugnada quanto à consumação da prescrição. Primeiramente,
é nítido que a presente demanda não é de natureza puramente declaratória,
a qual seria imprescritível, vez que não existe, a rigor, uma pretensão
deduzida em juízo, mas, tão somente, postulação para obtenção de certeza
jurídica sobre a existência ou inexistência de determinada relação jurídica
ou da falsidade ou autenticidade de um documento. Cuida-se, aqui, de uma
postulação essencialmente condenatória - eis que visa impor obrigações
de fazer, consistente na reintegração do autor aos quadros funcionais da
requerida, e de pagar os vencimentos que entende devidos -, a qual pressupõe,
naturalmente, um pronunciamento declaratório sobre a existência do direito
litigioso. Nesse sentido, a célebre lição de Agnelo Amorim Filho (in: Critério
científico para distinguir a prescrição da decadência e para identificar
as ações imprescritíveis. Revista de Direito Processual Civil. São Paulo,
v. 3º, p. 95-132, jan./jun. 1961). 4. Certo é que o autor nunca foi servidor
público efetivo vinculado a qualquer das entidades federais que constam
do polo passivo da demanda. Constituiu, tão somente, relação de emprego,
regida pela Consolidação das Leis do Trabalho, com a Petroflex Indústria e
Comércio S.A. (em 21/08/1986), cuja personalidade jurídica era de direito
privado, de forma que sua situação jurídica não se transmudou com o advento
da Constituição Federal de 1988. De se notar, ainda, que mesmo que ele fosse
servidor público efetivo, não estaria abrangido pelo disposto no artigo 19 do
ADCT, eis que sua admissão se deu em 1986. Assim, embora tenha sido comprovado
que o autor laborou em período contínuo entre 1986 e 1997, ele não foi atingido
pela regra de transição que criou estabilidade para os servidores públicos,
já que sequer foi admitido como servidor, mas, tão somente, como empregado
de uma sociedade empresária privada. Assim, estando sujeito tão somente à
disciplina trabalhista, não se lhe aplica o regramento jurídico constitucional
previsto em favor dos servidores públicos. Por sua vez, para que se cogitasse
da aplicação das Leis nºs 8.878/94 e 10.790/03, seria preciso que a situação
profissional do autor se enquadrasse nos escopos temporais da lei, como bem
pontuou o Juízo a quo. 5. Na sequência, o apelante afiança que, em existindo
prazo prescricional, ele teria permanecido suspenso enquanto pendente a criação
de "comissão reintegratória", referindo à Comissão Especial Interministerial -
CEI, a que se referia o Decreto nº 6.077/07. Oportuno destacar que esse ato
do Poder Executivo foi precedido dos Decretos nºs 1.498/95, 1.499/95, 3.363/00
e 5.115/04, os quais criaram Comissões Especiais destinadas a revisar os atos
de concessão de anistia com base na Lei nº 8.878/94. Percebe-se, então, que a
aplicabilidade de tais diplomas normativos ficava condicionada à verificação,
in concreto, da condição de anistiado, ou, ao menos, a prévia apreciação,
pela Administração Pública, de requerimento por parte de interessado que
afirmasse tal condição. Assim, tendo em vista que nem em tese a situação
jurídica do autor se subsume àquela prevista na lei de regência, não pode
se cogitar de que o direito de ação que pretendesse exercer para discutir,
no Poder Judiciário, a condição de anistiado, teria tido o prazo para o
seu exercício impactado pela edição dos referidos decretos. 6. Ademais,
forçoso é concluir que o regramento da prescrição do Código Civil, destinado
à regular as relações privadas, sofre derrogações do direito público, e,
existe diploma legal específico que trata da prescrição das pretensões em
face do Poder Público, qual seja, o 2 Decreto nº 20.910/32. Na hipótese,
o autor alude à normas de suspensão do prazo prescricional incidentes
para relações envolvendo negócios jurídicos de direito privado, as quais,
à toda evidência, não se aplicam à espécie. 7. Ante o exposto, conclui-se
que a sentença não está a merecer qualquer reparo, motivo pelo qual se nega
provimento à apelação interposta. Em observância ao artigo 85, § 11, do CPC,
os honorários recursais são fixados em 1% (um por cento) sobre o valor da
causa, mas sua exigibilidade permanece suspensa em razão da gratuidade de
justiça deferida (artigo 98, § 3º, do CPC).
Ementa
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RECONHECIMENTO DA CONDIÇÃO DE
"ANISTIADO". EMPREGADO DISPENSADO DURANTE O GOVERNO COLLOR. ARTIGO 19 DO
ADCT. LEI Nº 8.878/94. LEI Nº 10.790/03. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO
DE ANISTIADO. EMPREGADO DE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO. INEXISTÊNCIA
DE CERCEAMENTO DE DEFESA. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DO DIREITO. RECURSO
DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta por ANTÔNIO CARLOS JATOBÁ nos
autos da ação ordinária por ele proposta em face da PETRÓLEO BRASILEIRO S.A. -
PETROBRÁS, da UNIÃO FEDERAL e de ARLANXEO BRASIL S/A, objetivando a declaração
de nulidade do ato de demissão do autor, por inobservância ao artigo 19 do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), bem assim a condenação
ao pagamento das vantagens em caráter retroativo. Alternativamente, requer sua
reintegração funcional com base nas normas coletivas de trabalho editadas desde
2005 e ratificados nos atos subsequentes, cumulado com pedido de condenação
solidária dos réus no pagamento de salários vencidos e vincendos, inclusive
férias acrescidas de terço constitucional, décimo terceiro a partir de 2005
e de condenação solidária dos réus no pagamento de quinhentos salários
mínimos a título de danos morais. 2. Inicialmente, aventa a parte autora
nulidade do feito julgado por cerceamento de defesa, isto é, por violação
às garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da
ampla defesa, ao argumento de que há necessidade de produção de prova oral,
consistente em colheita dos depoimentos pessoais dos representantes das
pessoas jurídicas rés e de declarações de testemunhas. Ocorre que a questão
jurídica controvertida nos autos é essencialmente de direito, vez que seu
ponto nevrálgico não diz respeito às circunstâncias ou razões da demissão
do autor, mas sim à incidência ou não do regime jurídico estatuído pelas
Lei nºs 8.878/94 e 10.790/03. A aferição da condição de "anistiado" a que
se refere o primeiro dos citados diplomas legais se dá com a constatação
do preenchimento dos requisitos nela previsto, e tanto pode ser verificado
por prova documental, tendo sido coligido farto material probatório para
instruir o feito. A eventual confirmação das alegações do autor, de que teria
ocorrido a readmissão de diversos ex-empregados demitidos na mesma época,
em nada contribui para o deslinde da controvérsia, eis que não influi na
verificação da aplicação do regime jurídico das leis supracitadas, vez que a
situação jurídica do "anistiado" é personalíssima. Revelando-se despicienda
e inconsequente a colheita de prova oral, agiu corretamente o Juízo singular
em indeferir a diligência (fl. 428), forte no artigo 370, parágrafo único,
do CPC/15. Observa-se, ainda, que, após ter o autor reiterado o pedido
de provas (fls. 429 e 450/451), o magistrado oportunizou ao postulante
que indicasse justificadamente os fatos 1 controvertidos que pretendesse
esclarecer pela realização de audiência (fls. 453 e 481), motivo pelo qual
veio a ser reconhecida a preclusão em primeira instância (fl. 488). Inviável,
portanto, o reconhecimento de cerceamento de defesa ou qualquer nulidade
processual. 3. As teses aventadas pelo recorrente não infirmam as conclusões
da sentença impugnada quanto à consumação da prescrição. Primeiramente,
é nítido que a presente demanda não é de natureza puramente declaratória,
a qual seria imprescritível, vez que não existe, a rigor, uma pretensão
deduzida em juízo, mas, tão somente, postulação para obtenção de certeza
jurídica sobre a existência ou inexistência de determinada relação jurídica
ou da falsidade ou autenticidade de um documento. Cuida-se, aqui, de uma
postulação essencialmente condenatória - eis que visa impor obrigações
de fazer, consistente na reintegração do autor aos quadros funcionais da
requerida, e de pagar os vencimentos que entende devidos -, a qual pressupõe,
naturalmente, um pronunciamento declaratório sobre a existência do direito
litigioso. Nesse sentido, a célebre lição de Agnelo Amorim Filho (in: Critério
científico para distinguir a prescrição da decadência e para identificar
as ações imprescritíveis. Revista de Direito Processual Civil. São Paulo,
v. 3º, p. 95-132, jan./jun. 1961). 4. Certo é que o autor nunca foi servidor
público efetivo vinculado a qualquer das entidades federais que constam
do polo passivo da demanda. Constituiu, tão somente, relação de emprego,
regida pela Consolidação das Leis do Trabalho, com a Petroflex Indústria e
Comércio S.A. (em 21/08/1986), cuja personalidade jurídica era de direito
privado, de forma que sua situação jurídica não se transmudou com o advento
da Constituição Federal de 1988. De se notar, ainda, que mesmo que ele fosse
servidor público efetivo, não estaria abrangido pelo disposto no artigo 19 do
ADCT, eis que sua admissão se deu em 1986. Assim, embora tenha sido comprovado
que o autor laborou em período contínuo entre 1986 e 1997, ele não foi atingido
pela regra de transição que criou estabilidade para os servidores públicos,
já que sequer foi admitido como servidor, mas, tão somente, como empregado
de uma sociedade empresária privada. Assim, estando sujeito tão somente à
disciplina trabalhista, não se lhe aplica o regramento jurídico constitucional
previsto em favor dos servidores públicos. Por sua vez, para que se cogitasse
da aplicação das Leis nºs 8.878/94 e 10.790/03, seria preciso que a situação
profissional do autor se enquadrasse nos escopos temporais da lei, como bem
pontuou o Juízo a quo. 5. Na sequência, o apelante afiança que, em existindo
prazo prescricional, ele teria permanecido suspenso enquanto pendente a criação
de "comissão reintegratória", referindo à Comissão Especial Interministerial -
CEI, a que se referia o Decreto nº 6.077/07. Oportuno destacar que esse ato
do Poder Executivo foi precedido dos Decretos nºs 1.498/95, 1.499/95, 3.363/00
e 5.115/04, os quais criaram Comissões Especiais destinadas a revisar os atos
de concessão de anistia com base na Lei nº 8.878/94. Percebe-se, então, que a
aplicabilidade de tais diplomas normativos ficava condicionada à verificação,
in concreto, da condição de anistiado, ou, ao menos, a prévia apreciação,
pela Administração Pública, de requerimento por parte de interessado que
afirmasse tal condição. Assim, tendo em vista que nem em tese a situação
jurídica do autor se subsume àquela prevista na lei de regência, não pode
se cogitar de que o direito de ação que pretendesse exercer para discutir,
no Poder Judiciário, a condição de anistiado, teria tido o prazo para o
seu exercício impactado pela edição dos referidos decretos. 6. Ademais,
forçoso é concluir que o regramento da prescrição do Código Civil, destinado
à regular as relações privadas, sofre derrogações do direito público, e,
existe diploma legal específico que trata da prescrição das pretensões em
face do Poder Público, qual seja, o 2 Decreto nº 20.910/32. Na hipótese,
o autor alude à normas de suspensão do prazo prescricional incidentes
para relações envolvendo negócios jurídicos de direito privado, as quais,
à toda evidência, não se aplicam à espécie. 7. Ante o exposto, conclui-se
que a sentença não está a merecer qualquer reparo, motivo pelo qual se nega
provimento à apelação interposta. Em observância ao artigo 85, § 11, do CPC,
os honorários recursais são fixados em 1% (um por cento) sobre o valor da
causa, mas sua exigibilidade permanece suspensa em razão da gratuidade de
justiça deferida (artigo 98, § 3º, do CPC).
Data do Julgamento
:
28/09/2018
Data da Publicação
:
03/10/2018
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
POUL ERIK DYRLUND
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
POUL ERIK DYRLUND
Observações
:
2º RECURSO
Mostrar discussão