TRF2 0049878-89.2018.4.02.5101 00498788920184025101
DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. MULTA
IMPOSTA PELA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - ANS. CONTRATO ANTERIOR
À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.656/98. QUESTIONAMENTO ACERCA DA APLICABILIDADE
DA LEI Nº 9.656/98. DIPLOMA LEGAL APLICÁVEL ÀS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS
COMETIDAS APÓS A SUA VIGÊNCIA, AINDA QUE REFERENTE A CONTRATOS A ELA
ANTERIORES. PODER DE POLÍCIA DA ANS. ABRANGÊNCIA RESTRITA DO ACÓRDÃO DO
STF NA ADI Nº 1931/DF. LEGALIDADE DA PENA APLICADA. PROPORCIONALIDADE
E RAZOABILIDADE DA PENA. FUNÇÕES PUNITIVA E PEDAGÓGICA. NEGATIVA
DE COBERTURA COMPROVADA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA DE MULTA PELA PENA DE
ADVERTÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação
interposta pela SUL AMÉRICA SAÚDE COMPANHIA DE SEGURO, tendo por objeto a
sentença de fls. 346/349 nos autos dos embargos à execução por ela proposta em
face da AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - ANS, objetivando a extinção
da Execução Fiscal nº 0021748-94.2015.4.02.5101. 2. Trata-se de apelação
interposta pela SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE, tendo por objeto a
sentença de fls. 387/932 nos autos dos embargos à execução por ela proposta em
face da AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - ANS, objetivando invalidação
do auto de infração que lhe impôs multa administrativa, com a consequente
extinção da Execução Fiscal nº 0097671-92.2016.4.02.5101, ou, subsidiariamente,
a substituição da pena de multa pela de advertência. 3. Primeiramente,
a Apelante sustenta que a Lei nº 9.656/98 não é aplicável aos contratos
celebrados em data anterior ao início de vigência da lei, concluindo,
na sequência, que a ANS não poderia autuar as Operadoras, em casos que se
debrucem sobre contratos celebrados em data anterior à lei e, por livre
escolha dos beneficiários, não adaptados. O argumento não resiste a uma
perfunctória compreensão do regime jurídico criado pela Lei nº 9.656/98. Esse
diploma legal, de 03 de junho de 1998, pretende não somente disciplinar as
relações jurídicas estabelecidas entre as operadoras de planos de saúde e
os consumidores - regidas essencialmente pelo direito privado contratual -,
mas também as relações jurídicas entre aquelas e o Estado, aqui presentado
por uma autarquia em regime especial, a ANS, criada pela Lei nº 9.961/00 -
e que são, necessariamente, de direito público administrativo, por estarem
inseridas no escopo da atividade regulatória do Estado, a ele incumbida
pelo artigo 174 da Constituição Federal. É dizer, em outras palavras, que o
conteúdo normativo da lei se presta 1 não somente a balizar o exercício da
autonomia contratual no âmbito dos seguros de saúde, mas também a disciplinar
as condutas das próprias seguradoras enquanto agentes econômicos de um setor
regulado. Disso se conclui que, embora algumas normas da Lei nº 9.656/98 não
possam retroagir para atingir avenças celebradas anteriormente à vigência,
o que vulneraria a autonomia da vontade, como, aliás, reconhece o próprio
artigo 35, caput, desse diploma legal, outras delas, por constituírem
previsões legais para autorizar o exercício do poder de polícia pela
agência reguladora, se aplicam a quaisquer transgressões perpetradas após
a sua vigência, ainda que envolvendo um contrato anterior à lei, o que vem
expresso no seu artigo 25. Assim, o artigo 35 consagra uma regra geral para as
situações que envolvam unicamente os aspectos internos da relação contratual
de plano de assistência à saúde, e, em relação a estas, somente se aplicará a
Lei nº 9.656/98 para os contratos celebrados posteriormente à sua vigência,
enquanto que o artigo 25 constitui uma regra de polícia administrativa, e,
portanto, se aplica a qualquer relação contratual de plano de assistência
à saúde, ainda que baseada em contrato anterior e não adaptado, desde que
em relação à infrações administrativas cometidas posteriormente, vez que a
lei punitiva não pode retroagir. 4. Malgrado a redação da suma do julgado
na Ação Direta de Inconstitucionalidade 1931/DF possa levar à equivocada
conclusão seria afastada a incidência da Lei nº 9.656/98 para todo e
qualquer contrato celebrado anteriormente à sua vigência, deve-se ter em
mente que a matéria levada à julgamento para a Suprema Corte dizia respeito
unicamente à constitucionalidade de dispositivos legais que incidiam sobre
a formação e os caracteres da relação jurídica contratual, em seu aspecto
intrínseco (interna corporis), não tendo sido discutida pela Corte, em nenhum
momento, qualquer norma da Lei nº 9.656/98 atinente ao exercício do poder de
polícia da agência reguladora competente. Em relação à tais normas, como é
o caso do supracitado artigo 25, portanto, permanece intacta a presunção de
constitucionalidade. 5. No mérito dos embargos à execução, que a embargante
aduz a inexistência de infração administrativa, pelo fato de que o contrato
celebrado não contempla a cobertura pretendida pela beneficiária que fez
a reclamação administrativa. A afirmação é insustentável, uma vez que,
o exame "PET SCAN" e estudo de corpo inteiro com glicose e marcado com
flúor 18 FDG estão enquadrados no escopo dos procedimentos efetuados com
medicina nuclear, excluídos apenas os que utilizam Tálio ou Gálio, previstos
na Cláusula 7.2.2.1 do contrato celebrado. E observe- se que aqui não se
trata de aplicar interpretação ampliativa a cláusula contratual, uma vez
que sua própria redação é suficientemente abrangente e exclui expressamente
algumas categorias, que são os exames que utilizem os elementos químicos
supracitados. Dito de outro modo, o código linguístico da norma contratual
admite interpretação ampla, sem que haja desnaturação do contrato de seguro,
uma vez que a própria linguagem nele utilizada é plurissignificativa, dotada
de amplo conteúdo semântico. Acaso quisesse restringir o conteúdo da norma,
incumbiria à própria seguradora listar expressamente as hipóteses de exclusão
ou as exceções àquela cláusula, como o fez com os procedimentos utilizadores
de Tálio ou Gálio. Ao se valer de uma expressão abrangente como "procedimentos
efetuados com medicina nuclear", é inequívoco que está abrangendo, por exemplo,
os exames requeridos pela beneficiária do Plano. E, como bem observado pelo
Juízo a quo, não há qualquer cláusula contratual que restrinja ou exclua os
procedimentos requeridos pela usuária, os quais se entendem cobertos pelo Plano
em razão da previsão da Cláusula 7.2.2.1. 6. Tampouco prospera a afirmação de
irrazoabilidade e desproporcionalidade da sanção aplicada, tendo em vista que
o valor de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) está expressamente 2 cominado
no artigo 78 da Resolução Normativa nº 124/2006 da ANS, e possui um caráter
dúplice, pedagógico ou dissuasório, e também punitivo ou repressivo, não
cabendo ao Poder Judiciário substituir-se ao administrador público, mormente a
entidade responsável pela regulação do setor econômico, com fito de transmudar
a pena pecuniária numa pena de advertência. 7. Negado provimento ao recurso.
Ementa
DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. MULTA
IMPOSTA PELA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - ANS. CONTRATO ANTERIOR
À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.656/98. QUESTIONAMENTO ACERCA DA APLICABILIDADE
DA LEI Nº 9.656/98. DIPLOMA LEGAL APLICÁVEL ÀS INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS
COMETIDAS APÓS A SUA VIGÊNCIA, AINDA QUE REFERENTE A CONTRATOS A ELA
ANTERIORES. PODER DE POLÍCIA DA ANS. ABRANGÊNCIA RESTRITA DO ACÓRDÃO DO
STF NA ADI Nº 1931/DF. LEGALIDADE DA PENA APLICADA. PROPORCIONALIDADE
E RAZOABILIDADE DA PENA. FUNÇÕES PUNITIVA E PEDAGÓGICA. NEGATIVA
DE COBERTURA COMPROVADA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA DE MULTA PELA PENA DE
ADVERTÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação
interposta pela SUL AMÉRICA SAÚDE COMPANHIA DE SEGURO, tendo por objeto a
sentença de fls. 346/349 nos autos dos embargos à execução por ela proposta em
face da AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - ANS, objetivando a extinção
da Execução Fiscal nº 0021748-94.2015.4.02.5101. 2. Trata-se de apelação
interposta pela SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE, tendo por objeto a
sentença de fls. 387/932 nos autos dos embargos à execução por ela proposta em
face da AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - ANS, objetivando invalidação
do auto de infração que lhe impôs multa administrativa, com a consequente
extinção da Execução Fiscal nº 0097671-92.2016.4.02.5101, ou, subsidiariamente,
a substituição da pena de multa pela de advertência. 3. Primeiramente,
a Apelante sustenta que a Lei nº 9.656/98 não é aplicável aos contratos
celebrados em data anterior ao início de vigência da lei, concluindo,
na sequência, que a ANS não poderia autuar as Operadoras, em casos que se
debrucem sobre contratos celebrados em data anterior à lei e, por livre
escolha dos beneficiários, não adaptados. O argumento não resiste a uma
perfunctória compreensão do regime jurídico criado pela Lei nº 9.656/98. Esse
diploma legal, de 03 de junho de 1998, pretende não somente disciplinar as
relações jurídicas estabelecidas entre as operadoras de planos de saúde e
os consumidores - regidas essencialmente pelo direito privado contratual -,
mas também as relações jurídicas entre aquelas e o Estado, aqui presentado
por uma autarquia em regime especial, a ANS, criada pela Lei nº 9.961/00 -
e que são, necessariamente, de direito público administrativo, por estarem
inseridas no escopo da atividade regulatória do Estado, a ele incumbida
pelo artigo 174 da Constituição Federal. É dizer, em outras palavras, que o
conteúdo normativo da lei se presta 1 não somente a balizar o exercício da
autonomia contratual no âmbito dos seguros de saúde, mas também a disciplinar
as condutas das próprias seguradoras enquanto agentes econômicos de um setor
regulado. Disso se conclui que, embora algumas normas da Lei nº 9.656/98 não
possam retroagir para atingir avenças celebradas anteriormente à vigência,
o que vulneraria a autonomia da vontade, como, aliás, reconhece o próprio
artigo 35, caput, desse diploma legal, outras delas, por constituírem
previsões legais para autorizar o exercício do poder de polícia pela
agência reguladora, se aplicam a quaisquer transgressões perpetradas após
a sua vigência, ainda que envolvendo um contrato anterior à lei, o que vem
expresso no seu artigo 25. Assim, o artigo 35 consagra uma regra geral para as
situações que envolvam unicamente os aspectos internos da relação contratual
de plano de assistência à saúde, e, em relação a estas, somente se aplicará a
Lei nº 9.656/98 para os contratos celebrados posteriormente à sua vigência,
enquanto que o artigo 25 constitui uma regra de polícia administrativa, e,
portanto, se aplica a qualquer relação contratual de plano de assistência
à saúde, ainda que baseada em contrato anterior e não adaptado, desde que
em relação à infrações administrativas cometidas posteriormente, vez que a
lei punitiva não pode retroagir. 4. Malgrado a redação da suma do julgado
na Ação Direta de Inconstitucionalidade 1931/DF possa levar à equivocada
conclusão seria afastada a incidência da Lei nº 9.656/98 para todo e
qualquer contrato celebrado anteriormente à sua vigência, deve-se ter em
mente que a matéria levada à julgamento para a Suprema Corte dizia respeito
unicamente à constitucionalidade de dispositivos legais que incidiam sobre
a formação e os caracteres da relação jurídica contratual, em seu aspecto
intrínseco (interna corporis), não tendo sido discutida pela Corte, em nenhum
momento, qualquer norma da Lei nº 9.656/98 atinente ao exercício do poder de
polícia da agência reguladora competente. Em relação à tais normas, como é
o caso do supracitado artigo 25, portanto, permanece intacta a presunção de
constitucionalidade. 5. No mérito dos embargos à execução, que a embargante
aduz a inexistência de infração administrativa, pelo fato de que o contrato
celebrado não contempla a cobertura pretendida pela beneficiária que fez
a reclamação administrativa. A afirmação é insustentável, uma vez que,
o exame "PET SCAN" e estudo de corpo inteiro com glicose e marcado com
flúor 18 FDG estão enquadrados no escopo dos procedimentos efetuados com
medicina nuclear, excluídos apenas os que utilizam Tálio ou Gálio, previstos
na Cláusula 7.2.2.1 do contrato celebrado. E observe- se que aqui não se
trata de aplicar interpretação ampliativa a cláusula contratual, uma vez
que sua própria redação é suficientemente abrangente e exclui expressamente
algumas categorias, que são os exames que utilizem os elementos químicos
supracitados. Dito de outro modo, o código linguístico da norma contratual
admite interpretação ampla, sem que haja desnaturação do contrato de seguro,
uma vez que a própria linguagem nele utilizada é plurissignificativa, dotada
de amplo conteúdo semântico. Acaso quisesse restringir o conteúdo da norma,
incumbiria à própria seguradora listar expressamente as hipóteses de exclusão
ou as exceções àquela cláusula, como o fez com os procedimentos utilizadores
de Tálio ou Gálio. Ao se valer de uma expressão abrangente como "procedimentos
efetuados com medicina nuclear", é inequívoco que está abrangendo, por exemplo,
os exames requeridos pela beneficiária do Plano. E, como bem observado pelo
Juízo a quo, não há qualquer cláusula contratual que restrinja ou exclua os
procedimentos requeridos pela usuária, os quais se entendem cobertos pelo Plano
em razão da previsão da Cláusula 7.2.2.1. 6. Tampouco prospera a afirmação de
irrazoabilidade e desproporcionalidade da sanção aplicada, tendo em vista que
o valor de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) está expressamente 2 cominado
no artigo 78 da Resolução Normativa nº 124/2006 da ANS, e possui um caráter
dúplice, pedagógico ou dissuasório, e também punitivo ou repressivo, não
cabendo ao Poder Judiciário substituir-se ao administrador público, mormente a
entidade responsável pela regulação do setor econômico, com fito de transmudar
a pena pecuniária numa pena de advertência. 7. Negado provimento ao recurso.
Data do Julgamento
:
15/02/2019
Data da Publicação
:
20/02/2019
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
POUL ERIK DYRLUND
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
POUL ERIK DYRLUND
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