TRF2 0067038-02.1996.4.02.5101 00670380219964025101
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA ORDEM TRIBUTÁRIA. PRESCRIÇÃO
PELA PENA EM CONCRETO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. FALSIFICAÇÃO
E USO DE DOCUMENTO PÚBLICO. DESPACHANTES ADUANEIROS. PRELIMINARES
AFASTADAS. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADOS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA BASE
DESPROPORCIONAL. CONTINUIDADE DELITIVA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I -
À luz do princípio do livre convencimento motivado, previsto no art. 155,
do Código de Processo Penal, o juiz é livre para formar seu convencimento,
o que significa dizer que pode o magistrado indeferir provas e diligências
consideradas desnecessárias ou protelatórias para deslinde da controvérsia,
desde que fundamente sua decisão. II - Dentre os princípios constitucionais
que regem a relação processual está o da igualdade entre as partes, o qual
não afasta as prerrogativas de partes em circunstâncias especiais, tais
como: Ministério Público, Defensoria Pública e Fazenda Pública, abrangendo
também as autarquias e as fundações públicas. III - O art. 2º e parágrafo
único do Código Penal e o art. 5º, XXXVI, XL e LIV do texto constitucional,
ao tratarem do tema da aplicabilidade da lei penal no tempo, enunciam os
princípios da irretroatividade da lei mais severa e a retroatividade da lei
mais favorável, de modo que o propalado art. 366 do Código de Processo Penal,
na redação dada pela Lei 9.271-96, exatamente por conter norma material mais
severa, pela suspensão do prazo prescricional, jamais poderá ser aplicado
aos crimes ocorridos anteriormente à sua vigência. IV - É válida a citação
por edital determinada pelo juízo a quo após esgotados todos os meios para a
busca do acusado, já que inexistente nos qualquer outro endereço do réu, bem
como quaisquer outros elementos que pudessem auxiliar na sua localização pelo
juízo. V - O objetivo do ato previsto no artigo 542 do Código de Processo Penal
evidentemente não é o da repetição da instrução criminal, mas sim possibilitar
aos réus que se pronunciem acerca da legitimidade das reproduções constantes
nos autos do processo. VI - Na emendatio libelli, o magistrado, ao proferir
a sentença, apenas procede à adequação da capitulação jurídica aos fatos
narrados na peça inicial, não havendo qualquer prejuízo à defesa, uma vez que
o réu se defende dos fatos imputados na denúncia e não da classificação a eles
atribuída. VII - Não há que falar na existência de bis in idem em razão da
existência de outro feito, se o objeto da presente ação é mais amplo e o atuar
do réu é diverso. VIII - Não há previsão legal no sentido de ser obrigatória a
presença do réu ou de seu defensor no interrogatório do corréu. Ao contrário,
o interrogatório separado dos réus encontra amparo no art. 191 do Código de
Processo Penal, o qual dispõe expressamente que havendo mais de um acusado,
serão interrogados separadamente". IX - A nulidade decorrente da colidência
de defesas pressupõe a demonstração de que houve, entre corréus defendidos
pelo mesmo patrono, apresentação de teses conflitantes, ou seja, no caso
de um réu atribuir a outro a prática criminosa que só pode ser imputada a
um único acusado, de maneira que a condenação de um ensejará a absolvição
do outro. X - Em obediência ao princípio "pas de nullité sans grief", que
vigora em nosso processo penal (art. 563 do Código de Processo Penal), não
se declara nulidade de ato se dele não resulta prejuízo para qualquer das
partes. XI - A nomeação de defensor dativo, em razão da ausência de advogado
constituído, por si só, não permite retirar a idoneidade e a competência de
tal profissional relativamente ao mister que exerce mediante compromisso e sob
as penas da lei. XII - Não há nulidade em cotejar as provas dos autos com os
elementos de informação colhidos no inquérito, os quais existem nos autos antes
mesmo do recebimento da denúncia e estão à disposição da defesa para análise
e submissão ao contraditório diferido. XIII - Se a atuação do magistrado
se dá em estrita observância ao princípio constitucional da motivação dos
atos jurisdicionais (artigo 93, inciso IX, da Constituição da República),
declinando os fundamentos que o levaram a concluir pelo decreto condenatório,
deve ser afastada a alegação de ausência de imparcialidade. XIV - Reconhecida
a prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa, em relação ao
delito previsto no artigo 1º, I, da Lei 8137-90, ficam prejudicadas todas as
teses recursais que lhe dizem respeito, nos termos do Enunciado n.º 241 da
Súmula do extinto Tribunal Federal de Recursos, aplicado por analogia, que
diz que "a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva
prejudica a apreciação do mérito da apelação criminal." XV - Comprovadas
a materialidade e a autoria assim como o dolo, consubstanciado na vontade
livre e consciente de, na condição de despachantes aduaneiros, servirem de
intermediadores entre auditor fiscal e as sociedades empresárias beneficiadas
com esquema criminoso consistente na simulação de exportações inexistentes
de mercadorias, possibilitando a sonegação de impostos e a celebração de
contratos de câmbio, com base em documentos falsos, impõe-se a manutenção
da condenação nas penas do artigo 297, § 1º, do Código Penal. XVI - Embora
o inquérito policial seja pautado pelo sistema inquisitivo, em que não
vigora a garantia processual do contraditório, certo é que as provas nele
produzidas sempre podem ser questionadas na fase judicial, ocasião em que é
facultado à defesa trazer aos autos todas as evidências de que disponha para
desconstituir os elementos incriminadores colhidos no curso das investigações,
defendendo-se de forma ampla. XVII - Comprovadas a materialidade e autoria,
assim como o dolo de utilizar despachos de exportação fraudulentos, com o fim
de sonegar tributo e celebrar contratos de câmbio, impõe-se a manutenção da
condenação nas penas do artigo 304 do Código Penal. XVIII - Não constituindo
o falsum mera etapa do delito tributário, mas sim crime autônomo, não há que
falar em aplicação do princípio da consunção. XIX - No que tange à dosimetria
da pena, ainda que mantida a valoração negativa das circunstâncias judiciais
consideradas na sentença, se a pena base fixada revela-se desproporcional,
impõe-se a sua redução para patamar que seja suficiente para prevenção e
repressão do delito. XX - Conforme orientação doutrinária e jurisprudencial,
a exasperação da pena em razão da continuidade delitiva se dá de acordo
com número de vezes em que o crime é praticado. XXI- Recurso dos réus
parcialmente provido.
Ementa
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA ORDEM TRIBUTÁRIA. PRESCRIÇÃO
PELA PENA EM CONCRETO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. FALSIFICAÇÃO
E USO DE DOCUMENTO PÚBLICO. DESPACHANTES ADUANEIROS. PRELIMINARES
AFASTADAS. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADOS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA BASE
DESPROPORCIONAL. CONTINUIDADE DELITIVA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I -
À luz do princípio do livre convencimento motivado, previsto no art. 155,
do Código de Processo Penal, o juiz é livre para formar seu convencimento,
o que significa dizer que pode o magistrado indeferir provas e diligências
consideradas desnecessárias ou protelatórias para deslinde da controvérsia,
desde que fundamente sua decisão. II - Dentre os princípios constitucionais
que regem a relação processual está o da igualdade entre as partes, o qual
não afasta as prerrogativas de partes em circunstâncias especiais, tais
como: Ministério Público, Defensoria Pública e Fazenda Pública, abrangendo
também as autarquias e as fundações públicas. III - O art. 2º e parágrafo
único do Código Penal e o art. 5º, XXXVI, XL e LIV do texto constitucional,
ao tratarem do tema da aplicabilidade da lei penal no tempo, enunciam os
princípios da irretroatividade da lei mais severa e a retroatividade da lei
mais favorável, de modo que o propalado art. 366 do Código de Processo Penal,
na redação dada pela Lei 9.271-96, exatamente por conter norma material mais
severa, pela suspensão do prazo prescricional, jamais poderá ser aplicado
aos crimes ocorridos anteriormente à sua vigência. IV - É válida a citação
por edital determinada pelo juízo a quo após esgotados todos os meios para a
busca do acusado, já que inexistente nos qualquer outro endereço do réu, bem
como quaisquer outros elementos que pudessem auxiliar na sua localização pelo
juízo. V - O objetivo do ato previsto no artigo 542 do Código de Processo Penal
evidentemente não é o da repetição da instrução criminal, mas sim possibilitar
aos réus que se pronunciem acerca da legitimidade das reproduções constantes
nos autos do processo. VI - Na emendatio libelli, o magistrado, ao proferir
a sentença, apenas procede à adequação da capitulação jurídica aos fatos
narrados na peça inicial, não havendo qualquer prejuízo à defesa, uma vez que
o réu se defende dos fatos imputados na denúncia e não da classificação a eles
atribuída. VII - Não há que falar na existência de bis in idem em razão da
existência de outro feito, se o objeto da presente ação é mais amplo e o atuar
do réu é diverso. VIII - Não há previsão legal no sentido de ser obrigatória a
presença do réu ou de seu defensor no interrogatório do corréu. Ao contrário,
o interrogatório separado dos réus encontra amparo no art. 191 do Código de
Processo Penal, o qual dispõe expressamente que havendo mais de um acusado,
serão interrogados separadamente". IX - A nulidade decorrente da colidência
de defesas pressupõe a demonstração de que houve, entre corréus defendidos
pelo mesmo patrono, apresentação de teses conflitantes, ou seja, no caso
de um réu atribuir a outro a prática criminosa que só pode ser imputada a
um único acusado, de maneira que a condenação de um ensejará a absolvição
do outro. X - Em obediência ao princípio "pas de nullité sans grief", que
vigora em nosso processo penal (art. 563 do Código de Processo Penal), não
se declara nulidade de ato se dele não resulta prejuízo para qualquer das
partes. XI - A nomeação de defensor dativo, em razão da ausência de advogado
constituído, por si só, não permite retirar a idoneidade e a competência de
tal profissional relativamente ao mister que exerce mediante compromisso e sob
as penas da lei. XII - Não há nulidade em cotejar as provas dos autos com os
elementos de informação colhidos no inquérito, os quais existem nos autos antes
mesmo do recebimento da denúncia e estão à disposição da defesa para análise
e submissão ao contraditório diferido. XIII - Se a atuação do magistrado
se dá em estrita observância ao princípio constitucional da motivação dos
atos jurisdicionais (artigo 93, inciso IX, da Constituição da República),
declinando os fundamentos que o levaram a concluir pelo decreto condenatório,
deve ser afastada a alegação de ausência de imparcialidade. XIV - Reconhecida
a prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa, em relação ao
delito previsto no artigo 1º, I, da Lei 8137-90, ficam prejudicadas todas as
teses recursais que lhe dizem respeito, nos termos do Enunciado n.º 241 da
Súmula do extinto Tribunal Federal de Recursos, aplicado por analogia, que
diz que "a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva
prejudica a apreciação do mérito da apelação criminal." XV - Comprovadas
a materialidade e a autoria assim como o dolo, consubstanciado na vontade
livre e consciente de, na condição de despachantes aduaneiros, servirem de
intermediadores entre auditor fiscal e as sociedades empresárias beneficiadas
com esquema criminoso consistente na simulação de exportações inexistentes
de mercadorias, possibilitando a sonegação de impostos e a celebração de
contratos de câmbio, com base em documentos falsos, impõe-se a manutenção
da condenação nas penas do artigo 297, § 1º, do Código Penal. XVI - Embora
o inquérito policial seja pautado pelo sistema inquisitivo, em que não
vigora a garantia processual do contraditório, certo é que as provas nele
produzidas sempre podem ser questionadas na fase judicial, ocasião em que é
facultado à defesa trazer aos autos todas as evidências de que disponha para
desconstituir os elementos incriminadores colhidos no curso das investigações,
defendendo-se de forma ampla. XVII - Comprovadas a materialidade e autoria,
assim como o dolo de utilizar despachos de exportação fraudulentos, com o fim
de sonegar tributo e celebrar contratos de câmbio, impõe-se a manutenção da
condenação nas penas do artigo 304 do Código Penal. XVIII - Não constituindo
o falsum mera etapa do delito tributário, mas sim crime autônomo, não há que
falar em aplicação do princípio da consunção. XIX - No que tange à dosimetria
da pena, ainda que mantida a valoração negativa das circunstâncias judiciais
consideradas na sentença, se a pena base fixada revela-se desproporcional,
impõe-se a sua redução para patamar que seja suficiente para prevenção e
repressão do delito. XX - Conforme orientação doutrinária e jurisprudencial,
a exasperação da pena em razão da continuidade delitiva se dá de acordo
com número de vezes em que o crime é praticado. XXI- Recurso dos réus
parcialmente provido.
Data do Julgamento
:
26/01/2016
Classe/Assunto
:
APELAÇÃO CRIMINAL
Órgão Julgador
:
2ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
ANDRÉ FONTES
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
ANDRÉ FONTES
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