TRF2 0087608-42.2015.4.02.5101 00876084220154025101
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. VÍDEO POTENCIALMENTE OFENSIVO A
ÓRGÃOS E AGENTES PÚBLICOS. RETIRADA DA INTERNET. JUÍZO DE PONDERAÇÃO
ENTRE O DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO E O DIREITO À IMAGEM. MULTA
COMINATÓRIA. EXORBITÂNCIA. REDUÇÃO DO VALOR. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. I
- Trata-se de Apelação Cível em face de sentença que julgou parcialmente
procedente o pedido, para confirmar a decisão liminar que determinou ao réu a
exclusão, no ambiente virtual, d o v í d e o / á u d i o p o s t a d o n o e
n d e r e ç o https://m.youtube.com/watch?feature=youtu.be&v=gQ7x3BWgD8E,
intitulado "Caiu a Máscara do Interventor José Nunes". II - A ação originária
foi motivada por Ofício da Presidência do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª
Região (fl. 10), tendo por objetivo a condenação da Ré a retirar, dos meios
públicos virtuais, − internet −, conteúdo que supostamente veicula
ofensa à imagem do referido órgão do Poder Judiciário e de alguns de seus
membros, bem como de membros do Ministério Público do Trabalho, ao comentar
o processo de intervenção do Sindicato dos Empregados no Comércio do Rio de
Janeiro, denunciando a existência de possível corrupção. III - A liberdade de
expressão não pode jamais constituir (e, de fato, não constitui) autorização
irrestrita para ofender, injuriar, denegrir, difamar e/ou caluniar outrem. Vale
dizer, liberdade de expressão não pode se traduzir em desrespeito aos outros
direitos fundamentais, de modo que a liberdade de expressão encontra limites
no próprio exercício de outros direitos fundamentais, devendo-se, em caso de
conflito, proceder a uma cuidadosa ponderação entre os interesses envolvidos,
observando-se, em todo e qualquer caso, o critério da proporcionalidade
como norteador na busca da solução para o conflito apresentado. IV- Se
é correto afirmar que a prevalência de um direito sobre outro, em casos
de conflito, se determina em razão das peculiaridades do caso concreto,
não menos acertado é reconhecer que situações existem em que o conflito é
apenas aparente, posto que a pretensão de uma das partes envolvidas não se
inclui no âmbito de proteção do direito que evoca, como ocorre em relação
à liberdade de expressão. Nessa trilha, é possível afirmar que a liberdade
de expressão pode − e, em alguns casos, mais precisamente deve −
ser limitada, o que não conduz, contudo, à sua supressão. V- Considerando que
o direito à liberdade de expressão situa-se em um patamar axiológico elevado
na ordem constitucional, em função de sua relevância para a dignidade humana
e a democracia, a restrição a qualquer conteúdo veiculado na rede mundial de
computadores só deve ser feita em situações excepcionalíssimas e justificáveis,
quando, por exemplo, forem ofensivos à imagem das pessoas ou potencialmente
fomentadores de crimes, do ódio, da 1 discriminação e da intolerância,
ou seja, situações que não correspondam ao legítimo exercício do referido
direito. VI - Não se pode olvidar que "silenciando a Constituição quanto ao
regime da internet (rede mundial de computadores), não há como se lhe recusar a
qualificação de território virtual livremente veiculador de ideias e opiniões,
debates, notícias e tudo o mais que signifique plenitude de comunicação" (ADPF
130, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 30/04/2009,
DJe-208 DIVULG 05-11-2009 PUBLIC 06-11-2009 EMENT VOL-02381- 01 PP-00001 RTJ
VOL-00213-01 PP-00020). VII - No entanto, como bem salientado na sentença,
"o que se constata é um diálogo com ilações a respeito de autoridades, sem
especificar ato ou fato ilícito praticado, pelo que entendo que a divulgação
do vídeo atenta contra a imagem do Tribunal e de autoridades. E pior: sem
indicar os eventuais "suspeitos" no TRT e no MPT (...). Impedir a veiculação
de conteúdo que já se mostrou inadequado e desconectado da realidade é medida
extrema e só aplicável em último caso. (...) Trata-se, portanto, de mera
ponderação de direitos constitucionalmente previstos (informação x honra
e imagem) (...). E - diga-se de passagem - sequer há identificação também
dos eventuais beneficiados das ações judiciais questionadas. (...) Neste
caso, a retirada do conteúdo veiculado é medida necessária e suficiente,
devendo-se impedir divulgação de conteúdo que apenas reflete conversas com
dados desconexos e desprovidos de mínima verossimilhança, que poderiam de
alguma forma afetar a imagem da instituição e de seus membros.". VIII -
Registre-se, por oportuno, que não estamos diante de anonimato, haja vista
que, consoante o documento de fl. 08, o áudio em testilha, publicado em
13/06/2015, fora inserido no sítio Youtube pela Chapa 3 Trabalho e Ética,
pertencente ao Sindicato dos Empregados no Comércio do Rio de Janeiro. IX
- De fato, embora não cuide de hipótese de anonimato, no caso trazido à
apreciação deste Órgão Julgador, é possível afirmar, com base nos fundamentos
anteriormente expostos, que a veiculação de vídeos/áudios potencialmente
ofensivos contra órgãos públicos não corresponde ao legítimo exercício do
direito à liberdade de expressão, merecendo ser, por via de consequência,
retirado o vídeo/áudio em questão da rede mundial de computadores, tendo em
vista o acesso irrestrito a tal conteúdo, que continuaria sendo disseminado a
um número indeterminado de pessoas. X - Assim, avaliando o direito reivindicado
à luz do ordenamento constitucional, que, ao mesmo tempo em que prevê que a
manifestação do pensamento, a expressão e a informação, sob qualquer forma,
processo ou veículo, não sofrerão nenhuma restrição (art. 5º, IV, e art. 220
da CRFB/88), também assegura a inviolabilidade à honra, à vida privada e a
proteção à imagem (art. 5º, X, da CRFB/88, conclui-se que, no presente caso,
houve abuso do direito à liberdade de expressão, devendo prevalecer o direito
à honra e à imagem das instituições públicas envolvidas, posto que entes
públicos e seus membros não devem ter sua imagem denegrida por acusações
ofensivas à sua moral sem o mínimo lastro probatório. XI - Na hipótese
dos autos, muito embora a medida de coerção utilizada pelo MM. Juízo a quo
tenha tido o intuito de vencer a resistência da Parte Ré ao cumprimento da
obrigação de fazer que lhe fora imposta, sendo admissível e recomendável,
o valor fixado a título de astreintes (R$ 500,00 - quinhentos reais - por
dia de atraso no cumprimento da decisão judicial) encontra-se dissonante do
critério da proporcionalidade, de observância obrigatória. XII - Assim, tendo
em vista o valor dado à causa (R$ 10.000,00 - dez mil reais), verifica-se que
2 a multa cominatória revela-se excessiva, mostrando-se prudente, portanto,
a sua redução para R$ 100,00 (cem reais) por dia de atraso. XIII - Apelação
parcialmente provida.
Ementa
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. VÍDEO POTENCIALMENTE OFENSIVO A
ÓRGÃOS E AGENTES PÚBLICOS. RETIRADA DA INTERNET. JUÍZO DE PONDERAÇÃO
ENTRE O DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO E O DIREITO À IMAGEM. MULTA
COMINATÓRIA. EXORBITÂNCIA. REDUÇÃO DO VALOR. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. I
- Trata-se de Apelação Cível em face de sentença que julgou parcialmente
procedente o pedido, para confirmar a decisão liminar que determinou ao réu a
exclusão, no ambiente virtual, d o v í d e o / á u d i o p o s t a d o n o e
n d e r e ç o https://m.youtube.com/watch?feature=youtu.be&v=gQ7x3BWgD8E,
intitulado "Caiu a Máscara do Interventor José Nunes". II - A ação originária
foi motivada por Ofício da Presidência do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª
Região (fl. 10), tendo por objetivo a condenação da Ré a retirar, dos meios
públicos virtuais, − internet −, conteúdo que supostamente veicula
ofensa à imagem do referido órgão do Poder Judiciário e de alguns de seus
membros, bem como de membros do Ministério Público do Trabalho, ao comentar
o processo de intervenção do Sindicato dos Empregados no Comércio do Rio de
Janeiro, denunciando a existência de possível corrupção. III - A liberdade de
expressão não pode jamais constituir (e, de fato, não constitui) autorização
irrestrita para ofender, injuriar, denegrir, difamar e/ou caluniar outrem. Vale
dizer, liberdade de expressão não pode se traduzir em desrespeito aos outros
direitos fundamentais, de modo que a liberdade de expressão encontra limites
no próprio exercício de outros direitos fundamentais, devendo-se, em caso de
conflito, proceder a uma cuidadosa ponderação entre os interesses envolvidos,
observando-se, em todo e qualquer caso, o critério da proporcionalidade
como norteador na busca da solução para o conflito apresentado. IV- Se
é correto afirmar que a prevalência de um direito sobre outro, em casos
de conflito, se determina em razão das peculiaridades do caso concreto,
não menos acertado é reconhecer que situações existem em que o conflito é
apenas aparente, posto que a pretensão de uma das partes envolvidas não se
inclui no âmbito de proteção do direito que evoca, como ocorre em relação
à liberdade de expressão. Nessa trilha, é possível afirmar que a liberdade
de expressão pode − e, em alguns casos, mais precisamente deve −
ser limitada, o que não conduz, contudo, à sua supressão. V- Considerando que
o direito à liberdade de expressão situa-se em um patamar axiológico elevado
na ordem constitucional, em função de sua relevância para a dignidade humana
e a democracia, a restrição a qualquer conteúdo veiculado na rede mundial de
computadores só deve ser feita em situações excepcionalíssimas e justificáveis,
quando, por exemplo, forem ofensivos à imagem das pessoas ou potencialmente
fomentadores de crimes, do ódio, da 1 discriminação e da intolerância,
ou seja, situações que não correspondam ao legítimo exercício do referido
direito. VI - Não se pode olvidar que "silenciando a Constituição quanto ao
regime da internet (rede mundial de computadores), não há como se lhe recusar a
qualificação de território virtual livremente veiculador de ideias e opiniões,
debates, notícias e tudo o mais que signifique plenitude de comunicação" (ADPF
130, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 30/04/2009,
DJe-208 DIVULG 05-11-2009 PUBLIC 06-11-2009 EMENT VOL-02381- 01 PP-00001 RTJ
VOL-00213-01 PP-00020). VII - No entanto, como bem salientado na sentença,
"o que se constata é um diálogo com ilações a respeito de autoridades, sem
especificar ato ou fato ilícito praticado, pelo que entendo que a divulgação
do vídeo atenta contra a imagem do Tribunal e de autoridades. E pior: sem
indicar os eventuais "suspeitos" no TRT e no MPT (...). Impedir a veiculação
de conteúdo que já se mostrou inadequado e desconectado da realidade é medida
extrema e só aplicável em último caso. (...) Trata-se, portanto, de mera
ponderação de direitos constitucionalmente previstos (informação x honra
e imagem) (...). E - diga-se de passagem - sequer há identificação também
dos eventuais beneficiados das ações judiciais questionadas. (...) Neste
caso, a retirada do conteúdo veiculado é medida necessária e suficiente,
devendo-se impedir divulgação de conteúdo que apenas reflete conversas com
dados desconexos e desprovidos de mínima verossimilhança, que poderiam de
alguma forma afetar a imagem da instituição e de seus membros.". VIII -
Registre-se, por oportuno, que não estamos diante de anonimato, haja vista
que, consoante o documento de fl. 08, o áudio em testilha, publicado em
13/06/2015, fora inserido no sítio Youtube pela Chapa 3 Trabalho e Ética,
pertencente ao Sindicato dos Empregados no Comércio do Rio de Janeiro. IX
- De fato, embora não cuide de hipótese de anonimato, no caso trazido à
apreciação deste Órgão Julgador, é possível afirmar, com base nos fundamentos
anteriormente expostos, que a veiculação de vídeos/áudios potencialmente
ofensivos contra órgãos públicos não corresponde ao legítimo exercício do
direito à liberdade de expressão, merecendo ser, por via de consequência,
retirado o vídeo/áudio em questão da rede mundial de computadores, tendo em
vista o acesso irrestrito a tal conteúdo, que continuaria sendo disseminado a
um número indeterminado de pessoas. X - Assim, avaliando o direito reivindicado
à luz do ordenamento constitucional, que, ao mesmo tempo em que prevê que a
manifestação do pensamento, a expressão e a informação, sob qualquer forma,
processo ou veículo, não sofrerão nenhuma restrição (art. 5º, IV, e art. 220
da CRFB/88), também assegura a inviolabilidade à honra, à vida privada e a
proteção à imagem (art. 5º, X, da CRFB/88, conclui-se que, no presente caso,
houve abuso do direito à liberdade de expressão, devendo prevalecer o direito
à honra e à imagem das instituições públicas envolvidas, posto que entes
públicos e seus membros não devem ter sua imagem denegrida por acusações
ofensivas à sua moral sem o mínimo lastro probatório. XI - Na hipótese
dos autos, muito embora a medida de coerção utilizada pelo MM. Juízo a quo
tenha tido o intuito de vencer a resistência da Parte Ré ao cumprimento da
obrigação de fazer que lhe fora imposta, sendo admissível e recomendável,
o valor fixado a título de astreintes (R$ 500,00 - quinhentos reais - por
dia de atraso no cumprimento da decisão judicial) encontra-se dissonante do
critério da proporcionalidade, de observância obrigatória. XII - Assim, tendo
em vista o valor dado à causa (R$ 10.000,00 - dez mil reais), verifica-se que
2 a multa cominatória revela-se excessiva, mostrando-se prudente, portanto,
a sua redução para R$ 100,00 (cem reais) por dia de atraso. XIII - Apelação
parcialmente provida.
Data do Julgamento
:
24/08/2017
Data da Publicação
:
29/08/2017
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
REIS FRIEDE
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
REIS FRIEDE
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