TRF2 0090071-59.2012.4.02.5101 00900715920124025101
ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO DE PENSÃO. PARCELAS PAGAS A MAIOR. ERRO
DA ADMINISTRAÇÃO. RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO DE VERBAS RECEBIDAS
INDEVIDAMENTE. POSSIBILIDADE. AUTOTUTELA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. 1. Trata-se
de ação ajuizada em face da UNIÃO FEDERAL, com pedido de antecipação de
tutela, na qual postula que a Ré se abstenha de efetuar qualquer redução
ou desconto em seu benefício de pensão por morte, assim como desconsidere o
montante da dívida apurada a título de ressarcimento ao Erário. Como causa
de pedir sustenta ter recebido comunicação da Ré de que sua pensão seria
corrigida, sendo apurado o débito de R$ 57.581,95 referente aos valores
recebidos de forma indevida, valor esse que será descontado a título de
reposição ao Erário. Aduz que apesar de ter interposto tempestivamente
recurso administrativo, já estão sendo efetuados descontos no valor mensal
de seu benefício, o que viola diversos princípios constitucionais. 2. Agravo
retido da União conhecido e provido e tutela de urgência revogada, conforme
abaixo exposto, por ausência de prova inequívoca da verossimilhança das
alegações autorais. 3. Compulsando a documentação acostada aos autos, noto
que a redução do valor do benefício de pensão recebido pela Autora, bem como
a sua condenação a devolver ao Erário os valores recebidos indevidamente,
ocorreram em razão da constatação, pela União, de que o benefício "não vinha
seguindo o estabelecido pela Orientação Normativa nº 09, de 05/11/2010,
da Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento
e Gestão, a respeito das pensões por morte de que trata o art. 217 da lei nº
10.887/2004" (fl. 69). 4. A redução dos valores recebidos a título de pensão
por morte se deu em decorrência do que restou apurado nos autos do referido
Processo Administrativo nº 25001.012203/2012-10 (fls. 117/118), sendo legítimo
o ato que determinou a adaptação do referido benefício a partir de Abril
de 2012, uma vez que é dever da Administração Pública rever seus próprios
atos, desde que constate serem ilegais ou que apresentem alguma espécie de
vício. Nada mais justo e legítimo, constituindo verdadeiro poder dever da
Administração Pública a sua correção (Súmula nº 473/ STF). 5. O fato descrito
nos autos demonstra erro na aplicação da lei, não gerando para a parte autora
beneficiada, por conseguinte, direito à continuidade da percepção de valor
em contrariedade à lei, posto que a Administração Pública pode utilizar o
seu poder de Autotutela para rever seus próprios atos, com a possibilidade
de anular ou revogar os mesmos, quando viciados. Aplica-se, na espécie,
o entendimento que se consolida nas Súmulas 346 e 473, do Supremo Tribunal
Federal, as quais conferem à Administração Pública o poder de declarar nulos
os seus próprios 1 atos, quando da constatação de ilegalidade dos mesmos, ou
então de revogá-los sob a égide dos critérios de oportunidade e conveniência
do ato. Desta forma, no caso em tela, em razão do princípio da legalidade,
a Administração promove o controle interno de seu ato. 6. Ressalto ainda
que o fato de o pagamento eventualmente indevido ter ocorrido por um longo
período de tempo não gera direito adquirido à sua manutenção, haja vista
o princípio da legalidade que rege a Administração Pública, em especial o
regime jurídico de seus servidores, matéria em relação ao qual não há que se
falar em direito adquirido. 7. Igualmente não há que se falar em prescrição
ou decadência do poder-dever da Administração Pública de rever seus atos,
tendo em vista que a ilegalidade, caso existente, se renova mês a mês,
não existindo um ato administrativo isolado que possa ser considerado como
idôneo a deflagrar a contagem de qualquer prazo, tratando-se em verdade
de pagamento espontâneo, mês a mês, sem base na legislação atinente à
remuneração dos servidores públicos. Não há decadência ou prescrição no
presente caso em desfavor da Administração Pública, dado que os atos ilegais
são nulos e não convalescem, sendo pois imprescritíveis. 8. Demais disso,
à Administração pública é reconhecido o poder de autotutela, ou seja,
o poder de rever os seus próprios atos, conforme deixa claro o art. 53
da Lei 9.784/ 99, o qual consagra o princípio da Administração Pública da
Autotutela. Esse poder da Administração está consagrado em duas Súmulas do
STF: nº 346 e 473. 9. Outrossim, a decadência, tal como referida no art. 54
da Lei 9.784/99, deve receber interpretação conforme a Constituição, e não
interpretação que venha a ferir os princípios da legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência, dispostos no caput do art. 37 da
Constituição Federal de 1988. Precedentes: AC 200951010174760, Relator:
Desembargador Federal JOSÉ ANTONIO NEIVA, Sétima Turma Especializada, E-DJF2R
- Data:: 16/07/2012 - Página:: 392; AC 200851010073550, Relator Juiz Federal
Convocado LUIZ PAULO DA SILVA ARAUJO FILHO, QUINTA TURMA ESPECIALIZADA,
E-DJF2R - Data:: 02/09/2010 - Página:: 120). 10. A Lei nº 9.784/99, no
artigo 54, culminou por estabelecer um prazo decadencial de cinco anos,
para que o Poder Público anulasse o ato administrativo, e não declarasse a
respectiva nulidade. Estabeleceu-se, portanto, a diferenciação entre atos
administrativos nulos, e anuláveis. Por sua vez, reza o art. 55 da mesma lei:
"Art. 55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse
público nem prejuízo a terceiro os atos que apresentarem defeitos sanáveis
poderão ser convalidados pela própria administração". Em outras palavras,
essa norma legal confere os contornos legais do que seja ato anulável, e a
contrario senso, do ato nulo, ao fazer menção a atos que possuam defeitos
sanáveis "os que podem ser repraticados sem vício", sejam aqueles que não
acarretam lesão ao interesse público, nem prejuízo a terceiros, quando sejam
serão convalidáveis pela Administração Pública, ou pelo decurso do prazo
apontado no artigo 54, do mesmo diploma legal. 11. Lembre-se ainda que o
artigo 114, da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, que dispõe sobre o
regime jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, das autarquias e das
fundações públicas federais, publicada no Diário Oficial de 12 de dezembro
de 1990, que dispõe: "Art. 114. A administração deverá rever seus atos, a
qualquer tempo, quando eivados de ilegalidade". 12. Cabe, neste diapasão,
trazer à colação o artigo 169 do Código Civil de 2002 (Lei nº 10.406 de
10/01/02), que estatui: "Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível
de 2 confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo". O Supremo Tribunal
Federal, no RE nº 330.834/MA, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma,
julg. 03/09/02, INFSTF 280, deixou consagrado "que o ato nulo não gera
efeitos aos seus beneficiários". 13. Importante dizer, ainda, que, segundo o
entendimento do Supremo Tribunal Federal, por se tratar de ato administrativo
complexo, a concessão da pensão apenas se aperfeiçoa com o registro perante o
Tribunal de Contas da União (STF, 2ª T., MS 26004 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli,
j. 18/10/2016), não havendo decadência antes desse ato. 14. Bom dizer que, no
caso em tela, consoante informado pelo órgão pagador do benefício (fl. 69),
o pagamento dos proventos se deu por muitos anos por descumprimento ao
"estabelecido pela Orientação Normativa nº 09, de 05/11/2010, da Secretaria de
Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, a respeito
das pensões por morte de que trata o art. 217 da lei nº 10.887/2004". O fato
de uma ilegalidade se manter por anos a fio não gera direito adquirido. Não
existe direito adquirido contra texto expresso de lei. 15. Não vislumbro no
presente caso qualquer violação ao princípio da ampla defesa ou da motivação. A
carta encaminhada à requerente não violou o Princípio da Motivação, posto
que indicou que o benefício estava sendo pago em desacordo com a lei que
regulamenta o assunto. Não há que se falar em violação à sumula n. 46 deste
TRF2, vez que a mesma se volta a benefícios previdenciários do RGPS, o que
não é o caso em questão. Bom anotar que constatado o equívoco no pagamento,
deve a Administração Pública efetuar a correção de tal ato, procedendo
aos devidos descontos do que fora recebido pelo servidor ou pensionista
indevidamente, sem que seja necessário o contraditório. 16. Com efeito,
a pretensão da autora de manter inalterado o seu benefício sob o argumento
de que as verbas estariam incorporadas definitivamente ao seu patrimônio
esbarra no princípio da Autotutela, pelo qual a Administração Pública pode
e deve rever seus atos, invalidando-os, quando eivados de ilegalidade, pois
deles não se originam direitos, não fazendo surgir o direito adquirido à
continuidade do pagamento contrariamente ao que determina a lei. 17. Demais
disso, é evidente que o recebimento errôneo de valores sem amparo em lei
pode e deve ser confrontado com os requisitos legais pertinentes, desde
a origem. Portanto, verificada a irregularidade no benefício, correta
a providência adotada no sentido de adequar o valor, no exercício do
poder-dever de Autotutela, bem como em face da sujeição da Administração
ao Princípio da Legalidade (art. 37 da CF). 18. Acerca da restituição ao
Erário de valores indevidamente pagos no período anteriormente descrito,
importante destacar que o Supremo Tribunal Federal, no julgado transcrito
a seguir, acrescentou outros requisitos além da boa-fé para que a devolução
não seja obrigatória, in verbis: "MANDADO DE SEGURANÇA. (...) DEVOLUÇÃO DE
VALORES QUE, RETIDOS NA FONTE INDEVIDAMENTE PELA UNIDADE PAGADORA, FORAM
RESTITUÍDOS PELA MESMA NO MÊS SEGUINTE. DÚVIDA QUANTO À INTERPRETAÇÃO DOS
PRECEITOS ATINENTES À MATÉRIA. SEGURANÇA CONCEDIDA.(...) 3. A reposição,
ao erário, dos valores percebidos pelos servidores torna-se desnecessária,
nos termos do ato impugnado, quando concomitantes os seguintes requisitos:
"i] presença de boa-fé do servidor; ii] ausência, por parte do servidor,
de influência ou interferência para a concessão da vantagem impugnada; iii]
existência de dúvida plausível sobre a interpretação, validade ou incidência
da norma infringida, no momento da edição do ato que autorizou o pagamento
da vantagem impugnada; iv] interpretação razoável, embora errônea, da lei
pela Administração."(...)" (STF, Tribunal Pleno, MS 25641/DF, Rel. Min. Eros
Grau, DJE 22/02/2008, unânime) 3 19. No caso em tela, ainda que haja boa-fé da
pensionista, não se encontram presentes o terceiro e o quarto requisitos acima
elencados, quais sejam: existência de dúvida plausível sobre a interpretação,
validade ou incidência da norma infringida, no momento da edição do ato que
autorizou o pagamento do valor impugnado e interpretação razoável, embora
errônea, da lei pela Administração, o que afasta de forma contundente a
impossibilidade de reposição aos Cofres Públicos. 20. Veja-se que a parte
autora recebeu durante anos valores em descompasso com o que era devido por
força de mero erro de cálculo no reajuste da pensão, e não por interpretação
errônea da lei. Nesse sentido, caso não fosse cabível a restituição ao
erário de valores oriundos de pagamentos a maior, decorrentes de erro
operacional, haveria enriquecimento sem causa do beneficiado, o que é vedado
pelo ordenamento jurídico. 21. Desse modo, é perfeitamente admissível que a
Administração pretenda a restituição de valores por ela pagos indevidamente,
não sendo o fato de possuírem tais verbas caráter alimentar suficiente
para legitimar o locupletamento ilícito, ainda que sucedido de boa-fé,
principalmente quando este ocorre em detrimento dos Cofres Públicos. 22. A
reposição ao erário, através do desconto, já era prevista na redação original
do art. 45 da Lei n. 8.112/90 e hoje é regulado pelo disposto no art. 46 da
Lei n. 8.112/90, com a redação dada pela atual Medida Provisória n. 2.225-45,
de 04 de setembro de 2001. 23. Desta sorte, uma vez constatado pagamento
indevido nos proventos da Autora, deve a Administração reaver os indigitados
valores. Não prospera o pedido autoral no sentido de não ser descontada dos
valores recebidos indevidamente porque recebidos de boa-fé. Frise-se que
a ausência de dolo do pensionista não é argumento suficiente para impedir a
administração de recuperar os valores pagos erroneamente. Neste caso, a boa-fé
não prevalece ante o interesse público no restabelecimento da ordem jurídica
violada, que impõe à Administração o dever de recuperar os valores que, em
última análise, não são devidos à pensionista, mas pertencem ao Patrimônio
Público e para tal devem retornar, na forma prevista no art. 46, §1º, da Lei
8112/90. 24. Dessarte, nos autos, restou demonstrado que a Administração, em
obediência ao antedito preceptivo legal, comunicou a parte autora do desconto
que seria praticado e efetuou o desconto nos limites de valores legalmente
estabelecidos, não havendo que se falar em qualquer ato abusivo ou ilegal
praticado pela Administração. A alegação de percebimento dos valores de boa-fé
não é capaz de afastar a devolução, tendo em vista a restituição estar prevista
em lei. 25. O agravo retido da União merece ser provido, vez que a tutela de
urgência no caso não se escora em prova inequívoca da verossimilhança das
alegações autorais, razão pela qual a revogo neste momento. Nos termos do
artigo 300 do CPC/2015, "A tutela de urgência será concedida quando houver
elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de ando ou
risco ao resultado útil do processo". Segundo pontifica o Professor Marinoni,
"A probabilidade que autoriza o emprego da técnica antecipatória para a
tutela dos direitos é a probabilidade lógica - que é aquela que surge da
confrontação das alegações e das provas com os elementos disponíveis nos
autos, sendo provável a hipótese que encontra maior grau de confirmação e
menor grua de refutação nesses elementos. O juiz tem que se convencer de que
o direito é provável para conceder tutela provisória". Na espécie, ficou
patente a inexistência do direito da demandante, razão pela qual a tutela
de urgência fica revogada e o agravo retido da União provido. 4 26. Agravo
retido da União provido para revogar a tutela de urgência. Apelo da União e
remessa necessária providas para julgar improcedentes os pedidos. Apelação
da parte autora improvida. Condenação da parte autora em custas e honorários
advocatícios, estes no importe de 10% sobre o valor da causa atualizado,
os quais ficam suspensos em razão da gratuidade de justiça deferida e dos
arts. 98 e 99 do NCPC.
Ementa
ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO DE PENSÃO. PARCELAS PAGAS A MAIOR. ERRO
DA ADMINISTRAÇÃO. RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO DE VERBAS RECEBIDAS
INDEVIDAMENTE. POSSIBILIDADE. AUTOTUTELA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. 1. Trata-se
de ação ajuizada em face da UNIÃO FEDERAL, com pedido de antecipação de
tutela, na qual postula que a Ré se abstenha de efetuar qualquer redução
ou desconto em seu benefício de pensão por morte, assim como desconsidere o
montante da dívida apurada a título de ressarcimento ao Erário. Como causa
de pedir sustenta ter recebido comunicação da Ré de que sua pensão seria
corrigida, sendo apurado o débito de R$ 57.581,95 referente aos valores
recebidos de forma indevida, valor esse que será descontado a título de
reposição ao Erário. Aduz que apesar de ter interposto tempestivamente
recurso administrativo, já estão sendo efetuados descontos no valor mensal
de seu benefício, o que viola diversos princípios constitucionais. 2. Agravo
retido da União conhecido e provido e tutela de urgência revogada, conforme
abaixo exposto, por ausência de prova inequívoca da verossimilhança das
alegações autorais. 3. Compulsando a documentação acostada aos autos, noto
que a redução do valor do benefício de pensão recebido pela Autora, bem como
a sua condenação a devolver ao Erário os valores recebidos indevidamente,
ocorreram em razão da constatação, pela União, de que o benefício "não vinha
seguindo o estabelecido pela Orientação Normativa nº 09, de 05/11/2010,
da Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento
e Gestão, a respeito das pensões por morte de que trata o art. 217 da lei nº
10.887/2004" (fl. 69). 4. A redução dos valores recebidos a título de pensão
por morte se deu em decorrência do que restou apurado nos autos do referido
Processo Administrativo nº 25001.012203/2012-10 (fls. 117/118), sendo legítimo
o ato que determinou a adaptação do referido benefício a partir de Abril
de 2012, uma vez que é dever da Administração Pública rever seus próprios
atos, desde que constate serem ilegais ou que apresentem alguma espécie de
vício. Nada mais justo e legítimo, constituindo verdadeiro poder dever da
Administração Pública a sua correção (Súmula nº 473/ STF). 5. O fato descrito
nos autos demonstra erro na aplicação da lei, não gerando para a parte autora
beneficiada, por conseguinte, direito à continuidade da percepção de valor
em contrariedade à lei, posto que a Administração Pública pode utilizar o
seu poder de Autotutela para rever seus próprios atos, com a possibilidade
de anular ou revogar os mesmos, quando viciados. Aplica-se, na espécie,
o entendimento que se consolida nas Súmulas 346 e 473, do Supremo Tribunal
Federal, as quais conferem à Administração Pública o poder de declarar nulos
os seus próprios 1 atos, quando da constatação de ilegalidade dos mesmos, ou
então de revogá-los sob a égide dos critérios de oportunidade e conveniência
do ato. Desta forma, no caso em tela, em razão do princípio da legalidade,
a Administração promove o controle interno de seu ato. 6. Ressalto ainda
que o fato de o pagamento eventualmente indevido ter ocorrido por um longo
período de tempo não gera direito adquirido à sua manutenção, haja vista
o princípio da legalidade que rege a Administração Pública, em especial o
regime jurídico de seus servidores, matéria em relação ao qual não há que se
falar em direito adquirido. 7. Igualmente não há que se falar em prescrição
ou decadência do poder-dever da Administração Pública de rever seus atos,
tendo em vista que a ilegalidade, caso existente, se renova mês a mês,
não existindo um ato administrativo isolado que possa ser considerado como
idôneo a deflagrar a contagem de qualquer prazo, tratando-se em verdade
de pagamento espontâneo, mês a mês, sem base na legislação atinente à
remuneração dos servidores públicos. Não há decadência ou prescrição no
presente caso em desfavor da Administração Pública, dado que os atos ilegais
são nulos e não convalescem, sendo pois imprescritíveis. 8. Demais disso,
à Administração pública é reconhecido o poder de autotutela, ou seja,
o poder de rever os seus próprios atos, conforme deixa claro o art. 53
da Lei 9.784/ 99, o qual consagra o princípio da Administração Pública da
Autotutela. Esse poder da Administração está consagrado em duas Súmulas do
STF: nº 346 e 473. 9. Outrossim, a decadência, tal como referida no art. 54
da Lei 9.784/99, deve receber interpretação conforme a Constituição, e não
interpretação que venha a ferir os princípios da legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência, dispostos no caput do art. 37 da
Constituição Federal de 1988. Precedentes: AC 200951010174760, Relator:
Desembargador Federal JOSÉ ANTONIO NEIVA, Sétima Turma Especializada, E-DJF2R
- Data:: 16/07/2012 - Página:: 392; AC 200851010073550, Relator Juiz Federal
Convocado LUIZ PAULO DA SILVA ARAUJO FILHO, QUINTA TURMA ESPECIALIZADA,
E-DJF2R - Data:: 02/09/2010 - Página:: 120). 10. A Lei nº 9.784/99, no
artigo 54, culminou por estabelecer um prazo decadencial de cinco anos,
para que o Poder Público anulasse o ato administrativo, e não declarasse a
respectiva nulidade. Estabeleceu-se, portanto, a diferenciação entre atos
administrativos nulos, e anuláveis. Por sua vez, reza o art. 55 da mesma lei:
"Art. 55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse
público nem prejuízo a terceiro os atos que apresentarem defeitos sanáveis
poderão ser convalidados pela própria administração". Em outras palavras,
essa norma legal confere os contornos legais do que seja ato anulável, e a
contrario senso, do ato nulo, ao fazer menção a atos que possuam defeitos
sanáveis "os que podem ser repraticados sem vício", sejam aqueles que não
acarretam lesão ao interesse público, nem prejuízo a terceiros, quando sejam
serão convalidáveis pela Administração Pública, ou pelo decurso do prazo
apontado no artigo 54, do mesmo diploma legal. 11. Lembre-se ainda que o
artigo 114, da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, que dispõe sobre o
regime jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, das autarquias e das
fundações públicas federais, publicada no Diário Oficial de 12 de dezembro
de 1990, que dispõe: "Art. 114. A administração deverá rever seus atos, a
qualquer tempo, quando eivados de ilegalidade". 12. Cabe, neste diapasão,
trazer à colação o artigo 169 do Código Civil de 2002 (Lei nº 10.406 de
10/01/02), que estatui: "Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível
de 2 confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo". O Supremo Tribunal
Federal, no RE nº 330.834/MA, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma,
julg. 03/09/02, INFSTF 280, deixou consagrado "que o ato nulo não gera
efeitos aos seus beneficiários". 13. Importante dizer, ainda, que, segundo o
entendimento do Supremo Tribunal Federal, por se tratar de ato administrativo
complexo, a concessão da pensão apenas se aperfeiçoa com o registro perante o
Tribunal de Contas da União (STF, 2ª T., MS 26004 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli,
j. 18/10/2016), não havendo decadência antes desse ato. 14. Bom dizer que, no
caso em tela, consoante informado pelo órgão pagador do benefício (fl. 69),
o pagamento dos proventos se deu por muitos anos por descumprimento ao
"estabelecido pela Orientação Normativa nº 09, de 05/11/2010, da Secretaria de
Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, a respeito
das pensões por morte de que trata o art. 217 da lei nº 10.887/2004". O fato
de uma ilegalidade se manter por anos a fio não gera direito adquirido. Não
existe direito adquirido contra texto expresso de lei. 15. Não vislumbro no
presente caso qualquer violação ao princípio da ampla defesa ou da motivação. A
carta encaminhada à requerente não violou o Princípio da Motivação, posto
que indicou que o benefício estava sendo pago em desacordo com a lei que
regulamenta o assunto. Não há que se falar em violação à sumula n. 46 deste
TRF2, vez que a mesma se volta a benefícios previdenciários do RGPS, o que
não é o caso em questão. Bom anotar que constatado o equívoco no pagamento,
deve a Administração Pública efetuar a correção de tal ato, procedendo
aos devidos descontos do que fora recebido pelo servidor ou pensionista
indevidamente, sem que seja necessário o contraditório. 16. Com efeito,
a pretensão da autora de manter inalterado o seu benefício sob o argumento
de que as verbas estariam incorporadas definitivamente ao seu patrimônio
esbarra no princípio da Autotutela, pelo qual a Administração Pública pode
e deve rever seus atos, invalidando-os, quando eivados de ilegalidade, pois
deles não se originam direitos, não fazendo surgir o direito adquirido à
continuidade do pagamento contrariamente ao que determina a lei. 17. Demais
disso, é evidente que o recebimento errôneo de valores sem amparo em lei
pode e deve ser confrontado com os requisitos legais pertinentes, desde
a origem. Portanto, verificada a irregularidade no benefício, correta
a providência adotada no sentido de adequar o valor, no exercício do
poder-dever de Autotutela, bem como em face da sujeição da Administração
ao Princípio da Legalidade (art. 37 da CF). 18. Acerca da restituição ao
Erário de valores indevidamente pagos no período anteriormente descrito,
importante destacar que o Supremo Tribunal Federal, no julgado transcrito
a seguir, acrescentou outros requisitos além da boa-fé para que a devolução
não seja obrigatória, in verbis: "MANDADO DE SEGURANÇA. (...) DEVOLUÇÃO DE
VALORES QUE, RETIDOS NA FONTE INDEVIDAMENTE PELA UNIDADE PAGADORA, FORAM
RESTITUÍDOS PELA MESMA NO MÊS SEGUINTE. DÚVIDA QUANTO À INTERPRETAÇÃO DOS
PRECEITOS ATINENTES À MATÉRIA. SEGURANÇA CONCEDIDA.(...) 3. A reposição,
ao erário, dos valores percebidos pelos servidores torna-se desnecessária,
nos termos do ato impugnado, quando concomitantes os seguintes requisitos:
"i] presença de boa-fé do servidor; ii] ausência, por parte do servidor,
de influência ou interferência para a concessão da vantagem impugnada; iii]
existência de dúvida plausível sobre a interpretação, validade ou incidência
da norma infringida, no momento da edição do ato que autorizou o pagamento
da vantagem impugnada; iv] interpretação razoável, embora errônea, da lei
pela Administração."(...)" (STF, Tribunal Pleno, MS 25641/DF, Rel. Min. Eros
Grau, DJE 22/02/2008, unânime) 3 19. No caso em tela, ainda que haja boa-fé da
pensionista, não se encontram presentes o terceiro e o quarto requisitos acima
elencados, quais sejam: existência de dúvida plausível sobre a interpretação,
validade ou incidência da norma infringida, no momento da edição do ato que
autorizou o pagamento do valor impugnado e interpretação razoável, embora
errônea, da lei pela Administração, o que afasta de forma contundente a
impossibilidade de reposição aos Cofres Públicos. 20. Veja-se que a parte
autora recebeu durante anos valores em descompasso com o que era devido por
força de mero erro de cálculo no reajuste da pensão, e não por interpretação
errônea da lei. Nesse sentido, caso não fosse cabível a restituição ao
erário de valores oriundos de pagamentos a maior, decorrentes de erro
operacional, haveria enriquecimento sem causa do beneficiado, o que é vedado
pelo ordenamento jurídico. 21. Desse modo, é perfeitamente admissível que a
Administração pretenda a restituição de valores por ela pagos indevidamente,
não sendo o fato de possuírem tais verbas caráter alimentar suficiente
para legitimar o locupletamento ilícito, ainda que sucedido de boa-fé,
principalmente quando este ocorre em detrimento dos Cofres Públicos. 22. A
reposição ao erário, através do desconto, já era prevista na redação original
do art. 45 da Lei n. 8.112/90 e hoje é regulado pelo disposto no art. 46 da
Lei n. 8.112/90, com a redação dada pela atual Medida Provisória n. 2.225-45,
de 04 de setembro de 2001. 23. Desta sorte, uma vez constatado pagamento
indevido nos proventos da Autora, deve a Administração reaver os indigitados
valores. Não prospera o pedido autoral no sentido de não ser descontada dos
valores recebidos indevidamente porque recebidos de boa-fé. Frise-se que
a ausência de dolo do pensionista não é argumento suficiente para impedir a
administração de recuperar os valores pagos erroneamente. Neste caso, a boa-fé
não prevalece ante o interesse público no restabelecimento da ordem jurídica
violada, que impõe à Administração o dever de recuperar os valores que, em
última análise, não são devidos à pensionista, mas pertencem ao Patrimônio
Público e para tal devem retornar, na forma prevista no art. 46, §1º, da Lei
8112/90. 24. Dessarte, nos autos, restou demonstrado que a Administração, em
obediência ao antedito preceptivo legal, comunicou a parte autora do desconto
que seria praticado e efetuou o desconto nos limites de valores legalmente
estabelecidos, não havendo que se falar em qualquer ato abusivo ou ilegal
praticado pela Administração. A alegação de percebimento dos valores de boa-fé
não é capaz de afastar a devolução, tendo em vista a restituição estar prevista
em lei. 25. O agravo retido da União merece ser provido, vez que a tutela de
urgência no caso não se escora em prova inequívoca da verossimilhança das
alegações autorais, razão pela qual a revogo neste momento. Nos termos do
artigo 300 do CPC/2015, "A tutela de urgência será concedida quando houver
elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de ando ou
risco ao resultado útil do processo". Segundo pontifica o Professor Marinoni,
"A probabilidade que autoriza o emprego da técnica antecipatória para a
tutela dos direitos é a probabilidade lógica - que é aquela que surge da
confrontação das alegações e das provas com os elementos disponíveis nos
autos, sendo provável a hipótese que encontra maior grau de confirmação e
menor grua de refutação nesses elementos. O juiz tem que se convencer de que
o direito é provável para conceder tutela provisória". Na espécie, ficou
patente a inexistência do direito da demandante, razão pela qual a tutela
de urgência fica revogada e o agravo retido da União provido. 4 26. Agravo
retido da União provido para revogar a tutela de urgência. Apelo da União e
remessa necessária providas para julgar improcedentes os pedidos. Apelação
da parte autora improvida. Condenação da parte autora em custas e honorários
advocatícios, estes no importe de 10% sobre o valor da causa atualizado,
os quais ficam suspensos em razão da gratuidade de justiça deferida e dos
arts. 98 e 99 do NCPC.
Data do Julgamento
:
12/11/2018
Data da Publicação
:
27/11/2018
Classe/Assunto
:
APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e
do Trabalho
Órgão Julgador
:
8ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
MARCELO DA FONSECA GUERREIRO
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
MARCELO DA FONSECA GUERREIRO
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