TRF2 0105538-84.2014.4.02.0000 01055388420144020000
AÇÃO RESCISÓRIA. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ARTIGO 485, INCISOS V
E IX, DO CPC/73. VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 37, § 6º, DA CF/88; ARTIGOS 475-C,
II C/C 475-B, AMBOS DO CPC/73 E ARTIGO 884 DO CC/2002. INDENIZAÇÃO
POR PREJUÍZOS SOFRIDOS EM RAZÃO DO TABELAMENTO DE PREÇOS IMPOSTO AO
SETOR SUCRO- ALCOOLEIRO. APURAÇÃO DO QUANTUM DEBEATUR. LIQUIDAÇÃO POR
A RBITRAMENTO. NECESSIDADE. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. - Cuida-se de ação
rescisória, proposta pela UNIÃO FEDERAL, com fundamento no art. 485, incisos
V e IX do CPC, objetivando desconstituir acórdão que, nos autos de demanda
objetivando a reparação de danos sofridos pelas usinas autoras em razão da
fixação de preços pelo Governo Federal para o setor sucroalcooleiro, deu
parcial provimento ao recurso de apelação da parte autora "para condenar
a Ré no sentido de realizar indenização daqueles danos materiais causados
às Autoras" arbitrado, "conforme o art. 944, caput, do CC/2002, em 80%
(oitenta por cento) do valor correspondente a diferença entre os preços
privados ao álcool etílico (ou etanol), tanto anidro quanto hidratado, e do
açúcar cristal standart, praticados, e os praticáveis conforme os índices de
revisão apurados pelo CPS/IBRE/FGV (fls. 234 e 282), do valor correspondente
a soma dos preços privados de mais daqueles produtos industriais praticáveis
conforme os índices de revisão apurados por esta entidade privada (fls. 252-6
e 307-10), e do valor correspondente a soma dos quanta debeatur acessórios
creditícios (fls. 237/8/57 e 285-8/312)". Ressalte-se que, iniciada a
fase de execução nos autos originários, a Companhia Agrícola do Norte 1
Fluminense apresentou como montante devido o valor de R$ 1.212.964.807,16
(um bilhão, duzentos e doze milhões, novecentos e sessenta e quatro mil,
oitocentos e sete reais e dezesseis centavos), atualizado até agosto de
2013 (fls. 1188/1192 e 1209/1221) e a Usina São João (B. Lysandro) S/A o
quantum de R$ 3.488.972.361,47 (três bilhões, quatrocentos e oitenta e oito
milhões, novecentos e setenta e dois mil, trezentos e sessenta e um reais e
quarenta e sete centavos), atualizado até outubro de 2013 (fls. 1226/1236),
totalizando mais de R$ 4.600.000.000,00 (quatro bilhões e seiscentos m
ilhões de reais). - In casu, a pretensão rescisória encontra-se fundada
em violação literal a dispositivo de lei e em ocorrência de erro de fato,
aduzindo a autora que o acórdão teria violado o disposto no artigo 37, § 6º,
da CF/88; nos artigos 475-B e 475-C, inciso II, ambos do CPC e no artigo 883
do CC, ante a necessidade "de nova perícia para fixação do quantum d ebeatur,
mediante liquidação por arbitramento". - O erro de fato sanável pela via da
ação rescisória é aquele que consiste na admissão de fato inexistente como
existente ou vice-versa na decisão rescindenda, impondo-se destacar que o erro
deve se relacionar a fato que, na formação da decisão, não tenha sido objeto
de controvérsia ou de pronunciamento judicial, hipótese que não parece ocorrer
na espécie, tendo em vista que a controvérsia acerca apuração dos prejuízos
alegados, considerando os documentos colacionados aos autos, foi enfrentada
na demanda originária. Destarte, o expresso pronunciamento judicial sobre os
fatos e as provas apresentadas, parece revelar-se suficiente para afastar a
f igura do erro de fato. - Merece amparo a alegação de violação ao disposto
no artigo 37, § 6º, da CF/88; nos artigos 475-B e 475-C, inciso II, ambos do
CPC e no artigo 883 do CC, ante a necessidade "de nova perícia para fixação
do quantum debeatur, mediante liquidação por arbitramento". Neste ponto,
é de se ter claro que o inciso V, do artigo 485, do CPC/73, vigente à época
do ajuizamento da demanda, que constitui um dos fundamentos da presente
rescisória, contempla a hipótese de rescisão de 2 sentença transitada em
julgado por violação literal a dispositivo de lei, o que pressupõe que a
lesão seja direta e de tal modo aberrante que viole o dispositivo legal em
sua literalidade, não se admitindo, pois, a veiculação de pedido c om base
em mera injustiça ou má apreciação das provas. - No caso concreto, no qual a
controvérsia cinge-se à apuração do quantum debeatur do dano a ser indenizado
em razão dos prejuízos decorrentes da fixação de preços pelo governo federal
para o setor sucroalcooleiro em desacordo com os critérios previstos na Lei
4.870/65, o acórdão rescindendo parece ter incorrido em violação a dispostivo
de lei que macula a validade da coisa julgada formada pela decisão ora
impugnada, encontrando-se, inclusive, em desacordo com o a tual entendimento
jurisprudencial a respeito do tema. - Cumpre esclarecer que na presente ação
rescisória, não se discute o direito à indenização e a existência de prejuízos,
em tese, causados às usinas do setor sucroalcooleiro em virtude da fixação
de preços pelo IAA, razão pela qual não há que se falar em reexame de laudo
pericial elaborado no processo cognitivo originário, o qual, naqueles autos,
serviu de amparo à comprovação do fato constitutivo do direito então alegado
pelas autoras no sentido da responsabilidade civil da União. Na hipótese ora
examinada, o cerne da controvérsia repousa na temática atinente à necessidade
de apuração individualizada da extensão do dano já reconhecido, ou seja,
do quantum debeatur, bem como do critério jurídico a ser adotado para que
sejam observados os elementos caracterizadores da responsabilidade objetiva
do Estado, em especial a observância do nexo de causalidade entre a conduta
lesiva e o dano efetiva e concretamente experimentado. Nesse mesmo sentido,
o Parquet Federal salientou, em seu parecer, que "não obstante o laudo
pericial de fls. 230/339 servir de suporte probatório para se visualizar
um cenário indenizatório às empresas, ora rés, não traz qualquer respaldo
para a apuração das diferenças devidas caso a caso, sendo indispensável
a liquidação por arbitramento do julgado p ara esse fim". - Com efeito,
nas hipóteses de responsabilidade civil 3 objetiva do Estado, prevista
no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, o surgimento da obrigação
indenizatória da Administração Pública decorre da verificação do nexo de
causalidade entre o dano ocorrido e a conduta do Estado. Por tal razão,
revela-se insuficiente a mera alegação genérica de existência de prejuízos
decorrentes da intervenção estatal, bem como demonstra-se imprescindível a
comprovação do dano efetivamente sofrido, tendo em vista não ser admitida
indenização em caráter hipotético ou presumido, divorciada da realidade
delineada pelo conjunto fático-probatório produzido nos autos. Destarte,
tendo sido reconhecido o direito à indenização (an debeatur), a extensão do
dano indenizável, efetivamente ocorrido e comprovado, deve ser discutida
em sede de liquidação por arbitramento, com a correspodente realização de
nova prova pericial, ocasião oportuna para a devida apuração dos prejuízos
concretamente sofridos no caso e specífico. - Não parece se revelar adequada a
utilização, como único parâmetro de definição do quantum debeatur, de critério
genérico correspondente ao simples cálculo da diferença entre os preços
praticados pelas empresas e os valores estipulados pelo IAA, tendo em vista a
necessidade de identificação e quantificação do prejuízo efetivo, considerando
as particularidades do caso concreto, a demonstrar a relação de causalidade
entre o dano e o ato que fixou os preços do setor sucroalcooleiro, bem como a
averiguação do real montante do p rejuízo decorrente da intervenção estatal. -
O acórdão rescindendo, partindo da análise de perícia genérica que conduziu ao
reconhecimento do direito à indenização, ao que tudo indica, antecipou-se,
indevidamente, ao acolher critério de estipulação do quantum devido que
posteriormente foi, inclusive, reconhecido pelo STJ, sob a sistemática dos
recursos repetitivos, como inadequado para casos similares aos dos presentes
autos, que versam especificamente a respeito da repercussão da fixação de p
reços pelo IAA no setor sucroalcooleiro. - Neste aspecto, convém acentuar que,
a respeito do tema, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça exarou manifestação,
sob 4 a sistemática dos Recursos Repetitivos prevista no art. 543-C do CPC/73,
no sentido de que "simples descumprimento de critério jurídico, consistente
na fixação de preços em dissonância com critério fixado na Lei 4.870/1965, não
pode servir como parâmetro para definição do "quantum debeatur" de indenização
devida a empresa do setor sucroalcooleiro. Isso porque a indenização que visa
a recomposição de danos emergentes e recebimento de lucros cessantes exige a
demonstração de probabilidade razoável, objetiva e concreta. Dessa forma, não
se admite indenização por danos emergentes ou lucros cessantes hipotéticos, sem
suporte na realidade fática, alicerçada apenas em descumprimento de critério
legal", tendo sido consignado que "a fixação do preço da cana para estipular
o valor da indenização é um procedimento complexo, e não pode se dissociar
da realidade do mercado brasileiro, devendo ser determinado levando em conta
uma gama de informações sobre o mercado, e não apenas de dados sobre custos
de produção" (REsp 1347136/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 11/12/2013, DJe 07/03/2014). Deste modo, os prejuízos sofridos
em decorrência da fixação de preços pelo IAA exigem efetiva comprovação,
com suporte na realidade fática, não se admitindo indenização em caráter
hipotético ou presumido, alicerçado apenas em descumprimento de critério
legal, podendo, uma vez já reconhecido o direito à indenização (an debeatur),
ser posteriormente discutido o quantum debeatur em liquidação de sentença por
arbitramento, oportunidade em que as partes poderão demonstrar a extensão d
os efeitos financeiros no caso concreto. - Muito embora tenham sido opostos
embargos de declaração em face do aludido recurso especial, ocasião em que
se reconheceu que "nos casos em que já há sentença transitada em julgado, no
processo de conhecimento, a forma de apuração do valor devido deve observar
o respectivo título executivo" (EDcl no REsp 1347136/DF, Rel. Ministra
ASSUSETE MAGALHÃES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/06/2014, DJe 02/02/2015),
tal entendimento não parece se aplicar no âmbito da presente ação rescisória,
tendo em vista que a mesma tem por objetivo justamente a desconstituição
de coisa julgada. 5 - Nesta medida, observa-se que a adoção de critério de
aferição de quantum indenizatório sem observância do correspondente processo
de liquidação e da realização de prova pericial para verificação da extensão
dos efetivos prejuízos sofridos nas situações concretas e individualizadas das
usinas autoras, ao que tudo indica, além de deixar de observar os elementos
necessários para caracterização da responsabilidade objetiva do Estado,
parece violar a sistemática prevista no ordenamento processual pátrio, a qual
constitui matéria de ordem pública, revelando-se contrária a entendimento
jurisprudencial existente acerca do tema no sentido da necessidade de prévia
liquidação de sentença nos casos em que o título judicial não se reveste de
liquidez e c uja execução não depende de mero cálculo aritmético. - Sem se
olvidar do princípio da fidelidade do título judicial, é necessário atentar
para o entendimento que preconiza que a forma de liquidação especificada no
decisum cognitivo não transita em julgado e que havendo vício de inadequação
na espécie de liquidação, aplica-se o princípio da fungibilidade das formas de
liquidação, segundo o qual a fixação do quantum debeatur deve processar-se pela
via adequada, independentemente do preceito expresso no título executivo. Da
mesma forma, orienta a Súmula 344 do STJ, ao estabelecer que "a liquidação
por forma diversa da e stabelecida na sentença não ofende a coisa julgada". -
Convém registrar que a rejeição de critério genérico de quantificação de dano
encontra amparo na orientação no sentido de que "a liquidação de sentença
consiste em um processo de conhecimento preparatório ao da execução",
de que "se a condenação que deu origem ao título judicial, ou parte dela,
for ilíquida, imperativo se mostra a liquidação, que completa a atividade
jurisdicional de conhecimento" e de que "a sentença proferida no processo de
conhecimento confere certeza ao direito do credor, enquanto que a sentença de
liquidação lhe adiciona a liquidez e a conseqüente exigibilidade, ocasião em
que o título será então revestido de executoriedade e, portanto, passível
de execução" (REsp 758.275/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA
TURMA, 6 julgado em 09/03/2006, DJ 27/03/2006, p. 270. Nesta mesma linha:
REsp 1361527/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em
06/12/2016, DJe 17/02/2017; AgRg no AREsp 501.880/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO
NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/05/2015, DJe 09/06/2015). Desta
forma, tendo em vista que o REsp 1.347.136/DF, julgado sob a sistemática
dos recursos repetitivos, apenas corroborou tal posicionamento ao prever sua
adoção expressamente para os casos de indenização por prejuízos sofridos pelo
setor sucroalcooleiro, não há que se falar em descabimento de ação rescisória
baseada em mudança de entendimento j urisprudencial. - Precedentes citados. -
Pedido rescisório julgado procedente a fim de que seja rescindido o acórdão
proferido na ação nº 1990.51.01.001447- 2, tão somente para determinar que
o quantum debeatur da indenização devida pela União deverá ser apurado por
meio de liquidação por arbitramento, mediante nova perícia para a mensuração
do prejuízo causado a cada uma das empresas no caso concreto, condenando a
parte ré ao pagamento de honorários advocatícios, na forma do artigo 85 do
CPC/2015, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, pro r ata.
Ementa
AÇÃO RESCISÓRIA. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ARTIGO 485, INCISOS V
E IX, DO CPC/73. VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 37, § 6º, DA CF/88; ARTIGOS 475-C,
II C/C 475-B, AMBOS DO CPC/73 E ARTIGO 884 DO CC/2002. INDENIZAÇÃO
POR PREJUÍZOS SOFRIDOS EM RAZÃO DO TABELAMENTO DE PREÇOS IMPOSTO AO
SETOR SUCRO- ALCOOLEIRO. APURAÇÃO DO QUANTUM DEBEATUR. LIQUIDAÇÃO POR
A RBITRAMENTO. NECESSIDADE. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. - Cuida-se de ação
rescisória, proposta pela UNIÃO FEDERAL, com fundamento no art. 485, incisos
V e IX do CPC, objetivando desconstituir acórdão que, nos autos de demanda
objetivando a reparação de danos sofridos pelas usinas autoras em razão da
fixação de preços pelo Governo Federal para o setor sucroalcooleiro, deu
parcial provimento ao recurso de apelação da parte autora "para condenar
a Ré no sentido de realizar indenização daqueles danos materiais causados
às Autoras" arbitrado, "conforme o art. 944, caput, do CC/2002, em 80%
(oitenta por cento) do valor correspondente a diferença entre os preços
privados ao álcool etílico (ou etanol), tanto anidro quanto hidratado, e do
açúcar cristal standart, praticados, e os praticáveis conforme os índices de
revisão apurados pelo CPS/IBRE/FGV (fls. 234 e 282), do valor correspondente
a soma dos preços privados de mais daqueles produtos industriais praticáveis
conforme os índices de revisão apurados por esta entidade privada (fls. 252-6
e 307-10), e do valor correspondente a soma dos quanta debeatur acessórios
creditícios (fls. 237/8/57 e 285-8/312)". Ressalte-se que, iniciada a
fase de execução nos autos originários, a Companhia Agrícola do Norte 1
Fluminense apresentou como montante devido o valor de R$ 1.212.964.807,16
(um bilhão, duzentos e doze milhões, novecentos e sessenta e quatro mil,
oitocentos e sete reais e dezesseis centavos), atualizado até agosto de
2013 (fls. 1188/1192 e 1209/1221) e a Usina São João (B. Lysandro) S/A o
quantum de R$ 3.488.972.361,47 (três bilhões, quatrocentos e oitenta e oito
milhões, novecentos e setenta e dois mil, trezentos e sessenta e um reais e
quarenta e sete centavos), atualizado até outubro de 2013 (fls. 1226/1236),
totalizando mais de R$ 4.600.000.000,00 (quatro bilhões e seiscentos m
ilhões de reais). - In casu, a pretensão rescisória encontra-se fundada
em violação literal a dispositivo de lei e em ocorrência de erro de fato,
aduzindo a autora que o acórdão teria violado o disposto no artigo 37, § 6º,
da CF/88; nos artigos 475-B e 475-C, inciso II, ambos do CPC e no artigo 883
do CC, ante a necessidade "de nova perícia para fixação do quantum d ebeatur,
mediante liquidação por arbitramento". - O erro de fato sanável pela via da
ação rescisória é aquele que consiste na admissão de fato inexistente como
existente ou vice-versa na decisão rescindenda, impondo-se destacar que o erro
deve se relacionar a fato que, na formação da decisão, não tenha sido objeto
de controvérsia ou de pronunciamento judicial, hipótese que não parece ocorrer
na espécie, tendo em vista que a controvérsia acerca apuração dos prejuízos
alegados, considerando os documentos colacionados aos autos, foi enfrentada
na demanda originária. Destarte, o expresso pronunciamento judicial sobre os
fatos e as provas apresentadas, parece revelar-se suficiente para afastar a
f igura do erro de fato. - Merece amparo a alegação de violação ao disposto
no artigo 37, § 6º, da CF/88; nos artigos 475-B e 475-C, inciso II, ambos do
CPC e no artigo 883 do CC, ante a necessidade "de nova perícia para fixação
do quantum debeatur, mediante liquidação por arbitramento". Neste ponto,
é de se ter claro que o inciso V, do artigo 485, do CPC/73, vigente à época
do ajuizamento da demanda, que constitui um dos fundamentos da presente
rescisória, contempla a hipótese de rescisão de 2 sentença transitada em
julgado por violação literal a dispositivo de lei, o que pressupõe que a
lesão seja direta e de tal modo aberrante que viole o dispositivo legal em
sua literalidade, não se admitindo, pois, a veiculação de pedido c om base
em mera injustiça ou má apreciação das provas. - No caso concreto, no qual a
controvérsia cinge-se à apuração do quantum debeatur do dano a ser indenizado
em razão dos prejuízos decorrentes da fixação de preços pelo governo federal
para o setor sucroalcooleiro em desacordo com os critérios previstos na Lei
4.870/65, o acórdão rescindendo parece ter incorrido em violação a dispostivo
de lei que macula a validade da coisa julgada formada pela decisão ora
impugnada, encontrando-se, inclusive, em desacordo com o a tual entendimento
jurisprudencial a respeito do tema. - Cumpre esclarecer que na presente ação
rescisória, não se discute o direito à indenização e a existência de prejuízos,
em tese, causados às usinas do setor sucroalcooleiro em virtude da fixação
de preços pelo IAA, razão pela qual não há que se falar em reexame de laudo
pericial elaborado no processo cognitivo originário, o qual, naqueles autos,
serviu de amparo à comprovação do fato constitutivo do direito então alegado
pelas autoras no sentido da responsabilidade civil da União. Na hipótese ora
examinada, o cerne da controvérsia repousa na temática atinente à necessidade
de apuração individualizada da extensão do dano já reconhecido, ou seja,
do quantum debeatur, bem como do critério jurídico a ser adotado para que
sejam observados os elementos caracterizadores da responsabilidade objetiva
do Estado, em especial a observância do nexo de causalidade entre a conduta
lesiva e o dano efetiva e concretamente experimentado. Nesse mesmo sentido,
o Parquet Federal salientou, em seu parecer, que "não obstante o laudo
pericial de fls. 230/339 servir de suporte probatório para se visualizar
um cenário indenizatório às empresas, ora rés, não traz qualquer respaldo
para a apuração das diferenças devidas caso a caso, sendo indispensável
a liquidação por arbitramento do julgado p ara esse fim". - Com efeito,
nas hipóteses de responsabilidade civil 3 objetiva do Estado, prevista
no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, o surgimento da obrigação
indenizatória da Administração Pública decorre da verificação do nexo de
causalidade entre o dano ocorrido e a conduta do Estado. Por tal razão,
revela-se insuficiente a mera alegação genérica de existência de prejuízos
decorrentes da intervenção estatal, bem como demonstra-se imprescindível a
comprovação do dano efetivamente sofrido, tendo em vista não ser admitida
indenização em caráter hipotético ou presumido, divorciada da realidade
delineada pelo conjunto fático-probatório produzido nos autos. Destarte,
tendo sido reconhecido o direito à indenização (an debeatur), a extensão do
dano indenizável, efetivamente ocorrido e comprovado, deve ser discutida
em sede de liquidação por arbitramento, com a correspodente realização de
nova prova pericial, ocasião oportuna para a devida apuração dos prejuízos
concretamente sofridos no caso e specífico. - Não parece se revelar adequada a
utilização, como único parâmetro de definição do quantum debeatur, de critério
genérico correspondente ao simples cálculo da diferença entre os preços
praticados pelas empresas e os valores estipulados pelo IAA, tendo em vista a
necessidade de identificação e quantificação do prejuízo efetivo, considerando
as particularidades do caso concreto, a demonstrar a relação de causalidade
entre o dano e o ato que fixou os preços do setor sucroalcooleiro, bem como a
averiguação do real montante do p rejuízo decorrente da intervenção estatal. -
O acórdão rescindendo, partindo da análise de perícia genérica que conduziu ao
reconhecimento do direito à indenização, ao que tudo indica, antecipou-se,
indevidamente, ao acolher critério de estipulação do quantum devido que
posteriormente foi, inclusive, reconhecido pelo STJ, sob a sistemática dos
recursos repetitivos, como inadequado para casos similares aos dos presentes
autos, que versam especificamente a respeito da repercussão da fixação de p
reços pelo IAA no setor sucroalcooleiro. - Neste aspecto, convém acentuar que,
a respeito do tema, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça exarou manifestação,
sob 4 a sistemática dos Recursos Repetitivos prevista no art. 543-C do CPC/73,
no sentido de que "simples descumprimento de critério jurídico, consistente
na fixação de preços em dissonância com critério fixado na Lei 4.870/1965, não
pode servir como parâmetro para definição do "quantum debeatur" de indenização
devida a empresa do setor sucroalcooleiro. Isso porque a indenização que visa
a recomposição de danos emergentes e recebimento de lucros cessantes exige a
demonstração de probabilidade razoável, objetiva e concreta. Dessa forma, não
se admite indenização por danos emergentes ou lucros cessantes hipotéticos, sem
suporte na realidade fática, alicerçada apenas em descumprimento de critério
legal", tendo sido consignado que "a fixação do preço da cana para estipular
o valor da indenização é um procedimento complexo, e não pode se dissociar
da realidade do mercado brasileiro, devendo ser determinado levando em conta
uma gama de informações sobre o mercado, e não apenas de dados sobre custos
de produção" (REsp 1347136/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 11/12/2013, DJe 07/03/2014). Deste modo, os prejuízos sofridos
em decorrência da fixação de preços pelo IAA exigem efetiva comprovação,
com suporte na realidade fática, não se admitindo indenização em caráter
hipotético ou presumido, alicerçado apenas em descumprimento de critério
legal, podendo, uma vez já reconhecido o direito à indenização (an debeatur),
ser posteriormente discutido o quantum debeatur em liquidação de sentença por
arbitramento, oportunidade em que as partes poderão demonstrar a extensão d
os efeitos financeiros no caso concreto. - Muito embora tenham sido opostos
embargos de declaração em face do aludido recurso especial, ocasião em que
se reconheceu que "nos casos em que já há sentença transitada em julgado, no
processo de conhecimento, a forma de apuração do valor devido deve observar
o respectivo título executivo" (EDcl no REsp 1347136/DF, Rel. Ministra
ASSUSETE MAGALHÃES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/06/2014, DJe 02/02/2015),
tal entendimento não parece se aplicar no âmbito da presente ação rescisória,
tendo em vista que a mesma tem por objetivo justamente a desconstituição
de coisa julgada. 5 - Nesta medida, observa-se que a adoção de critério de
aferição de quantum indenizatório sem observância do correspondente processo
de liquidação e da realização de prova pericial para verificação da extensão
dos efetivos prejuízos sofridos nas situações concretas e individualizadas das
usinas autoras, ao que tudo indica, além de deixar de observar os elementos
necessários para caracterização da responsabilidade objetiva do Estado,
parece violar a sistemática prevista no ordenamento processual pátrio, a qual
constitui matéria de ordem pública, revelando-se contrária a entendimento
jurisprudencial existente acerca do tema no sentido da necessidade de prévia
liquidação de sentença nos casos em que o título judicial não se reveste de
liquidez e c uja execução não depende de mero cálculo aritmético. - Sem se
olvidar do princípio da fidelidade do título judicial, é necessário atentar
para o entendimento que preconiza que a forma de liquidação especificada no
decisum cognitivo não transita em julgado e que havendo vício de inadequação
na espécie de liquidação, aplica-se o princípio da fungibilidade das formas de
liquidação, segundo o qual a fixação do quantum debeatur deve processar-se pela
via adequada, independentemente do preceito expresso no título executivo. Da
mesma forma, orienta a Súmula 344 do STJ, ao estabelecer que "a liquidação
por forma diversa da e stabelecida na sentença não ofende a coisa julgada". -
Convém registrar que a rejeição de critério genérico de quantificação de dano
encontra amparo na orientação no sentido de que "a liquidação de sentença
consiste em um processo de conhecimento preparatório ao da execução",
de que "se a condenação que deu origem ao título judicial, ou parte dela,
for ilíquida, imperativo se mostra a liquidação, que completa a atividade
jurisdicional de conhecimento" e de que "a sentença proferida no processo de
conhecimento confere certeza ao direito do credor, enquanto que a sentença de
liquidação lhe adiciona a liquidez e a conseqüente exigibilidade, ocasião em
que o título será então revestido de executoriedade e, portanto, passível
de execução" (REsp 758.275/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA
TURMA, 6 julgado em 09/03/2006, DJ 27/03/2006, p. 270. Nesta mesma linha:
REsp 1361527/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em
06/12/2016, DJe 17/02/2017; AgRg no AREsp 501.880/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO
NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/05/2015, DJe 09/06/2015). Desta
forma, tendo em vista que o REsp 1.347.136/DF, julgado sob a sistemática
dos recursos repetitivos, apenas corroborou tal posicionamento ao prever sua
adoção expressamente para os casos de indenização por prejuízos sofridos pelo
setor sucroalcooleiro, não há que se falar em descabimento de ação rescisória
baseada em mudança de entendimento j urisprudencial. - Precedentes citados. -
Pedido rescisório julgado procedente a fim de que seja rescindido o acórdão
proferido na ação nº 1990.51.01.001447- 2, tão somente para determinar que
o quantum debeatur da indenização devida pela União deverá ser apurado por
meio de liquidação por arbitramento, mediante nova perícia para a mensuração
do prejuízo causado a cada uma das empresas no caso concreto, condenando a
parte ré ao pagamento de honorários advocatícios, na forma do artigo 85 do
CPC/2015, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, pro r ata.
Data do Julgamento
:
18/07/2017
Data da Publicação
:
24/07/2017
Classe/Assunto
:
AR - Ação Rescisória - Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa -
Procedimentos Especiais - Procedimento de Conhecimento - Processo Cível e
do Trabalho
Órgão Julgador
:
3ª SEÇÃO ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
VERA LÚCIA LIMA
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
VERA LÚCIA LIMA
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