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Jurisprudência


TRF2 0106179-52.2015.4.02.5104 01061795220154025104

Ementa
DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - ANS. EXECUÇÃO DE SANÇÃO PECUNIÁRIA. LEIS NºS 9.656/98 E 9.961/00. DESNECESSIDADE DE DESMEMBRAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE EXECUÇÕES EM FACE DO MESMO DEVEDOR. APLICAÇÃO DA REGRA QUINQUENAL DE PRESCRIÇÃO DO DECRETO Nº 20.910/32. INAPLICABILIDADE DO PRAZO TRIENAL DO ARTIGO 206, § 3º, IV, DO CÓDIGO CIVIL. RESSARCIMENTO AO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - SUS (ART. 32 DA LEI Nº 9.656/98). CONSTITUCIONALIDADE DA REGRA QUE EXIGE O RESSARCIMENTO. ADI 1931. HIGIDEZ DO TÍTULO EXECUTIVO. DEFERÊNCIA À ENTIDADE RESPONSÁVEL PELA FISCALIZAÇÃO DO SETOR REGULADO. LEGALIDADE DA TABELA TUNEP. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS FORMAIS NO PROCESSO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE DE REFORMATIO IN PEJUS NOS RECURSOS ADMINISTRATIVOS. RECURSO DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta por UNIMED VOLTA REDONDA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, tendo por objeto a sentença de fls. 1767/1777, nos autos dos embargos à execução por ela propostos em face da AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - ANS, oriundos da Execução Fiscal nº 0002245-15.2014.4.02.5104, objetivando o reconhecimento da nulidade do título executivo e a inexistência de crédito, com a consequente extinção da execução fiscal. 2. Como causa de pedir, alega a autora, em síntese, a necessidade de desmembramento da execução fiscal; a consumação da prescrição trienal; a inconstitucionalidade formal e material do artigo 32 da Lei nº 9.656/98; a impossibilidade de restituição por inexistência de vínculo contratual; a inexistência de pedido de autorização pelos credenciados; a ilegalidade da tabela TUNEP; a nulidade do auto de infração por vício de motivação e ao princípio constitucional da eficiência; e, por fim, a violação à proibição da reformatio in pejus na esfera administrativa. 3. Embora a Lei nº 6.830/80, que disciplina o procedimento da execução fiscal, nada diga sobre a possibilidade de cumulação de execuções, tal possibilidade vem expressamente contemplada no artigo 780 do CPC/15, idêntico ao artigo 573 da codificação processual revogada. A lei se contenta, para permitir a cumulação, com: (i) a identidade do executado; (ii) a identidade do procedimento; e (iii) a competência do mesmo Juízo para todas as execuções. Trata-se, afinal, de medida de economia processual que visa a acelerar a cobrança de créditos fiscais. O próprio Juízo da Execução Fiscal é que deve decidir, discricionariamente, acerca da conveniência de manter os feitos executivos reunidos num mesmo processo. Inexistindo real prejuízo para a parte executada, não se vislumbra qualquer defeito a justificar a anulação da 1 sentença. 4. A questão prejudicial relativa a prescrição foi corretamente decidida pelo Juízo a quo, não merecendo qualquer reparo. Não se aplica, na espécie, o prazo trienal do artigo 206, § 3º, inciso IV, do Código Civil, pois, ainda que se esteja diante de uma pretensão de ressarcimento por enriquecimento sem causa, o crédito a que alude o artigo 32 da Lei nº 9.636/98 vem corporificado na dívida ativa do Poder Público e, por isso, se sujeita ao regime de direito público. Disso se conclui que a norma aplicável é a do artigo 1º do Decreto nº 20.910/32, a qual estatui prazo de prescrição quinquenal. 5. Malgrado a avença tenha sido celebrada em 1994, os reajustes na mensalidade ocorreram no ano de 2004 (fl. 591), muito após o início da vigência da Lei nº 9.656/98, de forma que não pode a operadora de plano de saúde se escusar ao argumento de que a parte conhecia os termos do contrato, sendo que ela mesmo, na condição de fornecedora do serviço, tinha o dever de se conformar ao disposto em lei. Por sua vez, a cópia do auto de infração que consta dos autos (fl. 655) demonstra o adequado e expresso enquadramento legal da infração apontada com a penalidade cabível. No mais, tendo em vista que a embargante propôs reclamação administrativa, é certo que o ato administrativo, ao cabo do procedimento de apuração formal, se aperfeiçoou, tendo sido revisado pelos órgãos competentes, não cabendo falar em vício de motivação. 6. Não se pode perder de vista que, segundo entendimento pacífico dos Tribunais Superiores e desta E. Corte Federal, os contratos de planos de saúde estão sujeitos à disciplina do Código de Defesa do Consumidor, o que veio a ser reafirmado em verbete recentemente editado pelo C. Superior Tribunal de Justiça, a Súmula 608, verbis: "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão". Nesse diapasão, a responsabilidade da fornecedora de serviços não se restringe à efetiva prestação do serviço, mas vem ladeada por deveres anexos, notadamente o de transparência, a exigir que os usuários do serviço recebessem informações adequadas. É dizer que, ainda que o contrato date de 1994 - quando já vigente o CDC -, o usuário tem o direito de conhecer a natureza e a extensão das contrapartidas que deve pagar para usufruir o serviço, o que, na hipótese, inocorreu. Quanto à irregularidade do próprio reajuste, a questão foi exaustivamente apreciada na esfera administrativa, não tendo a parte logrado trazer qualquer elemento capaz de infirmar a presunção de veracidade e legalidade dos atos administrativos lá exarados. 7. É entendimento corrente na jurisprudência dos Tribunais Superiores o de que, no plano do direito administrativo sancionador, inexiste vedação à reforma para pior (reformatio in pejus), vez que se insere no poder de autotutela do Poder Público a anulação de atos administrativos é um dever do ente público. A Lei nº 9.784/97, que disciplina os processos administrativos em âmbito federal, veda o agravamento da sanção imposta quando da revisão do processo (artigo 65), mas não da decisão que julga o recurso interposto pela parte interessada, na qual se admite gravame à situação do recorrente (artigo 64, parágrafo único), exigindo-se que seja, contudo, cientificado para que formule suas alegações antes da decisão. 8. Inexistente, pois, qualquer violação ao devido processo legal, uma vez que efetivamente se oportunizou à parte possibilidade de exercício da defesa naquela seara. Deve-se assinalar que o controle judicial da atividade administrativa, sobretudo a judicante, cinge-se à depuração da observância, pelas autoridades processantes, das garantias constitucionais que orbitam em torno do princípio do devido processo legal, como o contraditório e a ampla defesa, bem assim à 2 verificação da proporcionalidade de eventuais sanções impostas. In casu, a embargante não trouxe elementos que demonstrassem a incompatibilidade formal do procedimento sancionatório com a Constituição da República ou com a legislação de regência. A sanção imposta, mesmo com o gravame decorrente da revisão em segunda instância, não se revela desarrazoada ou desproporcional, mas leva em consideração os critérios previstos no artigo 27 da Lei nº 9.656/98, quais sejam: porte econômico da operadora ou prestadora de serviço e a gravidade da infração. 9. A apelante afirma, incidentalmente, a inconstitucionalidade formal e material do artigo 32 da lei que disciplina os planos e seguros privados de assistência à saúde. A linha de raciocínio deduzida já não vinha sendo acolhida pela jurisprudência dominante dos Tribunais Superiores e tampouco desta E. Corte de Justiça Federal, mas, recentemente, em 08/06/2018, sobreveio acórdão do Supremo Tribunal Federal, no controle concentrado de constitucionalidade, reconhecendo a validade do referido dispositivo legal. Na Ação Direta de Inconstitucionalidade 1931, proposta pela Confederação Nacional de Saúde - CNS, a Suprema Corte julgou constitucional o artigo 32, encampando o voto condutor do Min. Marco Aurélio. Tendo em vista que a Corte Suprema efetivamente esgotou o tratamento do tema, em sede de controle concentrado de constitucionalidade, do qual deflui eficácia vinculante e erga omnes, a questão se encontra efetivamente superada. 10. Deve-se assinalar, novamente, que a apreciação da regularidade dos procedimentos é de incumbência precípua da agência reguladora responsável pela fiscalização do setor de saúde suplementar, e não do Poder Judiciário, ao qual, aliás, se recomenda deferência, por envolver questões eminentemente técnicas. No mais, os atos administrativos, como frisado anteriormente, são dotados de presunção de legalidade e veracidade. Inobstante, deve-se ter em mente que o mesmo caderno probatório destes autos foi constituído na seara administrativa, e apreciado pelas instâncias próprias judicantes do setor regulado, não sendo dado ao Poder Judiciário, senão em hipóteses excepcionais, de flagrante ilegalidade, substituir-se à apreciação da entidade técnica, dotada de expertise para tanto. 11. Especificamente no que tange à questão da cobertura durante o período de carência, oportuno destacar que incumbe à própria operadora do plano de saúde demonstrar que a situação do usuário não era emergencial, uma vez que, em se tratando de hipótese de urgência, não se considera carência superior a 24 (vinte e quatro) horas. É outro entendimento do Superior Tribunal de Justiça que veio a ser cristalizado em verbete sumular, no caso, a Súmula 597: "A cláusula contratual de plano de saúde que prevê carência para utilização dos serviços de assistência médica nas situações de emergência ou de urgência é considerada abusiva se ultrapassado o prazo máximo de 24 horas contado da data da contratação". Esse entendimento já vinha sendo adotado pela jurisprudência deste E. Tribunal Regional Federal. Não tendo a embargante logrado desconstituir a presunção legal em favor do crédito público, tem-se que o título executivo ora impugnado permanece hígido, merecendo prosseguir a execução fiscal 12. Por fim, a UNIMED afirma a ilegalidade na aplicação da Tabela Única Nacional de Equivalência de Procedimentos - TUNEP, sustentando que seus valores criam cobranças muitos superiores àqueles efetivamente praticados pelas próprias entidades médico- hospitalares quando da realização dos procedimentos. A argumentação não prospera, tendo em vista que as tabelas utilizadas pelas seguradoras de saúde levam em conta, geralmente, a despesa do procedimento médico, hospitalar ou ambulatorial em si mesmo, desconsiderando outras modalidades de despesas acessórias no âmbito da prestação do serviço de saúde (como 3 os medicamentos e a remuneração dos profissionais), as quais, entretanto, estão contempladas nos patamares da TUNEP. Precedentes deste E. TRF. 13. Negado provimento ao recurso. Tendo em vista que não houve condenação em honorários advocatícios na primeira instância, em observância ao artigo 37-A, § 1º, da Lei nº 10.522/02, não se aplica aqui o artigo 85, § 11, do CPC/15.

Data do Julgamento : 27/07/2018
Data da Publicação : 01/08/2018
Classe/Assunto : AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador : 6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a) : POUL ERIK DYRLUND
Comarca : TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : POUL ERIK DYRLUND
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