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Jurisprudência


TRF2 0106982-10.2016.4.02.5101 01069821020164025101

Ementa
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE REGULARIDADE FISCAL. MATRIZ E FILIAIS. CNPJ DISTINTOS. AUTONOMIA JURÍDICO-ADMINISTRATIVA. IRRELEVÂNCIA NO QUE DIZ RESPEITO À UNIDADE PATRIMONIAL DA DEVEDORA. PRECEDENTE OBRIGATÓRIO DO STJ. 1- É sabido que a jurisprudência tem se posicionado no sentido de que, em linha de princípio, cada estabelecimento tem seu domicílio tributário, onde as obrigações tributárias são geradas, de modo que os respectivos encargos são exigidos conforme a situação específica e peculiar de cada filial. A partir disso, o STJ tem proferido entendimento no sentido de que cada estabelecimento de empresa que tenha CNPJ individual tem direito a certidão positiva com efeito de negativa em seu nome, ainda que restem pendências tributárias de outros estabelecimentos do mesmo grupo econômico, quer seja matriz ou filial. 2- A matriz e filial são a mesma pessoa jurídica, com o mesmo CNPJ, que muda apenas a terminação, para fins de identificação. Segundo a doutrina de Leandro Paulsen, nesse contexto, o tratamento unitário pode inviabilizar as providências necessárias à obtenção de certidões, "implicando em complexidade invencível, reveladora de ônus demasiado ao contribuinte". 3- A sociedade empresária é identificada como contribuinte pelo número de sua inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, sendo que a Secretaria da Receita Federal, através da Instrução Normativa SRF nº 1634/2016, que regulamenta atualmente a matéria, considera a matriz e filiais sujeitos à inscrição individualizada no CNPJ. 4- A jurisprudência passou a interpretar o artigo 127, II, do Código Tributário Nacional, cada estabelecimento tem seu domicílio tributário, não sendo possível a recusa de emissão de certidão negativa a determinado estabelecimento sob a alegação de que outros estabelecimentos da recorrida têm débitos junto à Administração Fiscal. 5- Pelas normas de Direito Civil, a matriz e filial constituem estabelecimentos da mesma pessoa jurídica de direito privado. Com efeito, a empresa é considerada uma só, quer haja um, quer haja vários estabelecimentos, sendo esta (exegese do art. 127, II, do CTN) uma questão de domicílio da pessoa jurídica, seara na qual se admite a pluralidade. 6- A esse respeito, o próprio § 1º do art. 75 do Código Civil dispõe que "tendo a pessoa jurídica diversos estabelecimentos em lugares diferentes, cada um deles será considerado domicílio para os atos nele praticados". Nisso, portanto, constitui a autonomia administrativa dos estabelecimentos. 7- Da mesma forma que o dispositivo da legislação civil acima mencionado, o Código Tributário Nacional, em seu art. 127, II, estabelece a possibilidade de pluralidade de domicílios, para fins fiscais. 1 8- É importante destacar que a interpretação dada pelo Superior Tribunal de Justiça ao art. 127, II, do CTN, bem como pela adoção da idéia de autonomia jurídico-funcional dos estabelecimento que possuam CNPJ próprio foi o de prestigiar a descentralização da administração empresarial, otimizando-a, portanto. 9- A distinção deve ser feita aqui para que esses precedentes não sejam considerados como fundamento para a realização de planejamento tributário fraudulento. Com efeito, as empresas poderão realizar planejamento tributário ilegal, transferindo débitos para as suas filiais, liberando as matrizes para obter certidão, e participar de licitações, conseguir financiamentos com o BNDES, parcelamentos, etc. A sociedade anônima, que é una, estaria repleta de débitos, em suas filiais, mas apesar disso, realizaria licitações e apta a financiamentos através da matriz. Vislumbrar-se-ia mais um caminho para a fraude e lesão ao erário. 10- A requerente afirma que a requerida se declara empresa gestora de Unidades de Pronto Atendimento (UPA´s 24 h) do Estado do Rio de Janeiro, tendo 10 estabelecimentos filiais, cada um gestor de uma UPA no Estado do Rio de Janeiro, pretendendo celebrar novos contratos públicos em outros Estados da Federação para gerir mais unidades de saúde, necessitando, para tanto, de certidão de regularidade fiscal, mas possui vultosa dívida previdenciária, além de inconsistências nas GFIP´s. Ressalte-se que, à evidência, a aptidão para a contratação com o Poder Público concedida à matriz, beneficiaria toda a pessoa jurídica, que, diga-se novamente, é una, o que no caso da impetrante corresponde a um total de dez estabelecimentos filiais. 11- Não se pretende afastar, aqui, prima facie, o entendimento que vem trilhando o Egrégio Superior Tribunal de Justiça, embora os precedentes citados não tenham sido julgados como representativos de controvérsia. Na verdade, o que se vislumbra é a necessidade da distinção sugerida. Perceba-se que nada impediria que a impetrante, como pessoa jurídica, valer-se do gozo de certidão negativa para a formalização de convênios e contratos que beneficiem toda a sociedade, em nome da matriz, ainda que as filiais possuíssem débitos fiscais exigíveis em seu CNPJ. 12- A própria Portaria Conjunta RFB / PGFN Nº 1751, de 02 de outubro de 2014, que trata da emissão de Certidões, dispõe que "a certidão emitida para pessoa jurídica é válida para o estabelecimento matriz e suas filiais" (art. 3º). 13- O próprio Superior Tribunal de Justiça, ao tratar da responsabilidade patrimonial das filiais em relação à dívida tributária da pessoa jurídica, tratou como irrelevante o fato de a filial possuir CNPJ próprio, por considerar a unidade patrimonial da pessoa jurídica frente ao fisco, ressaltando, inclusive, que a inscrição da filial no CNPJ é derivada do CNPJ da matriz. Esse entendimento foi proferido pela Primeira Seção da Corte Superior em julgamento de recurso representativo de controvérsia, e divulgado no informativo nº 0524, de 28 de agosto de 2013 (REsp 1355812/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/05/2013, DJe 31/05/2013). 14- Dessa forma, a existência de distinção entre o CNPJ da matriz com o da filial se dá em benefício da própria atividade da Administração Fiscal, e não pode servir como elemento apto a alterar a realidade que deve ser retratada na certidão de débitos, qual seja, a existência ou não de débitos em nome da pessoa jurídica. 15- O fato de o número de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica - CNPJ de cada estabelecimento ser diferente ocorre porque as normas relativas a esse cadastro são de natureza tributária e possuem como objetivo central facilitar a atividade fiscalizatória do Estado, sem o efeito, nota-se, de cindir as pessoas jurídicas que se estabelecem em mais de um lugar. 2 Acrescente-se que o STJ tem orientação em sua jurisprudência, com base em doutrina, no sentido de que a filial é uma espécie de estabelecimento empresarial, fazendo parte do acervo patrimonial de uma única pessoa jurídica, partilhando os mesmos sócios, contrato social e firma ou denominação da matriz, de modo que, conforme doutrina majoritária, consiste em uma universalidade de fato, não ostentando personalidade jurídica própria, nem é sujeito de direitos, tampouco uma pessoa distinta da sociedade empresária. 16- O STJ também já decidiu que o princípio tributário da autonomia dos estabelecimentos, cujo conteúdo normativo preceitua que estes devem ser considerados, na forma da legislação específica de cada tributo, unidades autônomas e independentes nas relações jurídico- tributárias travadas com a Administração Fiscal, é um instituto de direito material, ligado à questão do nascimento da obrigação tributária de cada imposto especificamente considerado e não tem relação com a responsabilidade patrimonial dos devedores prevista em um regramento de direito processual, ou com os limites da responsabilidade dos bens da empresa e dos sócios definidos no direito empresarial. 17- Portanto, a mencionada autonomia patrimonial das filiais é um instituto de direito material cujo efeito serve para indicar o nascimento da obrigação tributária, na forma do art. 127, II, do CTN e art. 75, §1º do Código Civil (tanto que a jurisprudência do Superior de Justiça é no sentido de que a matriz não tem legitimidade para representar processualmente as filiais nos casos em que o fato gerador do tributo se dá de maneira individualizada em cada estabelecimento comercial/industrial), e não se presta para cindir a pessoa jurídica ou desconfigurar sua unidade patrimonial com relação ao fisco. Caso contrário, seria contraditório conceber que cada filial/matriz possua plena independência, apto a garanti-la o direito à certidão negativa, independentemente dos débitos dos demais estabelecimentos, e ao mesmo tempo entender que a diversidade de CNPJ não afasta a unidade patrimonial da pessoa jurídica em relação ao fisco, para fins de responsabilidade patrimonial, conforme decidido no REsp 1355812 acima transcrito. 18- Remessa necessária e apelação providas.

Data do Julgamento : 09/03/2017
Data da Publicação : 16/03/2017
Classe/Assunto : APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador : 4ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a) : LUIZ ANTONIO SOARES
Comarca : TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : LUIZ ANTONIO SOARES
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