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Jurisprudência


TRF2 0107166-29.2017.4.02.5101 01071662920174025101

Ementa
DIREITO ADMINISTRATIVO E PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DA Lei nº 3.373/1958. FILHA SOLTEIRA E NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO PERMANENTE. REQUISITOS EXIGIDOS PELA LEI À ÉPOCA DO ÓBITO DO INSTITUIDOR DA PENSÃO. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. JURISPRUDÊNCIA DO TCU EM DISSONÂNCIA COM A ORIENTAÇÃO DO STF. PENSIONISTA MAIOR DE 21 ANOS À ÉPOCA DO ÓBITO. ILEGALIDADE NO ATO DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE DE MANUTENÇÃO DA PENSÃO. INEXISTÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO. REMESSA NECESSÁRIA E RECURSO PROVIDOS. 1. Tratam-se de remessa necessária, que considero interposta, e de apelação interposta pela UNIÃO FEDERAL, tendo por objeto a sentença de fls. 171/176, nos autos da ação ordinária proposta por IEDA COLARES DE NOVAIS em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando a condenação do ente público a se abster de cancelar o benefício de pensão por morte concedido à impetrante com fundamento na Lei nº 3.373/1958. 2. Como causa de pedir, alega a Autora que é beneficiária de pensão por morte instituída em razão do óbito de seu pai, ex-servidor público federal vinculado ao Ministério da Fazenda. Aduz que a Administração Pública deflagrou processo administrativo tendente ao cancelamento do benefício, com espeque no Acórdão 2.780/2016 do Tribunal de Contas da União, com base no fundamento de que a pensionista não comprovou a dependência econômica em relação ao benefício. Sustenta a ocorrência da decadência administrativa, e a aplicabilidade da decisão do Supremo Tribunal Federal que concedeu liminar para suspender os efeitos do referido acórdão do TCU. Afirma, ainda, violação ao princípio da legalidade pela imposição de exigência sem fundamento na lei de concessão do benefício. 3. Sendo a decisão recorrida ilíquida, considera-se interposta a remessa necessária, nos termos da Súmula 61 deste E. Tribunal Regional Federal: "Há remessa necessária nos casos de sentenças ilíquidas e condenatórias, de obrigação de fazer ou de não fazer, nos termos do artigo 496, inciso I e parágrafo 3º, do Código de Processo Civil de 2015". 4. A matéria versada nos autos diz respeito à legalidade do ato administrativo exarado pelo Ministério da Saúde que pode vir a resultar no cancelamento de pensão civil percebida por Ana Amélia da Costa Cunha com base na Lei nº 3.373/1958. Esse diploma legal dispunha sobre o Plano de Assistência ao Funcionário e sua Família, a que se referiam os artigos 161 e 256 da Lei nº 1.711/1952 - o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União - e, embora esta tenha sido revogada pela Lei nº 8.112/1990, aquela continua aplicável por força do princípio do tempus regit actum, visto que a norma de regência da pensão por morte é aquela vigente à 1 época do falecimento do instituidor. O cerne da questão diz respeito à existência de outro requisito para a manutenção do pensionamento, além daqueles expressamente previstos no artigo 5º, parágrafo único, da Lei nº 3.373/1958, qual seja, a dependência econômica do beneficiário em relação ao instituidor da pensão. Tem-se que a orientação do Supremo Tribunal Federal, esposada nas decisões do Min. Edson Fachin quando concedeu medidas cautelares nos Mandados de Segurança Coletivos nºs 34.677 e 34.859 aponta no sentido negativo. 5. Como se sabe, a Lei nº 3.373/1958 foi positivada ainda sob a égide do Código Civil de 1916, que enquadrava as mulheres, mesmo adultas, como relativamente incapazes, fruto das concepções culturais discriminatórias que predominavam até meados do século passado. Dava a lei tratamento distinto aos pensionistas do sexo masculino - que, na forma do artigo 5º, inciso II, alínea "a", daquela lei, deixavam de receber a pensão temporária ao completarem 21 anos, se não fossem inválidos - e às pensionistas do sexo feminino - submetidas à cláusula do parágrafo único do mesmo artigo 5º, que só perderiam a pensão instituída pelo genitor servidor público com a posse em cargo público permanente. Presumia-se legalmente, à época, que as mulheres, menores ou adultas, teriam maior dificuldade de prover o próprio sustento se fossem ainda solteiras após o falecimento do pai. Logo, a adjetivação "temporária" para a pensão por morte recebida pela filha beneficiária tinha uma conotação distinta daquela referente à pensão percebida pelo filho beneficiário, uma vez que a deste cessava ao atingir os 21 anos (então a maioridade civil), e daquela somente se viesse a ocupar cargo público ou se se casasse. A ratio da norma, portanto, era a de proteger financeiramente as mulheres adultas ainda não casadas, já que dificilmente seriam incorporadas ao mercado de trabalho formal. 6. A jurisprudência do Tribunal de Contas da União, que até período relativamente recente, ainda zelava pela aplicação integral do disposto na Lei nº 3.373/1958 para as pensões instituídas sob sua vigência, como se vê pelo que dispunha o Enunciado 168 da sua súmula, passou a entender, no Acórdão 892/2012, que a pensão civil prevista naquela lei só poderia subsistir, para mulheres maiores de 21 anos e solteiras, acaso esta dependesse economicamente do instituidor; se a beneficiária passasse ter condições de prover seu próprio sustento, a hipótese seria de cassar o benefício, a qualquer tempo. Esse acórdão representou uma completa guinada jurisprudencial da Corte de Contas, a qual culminou com a edição da Súmula 285 em 2014, com singela fórmula: "A pensão da Lei 3.373/1958 somente é devida à filha solteira maior de 21 anos enquanto existir dependência econômica em relação ao instituidor da pensão, falecido antes do advento da Lei 8.112/1990". A lógica de tal decisório está fundamentada na premissa de que, tendo a pensão sido criada, em 1958, para proteger dependentes econômicos dos servidores públicos, ela está sujeita à dinâmica dos institutos jurídicos que se prolongam no tempo, isto é, a cláusula rebus sic stantibus, de forma que, uma vez cessados os motivos que justificaram a concessão do benefício, dentre os quais estaria, pretensamente, a dependência econômica, ele poderia ser extinto. 7. A nova orientação foi reafirmada em outro julgado paradigma do TCU, o Acórdão 2.780/2016, em que definiu que o benefício não poderia ser percebido por "pensionistas que contarem com recebimento de renda própria, advinda de relação de emprego, na iniciativa privada, de atividade empresarial, na condição de sócias ou representantes de pessoas jurídicas ou de benefício do INSS". Tal decisório tem sido usado como fundamento para instauração de diversos procedimentos administrativos no âmbito da Administração Pública visando a apuração de "pagamento indevido" a pensionistas que ainda recebam o benefício instituído na forma da Lei nº 3.373/1958. 2 8. Feitas as ponderações acerca da matéria de direito, nota-se que o presente caso revela uma peculiaridade, a impedir o acolhimento da pretensão autoral, que é a circunstância de a pensionista já ser maior de 21 (vinte e um) anos quando da concessão do benefício. Com efeito, tendo ela nascido em 01/11/1942 (fl. 27), já contava com quase 30 (trinta) anos de idade quando do óbito de seu genitor, que se deu em 26/07/1972 (fl. 32), ou seja, muito após ter completado a idade limite para fazer jus ao benefício previdenciário. O artigo 5º, parágrafo único, da Lei nº 3.373/1958, não autoriza a concessão da pensão por morte em favor de filhas solteiras e maiores de 21 anos, mas autoriza a manutenção do benefício para aquelas que receberam antes de atingir a referida idade, que, à época, coincidia com a maioridade civil. Sem prejuízo de toda a linha de raciocínio antes deduzida, acerca do Acórdão 2.780/2016 do Tribunal de Contas da União e do entendimento fixado pelo Min. Edson Fachin no julgamento do MS 34.859, tem-se que os requisitos para a concessão da pensão por morte continuam sendo aqueles previstos nos incisos do caput do artigo 5º da Lei nº 3.373/1958. Em se tratando de filhos, conforme o inciso II, alínea "a", desse dispositivo legal, tanto homens quanto mulheres, a lei estabelece a idade de 21 anos como marco limite, ou, no caso dos inválidos, a eventual data da cessação da invalidez. O parágrafo único do artigo 5º, como já esclarecido, não fez senão abrir uma exceção para as pensionistas menores de 21 anos, para que continuassem a perceber o benefício após aquela idade, desde que mantidas as condições previstas nesse dispositivo legal. 9. A jurisprudência deste E. Tribunal Regional Federal vem se encaminhando no sentido de não reconhecer direito à percepção do benefício da pensão por morte, com base na Lei nº 3.373/1958, para as pensionistas que já eram comprovadamente maiores de 21 (vinte e um) anos quando do óbito do instituidor da pensão. Exemplificativamente, confiram-se os seguintes arestos, de diferentes Turma desta C. Corte da Justiça Federal: TRF-2 - APELREEX 0123665- 88.2017.4.02.5101 (2017.51.01.123665-4) - 7ª Turma Especializada - Rel. Des. Fed. JOSÉ ANTÔNIO NEIVA - Data de decisão: 23/03/2018 - Data de disponibilização: 02/04/2018 e TRF- 2 - AC 0014821-25.2009.4.02.5101 (2009.51.01.014821-9) - 5ª Turma Especializada - Rel. Des. Fed. RICARDO PERLINGEIRO - Data de decisão: 24/08/2017 - Data de disponibilização: 29/08/2017. 10. Dado provimento à remessa necessária e à apelação da União Federal, reformando a sentença para julgar improcedentes os pedidos autorais, bem como para cassar a liminar que antecipou os efeitos da tutela.

Data do Julgamento : 07/12/2018
Data da Publicação : 12/12/2018
Classe/Assunto : AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador : 6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a) : POUL ERIK DYRLUND
Comarca : TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : POUL ERIK DYRLUND
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