TRF2 0110209-08.2016.4.02.5101 01102090820164025101
DIREITO ADMINISTRATIVO E PREVIDENCIÁRIO. EX-SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. VANTAGEM
DO ARTIGO 184, INCISO II, DA LEI Nº 1.711/52. VALOR RECEBIDO INDEVIDAMENTE
EM RAZÃO DE EQUÍVOCO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. POSSIBILIDADE DE
REVISÃO. ILEGALIDADE QUE NÃO CONVALESCE. INAPLICÁVEL A REGRA DA DECADÊNCIA
QUINQUENAL. INOCORRÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. IMPOSSIBILIDADE DE
RESSARCIMENTO AO ERÁRIO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELO APOSENTADO. RECURSO
DESPROVIDO. 1. Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pela
UNIÃO FEDERAL, nos autos da ação ordinária proposta por DAVID ZIBEMBERG,
objetivando a declaração de nulidade de ato administrativo que readequou o
valor dos proventos recebidos a título do adicional previsto no artigo 184,
inciso II, da Lei nº 1.711/52, bem como a abstenção do ente público de pedir
a devolução de valores já percebidos. 2. Como causa de pedir, alega o Autor
que, na condição de servidor público federal do quadro funcional do Ministério
da Saúde, se aposentou em 03/04/1992, com a percepção da vantagem do artigo
184, inciso II, do antigo Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União
(rubrica "Vant. Art. 184 Inc II L. 1.711"), consistente em aumento de 20%
dos proventos para aquele que se aposentasse na última classe da respectiva
carreira. Aduz que a referida vantagem foi reduzida por ato do Ministério
da Saúde lastreado em procedimento da Controladoria-Geral da União, devendo
sua ilegalidade ser reconhecida, seja pelo decurso do prazo decadencial do
artigo 54 da Lei nº 9.784/99, seja pela violação ao princípio constitucional
da irredutibilidade dos vencimentos, ou então pela violação ao contraditório
e à ampla defesa. Subsidiariamente, pede que a União Federal seja condenada a
se abster de exigir a reposição dos valores, recebidos de boa-fé. 3. A matéria
vertida aos autos diz respeito a legalidade do ato administrativo exarado pelo
Ministério da Saúde que reduziu os proventos correspondentes à Vantagem do
artigo 184, inciso II, da Lei nº 1.711/52 - o antigo Estatuto dos Funcionários
Civis da União - em razão de auditoria realizada pela Controladoria-Geral
da União (CGU). Conforme demonstrado nos autos, foi incluída, em razão de
equívoco administrativo, a gratificação de desempenho (GDPST) na base de
cálculo do referido provento, indo de encontro à vedação do artigo 5º-B,
§ 4º, da Lei nº 11.355/06, motivo pelo qual se procedeu à redução do valor
de R$ 1.113,04 (mil e centro e treze reais e quatro centavos) para R$ 886,34
(oitocentos e oitenta e seis reais e trinta e quatro centavos), a partir de
abril de 2016. 4. É consolidado na jurisprudência desta E. Corte Federal o
entendimento de que a previsão do 1 artigo 54 da Lei nº 9.784/99, o qual impõe
à Administração Pública prazo decadencial de 5 (cinco) anos para exercício
do poder-dever de autotutela, se aplica para hipóteses de anulabilidades nos
atos e processos administrativos, vez que estas pressupõem vícios sanáveis,
ao passo que as nulidades, por decorrerem de transgressão à lei, jamais
convalescem pelo decurso do tempo. 5. Em relação à arguição de cerceamento de
defesa, também não deve ser acolhida, uma vez que a presente hipótese envolveu
unicamente a correção de um erro de cálculo, pela inclusão indevida de um
valor a mais na base de cálculo, sem causar a completa supressão da vantagem
do aposentado, mas apenas sua readequação financeira. 6. Vem se entendendo
que quando o pagamento indevido de valores pela Administração Pública ao
particular decorre de erro do próprio ente público, como na presente hipótese,
estando o administrado de boa-fé, deve ser afastada a previsão do artigo
46 da Lei nº 8.112/90, o qual determina a reposição ao erário público. Não
tendo o particular agido de má-fé, ou, como ocorreu nesta situação, quando
ele sequer sabia que o numerário era indevido, e nem teria motivos para
assim suspeitar, criou-se uma legítima expectativa de que os valores seriam
legais e definidos. Afinal, o princípio que veda o enriquecimento indevido
falece diante da boa-fé do indivíduo que foi beneficiado pela má atuação
do Estado. Esse entendimento foi cristalizado na Tese nº 531 dos Recursos
Especiais Repetitivos (REsp 1244182/PB, Rel. Min. Benedito Gonçalves,
publicado em 19/10/2012), com seguinte redação: "Quando a Administração
Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido
ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são
legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos,
ante a boa-fé do servidor público". É no mesmo sentido a orientação deste
E. Tribunal Regional Federal. 7. Negado provimento à remessa necessária e
à apelação interposta, e majoro a verba honorária em 1% (hum por cento),
sobre o valor da condenação na forma do artigo 85, § 11, do CPC.
Ementa
DIREITO ADMINISTRATIVO E PREVIDENCIÁRIO. EX-SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. VANTAGEM
DO ARTIGO 184, INCISO II, DA LEI Nº 1.711/52. VALOR RECEBIDO INDEVIDAMENTE
EM RAZÃO DE EQUÍVOCO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. POSSIBILIDADE DE
REVISÃO. ILEGALIDADE QUE NÃO CONVALESCE. INAPLICÁVEL A REGRA DA DECADÊNCIA
QUINQUENAL. INOCORRÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. IMPOSSIBILIDADE DE
RESSARCIMENTO AO ERÁRIO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELO APOSENTADO. RECURSO
DESPROVIDO. 1. Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pela
UNIÃO FEDERAL, nos autos da ação ordinária proposta por DAVID ZIBEMBERG,
objetivando a declaração de nulidade de ato administrativo que readequou o
valor dos proventos recebidos a título do adicional previsto no artigo 184,
inciso II, da Lei nº 1.711/52, bem como a abstenção do ente público de pedir
a devolução de valores já percebidos. 2. Como causa de pedir, alega o Autor
que, na condição de servidor público federal do quadro funcional do Ministério
da Saúde, se aposentou em 03/04/1992, com a percepção da vantagem do artigo
184, inciso II, do antigo Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União
(rubrica "Vant. Art. 184 Inc II L. 1.711"), consistente em aumento de 20%
dos proventos para aquele que se aposentasse na última classe da respectiva
carreira. Aduz que a referida vantagem foi reduzida por ato do Ministério
da Saúde lastreado em procedimento da Controladoria-Geral da União, devendo
sua ilegalidade ser reconhecida, seja pelo decurso do prazo decadencial do
artigo 54 da Lei nº 9.784/99, seja pela violação ao princípio constitucional
da irredutibilidade dos vencimentos, ou então pela violação ao contraditório
e à ampla defesa. Subsidiariamente, pede que a União Federal seja condenada a
se abster de exigir a reposição dos valores, recebidos de boa-fé. 3. A matéria
vertida aos autos diz respeito a legalidade do ato administrativo exarado pelo
Ministério da Saúde que reduziu os proventos correspondentes à Vantagem do
artigo 184, inciso II, da Lei nº 1.711/52 - o antigo Estatuto dos Funcionários
Civis da União - em razão de auditoria realizada pela Controladoria-Geral
da União (CGU). Conforme demonstrado nos autos, foi incluída, em razão de
equívoco administrativo, a gratificação de desempenho (GDPST) na base de
cálculo do referido provento, indo de encontro à vedação do artigo 5º-B,
§ 4º, da Lei nº 11.355/06, motivo pelo qual se procedeu à redução do valor
de R$ 1.113,04 (mil e centro e treze reais e quatro centavos) para R$ 886,34
(oitocentos e oitenta e seis reais e trinta e quatro centavos), a partir de
abril de 2016. 4. É consolidado na jurisprudência desta E. Corte Federal o
entendimento de que a previsão do 1 artigo 54 da Lei nº 9.784/99, o qual impõe
à Administração Pública prazo decadencial de 5 (cinco) anos para exercício
do poder-dever de autotutela, se aplica para hipóteses de anulabilidades nos
atos e processos administrativos, vez que estas pressupõem vícios sanáveis,
ao passo que as nulidades, por decorrerem de transgressão à lei, jamais
convalescem pelo decurso do tempo. 5. Em relação à arguição de cerceamento de
defesa, também não deve ser acolhida, uma vez que a presente hipótese envolveu
unicamente a correção de um erro de cálculo, pela inclusão indevida de um
valor a mais na base de cálculo, sem causar a completa supressão da vantagem
do aposentado, mas apenas sua readequação financeira. 6. Vem se entendendo
que quando o pagamento indevido de valores pela Administração Pública ao
particular decorre de erro do próprio ente público, como na presente hipótese,
estando o administrado de boa-fé, deve ser afastada a previsão do artigo
46 da Lei nº 8.112/90, o qual determina a reposição ao erário público. Não
tendo o particular agido de má-fé, ou, como ocorreu nesta situação, quando
ele sequer sabia que o numerário era indevido, e nem teria motivos para
assim suspeitar, criou-se uma legítima expectativa de que os valores seriam
legais e definidos. Afinal, o princípio que veda o enriquecimento indevido
falece diante da boa-fé do indivíduo que foi beneficiado pela má atuação
do Estado. Esse entendimento foi cristalizado na Tese nº 531 dos Recursos
Especiais Repetitivos (REsp 1244182/PB, Rel. Min. Benedito Gonçalves,
publicado em 19/10/2012), com seguinte redação: "Quando a Administração
Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido
ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são
legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos,
ante a boa-fé do servidor público". É no mesmo sentido a orientação deste
E. Tribunal Regional Federal. 7. Negado provimento à remessa necessária e
à apelação interposta, e majoro a verba honorária em 1% (hum por cento),
sobre o valor da condenação na forma do artigo 85, § 11, do CPC.
Data do Julgamento
:
17/05/2018
Data da Publicação
:
22/05/2018
Classe/Assunto
:
APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e
do Trabalho
Órgão Julgador
:
6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
ALFREDO JARA MOURA
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
ALFREDO JARA MOURA
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