TRF2 0110703-47.2014.4.02.5001 01107034720144025001
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. FÍSTULA
VESICO-VAGINAL. DANO MORAL CONFIGURADO. REDUÇÃO DA INDENIZAÇÃO. DANO
MATERIAL. NECESSIDADE DE EFETIVA COMPROVAÇÃO. RESSARCIMENTO DOS
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. IMPOSSIBILIDADE. JUROS MORATÓRIOS
E CORREÇÃO MONETÁRIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. REDUÇÃO DOS HONORÁRIOS
SUCUMBENCIAIS. APELAÇÃO ADESIVA DA PARTE AUTORA DESPROVIDA. APELAÇÃO DA
UNIÃO FEDERAL E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS I - Trata-se de
Remessa Necessária, de Apelação Cível e de Apelação Adesiva em face de
sentença que julgou parcialmente procedente o pedido contido na inicial,
para condenar a parte ré a pagar a importância de R$ 50.000,00 (cinquenta
mil reais), a título de indenização pelos danos morais, e de R$ 1.200,00
(mil e duzentos reais), a título de indenização pelos danos materiais. II -
No caso concreto, a Autora, por apresentar quadro de adenomiose, foi submetida
a procedimento de histerectomia no Hospital Naval Marcílio Dias, vinculado à
Marinha do Brasil, tendo sofrido fístula vesico-vaginal, o que lhe provocou
incontinência urinária contínua pelo período de dezenove meses, fazendo-se
necessária a realização de nova cirurgia para reparar a criação do trajeto
anômalo entre a bexiga e a vagina. III - É inegável que o Hospital atuou
com negligência dos devidos cuidados, não se tratando de mera iatrogenia,
de modo que se conclui que o dano suportado pela Autora não foi meramente
previsível e necessário no tratamento a que foi submetida, não decorrendo,
pois, do simples atuar médico. Logo, a criação de comunicação não anatômica
entre a bexiga e a vagina decorrente da cirurgia de histerectomia afigura-se
como erro médico. IV - Além disso, a omissão administrativa resulta do fato
de não terem sido tomadas, no pós- operatório e no retorno na emergência, as
medidas necessárias para constatação da lesão. V - Destarte, evidencia-se que
o dever médico de proporcionar ao paciente todos os cuidados conscienciosos
e atentos, de acordo com as aquisições da ciência, não ocorreu na hipótese
dos autos. VI - Reexaminando o conteúdo fático-probatório dos autos e
sopesando o evento danoso e a sua repercussão na esfera psicológica do
ofendido, mostra-se exagerado o montante de R$ 50.000,00 (cinquenta mil
reais) fixado pelo Juízo a quo, merecendo, nesta parte, reforma a Sentença
recorrida para fixar os danos morais em R$ 20.000,00 (vinte mil reais),
valor que se demonstra compatível com as circunstâncias observadas no caso
em concreto. VII - Quanto aos danos materiais, cumpre consignar que somente é
indenizável o dano material mediante prova efetiva de sua ocorrência. Assim,
devem ser ressarcidos apenas os valores efetivamente comprovados relativos
às despesas efetuadas para aquisição de fraldas e 1 absorventes geriátricos,
no período de abril/2014 a dezembro/2015, não sendo cabível a fixação dos
valores a serem restituídos por meio de presunção do que foi gasto, tampouco
através de uma média mensal. VIII - Vale ressaltar, por oportuno, que,
no caso de reparação por erro médico, sendo a responsabilidade contratual,
a correção monetária dos valores devidos a título de dano material incide da
data do efetivo prejuízo. Já quanto aos danos morais, a correção monetária
sobre o quantum devido a tal título incide a partir da data do arbitramento
(Súmula 362/STJ) e os juros de mora, desde a citação. IX - No que pertine
às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a incidência
dos juros moratórios deve observar os critérios fixados na legislação
infraconstitucional (índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados
à caderneta de poupança, conforme dispõe o art. 1º-F da Lei 9.494/97, com
a redação dada pela Lei nº 11.960/09). X - Em relação aos juros de mora
incidentes nas condenações impostas à Fazenda oriundas de relação jurídica
não-tributária, os mesmos devem observar o índice de 0,5% ao mês (Código Civil
de 1916) até o advento do Decreto-Lei nº 2.322/87, a partir de quando devem
observar o índice de 1% ao mês (art. 3º do Decreto-Lei nº 2.322/87) até o
advento da MP nº 2.180-35 (24/08/2001). A partir desta MP, que acrescentou
o art. 1º-F à Lei nº 9.494/97, os juros de mora deverão observar o índice
de 0,5% ao mês até o início da vigência da Lei nº 11.960/09 (30/06/2009),
momento em que deverá incidir o percentual estabelecido para a caderneta
de poupança, ressalvada apenas a expressão "haverá a incidência uma única
vez", em observância à Súmula nº 56 deste Tribunal Regional Federal. XI -
Em relação à correção monetária nas condenações impostas à Fazenda Pública,
em virtude da recente decisão do Supremo Tribunal Federal nos autos do RE
870.947/SE, sob o regime da repercussão geral, a conclusão é a de que deve
ser observado o Manual de Cálculos da Justiça Federal que prevê a aplicação do
Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), durante todo o período
do cálculo, até o efetivo pagamento. XII - Acerca dos honorários contratuais,
o C. Superior Tribunal de Justiça possui entendimento firmado de que os custos
decorrentes da contratação de advogado para ajuizamento de ação, por si sós,
não constituem ilícito capaz de ensejar danos materiais indenizáveis. XIII -
No que concerne ao pedido de indenização complementar do art. 404, parágrafo
único, do Código Civil, resta evidente que tal pleito configura indevida
inovação recursal, haja vista que o mesmo não constou da exordial, o que
inviabiliza seu exame. XIV - Pelo exame dos autos, considerando o princípio
da justa indenização ao advogado, traduzido no grau de complexidade e de
trabalho realizado pelos causídicos, bem como o tempo exigido para o seu
serviço, verifica-se que a verba sucumbencial fixada em R$ 20.000,00 (vinte
mil reais) não se coaduna com o previsto no dispositivo legal supramencionado,
tendo em vista a simplicidade do presente feito, em que não houve atividade
probatória suplementar, razão pela qual reduzo os honorários advocatícios
sucumbenciais, fixando-os em R$ 2.000,00 (dois mil reais). XV - Apelação
Adesiva da Parte Autora desprovida e Remessa Necessária e Apelação da União
Federal parcialmente providas.
Ementa
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. FÍSTULA
VESICO-VAGINAL. DANO MORAL CONFIGURADO. REDUÇÃO DA INDENIZAÇÃO. DANO
MATERIAL. NECESSIDADE DE EFETIVA COMPROVAÇÃO. RESSARCIMENTO DOS
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. IMPOSSIBILIDADE. JUROS MORATÓRIOS
E CORREÇÃO MONETÁRIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. REDUÇÃO DOS HONORÁRIOS
SUCUMBENCIAIS. APELAÇÃO ADESIVA DA PARTE AUTORA DESPROVIDA. APELAÇÃO DA
UNIÃO FEDERAL E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS I - Trata-se de
Remessa Necessária, de Apelação Cível e de Apelação Adesiva em face de
sentença que julgou parcialmente procedente o pedido contido na inicial,
para condenar a parte ré a pagar a importância de R$ 50.000,00 (cinquenta
mil reais), a título de indenização pelos danos morais, e de R$ 1.200,00
(mil e duzentos reais), a título de indenização pelos danos materiais. II -
No caso concreto, a Autora, por apresentar quadro de adenomiose, foi submetida
a procedimento de histerectomia no Hospital Naval Marcílio Dias, vinculado à
Marinha do Brasil, tendo sofrido fístula vesico-vaginal, o que lhe provocou
incontinência urinária contínua pelo período de dezenove meses, fazendo-se
necessária a realização de nova cirurgia para reparar a criação do trajeto
anômalo entre a bexiga e a vagina. III - É inegável que o Hospital atuou
com negligência dos devidos cuidados, não se tratando de mera iatrogenia,
de modo que se conclui que o dano suportado pela Autora não foi meramente
previsível e necessário no tratamento a que foi submetida, não decorrendo,
pois, do simples atuar médico. Logo, a criação de comunicação não anatômica
entre a bexiga e a vagina decorrente da cirurgia de histerectomia afigura-se
como erro médico. IV - Além disso, a omissão administrativa resulta do fato
de não terem sido tomadas, no pós- operatório e no retorno na emergência, as
medidas necessárias para constatação da lesão. V - Destarte, evidencia-se que
o dever médico de proporcionar ao paciente todos os cuidados conscienciosos
e atentos, de acordo com as aquisições da ciência, não ocorreu na hipótese
dos autos. VI - Reexaminando o conteúdo fático-probatório dos autos e
sopesando o evento danoso e a sua repercussão na esfera psicológica do
ofendido, mostra-se exagerado o montante de R$ 50.000,00 (cinquenta mil
reais) fixado pelo Juízo a quo, merecendo, nesta parte, reforma a Sentença
recorrida para fixar os danos morais em R$ 20.000,00 (vinte mil reais),
valor que se demonstra compatível com as circunstâncias observadas no caso
em concreto. VII - Quanto aos danos materiais, cumpre consignar que somente é
indenizável o dano material mediante prova efetiva de sua ocorrência. Assim,
devem ser ressarcidos apenas os valores efetivamente comprovados relativos
às despesas efetuadas para aquisição de fraldas e 1 absorventes geriátricos,
no período de abril/2014 a dezembro/2015, não sendo cabível a fixação dos
valores a serem restituídos por meio de presunção do que foi gasto, tampouco
através de uma média mensal. VIII - Vale ressaltar, por oportuno, que,
no caso de reparação por erro médico, sendo a responsabilidade contratual,
a correção monetária dos valores devidos a título de dano material incide da
data do efetivo prejuízo. Já quanto aos danos morais, a correção monetária
sobre o quantum devido a tal título incide a partir da data do arbitramento
(Súmula 362/STJ) e os juros de mora, desde a citação. IX - No que pertine
às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a incidência
dos juros moratórios deve observar os critérios fixados na legislação
infraconstitucional (índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados
à caderneta de poupança, conforme dispõe o art. 1º-F da Lei 9.494/97, com
a redação dada pela Lei nº 11.960/09). X - Em relação aos juros de mora
incidentes nas condenações impostas à Fazenda oriundas de relação jurídica
não-tributária, os mesmos devem observar o índice de 0,5% ao mês (Código Civil
de 1916) até o advento do Decreto-Lei nº 2.322/87, a partir de quando devem
observar o índice de 1% ao mês (art. 3º do Decreto-Lei nº 2.322/87) até o
advento da MP nº 2.180-35 (24/08/2001). A partir desta MP, que acrescentou
o art. 1º-F à Lei nº 9.494/97, os juros de mora deverão observar o índice
de 0,5% ao mês até o início da vigência da Lei nº 11.960/09 (30/06/2009),
momento em que deverá incidir o percentual estabelecido para a caderneta
de poupança, ressalvada apenas a expressão "haverá a incidência uma única
vez", em observância à Súmula nº 56 deste Tribunal Regional Federal. XI -
Em relação à correção monetária nas condenações impostas à Fazenda Pública,
em virtude da recente decisão do Supremo Tribunal Federal nos autos do RE
870.947/SE, sob o regime da repercussão geral, a conclusão é a de que deve
ser observado o Manual de Cálculos da Justiça Federal que prevê a aplicação do
Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), durante todo o período
do cálculo, até o efetivo pagamento. XII - Acerca dos honorários contratuais,
o C. Superior Tribunal de Justiça possui entendimento firmado de que os custos
decorrentes da contratação de advogado para ajuizamento de ação, por si sós,
não constituem ilícito capaz de ensejar danos materiais indenizáveis. XIII -
No que concerne ao pedido de indenização complementar do art. 404, parágrafo
único, do Código Civil, resta evidente que tal pleito configura indevida
inovação recursal, haja vista que o mesmo não constou da exordial, o que
inviabiliza seu exame. XIV - Pelo exame dos autos, considerando o princípio
da justa indenização ao advogado, traduzido no grau de complexidade e de
trabalho realizado pelos causídicos, bem como o tempo exigido para o seu
serviço, verifica-se que a verba sucumbencial fixada em R$ 20.000,00 (vinte
mil reais) não se coaduna com o previsto no dispositivo legal supramencionado,
tendo em vista a simplicidade do presente feito, em que não houve atividade
probatória suplementar, razão pela qual reduzo os honorários advocatícios
sucumbenciais, fixando-os em R$ 2.000,00 (dois mil reais). XV - Apelação
Adesiva da Parte Autora desprovida e Remessa Necessária e Apelação da União
Federal parcialmente providas.
Data do Julgamento
:
13/10/2017
Data da Publicação
:
18/10/2017
Classe/Assunto
:
APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e
do Trabalho
Órgão Julgador
:
6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
REIS FRIEDE
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
REIS FRIEDE
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