TRF2 0114529-67.2017.4.02.5101 01145296720174025101
DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. MULTA
IMPOSTA PELA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - ANS. REAJUSTE POR
FAIXA ETÁRIA. CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS ADVOGADOS. SUBMISSÃO À REGULAÇÃO
DA ANS. PLANO PRIVADO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE. CONTRATO ANTIGO. ANTERIOR
À LEI Nº 9.656/98. APLICABILIDADE DA LEI PARA INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS
COMETIDAS POSTERIORMENTE À SUA VIGÊNCIA. COMPETÊNCIA DA ANS. APLICABILIDADE
DO CDC. SEM INDICAÇÃO DOS PERCENTUAIS DE REAJUSTE NA APÓLICE. VIOLAÇÃO
AO DEVER DE INFORMAÇÃO. REGULARIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO. RAZOABILIDADE
E PROPORCIONALIDADE DA MULTA. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO POR PENA DE
MULTA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta pela CAIXA DE
ASSISTÊNCIA DOS ADVOGADOS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - CAARJ nos autos dos
embargos à execução propostos em face da AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR
- ANS, objetivando a extinção da Execução Fiscal nº 0516952-42.2011.4.02.5101,
a qual pretende a cobrança de multa administrativa imposta com fundamento na
Lei nº 9.656/98 e na Resolução de Diretoria Colegiada nº 24/00. 2. Os presentes
embargos à execução buscam desconstituir o título executivo representado pela
CDA nº 000000003488-64, a qual incorpora crédito fiscal no montante global de
R$ 31.915,80, atualizado em maio de 2011, correspondente à multa aplicada por
cometimento da infração tipificada no artigo 5º, inciso VII, da RDC nº 24/00 da
ANS, fundamentada no artigo 25, inciso II, da Lei nº 9.656/98 e no artigo 4º,
inciso XVII, da Lei nº 9.961/00. 3. Não prospera a tese de que a CAARJ não
se submete à disciplina regulatória da agência reguladora embargada. Já foi
pacificado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, à qual a deste
Tribunal Regional Federal presta deferência, o entendimento de que a CAARJ
possui natureza jurídica de direito público, sendo dotada de personalidade
própria em relação à Ordem dos Advogados do Brasil, mas, por operar planos
privados de assistência à saúde, ela se sujeita à regulação do setor,
realizada pela ANS. É harmônico, no mesmo sentido, o entendimento deste
E. Tribunal Regional Federal: TRF-2 - AC 0122840-47.2017.4.02.5101 [TRF2
2017.51.01.122840-2] - 8ª Turma Especializada - Rel. Des. Fed. GUILHERME
DIEFENTHAELER - Data de decisão: 07/05/2018 - Data de disponibilização:
11/05/2018. Logo, independentemente da qualidade do prestador de serviço,
seja pessoa jurídica de direito público 1 ou privado, fato é que, atuando ela
na iniciativa privada como operadora de planos privados de saúde suplementar,
é certo que sua atividade deve ser exercida em conformidade com o regramento
positivado pela agência reguladora dessa ramo da economia. 4. Na sequência,
a embargante sustenta que a Lei nº 9.656/98 não é aplicável aos contratos
celebrados em data anterior ao início de vigência da lei e, por livre escolha
dos beneficiários, não adaptados à sistemática legal, concluindo, na sequência,
que a ANS não possui competência para autuar as operadoras. Afirma, nessa
senda, que a apreciação de eventuais ilegalidades deveria ter sido feita
pela Superintendência de Seguros Privados - SUSEP ou por órgãos de proteção
ao consumidor. O argumento não resiste a uma perfunctória compreensão do
regime jurídico criado pela Lei nº 9.656/98. Esse diploma legal, de 03
de junho de 1998, pretende não somente disciplinar as relações jurídicas
estabelecidas entre as operadoras de planos de saúde e os consumidores
- regidas essencialmente pelo direito privado contratual -, mas também
as relações jurídicas entre aquelas e o Estado, aqui presentado por uma
autarquia em regime especial, a ANS, criada pela Lei nº 9.961/00 - e que são,
necessariamente, de direito público administrativo, por estarem inseridas no
escopo da atividade regulatória do Estado, a ele incumbida pelo artigo 174 da
Constituição Federal. É dizer, em outras palavras, que o conteúdo normativo
da lei se presta não somente a balizar o exercício da autonomia contratual
no âmbito dos seguros de saúde, mas também a disciplinar as condutas das
próprias seguradoras enquanto agentes econômicos de um setor regulado. Disso
se conclui que, embora algumas normas da Lei nº 9.656/98 não possam retroagir
para atingir avenças celebradas anteriormente à vigência, o que vulneraria
a autonomia da vontade, como, aliás, reconhece o próprio artigo 35, caput,
desse diploma legal, outras delas, por constituírem previsões legais
para autorizar o exercício do poder de polícia pela agência reguladora,
se aplicam a quaisquer transgressões perpetradas após a sua vigência,
ainda que envolvendo um contrato anterior à lei, o que vem expresso no seu
artigo 25. Assim, o artigo 35 consagra uma regra geral para as situações
que envolvam unicamente os aspectos internos da relação contratual de plano
de assistência à saúde, e, em relação a estas, somente se aplicará a Lei nº
9.656/98 para os contratos celebrados posteriormente à sua vigência, enquanto
que o artigo 25 constitui uma regra de polícia administrativa, e, portanto,
se aplica a qualquer relação contratual de plano de assistência à saúde,
ainda que baseada em contrato anterior e não adaptado, desde que em relação à
infrações administrativas cometidas posteriormente, vez que a lei punitiva não
pode retroagir. 5. Importa ressaltar que, recentemente, o Supremo Tribunal
Federal julgou o mérito da Ação Direta de Inconstitucionalidade 1931/DF,
em acórdão conduzido pelo Min. Marco Aurélio. Malgrado a redação da ementa
possa levar à equivocada conclusão de que deve ser levada em consideração
a legislação vigente à época da contratação, o que, na presente hipótese,
afastaria a Lei nº 9.656/98, deve-se ter em mente que a matéria levada à
julgamento para a Suprema Corte dizia respeito unicamente à constitucionalidade
de dispositivos legais que intervinham na própria relação jurídica contratual,
em seu aspecto intrínseco, não tendo sido discutida pela Corte, em nenhum
momento, qualquer norma atinente ao exercício do poder de polícia da agência
reguladora competente. Em relação à tais normas, como é o caso do supracitado
artigo 25, portanto, permanece intacta a presunção de constitucionalidade. Ora,
tendo a infração administrativa imputada sido cometida em 2002, é evidente
que está sujeita aos preceitos da Lei nº 9.656/98, bem assim ao poder
fiscalizatório e sancionador da ANS, ainda que tenha de tomar como referência
o disposto no próprio contrato celebrado em 2 12/05/1992. 6. O Superior
Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1568244, relatado
pelo Min. Ricardo Villas Bôas Cueva (14/12/2016), julgado pela sistemática
dos recursos repetitivos, definiu diversos parâmetros acerca de reajustes
das contraprestações pecuniárias dos planos privados de assistência à saúde
em razão da idade do usuário. Por sua vez, a Súmula Normativa nº 3/2001 da
ANS dispõe que, nos contratos anteriores à Lei 9.656/98, sem fixação dos
percentuais de majoração, devem ser considerados os valores das tabelas
de venda, desde que comprovadamente vinculadas ao contrato e entregues ao
beneficiário. 7. Na hipótese, observa-se que o instrumento do contrato prevê
expressamente a possibilidade de reajuste, conforme determinadas faixas
etárias, conforme suas Cláusulas 14ª e 15ª. Percebe-se, contudo, que não
há, no próprio texto do contrato, a indicação expressa das faixas etárias
e os correspondentes reajustes. A tabela de reajuste na verdade consta da
chamada "tabela de vendas", mas não da apólice em si, motivo pelo qual se
conclui que deveria a usuária do plano de saúde ter sido informada adequada
e expressamente acerca do reajuste, quando estivesse por ser realizado,
ou seja, quando a usuária completasse a idade para incidência do referido
reajuste. Correta, portanto, a ponderação feita pela magistrada sentenciante,
no sentido de que: "Insta ressaltar que não foi o fato da operadora ter
praticado aumento em razão da mudança de faixa etária que teria configurado
a infração passível de multa, mas sim o fato do percentual de reajuste não
estar explícito na cláusula contratual, constando apenas menção a uma tabela
de prêmios". Com efeito, a penalidade administrativa, no presente caso,
se justifica em razão da violação ao dever de informação a ser prestada
ao usuário, e não propriamente ao contrato em si, que realmente prevê,
em abstrato, a possibilidade de reajuste da mensalidade conforme as faixas
etárias. Ademais, tanto no processo administrativo sancionador, quanto no
presente processo judicial, a CAARJ se resigna estriba em argumentos genéricos
acerca da regularidade do contrato, apresentando modelos genéricos de minuta
contratual, sem que de tal documentação possa se verificar se o segurado teve
conhecimento do fato de que a tabela de reajustes constava, em verdade, do
manual do usuário, e não do próprio corpo da apólice. 8. Tendo em vista que o
Código de Defesa do Consumidor estabelece como direito básico do consumidor
a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com
especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade,
tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem (artigo
6º, inciso III), existe em desfavor do fornecedor um ônus de demonstrar que
tal informação foi prestada a contento. A outro giro, não é razoável presumir
que a usuária tivesse conhecimento da Tabela de Prêmios, que constava de
um documento apartado da própria apólice, esta sim que é o instrumento do
contrato de seguro, e tampouco das circunstâncias de eventual reajuste. Em
síntese: malgrado o reajuste em si tenha sido realizado dentro dos patamares
previstos no próprio contrato, não houve prova sobre a adequada prestação
de informações ao consumidor, mormente porque a reclamação formulada
pela beneficiária à ANS. Nos termos da legislação consumerista, que rege
também os planos de saúde, tal ônus não pode ser repassado ao consumidor,
devendo a fornecedora do serviço providenciar a maior transparência, ainda
que o reajuste em si seja admitido pelo contrato. Na situação concreta ora
em julgamento, forçoso é concluir que, ainda que a beneficiária do seguro
tivesse em mãos a apólice, sequer pelo instrumento do contrato ela poderia
divisar os critérios de reajuste, vez que estes vinham indicados em instrumento
apartado. Essa responsabilidade de prestar adequadamente as informações sobre
as contraprestações devidas é ainda maior no contexto dos contratos de planos
de assistência à 3 saúde, que são de adesão e de longa duração, situando-se o
consumidor numa relação de natural desvantagem, pois sequer pode negociar os
termos da pactuação, devendo optar por aderir integralmente ou não ao regime
contratual oferecido, ao qual provavelmente permanecerá vinculado por anos,
como ocorreu no caso, motivo pelo qual se conclui que deve haver a maior
quantidade de informações para que possa tomar suas decisões de forma racional
e segura. Confira-se: TRF-2 - 0066735-21.2015.4.02.5101 (2015.51.01.066735-1)
- 6ª Turma Especializada - Rel. Des. Fed. REIS FRIEDE - Data de decisão:
22/02/2018 - Data de disponibilização: 10/04/2018. 9. Igualmente não
socorre a pretensão recursal o fato de a magistrada singular ter feito
alusão, quando fundamentou a sentença, ao Estatuto do Idoso, que realmente
proíbe a aplicação de reajuste em razão da idade. Primeiro, porque se trata,
nitidamente, de um reforço argumentativo. O fundamento da imposição da sanção
administrativa continua sendo a norma regulamentar da ANS, sem prejuízo de
a sentença aludir, a título de esclarecimento, à outra norma que corrobora o
mesmo raciocínio. Segundo, porque o Estatuto do Idoso constitui norma de ordem
pública, motivo pelo qual sua aplicação, in concreto, deve ser feita pelo Poder
Judiciário mesmo sem a provocação das partes. 10. Também não merece acolhimento
a tese de nulidade do auto de infração por suposta violação ao princípio da
legalidade do ato administrativo, tendo em vista que, verificada a infração à
norma regulatória da ANS, incumbia ao agente público responsável a instauração
do processo administrativo sancionador para aplicação da penalidade. Já é
de há muito pacificado o entendimento na jurisprudência no sentido de que,
tendo as agências reguladoras sido criadas por lei, as quais, em geral,
instituem para tais entidades a atribuição de normatização e fiscalização
de determinado setor da atividade econômica, as normas por elas produzidas,
e o exercício do seu poder de polícia, se realizados na exata medida da
legislação de regência, como, no caso, as Leis nºs 9.656/98 e 9.961/00, não
transgridem o princípio constitucional da legalidade. 11. Tampouco prospera
a afirmação de irrazoabilidade e desproporcionalidade da sanção aplicada,
tendo em vista que o valor de R$ 21.000,00, o qual constitui o principal da
dívida exequenda, com os acréscimos dos juros e do Decreto-Lei nº 1.025/69,
possuem um caráter dúplice, pedagógico ou dissuasório, e também punitivo ou
repressivo, não cabendo ao Poder Judiciário substituir-se ao administrador
público, mormente a entidade responsável pela regulação do setor econômico,
com fito de transmudar a pena pecuniária numa pena de advertência, a qual
sequer se mostra, em abstrato, cabível à hipótese. Nesse sentido: TRF-2 -
0140794-09.2017.4.02.5101 (2017.51.01.140794-1) - 5ª Turma Especializada -
Rel. Juiz Federal Conv. FIRLY NASCIMENTO FILHO - Data de decisão: 08/05/2018 -
Data de Disponibilização: 10/05/2018. 12. Negado provimento ao recurso. Tendo
em vista que não houve condenação em honorários advocatícios na primeira
instância, não se aplica o artigo 85, § 11, do CPC/15
Ementa
DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. MULTA
IMPOSTA PELA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - ANS. REAJUSTE POR
FAIXA ETÁRIA. CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS ADVOGADOS. SUBMISSÃO À REGULAÇÃO
DA ANS. PLANO PRIVADO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE. CONTRATO ANTIGO. ANTERIOR
À LEI Nº 9.656/98. APLICABILIDADE DA LEI PARA INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS
COMETIDAS POSTERIORMENTE À SUA VIGÊNCIA. COMPETÊNCIA DA ANS. APLICABILIDADE
DO CDC. SEM INDICAÇÃO DOS PERCENTUAIS DE REAJUSTE NA APÓLICE. VIOLAÇÃO
AO DEVER DE INFORMAÇÃO. REGULARIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO. RAZOABILIDADE
E PROPORCIONALIDADE DA MULTA. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO POR PENA DE
MULTA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta pela CAIXA DE
ASSISTÊNCIA DOS ADVOGADOS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - CAARJ nos autos dos
embargos à execução propostos em face da AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR
- ANS, objetivando a extinção da Execução Fiscal nº 0516952-42.2011.4.02.5101,
a qual pretende a cobrança de multa administrativa imposta com fundamento na
Lei nº 9.656/98 e na Resolução de Diretoria Colegiada nº 24/00. 2. Os presentes
embargos à execução buscam desconstituir o título executivo representado pela
CDA nº 000000003488-64, a qual incorpora crédito fiscal no montante global de
R$ 31.915,80, atualizado em maio de 2011, correspondente à multa aplicada por
cometimento da infração tipificada no artigo 5º, inciso VII, da RDC nº 24/00 da
ANS, fundamentada no artigo 25, inciso II, da Lei nº 9.656/98 e no artigo 4º,
inciso XVII, da Lei nº 9.961/00. 3. Não prospera a tese de que a CAARJ não
se submete à disciplina regulatória da agência reguladora embargada. Já foi
pacificado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, à qual a deste
Tribunal Regional Federal presta deferência, o entendimento de que a CAARJ
possui natureza jurídica de direito público, sendo dotada de personalidade
própria em relação à Ordem dos Advogados do Brasil, mas, por operar planos
privados de assistência à saúde, ela se sujeita à regulação do setor,
realizada pela ANS. É harmônico, no mesmo sentido, o entendimento deste
E. Tribunal Regional Federal: TRF-2 - AC 0122840-47.2017.4.02.5101 [TRF2
2017.51.01.122840-2] - 8ª Turma Especializada - Rel. Des. Fed. GUILHERME
DIEFENTHAELER - Data de decisão: 07/05/2018 - Data de disponibilização:
11/05/2018. Logo, independentemente da qualidade do prestador de serviço,
seja pessoa jurídica de direito público 1 ou privado, fato é que, atuando ela
na iniciativa privada como operadora de planos privados de saúde suplementar,
é certo que sua atividade deve ser exercida em conformidade com o regramento
positivado pela agência reguladora dessa ramo da economia. 4. Na sequência,
a embargante sustenta que a Lei nº 9.656/98 não é aplicável aos contratos
celebrados em data anterior ao início de vigência da lei e, por livre escolha
dos beneficiários, não adaptados à sistemática legal, concluindo, na sequência,
que a ANS não possui competência para autuar as operadoras. Afirma, nessa
senda, que a apreciação de eventuais ilegalidades deveria ter sido feita
pela Superintendência de Seguros Privados - SUSEP ou por órgãos de proteção
ao consumidor. O argumento não resiste a uma perfunctória compreensão do
regime jurídico criado pela Lei nº 9.656/98. Esse diploma legal, de 03
de junho de 1998, pretende não somente disciplinar as relações jurídicas
estabelecidas entre as operadoras de planos de saúde e os consumidores
- regidas essencialmente pelo direito privado contratual -, mas também
as relações jurídicas entre aquelas e o Estado, aqui presentado por uma
autarquia em regime especial, a ANS, criada pela Lei nº 9.961/00 - e que são,
necessariamente, de direito público administrativo, por estarem inseridas no
escopo da atividade regulatória do Estado, a ele incumbida pelo artigo 174 da
Constituição Federal. É dizer, em outras palavras, que o conteúdo normativo
da lei se presta não somente a balizar o exercício da autonomia contratual
no âmbito dos seguros de saúde, mas também a disciplinar as condutas das
próprias seguradoras enquanto agentes econômicos de um setor regulado. Disso
se conclui que, embora algumas normas da Lei nº 9.656/98 não possam retroagir
para atingir avenças celebradas anteriormente à vigência, o que vulneraria
a autonomia da vontade, como, aliás, reconhece o próprio artigo 35, caput,
desse diploma legal, outras delas, por constituírem previsões legais
para autorizar o exercício do poder de polícia pela agência reguladora,
se aplicam a quaisquer transgressões perpetradas após a sua vigência,
ainda que envolvendo um contrato anterior à lei, o que vem expresso no seu
artigo 25. Assim, o artigo 35 consagra uma regra geral para as situações
que envolvam unicamente os aspectos internos da relação contratual de plano
de assistência à saúde, e, em relação a estas, somente se aplicará a Lei nº
9.656/98 para os contratos celebrados posteriormente à sua vigência, enquanto
que o artigo 25 constitui uma regra de polícia administrativa, e, portanto,
se aplica a qualquer relação contratual de plano de assistência à saúde,
ainda que baseada em contrato anterior e não adaptado, desde que em relação à
infrações administrativas cometidas posteriormente, vez que a lei punitiva não
pode retroagir. 5. Importa ressaltar que, recentemente, o Supremo Tribunal
Federal julgou o mérito da Ação Direta de Inconstitucionalidade 1931/DF,
em acórdão conduzido pelo Min. Marco Aurélio. Malgrado a redação da ementa
possa levar à equivocada conclusão de que deve ser levada em consideração
a legislação vigente à época da contratação, o que, na presente hipótese,
afastaria a Lei nº 9.656/98, deve-se ter em mente que a matéria levada à
julgamento para a Suprema Corte dizia respeito unicamente à constitucionalidade
de dispositivos legais que intervinham na própria relação jurídica contratual,
em seu aspecto intrínseco, não tendo sido discutida pela Corte, em nenhum
momento, qualquer norma atinente ao exercício do poder de polícia da agência
reguladora competente. Em relação à tais normas, como é o caso do supracitado
artigo 25, portanto, permanece intacta a presunção de constitucionalidade. Ora,
tendo a infração administrativa imputada sido cometida em 2002, é evidente
que está sujeita aos preceitos da Lei nº 9.656/98, bem assim ao poder
fiscalizatório e sancionador da ANS, ainda que tenha de tomar como referência
o disposto no próprio contrato celebrado em 2 12/05/1992. 6. O Superior
Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1568244, relatado
pelo Min. Ricardo Villas Bôas Cueva (14/12/2016), julgado pela sistemática
dos recursos repetitivos, definiu diversos parâmetros acerca de reajustes
das contraprestações pecuniárias dos planos privados de assistência à saúde
em razão da idade do usuário. Por sua vez, a Súmula Normativa nº 3/2001 da
ANS dispõe que, nos contratos anteriores à Lei 9.656/98, sem fixação dos
percentuais de majoração, devem ser considerados os valores das tabelas
de venda, desde que comprovadamente vinculadas ao contrato e entregues ao
beneficiário. 7. Na hipótese, observa-se que o instrumento do contrato prevê
expressamente a possibilidade de reajuste, conforme determinadas faixas
etárias, conforme suas Cláusulas 14ª e 15ª. Percebe-se, contudo, que não
há, no próprio texto do contrato, a indicação expressa das faixas etárias
e os correspondentes reajustes. A tabela de reajuste na verdade consta da
chamada "tabela de vendas", mas não da apólice em si, motivo pelo qual se
conclui que deveria a usuária do plano de saúde ter sido informada adequada
e expressamente acerca do reajuste, quando estivesse por ser realizado,
ou seja, quando a usuária completasse a idade para incidência do referido
reajuste. Correta, portanto, a ponderação feita pela magistrada sentenciante,
no sentido de que: "Insta ressaltar que não foi o fato da operadora ter
praticado aumento em razão da mudança de faixa etária que teria configurado
a infração passível de multa, mas sim o fato do percentual de reajuste não
estar explícito na cláusula contratual, constando apenas menção a uma tabela
de prêmios". Com efeito, a penalidade administrativa, no presente caso,
se justifica em razão da violação ao dever de informação a ser prestada
ao usuário, e não propriamente ao contrato em si, que realmente prevê,
em abstrato, a possibilidade de reajuste da mensalidade conforme as faixas
etárias. Ademais, tanto no processo administrativo sancionador, quanto no
presente processo judicial, a CAARJ se resigna estriba em argumentos genéricos
acerca da regularidade do contrato, apresentando modelos genéricos de minuta
contratual, sem que de tal documentação possa se verificar se o segurado teve
conhecimento do fato de que a tabela de reajustes constava, em verdade, do
manual do usuário, e não do próprio corpo da apólice. 8. Tendo em vista que o
Código de Defesa do Consumidor estabelece como direito básico do consumidor
a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com
especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade,
tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem (artigo
6º, inciso III), existe em desfavor do fornecedor um ônus de demonstrar que
tal informação foi prestada a contento. A outro giro, não é razoável presumir
que a usuária tivesse conhecimento da Tabela de Prêmios, que constava de
um documento apartado da própria apólice, esta sim que é o instrumento do
contrato de seguro, e tampouco das circunstâncias de eventual reajuste. Em
síntese: malgrado o reajuste em si tenha sido realizado dentro dos patamares
previstos no próprio contrato, não houve prova sobre a adequada prestação
de informações ao consumidor, mormente porque a reclamação formulada
pela beneficiária à ANS. Nos termos da legislação consumerista, que rege
também os planos de saúde, tal ônus não pode ser repassado ao consumidor,
devendo a fornecedora do serviço providenciar a maior transparência, ainda
que o reajuste em si seja admitido pelo contrato. Na situação concreta ora
em julgamento, forçoso é concluir que, ainda que a beneficiária do seguro
tivesse em mãos a apólice, sequer pelo instrumento do contrato ela poderia
divisar os critérios de reajuste, vez que estes vinham indicados em instrumento
apartado. Essa responsabilidade de prestar adequadamente as informações sobre
as contraprestações devidas é ainda maior no contexto dos contratos de planos
de assistência à 3 saúde, que são de adesão e de longa duração, situando-se o
consumidor numa relação de natural desvantagem, pois sequer pode negociar os
termos da pactuação, devendo optar por aderir integralmente ou não ao regime
contratual oferecido, ao qual provavelmente permanecerá vinculado por anos,
como ocorreu no caso, motivo pelo qual se conclui que deve haver a maior
quantidade de informações para que possa tomar suas decisões de forma racional
e segura. Confira-se: TRF-2 - 0066735-21.2015.4.02.5101 (2015.51.01.066735-1)
- 6ª Turma Especializada - Rel. Des. Fed. REIS FRIEDE - Data de decisão:
22/02/2018 - Data de disponibilização: 10/04/2018. 9. Igualmente não
socorre a pretensão recursal o fato de a magistrada singular ter feito
alusão, quando fundamentou a sentença, ao Estatuto do Idoso, que realmente
proíbe a aplicação de reajuste em razão da idade. Primeiro, porque se trata,
nitidamente, de um reforço argumentativo. O fundamento da imposição da sanção
administrativa continua sendo a norma regulamentar da ANS, sem prejuízo de
a sentença aludir, a título de esclarecimento, à outra norma que corrobora o
mesmo raciocínio. Segundo, porque o Estatuto do Idoso constitui norma de ordem
pública, motivo pelo qual sua aplicação, in concreto, deve ser feita pelo Poder
Judiciário mesmo sem a provocação das partes. 10. Também não merece acolhimento
a tese de nulidade do auto de infração por suposta violação ao princípio da
legalidade do ato administrativo, tendo em vista que, verificada a infração à
norma regulatória da ANS, incumbia ao agente público responsável a instauração
do processo administrativo sancionador para aplicação da penalidade. Já é
de há muito pacificado o entendimento na jurisprudência no sentido de que,
tendo as agências reguladoras sido criadas por lei, as quais, em geral,
instituem para tais entidades a atribuição de normatização e fiscalização
de determinado setor da atividade econômica, as normas por elas produzidas,
e o exercício do seu poder de polícia, se realizados na exata medida da
legislação de regência, como, no caso, as Leis nºs 9.656/98 e 9.961/00, não
transgridem o princípio constitucional da legalidade. 11. Tampouco prospera
a afirmação de irrazoabilidade e desproporcionalidade da sanção aplicada,
tendo em vista que o valor de R$ 21.000,00, o qual constitui o principal da
dívida exequenda, com os acréscimos dos juros e do Decreto-Lei nº 1.025/69,
possuem um caráter dúplice, pedagógico ou dissuasório, e também punitivo ou
repressivo, não cabendo ao Poder Judiciário substituir-se ao administrador
público, mormente a entidade responsável pela regulação do setor econômico,
com fito de transmudar a pena pecuniária numa pena de advertência, a qual
sequer se mostra, em abstrato, cabível à hipótese. Nesse sentido: TRF-2 -
0140794-09.2017.4.02.5101 (2017.51.01.140794-1) - 5ª Turma Especializada -
Rel. Juiz Federal Conv. FIRLY NASCIMENTO FILHO - Data de decisão: 08/05/2018 -
Data de Disponibilização: 10/05/2018. 12. Negado provimento ao recurso. Tendo
em vista que não houve condenação em honorários advocatícios na primeira
instância, não se aplica o artigo 85, § 11, do CPC/15
Data do Julgamento
:
20/09/2018
Data da Publicação
:
25/09/2018
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
POUL ERIK DYRLUND
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
POUL ERIK DYRLUND
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