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Jurisprudência


TRF2 0131821-45.2015.4.02.5001 01318214520154025001

Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. CONCESSIONÁRIA. PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO. INCÊNDIO EM ÁREA EXPERIMENTAL. NEXO CAUSAL E DANO MATERIAL DEMONSTRADOS. OMISSÃO. FUNCIONAMENTO E MANUTENÇÃO DE ELÉTRICA. DEVER DE INDENIZAR. QUANTUM INDENIZATÓRIO DEMONSTRADO. DADOS PÚBLICOS E ESTUDO TÉCNICO DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO. 1. Apelação cível em face de sentença que julgou procedente pedido de condenação de concessionária de serviço público ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 154.223,84 (cento e cinquenta e quatro mil e duzentos e vinte e três reais e oitenta e quatro centavos) decorrente de a incêndio na área de propriedade da demandante. 2. A responsabilidade civil é tema jurídico que discute a possibilidade de se impor àquele que causa dano a outrem o dever de reparar pelo resultado causado. A matéria encontra especial amparo nos artigos 5º, X e 37, § 6º, ambos da CRFB, e nos artigos 43, 186, 187 e 927, todos do Código Civil (CC/2002). 3. Quando se trata de omissão do ente estatal, em que pese a existência divergência doutrinária sobre a sua natureza, se esta seria objetiva ou subjetiva, a jurisprudência do STF se orienta no sentido de que a responsabilidade civil do Estado por omissão também está fundamentada no artigo 37, § 6º, da Constituição da República (CRFB), ou seja, configurado o nexo de causalidade entre o dano sofrido pelo particular e a omissão do Poder Público em impedir a sua ocorrência - quando tinha a obrigação legal específica de fazê-lo - surge a obrigação de indenizar, independentemente de prova da culpa na conduta administrativa (STF, Tribunal Pleno, RE 841.526, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 1.8.2016; STF, Tribunal Pleno, AgR-EDv-AgR 677139, Rel. Min. GILMAR MENDES, DJe 9.12.2015; STF, 1ª Turma, ARE 754.778 AgR, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, DJe 19.12.2013). 4. O entendimento do Supremo Tribunal Federal a respeito da matéria encontra-se firmado no sentido de que as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público respondem objetivamente por suas ações ou omissões em face de reparação de danos materiais suportados por terceiros (STF, AgRg em ARE 1043232, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, DJE 13.9.2017; AgRg em ARE 951552, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, DJE 26.8.2016), sendo dispensável a evidência de dolo ou culpa administrativa. 5. A controvérsia cinge-se à análise da existência do dever de indenização em razão de responsabilidade civil de pessoa jurídica de direito privado [prestadora de serviço público] por deixar de manter bom funcionamento e manutenção de rede elétrica [falha do serviço], ato omissivo que teria ocasionado o rompimento de cabo de energia elétrica em área florestal e, por conseguinte, teria provocado incêndio configurando danos materiais indenizáveis. 6. Alegações recursais baseadas na inexistência de demonstração da responsabilidade subjetiva da 1 concessionária no evento danoso, em razão da ausência de nexo causal e de dano material comprovado. 7. Em que pese o apelante afirmar inexistir comprovação da causa do dano constatado, o Juízo se baseou na suficiência das provas referentes ao relatório do Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo - IDAF, órgão estadual que tem competência para a defesa agropecuária e florestal, em conclusão da fiscalização in locu realizada na área afetada, ficando demonstrado que a causa do incêndio foi o curto circuito do fio de alta tensão e a posterior queda do referido cabo. Do mesmo modo, o documento referente ao Relatório de Ocorrência elaborado pelo Supervisor de Vigilância do CCA-UFES, em 17.09.2013, aponta que o incêndio se deu em razão do rompimento do fio de alta-tensão pertencente à EDP ESCELSA 8. Houve embasamento insuficiente do recorrente quanto à inexistência de nexo causal, porquanto foram acostadas cópias parciais do sistema da EDP/ESCELSA, sem que tenha sido apresentado o documento integral capaz de aferir a alegada causa do próprio desarme de energia. Nota-se, inclusive, que a informação atinente à causa do desarme foi suprimida (fl. 522), apenas constando o horário da suposta desenergização do cabo, o que não comprova as suas alegações de que não deu causa ao incêndio. 9. Ademais, depoimento prestado em videoconferência pela testemunha [engenheiro da ESCELSA], foi confirmado o desarme da rede elétrica, porém não foi afastada que a causa do incêndio tenha sido o rompimento do cabo de energia elétrica. Do conjunto probatório dos autos, extrai-se a conclusão que inexistiu qualquer fator externo para a ocorrência do curto circuito e do rompimento do cabo, senão o defeito apresentado pela rede elétrica decorrente de seu funcionamento, o que, in casu, demonstra a falha no serviço prestado pela ESCELSA. 10. Ainda que não haja prova direta, com relatório técnico, apontando a causa precisa para a "desenergização" do cabo ao momento de seu rompimento, o que não foi o caso, tal constatação mostrar- se-ia irrelevante para afastar a caracterização de conduta omissiva da concessionária. 11. Isso porque a empresa foi acionada pelos coordenadores a fim de que desligassem a rede elétrica "para que pudessem deslocar uma equipe até o local do incêndio para controlá-lo, pois seria facilmente contido se houvesse a possibilidade de chegar até o local." No entanto, apenas houve comparecimento da apelante no dia seguinte, quando o incêndio já havia se alastrado, sem possibilidade de impedir o evento danoso. 12. Dessa forma, foi em razão da conduta omissiva da apelante [falha na prestação do serviço de distribuição e manutenção do sistema de rede elétrica] que o evento danoso foi causado [curto circuito provocando o rompimento do cabo de alta tensão]. E, mais ainda, se materializado [precariedade na assistência para atender ao acionamento e confirmar o desligamento da rede elétrica], com os efeitos do incêndio na área experimental da UFES. 13. Trata-se de fundamento que se acresce ao do Juízo a quo para identificação da omissão da empresa apelante e consequente comprovação do nexo causal. A conduta omissiva da concessionária também se consubstancia, além dos indícios probatórios que apontam como o curto circuito e rompimento do cabo, na demora em responder à solicitação referente ao cabo e a dúvida acerca de sua desenergização. Havendo resposta tempestiva da empresa, o evento danoso seria contido, conforme aponta relatório do IDAF. 14. Portanto, presente o nexo de causalidade que indica a responsabilidade da apelante para indenizar área afetada por incêndio decorrente de omissão no seu atendimento à ocorrência (obrigação da ESCELSA na qualidade de concessionária do serviço público de fornecer e manter uma rede de distribuição de energia elétrica segura) e o incêndio danoso. Demonstrados a responsabilidade civil da apelante e o consequente dever de indenizar o dano material. 15. Quanto à suposto equívoco na demonstração dos danos materiais, ressalta-se que tal ponto foi, de igual modo, corretamente aferido na sentença. A computação dos danos materiais em reação à mata atingida pelo incêndio danoso levou em consideração: (i) medição da área afetada por aparelho de GPS, por 2 comissão técnica designada para a aferição; (ii) dados públicos fornecidos pela EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária; e (iii) estudo técnico que embasou a área afetada, realizado por profissional especializado e em momento anterior ao incêndio (estudo de 2012, fl. 27). 16. Sendo assim, descabe alegação quanto à parcialidade e unilateralidade da aferição apenas em razão de ter sido produzido por funcionário da UFES, porquanto os dados de aferição da área e os custos atribuídos foram pautados em critérios objetivos e técnicos. 17. O apelante limitou-se a impugnar aspectos formais ("quem fez a medição da área, qual a precisão do aparelho utilizado [...] e como foi calculada a metragem de cerca", fl. 527), sem que tenha apresentado elementos constitutivos ou proposta substitutiva que refutassem aquela já realizada em sede administrativa pela comissão técnica e especializada para medição dos danos materiais. 18. No mais, conforme orientação da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, é devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do artigo 85, § 11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente: a) decisão recorrida publicada a partir de 18.3.2016, quando entrou em vigor o novo CPC; a) recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente; c) condenação em honorários advocatícios desde a origem, no feito em que interposto o recurso (STJ, 2ª Seção, AgInt nos EREsp 1539725, Rel. Min. ANTONIO CARLOS FERREIRA, DJe 19.10.2017). 19. Honorários majorados em prol da apelada [UFES], no caso concreto de 10% para 11% do valor atualizado da causa (R$ 154.223,84 cento e cinquenta e quatro mil, duzentos e vinte e três reais e oitenta e quatro centavos), na forma do art. 85, § 11, do CPC/2015, por não se tratar de causa complexa, atendendo ao caráter dúplice da norma, na exegese do STJ. Contudo, a exigibilidade de tais verbas permanece suspensa, em face da gratuidade de justiça deferida, nos termos do §3º do art. 98 do CPC/2015. 20. Apelação desprovida.

Data do Julgamento : 29/01/2019
Data da Publicação : 01/02/2019
Classe/Assunto : AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador : 5ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a) : RICARDO PERLINGEIRO
Comarca : TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : RICARDO PERLINGEIRO
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